Rastros Freudianos em Mário de Andrade - Universidade Federal ...
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É <strong>de</strong>tenção, fixação (fixierung), no sentido freudiano, da dialética do ser <strong>em</strong><br />
uma i<strong>de</strong>ntificação carente <strong>de</strong> mediação, e por isso enfatuada. A falta <strong>de</strong><br />
mediação alu<strong>de</strong> precisamente a que esta estase prescin<strong>de</strong> do reconhecimento e<br />
não se mediatiza através do <strong>de</strong>sejo como <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> reconhecimento. 262<br />
Apesar <strong>de</strong> que <strong>em</strong> alguns momentos <strong>de</strong> seus Escritos e S<strong>em</strong>inários Lacan<br />
utiliza os termos Loucura e Psicose como sinônimos, loucura é um termo que<br />
transcen<strong>de</strong> a diferenciação das estruturas clínicas, atravessando todo o campo da<br />
subjetivida<strong>de</strong>, como b<strong>em</strong> assinala Rabinovich. Freud, por ex<strong>em</strong>plo, <strong>em</strong> Introdução ao<br />
narcisismo, nos mostrou o caráter <strong>de</strong> loucura do amor. 263 Lacan, no escrito sobre a<br />
causalida<strong>de</strong> psíquica, situa como louco o personag<strong>em</strong> Alcestes <strong>de</strong> Molière (O<br />
misantropo), por estar cativo do amor, <strong>de</strong>finido como próprio dos espelhismos<br />
mundanos; <strong>em</strong> Televisão, diz que as mulheres são loucas, mas “não loucas-<strong>de</strong>-todo”,<br />
que além <strong>de</strong> querer dizer “elas não são totalmente loucas”, alu<strong>de</strong> ao não-todo da<br />
sexualida<strong>de</strong> f<strong>em</strong>inina. No s<strong>em</strong>inário VI - O <strong>de</strong>sejo e sua interpretação, Lacan dirá que<br />
Hamlet se faz <strong>de</strong> louco para dissimular as suas intenções, pois diferent<strong>em</strong>ente <strong>de</strong><br />
Édipo ele sabe, e por isso está numa posição perigosa. Fazer-se <strong>de</strong> louco seria uma das<br />
dimensões da política do herói mo<strong>de</strong>rno, segundo Lacan, que situa <strong>em</strong> Hamlet um<br />
modo <strong>de</strong> “ser louco com os outros”.<br />
Muitas experiências das vanguardas literárias e artísticas pu<strong>de</strong>ram ser<br />
consi<strong>de</strong>radas loucas, no sentido <strong>de</strong> excessivas, apaixonadas ou transgressivas, s<strong>em</strong><br />
ser<strong>em</strong> psicóticas. Aliás, a relação que se estabeleceu entre loucura e verda<strong>de</strong>, 264 da<br />
loucura como experiência que toca a verda<strong>de</strong>, fez com que muitos artistas<br />
reivindicass<strong>em</strong> o estado <strong>de</strong> loucura. Os surrealistas, que já haviam celebrado a histeria<br />
como “um meio supr<strong>em</strong>o <strong>de</strong> expressão”, inspirados <strong>em</strong> Antonin Artaud, lançaram <strong>em</strong><br />
1925 a sua “Carta aos médicos-chefes dos asilos <strong>de</strong> loucos”, na qual consi<strong>de</strong>ram todo<br />
ato individual como um ato <strong>de</strong> loucura, e o louco como um criador, cujo valor é o<br />
mesmo que o do sonhador ou do histérico – assim como reivindicaram o direito à<br />
morte, o sexo, reivindicaram também a mulher criminosa, a mulher louca. Esta<br />
representaria uma espécie <strong>de</strong> heroína que se rebela contra a “felicida<strong>de</strong> doméstica”, a<br />
262 D. Rabinovich, op. cit., p.137.<br />
263 Wisnik, <strong>em</strong> artigo já citado, r<strong>em</strong>etendo-nos ao Fedro <strong>de</strong> Platão, l<strong>em</strong>bra os quatro campos <strong>de</strong><br />
manifestação da loucura divina, a mania, como estado <strong>de</strong> entusiasmo: a poesia, a adivinhação, a paixão<br />
amorosa e a possessão dionisíaca.<br />
264 A relação entre verda<strong>de</strong> e loucura po<strong>de</strong> ser aprofundada indo-se ao escrito <strong>de</strong> Lacan “Formulações<br />
sobre a causalida<strong>de</strong> psíquica” e à obra <strong>de</strong> Michel Foucault História da loucura, particularmente ao<br />
capítulo sobre “O círculo antropológico”.<br />
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