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Rastros Freudianos em Mário de Andrade - Universidade Federal ...

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sacrifícios ao sujeito: a aparição da dama loura para Febrônio, as exigências <strong>de</strong> Deus<br />

para Schreber. Irromper no real não implica ser <strong>de</strong>sprovido <strong>de</strong> significação, mas é o<br />

aparecimento <strong>de</strong> uma significação que não v<strong>em</strong> <strong>de</strong> parte alguma e tampouco r<strong>em</strong>ete a<br />

nada, pela razão <strong>de</strong> nunca ter integrado a ca<strong>de</strong>ia simbólica, mas que essencialmente<br />

concerne ao sujeito. Da alucinação à interpretação, o sujeito psicótico t<strong>em</strong> a certeza<br />

inabalável <strong>de</strong> que aquilo <strong>de</strong> que se trata lhe diz respeito. O chamado fenômeno<br />

el<strong>em</strong>entar implica que para o psicótico tudo po<strong>de</strong> tornar-se signo, inclusive os objetos<br />

inanimados, e neste caso nada do que acontece é por acaso.<br />

Freud, <strong>em</strong> suas Notas sobre a paranóia, distancia-se das concepções <strong>de</strong> sua<br />

época concernentes ao <strong>de</strong>lírio, ao dizer que “a formação <strong>de</strong>lirante que presumimos ser<br />

o produto patológico é, na realida<strong>de</strong>, uma tentativa <strong>de</strong> restabelecimento, um processo<br />

<strong>de</strong> reconstrução”. 257 Reconstrução do mundo <strong>em</strong> termos <strong>de</strong> reinvestimento das<br />

catexias libidinais que <strong>de</strong>le haviam sido retiradas, voltando-se para o próprio eu. Ao<br />

<strong>de</strong>finir as psicoses <strong>de</strong>ntro do quadro das “neuroses narcísicas”, Freud pensa a paranóia<br />

como uma fixação do sujeito no estágio do narcisismo, o que apontaria para um “não<br />

amo mas que a mim mesmo”. O esvaziamento libidinal do mundo e o subseqüente<br />

inchaço narcísico resultaria na tão característica megalomania da paranóia. Freud<br />

relaciona as teorias do fim do mundo <strong>de</strong> Schreber com a catástrofe interna do<br />

presi<strong>de</strong>nte, o retraimento <strong>de</strong> seu amor pelo mundo. É através do trabalho <strong>de</strong> seus<br />

<strong>de</strong>lírios que o paranóico reconstrói o seu mundo, ou melhor, um lugar possível no<br />

mundo. A interpretação <strong>de</strong>lirante po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rada como uma tentativa <strong>de</strong> aliviar<br />

os efeitos daquela falta no simbólico e suas conseqüências no imaginário. Schreber,<br />

através do trabalho do <strong>de</strong>lírio, alcançará por um t<strong>em</strong>po uma estabilização <strong>de</strong> sua<br />

psicose, ao passar do <strong>de</strong>lírio <strong>de</strong> ser perseguido por Deus ao <strong>de</strong> ser a mulher <strong>de</strong> Deus.<br />

Desta maneira, a transformação do <strong>de</strong>lírio, que po<strong>de</strong> ser chamado <strong>em</strong> termos<br />

lacanianos <strong>de</strong> metáfora <strong>de</strong>lirante, retém uma significação, limitando o gozo com esta<br />

significação do objeto que ele é. Afinal <strong>de</strong> contas, “que é um <strong>de</strong>lírio senão um<br />

processo <strong>de</strong> significantização, por reduzido que seja, mediante o qual o sujeito logra<br />

elaborar e fixar uma forma <strong>de</strong> gozo aceitável para ele?”. 258<br />

Numa outra abordag<strong>em</strong> da psicose schreberiana, Eric Santner, <strong>em</strong> A Al<strong>em</strong>anha<br />

<strong>de</strong> Schreber, articulará a paranóia <strong>de</strong> Schreber com a i<strong>de</strong>ologia do nacionalsocialismo,<br />

dialogando com teóricos como Elias Canetti, Deleuze e Guattari, <strong>de</strong>ntre<br />

257 S. Freud, op. cit., pp. 94-95.<br />

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