26.02.2014 Views

Rastros Freudianos em Mário de Andrade - Universidade Federal ...

Rastros Freudianos em Mário de Andrade - Universidade Federal ...

Rastros Freudianos em Mário de Andrade - Universidade Federal ...

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

que caracterizaria a paranóia seria respon<strong>de</strong>r a uma fantasia com <strong>de</strong>lírios <strong>de</strong><br />

perseguição.<br />

Apesar <strong>de</strong> neste texto Freud tentar explicar a paranóia através da mesma noção<br />

que dá conta dos sintomas na neurose, ele nos fornece algumas pistas para pensarmos<br />

que a psicose respon<strong>de</strong> a um outro mecanismo que não a repressão. No início <strong>de</strong>ste<br />

que é seu principal texto sobre a psicose, Freud afirma que a pesquisa psicanalítica da<br />

paranóia só se tornou possível porque estes sujeitos possu<strong>em</strong> “a peculiarida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

revelar exatamente aquelas coisas que [os] neuróticos mantêm escondidas como um<br />

segredo”. Esta afirmação nos r<strong>em</strong>ete à idéia <strong>de</strong> que na psicose o inconsciente estaria a<br />

céu aberto, justamente porque nela não se trata <strong>de</strong> repressão mas da rejeição ou<br />

forclusão – Verwerfung 254 – <strong>de</strong> um significante primordial. Este termo, ressaltado por<br />

Lacan, é utilizado por Freud <strong>em</strong> outros textos, especialmente no historial clínico do<br />

hom<strong>em</strong> dos lobos, quando Freud se refere a uma rejeição da idéia <strong>de</strong> castração, no<br />

sentido <strong>de</strong> um não querer saber nada disso. De acordo com Freud, esta recusa não<br />

implica “<strong>em</strong> julgamento sobre a questão da sua existência [da castração], pois era<br />

como se não existisse”. Como explicita Lacan, o sujeito po<strong>de</strong> recusar o acesso ao<br />

mundo simbólico <strong>de</strong> algo que no entanto ele experimentou, permanecendo assim<br />

excluído, não assumido. A carência <strong>de</strong>sta admissão simbólica primordial t<strong>em</strong> como<br />

conseqüência que a linguag<strong>em</strong> articulada do inconsciente não é reconhecida pelo<br />

sujeito, o qual ignora a língua que fala.<br />

Lacan, diferenciando estruturalmente neurose, psicose e perversão, <strong>de</strong>finirá a<br />

forclusão (Verwerfung) como o mecanismo próprio da psicose. 255 Na neurose, dá-se<br />

do <strong>de</strong>lírio <strong>de</strong> Schreber. Cf. “Psicanálise e familiarismo: a sagrada família”, in: O anti-édipo –<br />

capitalismo e esquizofrenia. 1972.<br />

254 Em al<strong>em</strong>ão, Werfen significa literalmente arr<strong>em</strong>essar, lançar, atirar, etc. “Conotativamente o termo<br />

evoca a idéia <strong>de</strong> <strong>de</strong>scartar e eliminar um material rejeitado” (Cf Luiz Hanns, op. cit., p. 368). A palavra<br />

Verwerfung t<strong>em</strong> sido traduzida por rejeição, repúdio ou, como Lacan preferiu chamar, recorrendo ao<br />

uso <strong>de</strong>ste termo do campo jurídico, forclusão.<br />

255 Faz-se necessário registrar que toda essa teorização sobre a psicose que ora <strong>de</strong>senvolv<strong>em</strong>os se insere<br />

no que Jacques-Alain Miller situou como um primeiro movimento do ensino <strong>de</strong> Lacan, que<br />

caracterizaria uma clínica estrutural. Nesta, haveria uma certa priorida<strong>de</strong> do registro simbólico com<br />

relação aos outros dois registros, o imaginário e o real, estruturas clínicas b<strong>em</strong> <strong>de</strong>limitadas, além <strong>de</strong> um<br />

lugar privilegiado para o significante nome-do-pai. Um segundo movimento <strong>de</strong>ste ensino, que po<strong>de</strong>ria<br />

ser situado a partir do s<strong>em</strong>inário XX, Mais ainda, implicaria numa segunda clínica na qual já não<br />

existiria a primazia <strong>de</strong> um dos registros sobre o outro, mas uma articulação dos três, cuja amarração<br />

seria feita pelo sintoma. Esta articulação ganhou visibilida<strong>de</strong> na figura do nó borromeu. O nome-do-pai<br />

se pluraliza, per<strong>de</strong> seu status privilegiado, tornando-se um s<strong>em</strong>blante do qual pod<strong>em</strong>os fazer uso.<br />

Assim, as rígidas fronteiras que separavam as estruturas clínicas se <strong>de</strong>svanec<strong>em</strong>, escapando-se então à<br />

lógica dos universais, das classes; o que passará a importar será a singularida<strong>de</strong> do caso. Estabelecer<br />

um segundo movimento no percurso <strong>de</strong> Lacan não significa, entretanto, qualificar este ensino <strong>em</strong><br />

termos progressivos, evolutivos, on<strong>de</strong> o que estaria por último seria melhor ou mais avançado. Por isso<br />

106

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!