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Rastros Freudianos em Mário de Andrade - Universidade Federal ...

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Os relatórios psiquiátricos e o argumento da <strong>de</strong>fesa são perpassados pelas<br />

teorias <strong>em</strong> voga na época, que vão <strong>de</strong>s<strong>de</strong> concepções biologicistas da loucura,<br />

passando por outras que associam as <strong>de</strong>terminações biológicas às ambientais, até à<br />

psicanálise freudiana, como se apresenta no relatório <strong>de</strong> Heitor Carrilho:<br />

Ao exame, <strong>de</strong>ixa perceber uma acentuada fixação materna, a par <strong>de</strong> um<br />

complexo paterno (Oedipo complexo)” ou, ainda <strong>em</strong> relação à mãe, ele teria<br />

tido “exageradas manifestações afetivas, [que] ficaram gravadas no seu<br />

subconsciente, mais tar<strong>de</strong> influindo nas manifestações neurósicas <strong>de</strong> sua psico<strong>de</strong>generação.<br />

240<br />

Ao mesmo t<strong>em</strong>po <strong>em</strong> que a psicanálise passava a ser incorporada ao discurso<br />

dos especialistas, ainda havia o peso <strong>de</strong> teorias como a da <strong>de</strong>generação hereditária 241<br />

que, conforme Dain Borges, perpassava o pensamento social brasileiro entre finais do<br />

século XIX e a década <strong>de</strong> 1940, “ligada a uma psicologização do caráter, à ciência da<br />

i<strong>de</strong>ntificação e à psicologia social”. 242 Os teóricos do eugenismo alertavam contra o<br />

perigo da <strong>de</strong>generação, inclusive contra a imigração disgênica, enquanto as escolas<br />

criminológicas e sociológicas buscavam caracterizar o indivíduo anti-social. Febrônio<br />

era consi<strong>de</strong>rado um caso clássico <strong>de</strong> <strong>de</strong>generação, sendo assassino e homossexual.<br />

Acreditava-se que os <strong>de</strong>generados seriam portadores <strong>de</strong> estigmas corporais –<br />

cicatrizes, anomalias congênitas, aci<strong>de</strong>ntais ou adquiridas, marcas ou sinais<br />

conhecer Krafft-Ebing, ao fazer uma referência a ele, quando argumenta acerca da “imperfeita bizarria”<br />

dos humanos.<br />

240 Trecho do Processo <strong>de</strong> Febrônio, citado por P. Fry, op. cit., p. 73.<br />

241 Para o psiquiatra francês B. A. Morel que expõe sua concepção antropológico-psiquiátrica das<br />

doenças mentais no Tratado das <strong>de</strong>generações <strong>de</strong> 1857, a causa mais importante <strong>de</strong> tais enfermida<strong>de</strong>s é<br />

a <strong>de</strong>generação hereditária. Segundo o autor, retomando a Gênesis bíblica, haveria um tipo primitivo<br />

perfeito, do qual o hom<strong>em</strong> se <strong>de</strong>sviou, produzindo-se, assim, uma <strong>de</strong>gradação, uma <strong>de</strong>generação,<br />

favorecida por condições externas nocivas. Mas o principal <strong>de</strong>sta doutrina é o caráter <strong>de</strong><br />

transmissibilida<strong>de</strong> hereditária e progressiva da <strong>de</strong>generação: “à medida <strong>em</strong> que o germe patológico se<br />

transmite, seus efeitos se agravam e os <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong>sc<strong>em</strong> os graus da <strong>de</strong>cadência física e moral até à<br />

esterilida<strong>de</strong>, a imbecilida<strong>de</strong>, a idiotice e finalmente a <strong>de</strong>generação cretinosa” (Morel apud Paul<br />

Bercherie. Los fundamentos <strong>de</strong> la clínica, p.70). Dentre as causas da <strong>de</strong>generação estão o meio social<br />

(indústrias, profissões insalubres, miséria), o mal moral e a imoralida<strong>de</strong> dos costumes, além das<br />

influências hereditárias. O tratamento compreendia não somente o tratamento físico, mas também<br />

cuidados educativos e morais e um certo eugenismo que impediria a progressão do mal na<br />

<strong>de</strong>scendência do paciente. Em 1892, é Max Nordau que, tomando a noção <strong>de</strong> Morel, publica na<br />

Al<strong>em</strong>anha o seu livro Degeneração, abordando o que consi<strong>de</strong>rava a <strong>de</strong>cadência das artes e da cultura<br />

no fim do século. A atmosfera <strong>de</strong> fadiga generalizada implicará uma perda <strong>de</strong> credibilida<strong>de</strong> dos valores,<br />

das formas e das i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s simbólicas, instituindo um estado <strong>de</strong> interregno e suas conseqüências, as<br />

quais ele via como terríveis. Associando a histeria a essa sensação <strong>de</strong> fadiga, atribuirá ao ritmo<br />

frenético das inovações tecnológicas a responsabilida<strong>de</strong> pelo quadro <strong>de</strong> <strong>de</strong>clínio sócio-cultural. Nordau<br />

incluirá <strong>de</strong>ntre os <strong>de</strong>generados, além dos criminosos, loucos e prostitutas, certos escritores e artistas<br />

como o “pe<strong>de</strong>rasta” Oscar Wil<strong>de</strong>, o “pervertido” Bau<strong>de</strong>laire, Emile Zola, entre outros.<br />

242 O. Gomes da Cunha, op. cit.<br />

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