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Rastros Freudianos em Mário de Andrade - Universidade Federal ...

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do Rio <strong>de</strong> Janeiro. Além <strong>de</strong> Febrônio, Blaise interessou-se por outras figuras da cena<br />

brasileira, como “O Lobisom<strong>em</strong> <strong>de</strong> Minas” e “O coronel Bento”, que se tornaram<br />

personagens do livro La vie dangereuse. O livro, publicado <strong>em</strong> 1938, reunia um<br />

conjunto <strong>de</strong> histórias extraordinárias, passadas no Brasil, com <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> negros<br />

africanos. L<strong>em</strong>br<strong>em</strong>os, também, que o poeta, além <strong>de</strong> escritor, havia iniciado uma<br />

formação médica na Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Medicina <strong>de</strong> Berna, e que era <strong>de</strong>tentor dum vasto<br />

conhecimento <strong>em</strong> psiquiatria. Interessou-se por t<strong>em</strong>as ligados à psicologia e à<br />

sexualida<strong>de</strong>, tendo <strong>de</strong>scoberto a psicanálise quando viajava pela Áustria, pela<br />

Al<strong>em</strong>anha e pela Suíça. 226<br />

No texto escrito sobre Febrônio, publicado <strong>em</strong> sua Antologia, Cendrars relata,<br />

através <strong>de</strong> uma narrativa envolvente, o seu encontro com ele, as impressões <strong>de</strong>ixadas,<br />

dados <strong>de</strong> sua biografia e o intuito <strong>de</strong> articular os seus atos criminosos com rituais<br />

tribais <strong>de</strong> orig<strong>em</strong> africana. Num estilo que mescla reportag<strong>em</strong> e ficção, o poeta<br />

encarna o antropólogo, vendo <strong>em</strong> Febrônio a mescla <strong>de</strong> diferentes culturas, que lhe<br />

ressoam como o rufar dos tambores <strong>de</strong> ancestrais longínquos. Por isso propõe que a<br />

história <strong>de</strong> Febrônio, ali resumida, seja lida como um palimpsesto, “tentando<br />

restabelecer <strong>de</strong>baixo do texto (...) tudo o que na carreira t<strong>em</strong>pestuosa <strong>de</strong>sse negro<br />

monstruoso t<strong>em</strong> alguma ressonância ou correspon<strong>de</strong> ao que nós sab<strong>em</strong>os da<br />

mentalida<strong>de</strong> dos primitivos e da mitologia da África” 227 . Apesar das orientações dos<br />

guardas, Blaise insistia <strong>em</strong> tentar falar com o preso, aproximando-se <strong>de</strong>le com muito<br />

226 Cf. E. Roudinesco, História da Psicanálise na França – A batalha dos c<strong>em</strong> anos. vol. 2:1925-1985,<br />

p. 93. Sobre a relação com a psicanálise, <strong>de</strong> acordo com a autora, escreve Cendrars <strong>em</strong> L’homme<br />

foudroyé: “Se a psicanálise me tivesse interessado, eu po<strong>de</strong>ria ter feito um gran<strong>de</strong> artigo ou escrito uma<br />

brochura para divulgar esta teoria na França. Mas não acreditava nela. Em meu retorno da Al<strong>em</strong>anha,<br />

on<strong>de</strong> tinha podido constatar <strong>de</strong> visu suas <strong>de</strong>vastações nos meios intelectuais <strong>de</strong> Viena e <strong>de</strong> Munique<br />

(...), eu disse bastante a esse respeito a Guillaume Apollinaire para lhe fornecer material para uma<br />

repercussão abundante”.<br />

227 B. Cendrars. “Febrônio Índio do Brasil”, Etc..., Etc... (Um livro 100% Brasileiro), p.175. É fato<br />

conhecido a reabilitação do primitivo operada pelos mo<strong>de</strong>rnistas, e a síntese do primitivo e do mo<strong>de</strong>rno<br />

para o grupo <strong>de</strong> 22, como aspectos contrastantes da cultura nacional. Segundo Benedito Nunes <strong>em</strong><br />

Oswald canibal, “o primitivo era o imprevisível, o irracional (...) o mo<strong>de</strong>rno, a previsão que or<strong>de</strong>na, a<br />

razão que organiza, a ‘prática culta da vida’ cujo regime a civilização tecno-industrial impunha” (p.<br />

29). <strong>Mário</strong> <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, num artigo <strong>de</strong> 1944 intitulado “Primitivos” (Revista da Acad<strong>em</strong>ia Paulista <strong>de</strong><br />

Letras, nº 27, 12/09/1944), mostra-se preocupado com as confusões <strong>em</strong> torno <strong>de</strong>ste termo, usado na<br />

crítica <strong>de</strong> arte. Assinala o erro <strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar a manifestação artística <strong>de</strong> uma escola ou indivíduo <strong>em</strong><br />

relação a outra que viria <strong>de</strong>pois como primitiva, pois “cada época, cada povo, cada indivíduo genial<br />

realiza a total possibilida<strong>de</strong> da sua concepção estética e da sua expressão”. Aceita que a noção seja<br />

usada para o hom<strong>em</strong> pré-histórico, para o hom<strong>em</strong> natural e <strong>em</strong> certo sentido para a criança. Questiona<br />

seriamente a qualificação <strong>de</strong> primitivos para aqueles que utilizam <strong>em</strong> suas pesquisas estéticas processos<br />

<strong>de</strong> expressão artística encontrados nos povos primitivos, porque a busca consciente <strong>de</strong> certos efeitos é<br />

“um fenômeno <strong>de</strong> supercultura, ocasionado pela fadiga, pela ânsia do novo ou pelo pragmatismo. Não<br />

se trata <strong>de</strong> forma alguma <strong>de</strong> um estágio, mas <strong>de</strong> uma atitu<strong>de</strong> mental”. Consi<strong>de</strong>ra, ainda, uma atitu<strong>de</strong> e<br />

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