Análise comparativa dos serviços públicos de ... - IEE/USP

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21.12.2013 Views

195 no planejamento e financiamento de políticas públicas, em relação a este aspecto, o padrão de exploração seguiu de perto aquele do início dos setores, no qual os que tinham condições de pagar recebiam os serviços. Tal pode ser confirmado pelo déficit na cobertura dos serviços, bem como nas condições adequadas de uso desses serviços, apresentados na seção 3.3.2. Esse modelo também se refletiu na questão tarifária. A despeito de o atendimento a populações pobres e zonas rurais estar contemplado em praticamente todos os planos setoriais, sobretudo no período militar, na prática o acesso não se estendeu a todos os segmentos e a população mais pobre, sobretudo nos períodos de crise, não reunia condições para a conexão nem para a manutenção do fornecimento dos serviços. O nível de inadimplência era alto e o comprometimento do orçamento familiar, no caso do saneamento, chegava até 3% da renda, índice muito alto para uma população de baixo poder aquisitivo (Acqua Plan, 1995; Infurb, 1995). Nos dois setores, o subsídio ao investimento e o subsídio entre consumidores foram alternativas empregadas. Fosse por meio de estrutura tarifária progressiva, aplicada no saneamento, ou da equalização tarifária e dos instrumentos da tarifa social, todos de caráter redistributivo, a universalização do acesso aos serviços de energia e saneamento não foi alcançado. No caso do setor elétrico, esses subsídios seriam, posteriormente, substancialmente reduzidos, em função da reestruturação liberal dos setores. No que concerne à participação popular, todo o período foi marcado pela centralização e autoritarismo na elaboração e condução de políticas públicas, refletindo o contexto político. Apesar da ocorrência de movimentos reivindicatórios, em especial nos primeiros anos do Estado Novo e na década de 1960, 1970, estes foram insistentemente reprimidos, ora por práticas populistas, ora por ações autoritárias (Bielschowsky, 2000; Rezende, 2000). Contudo, após o fim da “era” militar, já na

196 década de 1990, iniciativas de planejamento e gestão participativa seriam tentadas, em especial no campo da saúde. Nos setores em estudo, permaneceu o modelo centralizador e distante da realidade do cidadão. A partir da próxima seção, analisa-se o “movimento” de reformas liberais, iniciado logo em seguida, em simultâneo à redemocratização política do país. 3.4. OS AJUSTES LIBERAIS NO BRASIL - DA CRISE DO ESTADO À REESTRUTURAÇÃO DOS ANOS 1990 3.4.1. CONJUNTURA POLÍTICA E ECONÔMICA INTERNACIONAL O pano de fundo sobre o qual se viabilizou a restauração do pensamento liberal em âmbito mundial começou a se delinear ainda no início da década de 1970, em torno da “crise de hegemonia” norte-americana, em face de derrotas militares, perdas políticas e de dianteira tecnológica, concomitantemente com o aumento dos preços do petróleo 31 . Na América Latina, a “onda liberal” que culminou com as reformas estruturais aplicadas à maior parte dos países, ao Brasil, em especial, começou a ser fomentada nos últimos anos da década, ganhando seus contornos definitivos ao final dos anos 1980 (Fiori, 1999). Após o auge inflacionário de 1982, iniciou-se nos países centrais um processo de desinflação, seguido por recuperação econômica, decorrente da política de estímulo à demanda agregada aplicada pelos Estados Unidos. Esta política apoiavase no déficit fiscal, financiado pelos títulos da dívida pública, que pagava altos juros. O aumento da demanda fomentou um processo de exportação em larga escala nos países da Europa e Japão, recuperando suas economias. Porém, as altas taxas de juros levaram a tal crescimento da dívida dos países do Terceiro Mundo, que implicou na impossibilidade de seu resgate. Nesse mesmo ano, o México declara moratória (Batista, 1994; Santos, 1993). 31 Ver capítulo 2.

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no planejamento e financiamento <strong>de</strong> políticas públicas, em relação a este aspecto, o<br />

padrão <strong>de</strong> exploração seguiu <strong>de</strong> perto aquele do início <strong>dos</strong> setores, no qual os que<br />

tinham condições <strong>de</strong> pagar recebiam os <strong>serviços</strong>. Tal po<strong>de</strong> ser confirmado pelo déficit<br />

na cobertura <strong>dos</strong> <strong>serviços</strong>, bem como nas condições a<strong>de</strong>quadas <strong>de</strong> uso <strong>de</strong>sses<br />

<strong>serviços</strong>, apresenta<strong>dos</strong> na seção 3.3.2.<br />

Esse mo<strong>de</strong>lo também se refletiu na questão tarifária. A <strong>de</strong>speito <strong>de</strong> o<br />

atendimento a populações pobres e zonas rurais estar contemplado em praticamente<br />

to<strong>dos</strong> os planos setoriais, sobretudo no período militar, na prática o acesso não se<br />

esten<strong>de</strong>u a to<strong>dos</strong> os segmentos e a população mais pobre, sobretudo nos perío<strong>dos</strong> <strong>de</strong><br />

crise, não reunia condições para a conexão nem para a manutenção do fornecimento<br />

<strong>dos</strong> <strong>serviços</strong>. O nível <strong>de</strong> inadimplência era alto e o comprometimento do orçamento<br />

familiar, no caso do saneamento, chegava até 3% da renda, índice muito alto para<br />

uma população <strong>de</strong> baixo po<strong>de</strong>r aquisitivo (Acqua Plan, 1995; Infurb, 1995).<br />

Nos dois setores, o subsídio ao investimento e o subsídio entre consumidores<br />

foram alternativas empregadas. Fosse por meio <strong>de</strong> estrutura tarifária progressiva,<br />

aplicada no saneamento, ou da equalização tarifária e <strong>dos</strong> instrumentos da tarifa<br />

social, to<strong>dos</strong> <strong>de</strong> caráter redistributivo, a universalização do acesso aos <strong>serviços</strong> <strong>de</strong><br />

energia e saneamento não foi alcançado. No caso do setor elétrico, esses subsídios<br />

seriam, posteriormente, substancialmente reduzi<strong>dos</strong>, em função da reestruturação<br />

liberal <strong>dos</strong> setores.<br />

No que concerne à participação popular, todo o período foi marcado pela<br />

centralização e autoritarismo na elaboração e condução <strong>de</strong> políticas públicas,<br />

refletindo o contexto político. Apesar da ocorrência <strong>de</strong> movimentos reivindicatórios, em<br />

especial nos primeiros anos do Estado Novo e na década <strong>de</strong> 1960, 1970, estes foram<br />

insistentemente reprimi<strong>dos</strong>, ora por práticas populistas, ora por ações autoritárias<br />

(Bielschowsky, 2000; Rezen<strong>de</strong>, 2000). Contudo, após o fim da “era” militar, já na

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