Análise comparativa dos serviços públicos de ... - IEE/USP
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2 1.1. Motivação Embora venha sendo a estratégia predominante do atual ciclo ultraliberal do capitalismo, a realidade recente tem demonstrado que a privatização de serviços essenciais originariamente monopolistas, com funções sociais explícitas e gestão tradicionalmente estatal, em países com as graves discrepâncias sociais que caracterizam os da América Latina e o Brasil, em particular, é uma experiência arriscada. A tentativa de promover desverticalização, introdução de competição e regulação, em processos cuja prioridade tem sido, de forma marcante, a rápida transferência de ativos à iniciativa privada, tem criado arcabouços frágeis, incapazes de lidar com atores internacionais experientes, de se consolidar e promover a “cultura regulatória” antes ausente. Na prática, observa-se que os aparatos regulatórios assim constituídos, apesar da extensa argumentação teórica, vêm tratando de forma insatisfatória questões fundamentais do ponto de vista da coletividade, tais como: o acesso aos serviços, incluindo aí a modicidade dos preços praticados, a qualidade dos mesmos, a regularidade de sua prestação; a proteção ao ambiente, e a transparência e estímulo à participação pública no planejamento e fiscalização. Tal fato decorre, pode-se inferir, não apenas da inadequação do processo de implementação do modelo, mas da própria incapacidade de “o mercado” atuar, indistintamente, em toda e qualquer esfera de produção e/ou prestação de serviços, principalmente serviços essenciais. Corrigir as lacunas da regulação, diante de uma economia artificialmente liberalizada torna-se, então, um problema a mais, deixado para que a própria sociedade dele se desincumba, da melhor forma possível. Diante do quadro generalizado, internacionalmente, de falhas dos modelos e questionamento da onda neoliberal globalizante e dos efeitos deletérios que resultaram da aplicação de seus preceitos, sobretudo em países pobres mas,
3 inclusive, em economias mais sólidas, exacerbando a manutenção de um estado de coisas excludente e criador de miséria, faz-se necessário avaliar a adoção indiscriminada de pacotes de reestruturação de moldes ultraliberais em setores considerados essenciais, estratégicos e ainda bastante deficitários quanto ao atendimento de demandas sociais como o são os setores de energia elétrica e de saneamento básico no Brasil. Essa investigação suscita maior interesse diante das diferentes dinâmicas com que foram implementados os dois setores, embora as origens tenham-se dado de forma semelhante, privilegiando o interesse local e, inclusive, a gestão privada. Não obstante, o Programa Nacional de Desestatização (PND), contraditoriamente, adota premissas bastante semelhantes para formular e implementar a reestruturação de ambos, aparentemente negligenciando tais trajetórias. Diante desse contexto, a preocupação principal deste trabalho passa a ser a mensuração e a identificação de opções para o atendimento da demanda remanescente de energia elétrica e saneamento, e o incremento da participação dos setores na promoção do desenvolvimento social e econômico do Brasil, desmistificando o caráter determinista imputado ao movimento global que levou à substituição do paradigma econômico de capitalismo keynesiano para capitalismo ultraliberal, também na sociedade brasileira. Acredita-se que a realidade do país, marcada por desigualdades, necessita de enfoques que privilegiem, antes, a elevação de um grande contigente de marginalizados à condição de cidadãos, e a necessidade de assegurar uma gestão pública dos serviços, com controle social efetivo, de forma a promover a universalização dos serviços, com qualidade, tarifas que atendam às necessidades de acesso dos usuários e mantenham a capacidade de investimento dos setores. A partir da posição adotada pelo Brasil dentro do contexto econômico internacional contemporâneo e das precárias condições socioeconômicas ainda
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