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“DOENÇAS ORIFICIAIS” - Gastroenterologia e Proctologia Campinas

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S U M Á R I O<br />

<strong>“DOENÇAS</strong> <strong>ORIFICIAIS”</strong><br />

1. DOENÇA HEMORROIDÁRIA<br />

2. FISSURA ANAL<br />

3. ABSCESSOS E FÍSTULAS PERIANAIS<br />

4. DOENÇA PILONIDAL<br />

5. PRURIDO ANAL<br />

6. INCONTINÊNCIA ANAL<br />

7. PROLAPSO E PROCIDÊNCIA<br />

8. HIDRADENITE SUPURATIVA<br />

9. TRAUMA ANO-RETAL<br />

10. TUMORES DO CANAL ANAL<br />

1. DOENÇA HEMORROIDÁRIA<br />

As hemorróidas são estruturas arteriovenosas localizadas na<br />

submucosa da região anorretal. Elas participam do mecanismo de<br />

continência anal. Quando este plexo vascular dilata-se e passam a<br />

apresentar sintomas, caracterizam a doença hemorroidária. Ela é uma<br />

das mais conhecidas enfermidades do ser humano e também das mais<br />

antigas que se tem registro. É afecção das mais freqüentes, porém<br />

sendo impossível precisar sua real prevalência no Brasil. Estima-se que<br />

até 50% da população em geral possam apresentá-la. Ocorrem em<br />

ambos os sexos, com certa prevalência no masculino, em todas as<br />

raças e faixas etárias. Sua maior incidência é entre os 30 e 60 anos de<br />

idade, sendo rara na infância 3,4,8,10,13,14,16,17,19,21,24,29,35,38,40 .<br />

1.1. Anatomia<br />

Os plexos vasculares hemorroidários, localizados na submucosa do<br />

canal anal, existem em todos os seres humanos. São constituídos por<br />

uma rica rede de arteríolas e vênulas que se comunicam diretamente,<br />

formando os corpos cavernosos. São sustentados na submucosa do<br />

canal anal por fibras da musculatura longitudinal que auxiliam a fixálos<br />

nesta localização 15,40 .<br />

1


A doença hemorroidária, ocorre quando há congestão, dilatação e<br />

aumento dos corpos cavernosos formando grandes emaranhados<br />

vasculares submucosos, flexíveis, que se enchem de sangue, vindo<br />

dos três ramos terminais da artéria retal superior. Constituem assim<br />

os mamilos hemorroidários, de consistência amolecida e forma<br />

abaulada, situados no canal anal. Pode haver três mamilos, de<br />

localização anterior direita, posterior direita e lateral esquerda,<br />

denominados principais e os demais, quando existentes, são chamados<br />

de secundários 38,40,41,48 .<br />

1.2. Etiopatogenia<br />

A natureza exata da doença hemorroidária, não é ainda<br />

completamente conhecida.<br />

Vários fatores são importantes na sua etiopatogenia 38,40 :<br />

• Dificuldade do esvaziamento vascular no ato defecatório, com<br />

congestão e dilatação dos corpos cavernosos da submucosa do<br />

canal anal;<br />

• Prolapso anormal do plexo hemorroidário, durante a evacuação,<br />

por deficiência de sua fixação pela musculatura longitudinal da<br />

submucosa ou pelo excessivo esforço defecatório;<br />

• Dieta pobre em resíduos (fibras) e pouca ingestão de líquidos;<br />

• Hábitos defecatórios errôneos, como a insistência em evacuar<br />

todos os dias, esforçarem-se a defecar num determinado horário<br />

por conveniência ou forçar o esvaziamento total do conteúdo<br />

retal de uma só vez;<br />

• Predisposição familiar, porém, não hereditária; e<br />

• Fatores desencadeantes ou agravantes como constipação,<br />

diarréia crônica, gravidez ou abuso de laxantes.<br />

Uma vez manifestadas as primeiras condições para o aparecimento da<br />

doença hemorroidária, é rara sua remissão. Sem tratamento, a<br />

evolução dos mamilos hemorroidários é progressiva. A cura só<br />

ocorrerá com a erradicação de todo o tecido vascular doente.<br />

1.3. Classificação<br />

A classificação mais utilizada está relacionada à localização do mamilo<br />

hemorroidário no canal anal e à presença ou não de seu prolapso. O<br />

mamilo quando está situado acima da linha pectínea, na parte interna<br />

do canal anal, é chamado de interno.<br />

Se ele, à evacuação ou aos esforços, não prolaba abaixo da linha<br />

pectínea, é dito de 1° grau; quando o mamilo interno prolaba abaixo<br />

da linha pectínea, porém retrai espontaneamente, é de 2° grau; se<br />

prolaba à evacuação ou aos esforços e não retorna espontaneamente,<br />

necessitando ser recolocado digitalmente para o interior do canal anal,<br />

2


é chamado de 3° grau; e aquele mamilo hemorroidário interno<br />

prolabado permanentemente para o lado externo do canal anal, sem<br />

possibilidade de ser recolocado no interior do canal anal, é dito de 4°<br />

grau.<br />

O mamilo hemorroidário quando localizado abaixo da linha pectínea,<br />

na porção externa do canal anal, é denominado de externo.<br />

Na existência concomitante de mamilos internos e externos, a doença<br />

hemorroidária pode ser chamada de mista.<br />

Esta classificação tem valor em auxiliar na escolha e eficácia das<br />

terapias propostas.<br />

1.4. Sintomas<br />

A enfermidade hemorroidária apresenta diferentes sintomas, com<br />

vários graus de intensidade 38,40 :<br />

1.4.1. SANGRAMENTO<br />

É o sintoma principal, mais freqüente, e às vezes o primeiro a<br />

manifestar-se. Pode ser visto, inicialmente, no papel higiênico, ou<br />

gotejando no vaso sanitário, ou até mesmo em jato. É caracterizado<br />

pela cor vermelha rutilante. Também pode estar associado à passagem<br />

de fezes endurecidas que traumatizam o mamilo, ou pelo tipo de<br />

higiene anal (uso de papel higiênico).<br />

A hemorragia do mamilo hemorroidário é rara, porém a perda<br />

sangüínea leve e contínua, pode ocorrer, acarretando um quadro<br />

anêmico, às vezes bastante grave.<br />

É fundamental diferenciar esse sangramento hemorroidário do<br />

ocasionado pelos tumores do reto, pelas doenças inflamatórias<br />

intestinais, pela fissura anal ou pela dermatite perianal, por serem<br />

bastante similares.<br />

1.4.2. PROLAPSO<br />

É a exteriorização do mamilo hemorroidário interno, para fora do canal<br />

anal, durante o ato evacuatório ou durante atividades físicas. Pode<br />

retornar espontaneamente ou necessitar ser recolocado digitalmente.<br />

Deve ser diferenciado da papila anal hipertrófica prolabada, do pólipo<br />

retal baixo que se exterioriza através do canal anal e da procidência<br />

retal.<br />

1.4.3. EXSUDAÇÃO PERIANAL<br />

Caracterizada pela presença de secreção de muco perianal, geralmente<br />

acompanhada de prurido anal.<br />

1.4.4. DESCONFORTO ANORRETAL<br />

3


Durante ou após a evacuação pode haver um incomodo ou pressão<br />

anorretal, porém sem dor, pois a doença hemorroidária não dói. A<br />

presença de dor no canal anal indica, ou uma complicação do plexo<br />

hemorroidário como a tromboflebite e o hematoma perianal ou a<br />

associação com outra enfermidade como a fissura anal, o abscesso<br />

perianal ou mesmo, os tumores anorretais.<br />

1.5. Diagnóstico<br />

É realizado por meio de anamnese pormenorizada dos sintomas acima<br />

mencionados, pela avaliação dos hábitos evacuatórios e alimentares,<br />

pelo uso de laxativos, pela existência de doenças anteriores ou de<br />

cirurgias no trato digestivo.<br />

Após o exame físico completo, faz-se o exame proctológico cuidadoso.<br />

As hemorróidas internas não podem ser detectadas pela palpação<br />

digital, sendo o mamilo visto somente à anuscopia ou quando os<br />

mesmo prolabam aos esforços ou permanentemente 1,38,40 .<br />

1.6. Diagnóstico Diferencial<br />

Visto que sob o diagnóstico de doença hemorroidária ou mesmo de<br />

“hemorróidas” para o leigo, são incluídas com freqüência e<br />

erroneamente, uma grande variedade de doenças anorretais, é<br />

importante proceder-se, com especial cuidado e atenção, ao<br />

diagnóstico diferencial da doença hemorroidária com as enfermidades<br />

abaixo relacionadas 14,16,55,56 :<br />

- Tromboflebite perianal - Hematoma perianal<br />

- Procidência retal - Papila anal hipertrófica<br />

- Tumores anorretais - Fissura anal<br />

- Doenças Inflamatórias - Processos infecciosos<br />

1.7. Tratamento<br />

A doença hemorroidária que não apresenta sintomas ao paciente, não<br />

necessita de tratamento 38,40 .<br />

Quando os mamilos hemorroidários acarretam sintomas discretos,<br />

pode-se realizar o tratamento paliativo que consiste na modificação de<br />

seus hábitos evacuatórios, na proibição do uso de laxativos e de papel<br />

higiênico, na utilização de dieta rica em fibras, na ingestão abundante<br />

de líquidos, na feitura de banhos de assento mornos e pela aplicação<br />

local de pomadas e supositórios com ação antinflamatória e<br />

analgésica.<br />

Contudo, havendo a indicação de tratamento curativo, vários métodos<br />

terapêuticos podem ser utilizados. A arte da proctologia é encontrar a<br />

conduta mais apropriada para cada grau ou tipo de doença<br />

hemorroidária e a que melhor se aplica a cada enfermo.<br />

4


O objetivo é o de realizar-se um procedimento de execução simples,<br />

com mínima dor, que permita uma evacuação fisiológica, de baixa<br />

morbidade e nenhuma mortalidade, de rápida recuperação e precoce<br />

retorno às atividades individuais, de baixo custo e sempre que<br />

possível, sem hospitalização.<br />

Entre os métodos terapêuticos ambulatoriais mais utilizados, para o<br />

tratamento das hemorróidas internas, estão: a ligadura elástica, a<br />

fotocoagulação e a crioterapia. São procedimentos que não necessitam<br />

de anestesia e pode-se tratar vários mamilos numa mesma sessão,<br />

inclusive associando-se os métodos.<br />

1.7.1. CRIOTERAPIA<br />

É indicada para o tratamento dos mamilos hemorroidários internos de<br />

1º e 2º graus. Foi utilizada, inicialmente, por Fraser e Grill em 1967 e<br />

consiste na aplicação, durante um a dois minutos, de uma haste<br />

metálica esfriada por nitrogênio líquido à temperatura de 196ºC<br />

negativos, sobre o mamilo hemorroidário interno provocando sua<br />

necrose por congelamento. A crioterapia baseia-se no fato de que a<br />

célula submetida a um rápido congelamento solidifica o líquido<br />

intracelular rompendo sua membrana e provocando sua destruição.<br />

1.7.2. FOTOCOAGULAÇÃO<br />

É um método mais recente, muito prático e rápido, para a terapêutica<br />

dos mamilos internos de 1º e 2º graus, desenvolvido por Nath e<br />

colaboradores (1977). Utiliza-se um aparelho de raios infravermelho<br />

que aplicado na mucosa e submucosa, ao redor do mamilo<br />

hemorroidário interno, como uma coroa em seu ápice. Esta<br />

fotocoagulação realiza uma fibrose na submucosa diminuindo o aporte<br />

sangüíneo ao plexo hemorroidário por meio de vários pontos de<br />

necrose. Os raios infravermelhos são gerados por uma lâmpada<br />

halógena de wolfrânio, alimentada com 15 volts e o calor gerado na<br />

extremidade do aparelho chega aos 100 graus centígrados na mucosa<br />

e a 60 graus na submucosa provocando sua necrose.<br />

1.7.3. LIGADURA ELÁSTICA<br />

Este é outro método bastante simples, seguro, de baixo custo e muito<br />

utilizado para o tratamento dos mamilos internos de 2º, 3º e até<br />

mesmo alguns de 4º graus. Foi idealizado por Blaisdell em 1954 e<br />

difundido por Baron à partir de 1962. Consta de um aparelho aplicador<br />

de anéis de borracha que traciona o mamilo hemorroidário interno e<br />

coloca em sua base um anel elástico, sempre acima da linha pectínea,<br />

provocando sua necrose por isquemia.<br />

Nossa incidência de complicações com estes três métodos para<br />

tratamento ambulatorial de hemorróidas internas foi muito pequena<br />

5


(6%) e com mínima morbidade e nenhuma mortalidade. As principais<br />

complicações foram dor anorretal tipo tenesmo, sangramento anal,<br />

infecção local, fissura residual e/ou recidiva dos sintomas.<br />

Todos os três foram eficazes na cura dos mamilos hemorroidários<br />

internos, permitindo ser tratado mais de um mamilo numa mesma<br />

sessão ambulatorial, sem influenciar nos resultados ou na incidência<br />

das complicações.<br />

No entanto, para os enfermos que têm mamilos hemorroidários<br />

externos ou mistos, a melhor opção curativa é a hemorroidectomia.<br />

Este procedimento pode ser realizado, também. em ambulatório ou<br />

com o paciente internado.<br />

1.7.4. TÉCNICAS DE HEMORROIDECTOMIA<br />

As mais utilizadas são: a denominada de aberta desenvolvida por<br />

Salmon, 1829 e Milligan e Morgan, (1937); a fechada idealizada por<br />

Ferguson, 1959 e a semifechada (técnica de Obando-Reis Neto,<br />

1972) 2,12,22,28,36,44,46,49 .<br />

1.7.5. HEMORROIDECTOMIA POR GRAMPEAMENTO<br />

Ela objetiva reduzir o prolapso hemorroidário mediante a excisão de<br />

uma faixa transversal de mucosa localizada cerca de 4cm acima da<br />

linha pectínea, entre a ampola retal e o canal anal proximal, com<br />

anastomose mucomucosa mecânica 38,54 .<br />

Com esta técnica faz-se a interrupção das ramificações terminais das<br />

artérias hemorroidárias, com conseqüente redução do fluxo sangüíneo<br />

para os corpos cavernosos e ressecção do prolapso mucoso,<br />

eliminando, pelo menos teoricamente, os principais fatores envolvidos<br />

nos sintomas da doença hemorroidária. Como este local tem poucos<br />

receptores sensitivos a dor pós-operatória é discreta.<br />

Está indica para os portadores de hemorróidas internas de terceiro e<br />

quarto graus e contra-indicada nos enfermos com trombose<br />

hemorroidária. Deve-se enfatizar que esta técnica não apresenta bons<br />

resultados nos pacientes portadores de doença hemorroidária externa<br />

e de plicomas.<br />

1.7.6. HEMORROIDECTOMIA AMBULATORIAL<br />

Deve ser efetuada em local devidamente equipado e adequado para a<br />

sua realização, desde que sigam as normatizações do Conselho<br />

Federal de Medicina (n.º 1409/94), onde são definidas as condições<br />

estruturais necessárias ao ambulatório; o tipo de anestesia a ser<br />

utilizada (local ou bloqueio) com a necessidade da presença ou não, de<br />

um anestesista; o rigoroso cuidado na avaliação para alta do enfermo;<br />

a obrigatoriedade do paciente estar acompanhado de um adulto<br />

responsável; a viabilidade e segurança de transporte até a sua<br />

6


esidência; a observância de assistência médica pelas 24 horas em<br />

todos os dias de pós-operatório e suporte hospitalar na eventualidade<br />

da necessitar-se de internação 36,38,40 .<br />

As técnicas de hemorroidectomia que empregamos, em nosso serviço,<br />

para tratamento ambulatorial são: a ressecção diatérmica e a<br />

ressecção com tesoura ou bisturi de lâmina fria. Ambas são realizadas<br />

sob anestesia local e com o paciente deitado em decúbito lateral<br />

esquerdo, com os membros inferiores fletidos em 90º (posição de<br />

Sims).<br />

- Ressecção Diatérmica: É a hemorroidectomia ambulatorial<br />

realizada com a alça do bisturi elétrico ou com bisturi a laser, onde se<br />

faz a exérese de ambos os plexos hemorroidários, externo e interno,<br />

com a hemostasia rigorosa do leito cirúrgico, permanecendo a ferida<br />

aberta para a sua cicatrização 2,36 .<br />

- Ressecção com tesoura ou bisturi: É a hemorroidectomia<br />

ambulatorial efetuada por meio da ressecção dos plexos<br />

hemorroidários, externo e interno, da pele em direção à mucosa,<br />

numa ferida de configuração elipsóide, com tesoura ou bisturi de<br />

lamina fria. A ligadura do pedículo vascular interno pode ser realizada<br />

por meio da colocação de dois anéis de borracha para ligadura elástica<br />

ou por meio de um ponto transfixante, com fio absorvível 00, ou<br />

mesmo pela sua cauterização com bisturi elétrico ou a laser. Faz-se, a<br />

seguir, o fechamento da ferida externa, com fio absorvível 0000, em<br />

sutura contínua, tipo chuleio, iniciando-se na mucosa da base do<br />

pedículo vascular previamente ligado e terminando na pele.<br />

Os resultados pós-operatórios com ambas estas técnicas são muito<br />

bons, com mínima morbidade, rápido retorno do enfermo às suas<br />

atividades e ótima aceitação pelos pacientes. O período de cicatrização<br />

é porém, maior para o procedimento da ressecção com a ferida aberta<br />

quando comparado à da ferida fechada 38,40 .<br />

1.7.7. RESSECÇÃO HOSPITALAR<br />

Na doença hemorroidária mista de grande proporções ou quando as<br />

condições do enfermo requerem a internação hospitalar, a técnica<br />

operatória que utilizamos é a semifechada ou a fechada.<br />

1.7.8. COMPLICAÇÕES DAS HEMORROIDECTOMIAS<br />

As complicações pós-operatórias, mais importantes, são 32,33,52 :<br />

- Dor: Esta diretamente relacionada à técnica empregada e aos<br />

cuidados intra e pós-operatórios. Hemostasia adequada, fios de sutura<br />

finos, preservação das fibras musculares e mínimo trauma local são<br />

fundamentais para minimizá-la.<br />

- Sangramento: A ligadura adequada dos pedículos vasculares e<br />

hemostasia rigorosa durante a hemorroidectomia são muito<br />

7


importantes na sua prevenção. O sangramento tardio é raro e, em<br />

geral, ocorre entre sete a dez dias após o procedimento, cessando, em<br />

sua maioria, espontaneamente.<br />

- Fecaloma: O receio de que a evacuação pós-operatória possa<br />

desencadear ou agravar a dor da hemorroidectomia poderá fazer que<br />

alguns pacientes inibam a defecação podendo ocasionar a impactação<br />

fecal no reto com a formação de fecalomas. São tratados com enemas<br />

evacuatórios.<br />

- Retenção urinária: Sua etiologia é controversa, porém o bloqueio<br />

anestésico e a pressão e distensão intra-retais são fatores<br />

desencadeantes importantes.<br />

- Fissura anal: Está relacionada à má cicatrização da ferida<br />

operatória da hemorroidectomia, ao trauma e laceração do anoderma<br />

durante a evacuação. Acarreta intensa dor anal à evacuação no pósoperatório.<br />

Seu tratamento depende da sua extensão e gravidade,<br />

podendo ser clínico ou cirúrgico (por meio de uma esfincterotomia anal<br />

interna).<br />

Estenose anal: É enfermidade iatrogênica, que pode ocorrer após a<br />

hemorroidectomia, em especial, quando se utiliza a técnica aberta,<br />

causando seu estreitamento, decorrente da fibrose cicatricial<br />

inelástica. Sua resolução é, com freqüência, cirúrgica (anoplastia).<br />

Infecção da ferida operatória: Está relacionada aos cuidados pósoperatórios<br />

e são, com freqüência, decorrentes de má higiene local e<br />

falta de limpeza da ferida cirúrgica.<br />

Seu tratamento é clínico, por meio de banhos de assento com antisépticos,<br />

tais como, permanganato de potássio na diluição de<br />

1:40.000, pomadas tópicas, antiinflamatórios e antibióticos.<br />

1.8. Trombose Hemorroidária<br />

Alguns pacientes apresentam volumosa estase sangüínea nos plexos<br />

hemorroidários, externos e internos, que pode evoluir para um<br />

processo inflamatório endoflebítico, desencadeando uma doença<br />

denominada trombose hemorroidária. Quando a área atingida é<br />

extensa, também é chamada de pseudo-estrangulamento<br />

hemorroidário. Associa-se freqüentemente a intenso edema e, sem<br />

tratamento, pode evoluir para ulceração e necrose da área<br />

afetada 38,40 .<br />

1.8.1. SINTOMAS<br />

Seu aparecimento é abrupto. A dor é muito intensa, contínua e tipo<br />

latejante. Há secreção e sangramento perianal, com características<br />

arteriais. Pode haver dificuldade evacuatória e retenção urinária.<br />

Diferentemente do hematoma perianal, raramente se evidenciam<br />

nódulos azulados, mas sim, intenso edema local.<br />

8


1.8.2. DIAGNÓSTICO<br />

O diagnóstico da trombose hemorroidária é simples e fácil. Pela<br />

inspeção do ânus observa-se a presença de processo inflamatório<br />

agudo nos plexos hemorroidários, caracterizado por intenso edema,<br />

necrose e/ou ulceração. Eventualmente, o comprometimento plexular<br />

pode atingir e/ou ultrapassar a linha pectínea.<br />

1.8.3. TRATAMENTO<br />

O intenso edema e a necrose provocados pela trombose hemorroidária<br />

é irredutível e qualquer manobra para reduzi-la, mesmo sob analgesia,<br />

pode agravar o processo tromboflebítico.<br />

Seu tratamento é preferencialmente cirúrgico, em caráter de urgência,<br />

desde que as condições clínicas do enfermo permitam a operação.<br />

A técnica a ser empregada, deverá ser aquela na qual o cirurgião<br />

tenha maior experiência. A hemorroidectomia, nesta fase aguda, tem<br />

apresentado resultados bons, desde que respeitadas as bases técnicas<br />

da cirurgia anorretal. Ela é segura e efetiva, ocasionando raras<br />

complicações pós-operatórias quando comparada à cirurgia eletiva.<br />

As vantagens deste procedimento na urgência são: alívio imediato dos<br />

sintomas, cura dos mamilos hemorroidários, diminuição do tempo de<br />

recuperação e menor período de inatividade do paciente.<br />

1.9. Hematoma Perianal<br />

Ocorre após a ruptura de um vaso perianal, formando uma coleção<br />

sangüínea subcutânea, portanto extravasal. Esta fica confinada ao<br />

anoderma, não ultrapassando a linha pectínea. Tem alta incidência, é<br />

de aparecimento abrupto, podendo originar um ou mais nódulos<br />

perianais dolorosos de tamanhos variados e às vezes de coloração<br />

azulada 38,40 .<br />

Os hematomas perianais, estão associados a várias causas:<br />

constipação, diarréia, esforço evacuatório, exercícios físicos<br />

exagerados e maus hábitos higiênicos, como a limpeza anal com<br />

papel.<br />

1.9.1. SINTOMAS<br />

A dor é seu principal sintoma, de intensidade variável, em geral,<br />

contínua e que não se altera com a evacuação. Permanece por dois a<br />

três dias consecutivos, quando então, tende a diminuir junto com a<br />

dissolução do hematoma, desaparecendo em sete a dez dias. Os<br />

nódulos, principalmente os maiores de 2cm, costumam permanecer<br />

por um período de tempo maior e após dissolverem-se, podem<br />

resultar num excesso de pele perianal, denominado de plicoma.<br />

9


Às vezes pode ocorrer ulceração da pele que recobre o hematoma e<br />

esta ruptura pode provocar a eliminação espontânea dos coágulos. A<br />

presença deste sangramento perianal, costuma preocupar o paciente,<br />

fazendo-o procurar auxílio médico.<br />

1.9.2. DIAGNÓSTICO<br />

A história relatada é sempre de um ou mais nódulos dolorosos na<br />

região perianal, de aparecimento abrupto.<br />

À inspeção estática do canal anal observa-se um ou mais nódulos,<br />

dolorosos ao toque, de tamanhos variados, às vezes de cor azulada,<br />

que caracteriza o hematoma.<br />

O exame proctológico deverá ser, sempre que possível, completo. Em<br />

alguns enfermos a dor impede tal procedimento, e por isso, ele deverá<br />

ser completado após a melhora do enfermo. A realização da<br />

retossigmoidoscopia é fundamental para se avaliar a possibilidade de<br />

outras doenças anorretais associadas.<br />

No caso de lesão que se mantenha inalterada por mais de 10 dias, é<br />

conveniente excluir outras enfermidades menos freqüentes, tais como,<br />

o melanoma perianal maligno.<br />

1.9.3. TRATAMENTO<br />

Pela tendência dos hematomas pequenos dissolverem-se ou<br />

romperem-se espontaneamente, seu tratamento é conservador,<br />

objetivando, em especial, a diminuição da dor do enfermo. Prescrevese<br />

banhos de assento mornos, pomada tópica com ação<br />

antiinflamatória, medicamentos analgésicos orais, correção da higiene<br />

anal e auxiliares da evacuação.<br />

Nos nódulos maiores em que a dor é intensa, e não diminui após 48<br />

horas de tratamento conservador, a cirurgia poderá ser indicada. A<br />

excisão do hematoma perianal pode ser feita em regime ambulatorial,<br />

sob anestesia local, por meio de incisão elíptica na pele com exérese<br />

integral dos coágulos e fechamento da ferida com fio absorvível 0000.<br />

O sangramento pós-operatório é raro, os cuidados locais simples e a<br />

recuperação rápida.<br />

2. FISSURA ANAL<br />

Das enfermidades proctológicas, poucas têm incidência tão alta e<br />

causam tanta dor e sofrimento como a fissura anal 9,38 .<br />

10


A doença fissurária é caracterizada por uma lesão ulcerada no<br />

anoderma do canal anal que raramente ultrapassa a linha pectínea no<br />

sentido cranial.<br />

É, em geral, extremamente dolorosa. Sua intensidade é máxima<br />

durante ou imediatamente após as evacuações ou após a distensão do<br />

canal anal. Isso se deve à intensa sensibilidade da região do anoderma<br />

a estímulos dolorosos pelas suas inúmeras terminações nervosas e<br />

cuja lesão expõe, freqüentemente, as fibras do músculo esfíncter anal<br />

interno.<br />

Sua localização predominante é na região posterior do canal anal. Em<br />

nossa casuística esta localização correspondeu a 85,5%, a fissura<br />

anterior ocorreu em 10,5% dos enfermos, a simultaneidade de lesões,<br />

anterior e posterior, em 3% e a localização lateral em 1% dos<br />

pacientes. Este fato está relacionado com a elasticidade do canal anal<br />

que é reduzida na região posterior, impedindo sua adequada dilatação<br />

às evacuações e com sua vascularização, que é menor na região anal<br />

posterior.<br />

Em decorrência aos processos inflamatórios observados no canal anal,<br />

a fissura anal poderá estar associada a eles, em 30% dos enfermos.<br />

Poderá haver a presença de uma prega cutânea, edemaciada ou não,<br />

em forma de capuz, na extremidade externa da lesão fissurária,<br />

chamada de plicoma sentinela e/ou a presença de uma papila anal<br />

hipertrofiada, localizada na extremidade interna da fissura, na linha<br />

pectínea. Quando a lesão fissurária esta associada ao plicoma<br />

sentinela e à papila hipertrófica é chamada de tríade fissurária.<br />

2.1. Fisiopatologia<br />

A doença fissurária é ocasionada, em geral, por um trauma no canal<br />

anal. Este trauma provoca a estimulação das terminações sensitivas<br />

do anoderma, acarretando a contínua excitação do esfíncter anal<br />

interno e sua conseqüente hipertonia 18,25,30 .<br />

A passagem das fezes pelo canal anal durante o ato defecatório,<br />

produz a distensão das fibras musculares lisas deste esfíncter interno<br />

e, junto com a sensibilidade local da própria lesão ulcerada, provocam<br />

dor anal.<br />

A conscientização da evacuação dolorosa, inicia um mecanismo<br />

reflexo, tanto voluntário quanto involuntário, de inibição da evacuação<br />

que pode ressecar as fezes e as quais, quando expelidas endurecidas,<br />

podem traumatizar e agravar ainda mais a lesão no anoderma,<br />

dificultando sua cicatrização, completando, dessa forma, um círculo<br />

vicioso.<br />

A fissura anal aguda caracteriza-se por uma lesão em forma de<br />

fenda, estreita e superficial. Seus bordos são planos e limitados por<br />

anoderma.<br />

11


A perpetuação da hipertonia do esfíncter anal interno, é considerada a<br />

responsável pela fissura anal crônica. Ela é caracterizada por uma<br />

ferida, em geral, de bordos bem definidos, às vezes grossos, e na<br />

qual, pode-se reconhecer, com certa freqüência, as fibras brancas<br />

transversais do músculo esfíncter anal interno.<br />

2.2. Quadro Clínico<br />

O principal sintoma é a dor anal intensa, aguda e tipo penetrante que<br />

surge durante ou imediatamente após a defecação. Muitas vezes, esta<br />

dor estende-se de forma espasmódica para a região genital, às costas<br />

ou aos membros inferiores, podendo manter-se por horas após cada<br />

evacuação.<br />

O receio da nova defecação dolorosa conduz a uma obstipação e,<br />

como conseqüência, ao uso abusivo de laxativos irritativos que pode<br />

agravar o quadro doloroso.<br />

A lesão fissurária produz outro sintoma o sangramento anal às<br />

evacuações que é, em geral, rutilante e visível no papel higiênico ou<br />

depositado nas fezes. Este sangramento costuma assustar o enfermo<br />

mais até que a dor e induzi-lo a procurar auxílio médico. Pode haver,<br />

também, exsudação e prurido anal.<br />

A fissura anal, às vezes, apresenta como complicação uma infecção do<br />

leito fissurário. Quando esta infecção atinge as criptas anais, pode<br />

levar à contaminação das glândulas anorretais de Chiari, iniciando a<br />

seqüência da história natural dos processos infecciosos do canal anal.<br />

Muitas fístulas perianais evidenciam que o processo infeccioso teve seu<br />

início numa fissura anal cicatrizada.<br />

2.3. Diagnóstico<br />

O diagnóstico da fissura anal é simples. Na anamnese, as dores<br />

intensas durante e/ou após a defecação, relatadas pelo paciente, já<br />

permitem a hipótese da lesão fissurária.<br />

Mediante o afastamento das nádegas e da exposição cuidadosa do<br />

canal anal para inspeção, pode-se observar a ulceração anal associada<br />

ou não ao plicoma sentinela.<br />

O exame digital do canal anal, é muito doloroso e com freqüência, só<br />

possível após analgesia local.<br />

A anuscopia e a retossigmoidoscopia deverão sempre ser realizadas na<br />

busca de enfermidades associadas, porém após a analgesia local ou a<br />

melhora do quadro doloroso.<br />

Várias doenças anais podem se assemelhar, morfologicamente, à<br />

fissura anal, tais como, o carcinoma anal, a ulceração sifilítica<br />

primária, as ulcerações resultantes das enfermidades inflamatórias<br />

intestinais e a lesão herpética.<br />

12


Essas lesões diferem da fissura anal por apresentarem, com<br />

freqüência, ulcerações mal delimitadas, com bordos pouco definidos,<br />

sem localização preferencial e, principalmente, não causando dor local<br />

e sim intensa exsudação e incômodo. Por esta razão a ausência de<br />

hipertonia esfincteriana e a presença de fissura de localização pouco<br />

freqüente, são particularmente suspeitas e exigem observação<br />

cuidadosa. Nos casos duvidosos, somente o exame histológico ou<br />

sorológico, permitirá o diagnóstico diferencial.<br />

2.4. Tratamento Clínico<br />

É proposto, para a fissura anal aguda que tem como componente<br />

fisiopatológico a dor anal e não a hipertonia do esfíncter anal interno.<br />

Assim, a abordagem medicamentosa age sobre as causas da dor, na<br />

tentativa de se obter o relaxamento do esfíncter anal interno e como<br />

conseqüência, a cicatrização da lesão. Utiliza-se auxiliares da<br />

defecação, tais como, dietas ricas em fibras e mucilagens, proibindo-se<br />

uso de papel para higiene local, condimentos, álcool e laxativos<br />

catárticos. Emprega-se a aplicação de pomada local para combater a<br />

dor, o prurido e a infecção local, se houver, além de estimular a<br />

cicatrização da lesão fissurária. Pode-se associar o uso de anestésicos<br />

endoanais, na forma de enemas. Evita-se o emprego de pomadas<br />

contendo corticóides por possuírem propriedades inibidoras da<br />

proliferação celular que poderiam alterar a cicatrização e epitelização<br />

da fissura.<br />

Ainda com o objetivo de se evitar o tratamento cirúrgico, que apesar<br />

de simples, não é isento de complicações, novas terapêuticas têm<br />

possibilitado a cicatrização de até 60% das fissuras anais agudas,<br />

segundo nossa experiência e semelhante à da literatura.<br />

É a denominada "esfincterotomia química", que visa o relaxamento<br />

anal temporário, apenas para permitir a cura da fissura 23 .<br />

2.4.1. ÓXIDO NÍTRICO<br />

O’Kelly e cols (1994) introduziram o uso deste mediador do reflexo<br />

inibitório retoanal no tratamento da fissura anal aguda. Pode-se<br />

utilizar a pomada tópica de trinitrato de glicerina (GTN) a 0,2%, duas<br />

vezes ao dia, durante o mínimo de quatro semanas ou a aplicação<br />

local - três vezes no dia, também, durante quatro semanas, de solução<br />

cremosa com dinitrato de isossorbida a 1 ou 2%, diluída em vaselina.<br />

O óbice desse tratamento é a cefaléia, de moderada a intensa, que<br />

incide em, aproximadamente, 30% dos pacientes e a hipotensão<br />

ortostática que pode ocorrer em até, 5% dos casos. Ambas melhoram,<br />

somente com a suspensão do uso da droga. Este fato tem<br />

desencorajado seu uso rotineiro 31 .<br />

13


2.4.2. NIFEDIPINA - A administração da difedipina oral, um<br />

bloqueador dos canais de cálcio, também diminui a pressão anal<br />

podendo levar à cura da fissura anal. É utilizada na dose de 20mg,<br />

duas vezes ao dia, por oito semanas 31 .<br />

2.4.3. TOXINA BOTULÍNICA<br />

Essa toxina provoca uma desnervação química transitória (6 meses)<br />

do esfíncter anal interno, impedindo sua contração efetiva e<br />

permitindo a cura da fissura. É administrada por meio de injeções com<br />

20U de toxina botulínica (volume total de 0,4ml) no interior do<br />

esfíncter interno, numa única sessão. Esta técnica não requer<br />

hospitalização e é bem tolerada. Tem como vantagens a baixo índice<br />

de complicações inerentes ao procedimento cirúrgico e de<br />

incontinência 20 .<br />

2.4.4. INDORAMINA<br />

A ação do esfíncter anal interno é estimulada pela inervação simpática<br />

dos alfa-adrenoceptores. Sua inibição pelo uso de seu antagonista, a<br />

indoramina, em dose única de 20mg, poderá provocar o relaxamento<br />

esfincteriano pela diminuição da pressão do canal anal e a cura da<br />

fissura 53 .<br />

2.5. Tratamento Cirúrgico<br />

Na fissura anal crônica, cujo componente principal é a hipertonia do<br />

esfíncter anal interno, o tratamento cirúrgico é o mais indicado. O<br />

objetivo é a eliminação desta hipertonia por meio de uma<br />

esfincterotomia parcial do músculo esfíncter anal interno 11,27 .<br />

Nossa preferência é para a intervenção ambulatorial, sob anestesia<br />

local, pela técnica da esfincterotomia anal interna por acesso<br />

subcutaneomucoso lateral, sem necessidade da remoção da lesão<br />

fissurária, pois eliminada a hipertonia esfincteriana essa lesão cicatriza<br />

rapidamente 7,50,51 .<br />

Outra opção, mais recente e com ótimos resultados, é a crioterapia do<br />

leito fissurário, com nitrogênio líquido a 196º C abaixo de zero,<br />

durante dois minutos, que produz uma esfincterotomia parcial por<br />

agente físico e promove a cicatrização da fissura.<br />

A esfincterotomia anal interna, associada à fissurectomia, só estará<br />

indicada na fissura anal infectada aonde é necessário realizar-se a<br />

remoção da lesão fissurária, do tecido infectado circundante, incluindo<br />

a região afetada das criptas anais.<br />

Seu pós-operatório é conduzido com antiinflamatórios administrados<br />

por via oral, dieta com fibras e cuidados locais com semicúpios<br />

mornos, pomada antinflamatória, e a proibição do uso de papel<br />

higiênico, bem como de bebidas alcoólicas e alimentos condimentados.<br />

14


3. ABSCESSOS E FÍSTULAS PERIANAIS<br />

Processos inflamatórios ou infecciosos, com freqüência, acometem a<br />

região anorretal. São as papilites, as criptites, os abscessos e as<br />

fístulas perianais.<br />

Os processos infecciosos perianais têm como fatores predisponentes o<br />

estado geral do enfermo, doenças associadas como a diabetes<br />

mellitus, ou que alteram seu sistema inumológico, como a AIDS, os<br />

linfomas, a leucemia, ou os pacientes imunodeprimidos póstransplantes,<br />

ou submetidos à quimio e radioterapia 5,42,45 .<br />

A etiologia destes processos infecciosos pode ser a mais variada<br />

possível, em geral, estão relacionadas com 38,40 :<br />

• Doenças intestinais: doença de Crohn, retocolite ulcerativa,<br />

tuberculose intestinal, actinomicose, linfogranuloma venéreo e<br />

hidroadenite supurativa;<br />

• Trauma anorretal: provocados por empalamentos, corpos<br />

estranhos (osso de galinha, espinha de peixe, etc.), quedas a<br />

cavaleiro, agressões, etc.;<br />

• Complicações pós-operatórias: após as cirurgias anorretais, tais<br />

como hemorroidectomias, fissurectomias, esfincterotomias,<br />

esfincteroplastias e anoplastias;<br />

• Doenças malignas: carcinomas, linfomas, etc.;<br />

• Radioterapia: pélvica e perineal;<br />

• Agressão criptoglandular: originada a partir do trauma criptico.<br />

Os processos infecciosos anorretais decorrentes da agressão<br />

criptoglandular são os mais freqüentes e responsáveis por,<br />

aproximadamente, 80% dos casos. Eles têm como fator<br />

desencadeante o traumatismo local que pode ser ocasionado por:<br />

passagem de fezes endurecidas no canal anal; provocado por quadro<br />

diarréico intenso ou pelo uso de papel higiênico. Esse trauma local<br />

pode ocasionar um processo inflamatório e uma lesão com solução de<br />

continuidade que possibilita a invasão de microrganismos da flora<br />

colônica, originando o processo infeccioso agudo criptoglandular.<br />

Assim, esta agressão, iniciada nas criptas anais de Morgagni, poderá<br />

originar um processo infeccioso nesta cripta, chamada de criptite.<br />

Se a infecção progredir, atingindo os ductos das glândulas anais de<br />

Chiari e desencadear a contaminação glandular, possibilitando a<br />

formação de um abscesso perianal.<br />

15


Havendo a ruptura deste abscesso, espontaneamente ou por meio da<br />

sua drenagem cirúrgica, poderá surgir uma fístula perianal. Portanto,<br />

a criptite e o abscesso são a fase aguda do mesmo processo infeccioso<br />

e a fístula sua fase crônica (quadro 1).<br />

========== ENTRA QUADRO 1 =========<br />

3.1. Papilites<br />

A agressão ao canal anal poderá provocar um processo inflamatório<br />

nas papilas anais provocando as papilites. Na fase aguda do<br />

processo, haverá aumento de seu volume e alargamento de sua base,<br />

por causa do edema e da congestão, podendo essas papilas atingir o<br />

tamanho de 1 a 3cm. A seguir, este processo poderá cronificar-se<br />

dando origem a uma papilite crônica, dita hipertrófica.<br />

3.1.1. QUADRO CLÍNICO<br />

É geralmente vago, podendo haver, às vezes, discreto ardor ou dor na<br />

região anal que piora com a defecação, semelhantes aos sintomas da<br />

criptite. Quando o tamanho da papila for maior que 1cm, poderá<br />

ocorrer seu prolapso à evacuação, fato freqüentemente confundido<br />

com a doença hemorroidária.<br />

3.1.2. DIAGNÓSTICO<br />

Na fase aguda a papilite poderá ser diagnosticada pelo toque retal,<br />

podendo-se palpar, na linha pectínea, a presença de formações<br />

mamelonadas, únicas ou múltiplas, e sensíveis ao toque. A anuscopia<br />

confirmará a presença das papilas edemaciadas e congestas com<br />

volume aumentado. Entretanto, as papilas quando hipertróficas podem<br />

exteriorizar-se pelo ânus, à evacuação ou aos esforços, por causa do<br />

tamanho que atingem e com isto facilitar seu diagnóstico.<br />

O diagnóstico diferencial das papilites, em especial, da hipertrófica<br />

(crônica), deverá ser feito com os pólipos retais prolabados. Faz-se<br />

esta diferenciação pelo aspecto característico das papilas e sua<br />

localização na linha pectínea do canal anal, junto às bordas das criptas<br />

anais e nas bases das colunas de Morgagni.<br />

3.1.3. TRATAMENTO<br />

Na fase aguda, é clínico, por meio antiinflamatórios orais, de pomadas<br />

analgésicas e antiinflamatórias, e calor local pelo uso de bolsa quente<br />

e banhos de assento em água morna, além de proibir a higiene local<br />

com papel. Deve-se auxiliar a evacuação nos pacientes constipados<br />

com dieta rica em fibras e o uso de incrementadores do bolo fecal.<br />

A cirurgia está indicada, somente, para a papilite hipertrófica (crônica)<br />

que ocasiona sintoma. Consiste na sua ressecção, que poderá ser<br />

efetuada, sob anestesia local, em ambulatório.<br />

16


3.2. Criptites<br />

A cripta anal predispõe-se aos traumatismos do canal anal por causa<br />

de sua forma anatômica e pela fragilidade de suas paredes, fato que<br />

possibilita sua infecção.<br />

3.2.1. QUADRO CLÍNICO<br />

Caracteriza-se por discreto ardor ou dor na região anal que piora à<br />

evacuação e, às vezes, é acompanhado pela eliminação perianal de<br />

secreção de muco ou, nas formas mais intensas, mucopurulenta. Pode<br />

ocorrer também, a sensação de peso no canal anal e de evacuação<br />

incompleta.<br />

3.2.2. DIAGNÓSTICO<br />

É feito pela presença, à inspeção anal, de secreção de muco ou<br />

mucopurulenta. Ao toque retal poderá haver dor provocada pela<br />

contratura reflexa dos esfíncteres que dificulta o exame proctológico. A<br />

anuscopia poderá mostrar congestão, enantema e edema da linha<br />

pectínea e a passagem do anuscópio poderá provocar a eliminação de<br />

pus pela cripta infectada. A retossigmoidoscopia completará o exame<br />

na busca de enfermidades concomitantes. Seu diagnóstico diferencial<br />

será com as infecções específicas do canal anal.<br />

As criptites agudas, com freqüência, têm regressão espontânea.<br />

Entretanto, as mais intensas levam o paciente a procurar auxílio<br />

médico.<br />

3.2.3. TRATAMENTO<br />

Em geral ele é clínico, por meio de antimicrobianos orais, pomadas<br />

analgésicas e antiinflamatórias, calor local pelo uso de bolsa quente e<br />

banhos de assento em água morna. Deve-se auxiliar a evacuação com<br />

dieta rica em fibras ou com o uso de mucilagens e proibir a higiene<br />

anal com papel.<br />

Deve-se acompanhar a evolução do paciente e se, após sete dias de<br />

tratamento clínico, não havendo melhora, indica-se o tratamento<br />

cirúrgico, com a exploração das criptas anais com estilete. As criptas<br />

que estiverem pérvias ao estilete, deverão ser ressecadas. Havendo<br />

associação com plicomas perianais, papilites, ou hemorróidas estas<br />

poderão ser ressecadas durante o mesmo ato operatório.<br />

3.3. Abscessos Perianais<br />

Os abscessos anorretais são processos infecciosos agudos,<br />

supurativos, caracterizados por coleções purulentas. Sua etiologia<br />

mais comum é o trauma criptoglandular, originando-se de uma<br />

criptite. As glândulas anais de Chiari localizam-se ao redor do canal<br />

17


anal, no espaço existente entre os esfíncteres anais, interno e o<br />

externo, são em número de oito a doze, e seus ductos desembocam<br />

nas bases das criptas anais. Por este ducto é que pode ocorrer a<br />

contaminação glandular originária de uma criptite preexistente. A<br />

infecção glandular poderá espalhar-se, deste espaço interesfincteriano<br />

para várias direções na região anorretal 45 .<br />

A classificação dos abscessos é feita de acordo com sua localização<br />

anatômica. São denominados de perianais, isquiorretais, submucosos,<br />

interesfincterianos e pelvirretais.<br />

Os perianais são os mais freqüentes; os isquiorretais podem propagarse<br />

ao lado oposto pelo espaço retro-esfincteriano e originar as fístulas<br />

em ferradura; os submucosos provocam um abaulamento para o<br />

interior da ampola retal; os interesfincterianos dissecam o plano<br />

intermuscular; e os pelvirretais, localizados acima dos músculos<br />

elevadores do ânus e abaixo da reflexão peritoneal, são os mais raros,<br />

sendo também, os mais difíceis de diagnóstico e tratamento.<br />

Podem ser classificados, também, em superficiais como os perianais e<br />

isquiorretais, e em profundos como os submucosos, pelvirretais e<br />

interesfincterianos.<br />

3.3.1. QUADRO CLÍNICO<br />

A dor é o sintoma mais característico, sendo contínua e latejante, com<br />

intensidade variável de acordo com o volume da coleção purulenta,<br />

piorando à deambulação, ao sentar-se e até mesmo às evacuações.<br />

Pode associar-se febre, calafrios, tenesmo retal e urinário, e<br />

aparecimento de tumoração perianal.<br />

3.3.2. DIAGNÓSTICO<br />

É realizado pela inspeção que, nos abscessos superficiais, poderá<br />

revelar os sinais flogísticos de tumoração, hiperemia, dor e calor local.<br />

Nos abscessos profundos a inspeção pode nada revelar. À palpação<br />

nota-se a flutuação e os limites da coleção purulenta. Ao toque retal<br />

pode-se palpar abaulamentos dolorosos pela presença de abscessos<br />

profundos. A anuscopia costuma nada revelar. A retossigmoidoscopia<br />

deve, sempre que possível, ser realizada para avaliação de doenças<br />

associadas.<br />

Nos enfermos com dor intensa e exame físico duvidoso deve-se<br />

realizar a ultra-sonografia transrretal, que poderá demonstrar a<br />

presença de abscessos profundos e pequenos. No entanto, neste caso,<br />

o exame com melhor sensibilidade e especificidade é a ressonância<br />

magnética. A tomografia computadorizada e a cintilografia são de<br />

indicação menos comum. Os exames laboratoriais somente são<br />

utilizados para a avaliação do estado geral do paciente. Nos enfermos<br />

18


em que a dor é muito intensa, impossibilitando o exame proctológico,<br />

ele deverá ser realizado sob analgesia.<br />

O diagnóstico diferencial do abscesso criptoglandular deve ser feito<br />

com os abscessos perianais das enfermidades específicas.<br />

3.3.3. TRATAMENTO<br />

É cirúrgico e ao ser diagnosticado, deverá sempre ser drenado,<br />

independente das condições clínicas do paciente.<br />

Uma das opções operatórias é a drenagem simples da coleção<br />

purulenta, por meio de ampla incisão da pele que recobre o abscesso,<br />

permitindo drenagem do abscesso, impedindo o seu fechamento<br />

prematuro e a sua recidiva. Nos processos superficiais e pequenos,<br />

essa drenagem pode ser realizada, sob anestesia local, em<br />

ambulatório. Nos abscessos profundos e extensos, esta drenagem<br />

deverá ser efetuada, sob bloqueio anestésico, em centro cirúrgico. A<br />

ferida deverá permanecer aberta até a total cicatrização do abscesso.<br />

Havendo a cicatrização da ferida, o paciente será considerado curado.<br />

Não raro, porém, ocorre a persistência de um trajeto fistuloso entre a<br />

cripta doente a glândula perianal infectada, por onde há eliminação<br />

contínua de secreção purulenta, denominada de fístula perianal. Na<br />

persistência deste trajeto, haverá a necessidade de nova cirurgia para<br />

a correção desta fístula e da causa do abscesso, ou seja, da cripta<br />

doente.<br />

Outra técnica operatória e provavelmente, a mais usada, é efetuar-se,<br />

juntamente com a drenagem do abscesso, a imediata procura da<br />

cripta infectada (ou do orifício interno de origem do abscesso). Sempre<br />

que identificado, deve-se efetuar a ampla abertura deste trajeto,<br />

desde o abscesso até o canal anal, com a curetagem do leito da<br />

fístula, deixando-se esta ferida aberta até a sua completa cicatrização.<br />

Esta opção evita, na maioria das vezes, a recidiva da infecção ou do<br />

trajeto fistuloso, diminuindo a necessidade de nova cirurgia para a<br />

correção da fístula residual. Este procedimento é realizado, sob<br />

bloqueio anestésico, em centro cirúrgico.<br />

É rotina o uso profilático de antimicrobianos associados à drenagem<br />

cirúrgica, à exceção dos pacientes debilitados ou imunodeprimidos,<br />

quando se utiliza os antibióticos de amplo espectro como terapia.<br />

Analgésicos e antiinflamatórios orais ou parenterais são, também,<br />

empregados. Auxilia-se a evacuação com dieta rica em fibras ou com<br />

incrementadores do bolo fecal. Os cuidados locais pós-operatórios são<br />

feitos por meio de curativos diários, inicialmente até 5 a 6 vezes ao<br />

dia, com limpeza da ferida de drenagem pela lavagem com água<br />

corrente e protegendo-a com pomada analgésica e antinflamatória, até<br />

sua cicatrização total. Associam-se banhos de assento com<br />

permanganato de potássio, diluído em 1:40000, como solução anti-<br />

19


séptica após cada evacuação, nos primeiros 7 a 10 dias de pósoperatório.<br />

3.4. Gangrena Necrotizante<br />

É uma complicação grave do processo infeccioso anorretal. Poderá<br />

ocorrer, em especial, em pacientes debilitados, inumodeprimidos,<br />

diabéticos, idosos ou submetidos a drenagem insuficiente.<br />

A gangrena necrotizante ocorre quando o abscesso espalha-se para<br />

fora de seus limites anatômicos e invade todo o períneo, atingindo sua<br />

gordura, fáscias e músculos, e não raro, alastra-se para as nádegas,<br />

coxas, região inguinal, parede abdominal e espaço retroperitonial. Tem<br />

predileção, entretanto, para se estender anteriormente, alcançando a<br />

genitália. Quando a bolsa escrotal é envolvida pela infecção, com<br />

preservação dos testículos, denomina-se de síndrome de Fournier.<br />

3.4.1. QUADRO CLÍNICO<br />

Este processo infeccioso é causado pela associação de vários<br />

microrganismos da flora colônica, em especial, os anaeróbios e os<br />

gram negativos, responsáveis pela sua alta morbimortalidade. Em<br />

geral é causada, primariamente, pelo Clostridium perfringens, que<br />

apresenta quadro clínico fulminante e grave, com septicemia, choque<br />

toxêmico, etc.<br />

3.4.2. DIAGNÓSTICO<br />

Há o aparecimento de uma celulite perineal de rápida evolução, com<br />

crepitação, manchas escuras (necróticas) e invasão para as regiões<br />

vizinhas. O paciente apresenta sintomas retais vagos e súbita<br />

deteriorização do estado geral, com sinais de toxemia.<br />

3.4.3. TRATAMENTO<br />

É emergencial, com antibioticoterapia de amplo espectro, reequilíbrio<br />

hidroeletrolítico e cirurgia com desbridamento radical e agressivo de<br />

toda a área gangrenada ou necrótica.<br />

Em geral, há necessidade de repetirem-se estes desbridamentos por<br />

vários dias, e às vezes, mais de uma vez ao dia. Em casos mais<br />

graves, pode haver a indicação de sigmoidostomia derivativa para<br />

facilitar a limpeza local da ferida perineal. Há também a possibilidade<br />

do uso de câmara hiperbárica de oxigênio no combate à infeccção<br />

anaeróbia.<br />

3.5. Fístulas Perianais<br />

As fístulas perianais são caracterizadas por um trajeto comunicando o<br />

canal anal ou o reto (orifício interno) ao períneo (orifício externo).<br />

Calcula-se que a etiologia da fístula, também, em aproximadamente<br />

20


80% dos enfermos, seja criptoglandular e decorrente da ruptura de<br />

um abscesso originário da infecção das glândulas anais de<br />

Chiari 5,40,42,45 .<br />

Podem existir vários orifícios externos e/ou internos; uni ou bilaterais;<br />

posteriores, laterais ou anteriores; ou mesmo vários trajetos fistulosos<br />

relacionados a uma ou múltiplas criptas anais.<br />

3.5.1. CLASSIFICAÇÃO<br />

A fístula perianal é dita completa quando é possível reconhecer o<br />

orifício externo (cutâneo), o trajeto fistuloso e o orifício interno (cripta<br />

anal comprometida).<br />

Não sendo identificado um dos orifícios é chamada de incompleta.<br />

Quanto à profundidade, são denominadas de superficiais ou profundas.<br />

De acordo com o tipo de trajeto fistuloso; com o número de orifícios,<br />

interno ou externo; e pela musculatura esfincteriana envolvida na<br />

fístula são denominadas de simples ou complexas.<br />

São também classificadas, de acordo com a localização anatômica, em<br />

interesfincterianas, trans-esfincterianas, extra-esfincterianas e supraesfincterinas.<br />

3.5.2. QUADRO CLÍNICO<br />

Os pacientes referem, com freqüência, a ocorrência anterior de um<br />

abscesso anorretal que após drenado, espontânea ou cirurgicamente,<br />

passa a apresentar a eliminação de secreção purulenta perianal,<br />

relativamente indolor. A dor poderá estar presente nos casos de<br />

fístulas com recidiva da infecção (abscesso).<br />

À inspeção, constata-se a presença de um ou mais orifícios externos,<br />

com bordas endurecidas e, em geral, próximos ao canal anal. São<br />

raros os orifícios situados a mais de 5cm da margem anal. Nas fístulas<br />

superficiais, palpa-se um trajeto fistuloso subcutâneo entre o orifício<br />

externo e o canal anal. Ao toque retal pode-se identificar o tecido<br />

fibroso na região anorretal. Esta palpação, com freqüência, permite a<br />

saída de secreção pelo orifício da fístula.<br />

Em alguns pacientes é possível reconhecer o orifício interno da fístula<br />

pela anuscopia, à vezes, com a saída de secreção purulenta. A<br />

exploração instrumental do trajeto fistuloso com estilete, quando<br />

realizada, deverá ser extremamente cuidadosa para não provocar dor<br />

ou falso trajeto induzindo a erro quanto à cripta comprometida.<br />

3.5.3. DIAGNÓSTICO<br />

É facilmente estabelecido, na maioria das vezes, pela história e exame<br />

físico do paciente. O estudo por imagens é raramente indicado. A<br />

fístulografia e a ultra-sonografia transanal tem auxiliado nas fístulas<br />

21


complexas, porém o maior avanço propedêutico, nestes casos, foi a<br />

ressonância magnética.<br />

O diagnóstico diferencial deverá ser realizado com todas as<br />

enfermidades específicas que possibilitam o aparecimento de fistulas<br />

anorretais.<br />

3.5.4. TRATAMENTO<br />

É essencialmente cirúrgico. Faz-se a abertura (fistulotomia) ou a<br />

ressecção (fistulectomia) do trajeto fistuloso, incluindo o orifício<br />

externo e o interno, incluindo a cripta doente. A identificação<br />

cuidadosa deste trajeto é fundamental e poderá ser realizada por meio<br />

de estilete, ou mais raramente com a injeção de água oxigenada ou<br />

azul de metileno. A ferida é deixada aberta até a sua cicatrização total.<br />

Para a identificação e localização dos trajetos fistulosos segue-se a<br />

regra de Goodsall-Salmon. Ela divide o canal anal, por uma linha<br />

imaginária, em duas metades, uma anterior e outra posterior. Esta<br />

regra informa que os orifícios localizados na metade anterior do ânus,<br />

tendem a dirigir-se diretamente à cripta anal correspondente, de<br />

maneira radial e os orifícios localizados na metade posterior, tendem a<br />

confluir para a cripta mediana posterior.<br />

Nas fístulas simples e superficiais, pode-se efetuar a cirurgia em<br />

ambulatório, sob anestesia local. Entretanto, nas fístulas profundas ou<br />

complexas, deverá ser realizada com o paciente internado, em centro<br />

cirúrgico e sob bloqueio anestésico para uma segura exploração de<br />

todo o trajeto fistuloso.<br />

Os cuidados pós-operatórios são os mesmos utilizados para o abscesso<br />

anorretal.<br />

4. DOENÇA PILONIDAL<br />

É uma moléstia infecciosa da região sacrococcígea de origem<br />

relacionada, em geral, a fatores adquiridos. Manifesta-se de várias<br />

maneiras, em especial, pela formação de uma cavidade sinusal<br />

crônica, eventualmente, abscedada. Esta cavidade não possui parede<br />

própria (sendo, portanto, um pseudocisto) e é reacional ao processo<br />

inflamatório com formação de tecido de granulação decorrente da<br />

presença de pêlos no seu interior. Foi descrita por Anderson e Hodges<br />

em 1847, sendo sua denominação pilonidal derivada do latim: pilus -<br />

pêlo e nidus - ninho 38,40 .<br />

22


Incide, preferencialmente, em adultos jovens, do sexo masculino na<br />

proporção de 2:1 em relação ao feminino, na raça branca e em<br />

hirsutos.<br />

4.1. Etiopatogenia<br />

Há várias hipóteses para explicar sua etiopatogenia adquirida. Entre<br />

elas 38,40 :<br />

• a doença pilonidal seria resultado da sucção de pêlos da pele<br />

para o subcutâneo por pressão negativa das nádegas, formando<br />

uma cavidade recoberta por tecido de granulação, com pêlos<br />

aprisionados em seu interior, que atuariam como corpo estranho<br />

(Patey e Scarff, 1946);<br />

• causada pelo atrito da região interglútea, provocado pelos<br />

movimentos de deambulação e/ou por traumas locais que<br />

propiciariam a justaposição de pêlos em feixes. Estes migrariam,<br />

por sucção, para o tecido celular subcutâneo, por causa da<br />

pressão negativa que se forma no tecido subcutâneo da região,<br />

pelo estiramento da pele, nos movimentos de sentar e levantar,<br />

aliados à elevação da fascia sacrococcígea (Brearley, 1955).<br />

4.2. Quadro Clínico<br />

A fase aguda da enfermidade caracteriza-se pela presença de<br />

tumoração sacrococcígea associada a dor intensa e febre, indicativos<br />

de processo supurativo abscedado.<br />

Na fase crônica da doença pilonidal, o enfermo relata a presença de<br />

tumoração na região sacrococcígea, em geral, acompanhada por<br />

orifício único ou múltiplo, com secreção e dor, especialmente, quando<br />

submetido a pressão local. Pode haver, também, eliminação de pêlos<br />

pelos orifícios da lesão. Em alguns enfermos há o relato de trauma<br />

local, antecedendo os sintomas.<br />

4.3. Diagnóstico<br />

É feito pela história clínica e pelos achados do exame físico da região<br />

sacrococcígea, com presença de tumoração subcutânea de forma,<br />

tamanho e consistência variáveis, de acordo com a fase em que se<br />

encontra a enfermidade.<br />

Na maioria dos enfermos, há um orifício primário, em geral, de<br />

pequena dimensão, situado na linha interglútea. Outros orifícios<br />

secundários podem estar presentes, nesta mesma linha ou<br />

23


lateralmente a ela, com ou sem eliminação de secreções purulentas ou<br />

muco-sangüinlentas, ou com a presença de pêlos saindo de seu<br />

interior. Estes achados caracterizam a fase crônica da doença pilonidal.<br />

Algumas vezes o cisto pilonidal pode manifestar-se na forma de um<br />

abscesso sacrococcígeo, que pode ou não, drenar espontaneamente.<br />

O diagnóstico diferencial deve ser feito com as seguintes<br />

enfermidades: foliculites, hidroadenite supurativa, fístula da região<br />

anorretal e tumores benignos e malignos da região.<br />

4.4 Tratamento<br />

O tratamento da doença pilonidal sacrococcígea é, essencialmente,<br />

cirúrgico.<br />

Várias técnicas são utilizadas para a cura da lesão, todas objetivando a<br />

retirada dos pêlos e do tecido de granulação que o circunda. A ferida<br />

resultante poderá ficar aberta, cicatrizando por segunda intenção ou<br />

ser fechada por meio de suturas ou plásticas com retalhos cutâneos.<br />

Nossa preferência é pela utilização de uma de duas técnicas<br />

operatórias, ambas de grande simplicidade e de fácil execução. O<br />

critério de escolha se dá, de acordo com, a fase de manifestação da<br />

doença 38,40 :<br />

• Doença pilonidal na fase aguda: há, em geral, a presença de<br />

abscesso na região sacrococcígea e nela utilizamos a técnica<br />

denominada de incisão simples, com abertura de toda a<br />

tumoração e curetagem do tecido de granulação do subcutâneo.<br />

Apresenta a vantagem de preservar os tecidos inflamados e<br />

permitindo sua rápida cicatrização;<br />

• Doença pilonidal na fase crônica: optamos pela técnica chamada<br />

de excisão da lesão, onde efetuamos a sua completa ressecção,<br />

incluindo todos seus trajetos fistulosos, cuidadosamente,<br />

identificado.<br />

Ambas são técnicas abertas e a ferida cicatriza por segunda intenção.<br />

Podem ser realizadas, em ambulatório ou com curto período de<br />

hospitalização (8 a 12 horas), sob anestesia loco-regional ou até<br />

mesmo local.<br />

Suas vantagens são: indicação em todos os casos; preservação da<br />

fáscia e do perióstio sacral; preservação do tecido normal circunvizinho<br />

à lesão; mínimo desconforto pós-operatório e baixa recidiva (ao redor<br />

de 3%) tanto na fase aguda como na crônica.<br />

Os curativos pós-operatórios são muito importantes e devem ser<br />

realizados, diariamente, com limpeza da ferida com anti-sépticos<br />

tópicos e sua proteção com gaze umidificada para evitar aderência e<br />

contribuir para a hidratação da ferida. É fundamental, também, que se<br />

faça a raspagem ou a retirada dos pêlos circunvizinhos à lesão,<br />

periodicamente, até a completa cicatrização da ferida.<br />

24


5. PRURIDO ANAL<br />

As doenças dermatológicas da região anal e perianal, no adulto, são<br />

causa freqüente de consulta ao dermatologista, ao clínico geral e, não<br />

raro, ao coloproctologista.<br />

As condições de normalidade da pele na região anal e perianal são<br />

facilmente deterioráveis por falta de ventilação, pelo calor, pela<br />

umidade e pela contaminação por fezes, podendo ocasionar uma<br />

dermatite, definida pela presença de um processo inflamatório ou<br />

infeccioso e caracterizada pelo prurido anal 38,40 .<br />

5.1. Etiopatogenia<br />

As dermatites perianais, sob a visão da coloproctologia, podem ser<br />

classificadas de acordo com sua extensão em:<br />

• superficiais ou de primeiro grau: comprometem somente a<br />

camada epidérmica, ocasionando um eritema local com ou sem<br />

erosão ou ragade, podendo ser única ou múltiplas; e<br />

• profundas ou de segundo grau: atingem as camadas da<br />

derme e da hipoderme, podendo exprimir-se na pele pela<br />

presença de vesículas, ulcerações, liquenificação e/ou<br />

verrucosidades, entre outras alterações morfológicas.<br />

Em relação à intensidade, são classificadas em: discreta, moderada ou<br />

grave. Quanto à presença ou predominância dos tipos de lesão na<br />

pele, em: aguda, subaguda ou crônica.<br />

De acordo com sua etiologia são chamadas de:<br />

• primárias: quando são dermatites provenientes da própria pele<br />

perianal; e<br />

• secundárias: quando são lesões de outros órgãos ou sistemas<br />

que se manifestam por alteração da pele perianal.<br />

A despeito da patogenia diversa, suas manifestações clínicas são<br />

freqüentemente semelhantes, estando o prurido anal presente na<br />

maioria delas, de maneiras variáveis, contínuas ou com períodos de<br />

acalmia e paroxismos, geralmente, mais intensos à noite. A ardente<br />

necessidade de coçar-se pode provocar escoriações na pele,<br />

agravando a lesão e perpetuando o prurido.<br />

Enfermidades coloproctológicas ou ginecológicas podem estar<br />

envolvidas, bem como reações metabólicas ou psicológicas. Em todos<br />

os casos portanto, é necessário uma anamnese criteriosa, exame<br />

clínico, proctológico, ginecológico e dermatológico completos e,<br />

25


quando indicada, uma investigação laboratorial complementar e<br />

biópsia das lesões.<br />

Nos casos de etiologia conhecida, o tratamento específico cura,<br />

freqüentemente, a enfermidade e soluciona a lesão dermatológica.<br />

Entretanto, usualmente, a dermatite é inespecífica e seu tratamento,<br />

realizado mediante abordagem local com medicamentos tópicos e<br />

conduta higiênica e dietética.<br />

A dermatite dita de contato proporciona o quadro dermatológico mais<br />

comum de reação inflamatória da região anal e perianal que provoca o<br />

prurido anal. Caracteriza-se, inicialmente, pela presença de eritema e,<br />

com sua evolução, pode apresentar edema, infiltração, vesiculação,<br />

secreção, crostas, escamas e liquenificação. De acordo com a presença<br />

ou predominância das lesões, o quadro pode ser agudo, subagudo ou<br />

crônico. Com sua cronicidade e em decorrência da coçadura, surge a<br />

liquenificação, e às vezes, melanodermia regional e perda de pêlos.<br />

Sua etiologia pode resultar do contato com substâncias irritantes -<br />

dermatite por irritante primário ou por desenvolvimento de<br />

sensibilização a substância não irritante - dermatite de contato por<br />

sensibilizante.<br />

A dermatite de contato por irritação primária desenvolve-se súbita ou<br />

gradualmente pela exposição ao irritante, de acordo com a<br />

concentração deste, o tempo de ação e a tolerância individual. Limitase<br />

à área constatada, e o simples afastamento da substância<br />

responsável determinará a melhora do quadro. Suas causas perianais<br />

mais freqüentes são: uso de papel higiênico, perfume, colônia, sabão,<br />

sabonete, desodorante, talco, pomada ou pó antimicótico; trauma<br />

local durante a higiene do ânus com material inadequado, como<br />

jornal; ingestão de alimentos condimentados, pimentas ou álcool;<br />

passagem freqüente de fezes líquidas, abuso de laxativos de contato<br />

ou produtos de decomposição e contato, através das roupas íntimas ou<br />

não, com náilon, seda, raiom, lycra, corantes de tecido ou borracha.<br />

A dermatite de contato por sensibilização alérgica surge pelo<br />

desenvolvimento de um estado de sensibilização que pode ocorrer em<br />

algumas semanas ou somente após alguns anos. Estabelecido o<br />

quadro, a reação cutânea perianal surgirá após algumas horas da nova<br />

exposição. Entretanto, toda a pele está sensibilizada. Essa dermatite<br />

pode ser causada por alérgenos químicos ou imunológicos, tais como<br />

as reações a sulfas, antibióticos (neomicina, penicilina, etc.), antisépticos,<br />

antimicóticos e anestésicos.<br />

5.2. Quadro Clínico<br />

O quadro inicial pode ser agudo, fundamentalmente eritematoso, com<br />

a presença de prurido anal de intensidade variável, sangramento<br />

discreto e raramente dor.<br />

26


5.3. Diagnóstico<br />

A inspecção perianal revelará um simples eritema da região, com ou<br />

sem exsudação. Sua evolução é para uma dermatite subaguda, dita<br />

eczematosa. Apresenta-se, à inspecção, como lesões congestivas,<br />

microerosivas ou exsudativas, raramente vesiculares, escoriações<br />

provocadas pela coçadura da região e com formação de ragades<br />

perianais direcionadas ao canal anal.<br />

Em alguns casos, podem estender-se às nádegas, ao períneo, ao<br />

escroto ou à região vulvar, particularmente nos casos de longa<br />

duração ou por tratamentos impróprios. O prurido anal, nessa fase,<br />

tem um começo gradual ou abrupto, manifestando-se geralmente pelo<br />

desejo de coçar, com maior intensidade à noite. Esse sintoma é, por<br />

vezes, intermitente, podendo persistir por longos períodos com grande<br />

intensidade.<br />

A fase crônica pode apresentar uma dermatite perianal liquenificada,<br />

caracterizada por um espessamento cutâneo coberto por pedaços<br />

brancos macerados, o qual pode atingir progressivamente a pele<br />

adjacente. Nessa fase, o prurido anal é intenso, podendo provocar<br />

insônia, ansiedade e depressão.<br />

A infecção secundária pode surgir como complicação da fase aguda<br />

exsudativa ou por coçadura na crônica. É causada por bactéria<br />

piogênica (estafilococos ou estreptococos) ou pelas bactérias<br />

intestinais.<br />

5.4. Tratamento<br />

Abordagem local com medicamentos e conduta higiênica e dietética.<br />

Remove-se todo agente irritante ou sensibilizante, procurando<br />

esclarecer o paciente. É importante notar que, nas dermatites de<br />

contato crônicas, de longa duração, após instituído o tratamento, as<br />

alterações cutâneas regridem lentamente.<br />

Corticosteróides tópicos, preferencialmente na forma de creme, para<br />

não agravar a maceração da pele, devem ser usados em pequena<br />

quantidade, só no local lesado, por curto período e não de maneira<br />

contínua. Na fase inflamatória aguda, indica-se um a dois banhos de<br />

assento diários de permanganato de potássio na diluição de 1:40.000,<br />

em água morna. Na presença de intenso prurido anal, pode-se<br />

administrar anti-histamínicos para seu alívio. Estão contra-indicados os<br />

tratamentos locais mistos de antimicóticos e antimicrobianos, o uso de<br />

cáusticos tópicos e antibióticos orais.<br />

Lavar a região perianal após cada evacuação, com água e,<br />

eventualmente, sabonete neutro, enxugando cuidadosamente com<br />

toalha de algodão. Proibir o uso de papel higiênico, para limpeza ou<br />

para enxugar o ânus, de alimentos condimentados, de pimentas, de<br />

27


ebidas alcoólicas e de laxativos. Corrigir a obesidade, caso presente,<br />

evitar permanecer sentado por longos períodos e atividades que<br />

possam traumatizar a região perianal, como cavalgar e andar de<br />

bicicleta, faz parte das medidas preventivas a tomar com o enfermo.<br />

6. INCONTINÊNCIA ANAL<br />

Entende-se por incontinência anal a perda da capacidade voluntária de<br />

reter o conteúdo intestinal. Pode ser parcial quando ocorre perda de<br />

gases e fezes de consistência líquida, e total quando há perda de fezes<br />

formadas 38,40,47 .<br />

O número de doentes portadores de incontinência anal tende a<br />

aumentar como conseqüência do aumento da longevidade humana.<br />

Esta enfermidade tem grande importância porque esses pacientes<br />

acabam, com freqüência, afastados do convívio social ou, até mesmo,<br />

isolando-se voluntariamente.<br />

6.1. Etiopatogenia<br />

A incontinência fecal é, em geral, adquirida e resultante do<br />

enfraquecimento e/ou destruição, total ou parcial, da musculatura<br />

esfincteriana pélvica, podendo associar-se a:<br />

• neuropatia do nervo pudendo;<br />

• alterações do ângulo anorretal (com a idade ele torna-se mais<br />

obtuso);<br />

• seqüelas de traumas cirúrgicos ou<br />

• conseqüente a doenças inflamatórias.<br />

Deverá, também, ser considerada a alteração sensitiva da mucosa<br />

retal que ocorre no processo de envelhecimento no idoso e/ou pelo<br />

uso prolongado e abusivo de laxativos que provocam a degeneração<br />

neuronal da mucosa retal. Ambos causam a perda de sensibilidade<br />

para a presença de fezes na ampola retal, não havendo a contração<br />

dos músculos da continência voluntária, ou seja, o esfíncter anal<br />

externo, os elevadores do ânus e o puborretal.<br />

6.2. Quadro Clínico<br />

Caracteriza-se pela incapacidade de retenção voluntária, em suas<br />

fases iniciais, para gases e fezes líquidas, denominada de incontinência<br />

28


parcial e nos avançados, aonde há perda de fezes formadas, de<br />

incontinência total.<br />

Ambas ocasionam problemas sociais, econômicos e psicológicos aos<br />

enfermos, de maneira mais ou menos importante.<br />

A história clínica é de grande importância, pois permite estabelecer o<br />

grau da incontinência e o quanto este sintoma altera a qualidade de<br />

vida do enfermo. Deve-se questionar o tempo e o modo de<br />

aparecimento da incontinência fecal, se há consciência da vontade<br />

evacuatória, urgência defecatória e as características das fezes, além<br />

da freqüência de sua ocorrência.<br />

6.3. Diagnóstico<br />

A inspeção da região perianal pode demonstrar a presença de fezes ou<br />

de escaras.<br />

A inspeção estática do ânus permite a observação da forma do canal<br />

anal, a presença de cicatrizes e/ou a existência algum grau de<br />

hipotonia esfincteriana anal.<br />

A inspeção dinâmica do canal anal pode evidenciar o prolapso mucoso,<br />

a procidência retal ou, até mesmo, o abaulamento perineal.<br />

O toque retal permite a avaliação da tonicidade dos músculos<br />

esfincterianos e sua capacidade de contração, para fechar e abrir o<br />

ânus.<br />

A retossigmoidoscopia deverá ser, sempre, realizada para afastar<br />

enfermidades que alteram o hábito intestinal e que possam contribuir<br />

para essa incontinência fecal.<br />

Além destes exames, para a adequada avaliação da incontinência<br />

fecal, deve-se realizar outros, mais especializados, tais como,<br />

defecograma, manometria anorretal e/ou eletromiografia.<br />

6.4. Tratamento<br />

A maioria dos enfermos com incontinência anal é tratada com medidas<br />

conservadoras, de acordo com sua etiologia e de suas condições<br />

físicas. Na presença de incoordenação defecatória utiliza-se a<br />

estimulação elétrica anal.<br />

O tratamento conservador não cura o paciente, porém, pode melhorar<br />

seus sintomas.<br />

A indicação do tratamento cirúrgico varia de acordo com a causa da<br />

incontinência, da intensidade dos sintomas e das condições físicas e<br />

operatórias dos pacientes. Várias técnicas de esfincteroplastias para<br />

reconstrução da musculatura anorretal e, outras tantas, de anoplastias<br />

poderão ser utilizadas para sua correção.<br />

29


7. PROLAPSO E PROCIDÊNCIA<br />

O prolapso retal é caracterizado pela exteriorização da mucosa do reto<br />

através do ânus enquanto que a procidência caracteriza-se pela<br />

eversão de todas as camadas retais com ou sem protusão pelo canal<br />

anal. A procidência é chamada, também, de prolapso total e o<br />

prolapso é denominado de prolapso parcial ou mucoso.<br />

Ambos podem estar presentes em qualquer fase da vida humana,<br />

porém, sendo mais freqüentes em seus extremos. Há pequena<br />

predominância no sexo feminino 38,40 .<br />

7.1. Etiopatogenia<br />

A procidência retal está, diretamente, relacionada com a falência da<br />

musculatura do assoalho pélvico. Sob o ponto de vista cirúrgico, os<br />

mecanismos de fixação do reto são: os meios de suspensão do reto,<br />

feita pelo peritôneo pélvico, mesentério vascular e seus vasos; os<br />

meios de fixação pela fascia pélvica e os de sustentação pelos<br />

músculos elevadores do ânus, esfíncter anal externo e fáscia perineal.<br />

A etiologia mais comum do prolapso é o afrouxamento da fixação da<br />

submucosa do reto que permite o deslizamento de sua mucosa. Pode<br />

ser ocasionada por:<br />

• doença hemorroidária de terceiro grau;<br />

• hipotonia esfincteriana senil;<br />

• diarréia crônica;<br />

• constipação intestinal grave;<br />

• esforço defecatório excessivo e/ou<br />

• fraqueza relativa da musculatura do assoalho pélvico.<br />

Martin e cols, em 1932, admitiram como causa inicial da procidência<br />

retal a presença de um mesocolon longo, que permitia uma mobilidade<br />

anormal e invaginação sigmóide-retal. Seria portanto, essa<br />

invaginação que causaria o enfraquecimento dos meios de fixação<br />

retal.<br />

Para esse enfraquecimento são descritos vários fatores<br />

predisponentes, tais como:<br />

• constipação intestinal grave;<br />

• diarréia crônica;<br />

• mesocolon longo;<br />

• posição inadequada para a defecação;<br />

• esforço evacuatório;<br />

• parasitoses intestinais;<br />

• prolapso genital<br />

30


• multíparas<br />

• desnutrição grave e<br />

• pólipos na região retossigmoideana.<br />

7.2. Quadro Clínico<br />

O que caracteriza o quadro clínico é o relato da presença da eversão<br />

de “alguma coisa”, em geral, chamada de “hemorróidas” pelo ânus. É<br />

a exteriorização (eversão) da mucosa retal pelo canal anal às<br />

evacuações e aos esforços. Nos enfermos com prolapso há<br />

exteriorização somente de mucosa (prolapso parcial) e nos com<br />

procidência (prolapso total), de todas as camadas do reto. Em alguns<br />

pacientes essa exteriorização pode acontecer, até mesmo, após<br />

movimentos como a deambulação.<br />

Os enfermos informam que costumam recolocar, digitalmente, para o<br />

interior do reto, esse prolapso ou procidência, após cada eversão.<br />

Em geral, há também, desconforto, sangramento, secreção de muco e,<br />

raramente, dor local. A dor acontece quando ocorre um processo<br />

inflamatório na mucosa prolapsada que dificulta sua redução para o<br />

interior do canal anal.<br />

A este quadro, pode associar-se também, certo grau de incontinência<br />

fecal, causada pela hipotonia dos esfíncteres da continência e pela<br />

diminuição ou perda da angulação anorretal. Outra causa para essa<br />

incontinência seria, segundo Parks (1977), a desnervação esfincteriana<br />

decorrente da tração do nervo pudendo provocada pela exteriorização<br />

do reto.<br />

Suas complicações mais freqüentes são:<br />

• processo inflamatório na mucosa evertida;<br />

• edema local;<br />

• escaras na mucosa exteriorizada;<br />

• hemorragia;<br />

• rotura;<br />

• estrangulamento mucoso;<br />

• suboclusão ou obstrução intestinal e<br />

• peritonite.<br />

7.3. Diagnóstico<br />

É, essencialmente, clínico, por meio de anamnese criteriosa e do<br />

exame físico cuidadoso.<br />

A inspeção estática evidencia, com freqüência, um ânus entreaberto e<br />

hipotônico. A exteriorização da mucosa já poderá estar presente.<br />

À inspecção dinâmica, na presença do prolapso, o esforço provocará a<br />

protusão da mucosa retal com pregueamento radial, com no máximo 3<br />

a 4 cm de extensão, de superfície irregular, às vezes, edemaciada e<br />

com ulcerações ou sufusões superficiais.<br />

31


Nos pacientes com procidência retal, o esforço evacuatório poderá<br />

acarretar a exteriorização de todas as camadas do reto,<br />

caracterizando-se por apresentar mucosa vinhosa ou rósea, irregular e<br />

com pregueamento circular.<br />

A procidência, às vezes, pode atingir grande tamanho, com eversão de<br />

todo o reto e do cólon sigmóide, com 30cm ou mais, de extensão.<br />

Nas mulheres poderá haver concomitância de cistocele, uterocele e<br />

retocele.<br />

Quando o prolapso ou a procidência apresentam exteriorização<br />

(eversão) de pequeno tamanho é importante diferenciá-la do prolapso<br />

da doença hemorroidária. Para esse diagnóstico diferencial, poderá ser<br />

necessário que o enfermo faça o esforço defecatório no próprio vaso<br />

sanitário ou na posição de ”cócoras" antes de ser examinado.<br />

Outros diagnósticos diferenciais serão com outras enfermidades que<br />

também podem se exteriorizar pelo ânus, como a papila anal<br />

hipertrófica, tumores benignos e malignos, etc.<br />

A realização da retossigmoidoscopia é importante para excluir a<br />

presença de doenças associadas, especialmente, câncer retal ou<br />

pólipos.<br />

7.4. Tratamento<br />

O prolapso mucoso da criança é tratado, conservadoramente, por meio<br />

da regularização de seu hábito intestinal, pela terapêutica<br />

antiparasitária e/ou pela correção da desnutrição. Quando<br />

persistentes, podem ser feitas injeções de substâncias esclerosantes<br />

na submucosa.<br />

No adulto, a doença do prolapso retal será corrigida de acordo com<br />

suas causas, podendo-se utilizar diferentes técnicas de<br />

esfincteroplastias. Diversos centros especializados têm a preferência<br />

pela cirurgia de Delorme. Uma nova opção para sua correção é a<br />

cirurgia por grampeamento (técnica de Longo), descrita para o<br />

tratamento da doença hemorroidária<br />

Em relação à procidência, sempre que as condições gerais do enfermo<br />

permitirem, seu tratamento deverá ser cirúrgico.<br />

Em geral, a operação tem como objetivo a correção, de forma isolada<br />

ou associada, dos seguintes fatores:<br />

• encurtamento do fundo de saco peritoneal;<br />

• impedimento da invaginação do retossigmoide por meio da sua<br />

fixação ou suspensão;<br />

• reforço da musculatura do assoalho pélvico e/ou<br />

• diminuição da diâmetro do canal anal.<br />

7.4.1. TÉCNICA DE SACROPROMONTOFIXAÇÃO RETAL<br />

32


Com o objetivo da correção desses fatores fisiopatológicos, em<br />

especial, a invaginação do retossigmoide, Degni (1947) idealizou esta<br />

técnica cirúrgica de fixação retossigmoideana ao perióstio do sacro e<br />

do promontório de modo a impedir sua eversão 38,40 .<br />

O paciente é operado na posição de decúbito dorsal, em<br />

Trendelenburg, sob anestesia geral e laparotomia paramediana,<br />

pararretal interna, infraumbilical esquerda.<br />

Após a exposição do reto e de usa mobilização posterior, de maneira<br />

ampla, nossa preferência é fazer a fixação da parede do retossigmóide<br />

ao perióstio do sacro e do promontório, por meio de 3 a 5 pontos<br />

separados, com fio inabsorvível, n.º 00, sem a interposição de nenhum<br />

material sintético.<br />

Desde 1990, com o desenvolvimento da cirurgia videolaparoscópica,<br />

essa técnica pode ser realizada também, por essa tática, com<br />

excelentes resultados.<br />

Alguns cirurgiões têm realizado a fixação do retossigmoide ao<br />

sacropromontório por meio do uso de material sintético (telas), como<br />

uma faixa de 15 a 20cm de extensão com 4 a 5cm de largura que<br />

abraça esse segmento intestinal, com resultados semelhantes.<br />

Nos pacientes idosos, que não apresentam condições cirúrgicas ou nos<br />

que, após a fixação do reto, persiste a incontinência fecal no pósoperatório<br />

(após, aproximadamente, 6 meses), estará indicada a<br />

cerclagem anal por meio de fio inabsorvível n.º 2, circundando todo o<br />

canal anal, ao nível dos esfíncteres anais (técnica de Thiersch,<br />

1891) 38,40 .<br />

8. HIDRADENITE SUPURATIVA<br />

É doença crônica, recidivante, da pele e tecido celular subcutâneo,<br />

caracterizada pela formação de abscessos e trajetos fistulosos,<br />

acometendo, inicialmente, as glândulas sudoríparas apócrinas. A<br />

hidroadenite supurativa localizada nas regiões perineal, inguinal e<br />

glútea é pouco freqüente, porém ocasiona intenso sofrimento aos<br />

enfermos, com repercussão psicológica, familiar e profissional 38,40 .<br />

Foi descrita pela primeira vez em 1839 pelo cirurgião francês Velpeau<br />

e feita sua associação às glândulas sudoríparas por Verneuil, em 1854.<br />

As glândulas sudoríparas apócrinas são glândulas tubulares<br />

compostas, situadas no tecido subcutâneo profundo, maiores e muito<br />

menos numerosas do que as écrinas, em íntima relação com os<br />

folículos pilosos. Sua localização é restrita, principalmente, ao dorso do<br />

33


pescoço, axilas, aréola mamaria, região inguinal, púbis, nádegas,<br />

regiões perianal e perineal, incluindo vulva e escroto, e coxas. Seus<br />

ductos excretores desembocam no folículo piloso ou diretamente na<br />

pele, perto dele. Só se ativam na puberdade, regredindo gradualmente<br />

com a idade, sendo, dessa maneira, consideradas glândulas sexuais,<br />

com produção da 5-alfa testosterona-redutase e com secreção espessa<br />

e de composição complexa (protoplasma).<br />

Pode ser provocada pela oclusão do orifício glandular por tampão<br />

queratínico, que possibilita infecção secundária que, com sua rotura,<br />

provocaria a propagação da infecção aos tecidos e glândulas<br />

adjacentes. A influência de fatores genéticos (doença autossômica<br />

dominante), alterações imunológicas ou dos hormônios sexuais ainda<br />

são controversas.<br />

8.1. Quadro Clínico<br />

A enfermidade tem curso crônico e recidivante. Os pacientes<br />

apresentam vários orifícios fistulosos nas regiões perineal, inguinal,<br />

glútea, na raiz das coxas, no escroto ou na vulva, com queixa de<br />

supuração crônica e dor. Há endurecimento da pele e do tecido celular<br />

subcutâneo e palpam-se nódulos hipodérmicos e trajetos fistulosos<br />

múltiplos e serpiginosos.<br />

As cicatrizes deixadas pelos abscessos e fístulas têm aspecto de<br />

quelóide.<br />

8.2. Diagnóstico<br />

É feito essencialmente pelo seu quadro clínico. A presença de vários<br />

orifícios fistulosos nestas regiões, com endurecimento da pele e celular<br />

subcutâneo e supuração crônica.<br />

O diagnóstico diferencial deverá ser com a furunculose, a tuberculose,<br />

o linfogranuloma venéreo, a actinomicose, o cisto pilonidal, a doença<br />

de Crohn, os abscessos e as fístulas perianais.<br />

8.3. Tratamento<br />

O tratamento clínico com antimicrobianos é utilizado no combate da<br />

infecção local, porém é ineficaz para a erradicação da moléstia.<br />

A excisão cirúrgica é a única opção para sua cura definitiva. Deverá<br />

ser ampla e radical, incluindo toda a área comprometida, com margem<br />

segura e profundidade suficiente, até atingir os tecidos normais e,<br />

sempre que possível, preservando a pele perianal.<br />

De acordo com a extensão e complexidade das áreas cruentas<br />

resultantes dessa excisão, a mesma poderá ser tratada pela sutura<br />

primária, pela cicatrização por segunda intenção ou pelos enxertos<br />

livres de pele, imediatos ou tardios, após o controle da infecção.<br />

34


Sua recidiva pode ocorrer, segundo a literatura, entre 5 e 30% dos<br />

enfermos, independentemente do método optado para o tratamento<br />

da ferida resultante.<br />

9. TRAUMA ANO-RETAL<br />

Os ferimentos anorretais podem acontecer por contusão, denominado<br />

de trauma fechado e/ou por lesão penetrante ou perfurante, chamado<br />

de trauma aberto. Causam lesões intraperitoneais, perianais e/ou<br />

perineais, podendo afetar o reto intra e/ou extraperitoneal, bem como<br />

a sua vascularização 6,26,34,37,43 .<br />

9.1. Etiologia<br />

Para uma exposição didática os traumatismos anorretais serão<br />

classificados como originados de causa acidental, iatrogênica,<br />

criminosa, auto-erotismo e por objetos deglutidos.<br />

9.1.1. TRAUMAS ACIDENTAIS<br />

São os provocados por acidentes de trânsito, sobretudo os de<br />

motocicletas ou bicicletas ou os de trabalho ou domiciliar como, por<br />

exemplo, por “queda a cavaleiro” sobre muro, telhado, ou sobre<br />

objetos pontiagudos, etc., ocasionando traumatismos anorretais e/ou<br />

fraturas dos ossos da bacia com laceração do reto. Com menor<br />

freqüência, pelo disparo acidental de armas de fogo e raramente com<br />

arma branca.<br />

9.1.2. TRAUMAS IATROGÊNICOS<br />

A iatrogenia pode ocorrer devido a vários procedimentos médicos, em<br />

especial, os proctológicos, tocoginecológicos, urológicos, endoscópicos<br />

e radiológicos.<br />

O trauma ginecológico pode ocorrer durante as cirurgias de dilatação;<br />

de curetagem uterina ou de uma episiotomia extensa durante o parto<br />

vaginal.<br />

Os proctológicos podem resultar de procedimentos como dilatação de<br />

estenose retal, anastomótica, inflamatória ou tumoral, ressecção local<br />

de tumoração no reto ou durante a realização de biópsias.<br />

Os urológicos durante as prostatectomias, no momento da enucleação<br />

da próstata e mais raramente durante sua ressecção transuretral. A<br />

perfuração do reto durante a introdução de sonda uretral é rara.<br />

35


Lesões no reto podem, também, ocorrer durante a realização de<br />

retossigmóidoscopia rígida ou na colonoscopia devido a manobras<br />

intempestivas, dilatação de estenose e/ou nas polipectomias em reto<br />

intraperitoneal, em especial, de adenomas vilosos.<br />

Os traumas ditos criminosos, acontecem, geralmente, nos assaltos<br />

com agressão sexual; nos ferimentos intencionais por arma de fogo ou<br />

por arma branca.<br />

Traumatismos anorretais ocorrem, sobretudo, em pacientes com<br />

alteração do comportamento sexual (sobretudo homossexuais<br />

masculinos), causados pela introdução, via anorretal (empalamento),<br />

dos mais variados objetos, tais como, vibrador, lâmpada, frasco de<br />

fluido de isqueiro, frasco de desodorante, bico de esguicho, cabo de<br />

vassoura, vela, garrafa, ovo, copo, caneta e legumes, em especial<br />

cenoura, pepino, etc.<br />

O trauma pode advir de objetos deglutidos, na sua maioria,<br />

inadvertidamente. Os adultos, em especial, os que usam dentadura,<br />

não percebem pequenos fragmentos, tais como, osso de galinha,<br />

espinha de peixe ou prótese dentária e as crianças podem deglutir<br />

pequenos objetos, tais como, moedas, agulhas, alfinetes ou<br />

pregadeiras.<br />

Contudo, há pacientes com distúrbios psiquiátricos, que deglutem<br />

objetos de propósito, por exemplo, agulhas, parafusos, pregos,<br />

grampos, etc.<br />

Todos podem ferir o reto ou o canal anal, no momento da defecação.<br />

No entanto, o mais freqüente é a perfuração do intestino delgado e<br />

quando isto ocorre, em 75% das vezes, a lesão acontece na sua<br />

passagem pela válvula íleocecal.<br />

9.2. Fisiopatologia<br />

A flora microbiana colorretal normal é o principal fator da<br />

morbimortalidade das lesões anorretais. Ela é composta, nos adultos,<br />

por uma grande população bacteriana de, aproximadamente, 10 9 a<br />

10 11 por grama de fezes, sendo algumas de alta morbidade,<br />

sobretudo, as aeróbias gram-negativas e anaeróbias.<br />

A anatomia da região deste trauma: reto, intra e extraperitoneal, canal<br />

anal, órgãos pélvicos adjacentes e períneo, e os cuidados terapêuticos<br />

específicos necessários, estão diretamente relacionados com as<br />

conseqüências clínicas que poderão ocorrer.<br />

Quando a lesão é perfurante, em reto intraperitoneal, há<br />

extravasamento do conteúdo fecal para a cavidade abdominal,<br />

acarretando uma peritonite estercorácia (bacteriana) extremamente<br />

grave.<br />

Os ferimentos do reto extraperitoneal e do canal anal, no entanto,<br />

raramente atingem a cavidade abdominal. Contudo, como também<br />

36


estão em contato direto com o conteúdo fecal, podem ocasionar<br />

quadros infecciosos importantes e, caso não haja tratamento<br />

adequado, com freqüência, evoluem para a formação de graves<br />

abscessos pélvicos e/ou perianais. Quando atingem os espaços<br />

pelvirretais e/ou retrorretal, caracterizam-se pela dificuldade<br />

diagnóstica e por quadro toxêmico de alta morbimortalidade.<br />

9.3. Quadro clínico<br />

Uma anamnese pormenorizada e criteriosa é fundamental para se<br />

estabelecer o quadro clínico e o diagnóstico do paciente com lesão<br />

anorretal. Estando ele alerta e cooperativo, poderá ser questionado à<br />

respeito das circunstâncias do trauma. Entretanto, se o paciente<br />

apresenta politraumatismo e/ou lesão cerebral, pode haver, na maioria<br />

das vezes, impossibilidade de comunicação. Sendo assim, é<br />

necessário, sempre que possível, o depoimento de uma testemunha<br />

que tenha assistido a cena, para a composição da história.<br />

O relato do tipo e modo do ferimento, além do tempo decorrido do ato<br />

até o atendimento médico, é importante para a sua avaliação.<br />

Nas lesões criminosas com agressão sexual ou por auto-erotismo, as<br />

informações, em geral, são difíceis de se obter e, não raro, até<br />

escondidas pelo paciente, pois o fato acarreta grande<br />

constrangimento. Isso leva, com freqüência, à demora do diagnóstico<br />

e ao agravamento do quadro clinico com piora do prognóstico.<br />

Com relação ao empalamento, a maioria dos enfermos, sobretudo, os<br />

homossexuais ou bissexuais masculinos, não confirma a história da<br />

introdução de objetos pelo ânus, a não ser quando esse fica retido no<br />

reto e/ou cólon sigmóide. Quando admitem o fato, com freqüência,<br />

negam que tenha sido voluntário, criando narrativas envolvendo<br />

acidentes fantásticos, com detalhes, excessivamente, engenhosos.<br />

Os principais sintomas relacionados ao trauma anorretal são:<br />

Dor: É o sintoma mais importante. O trauma isolado anorretal,<br />

provoca dor contínua, às vezes, latejante, localizada nas áreas<br />

envolvidas: períneo, canal anal, reto e/ou abdome.<br />

Nas lesões do reto intraperitoneal, a dor localiza-se no abdome, em<br />

geral, na região infra-umbilical. A dor difusa pelo abdome é rara, no<br />

entanto, sua presença caracteriza, provavelmente, um quadro de<br />

peritonite generalizada e grave. É, com freqüência, intensa, contínua e<br />

acompanhada com sinais de reação peritoneal.<br />

Quando há lesão da linha pectínea, a dor localiza-se no canal anal,<br />

inicia-se no momento do trauma e piora com as evacuações.<br />

Somente nos enfermos com pequenas lesões do reto extraperitoneal,<br />

ou empalados, a presença da dor pode ser discreta ou inexistente.<br />

37


Tenesmo retal: O tenesmo retal pode, também, ocorrer nesses<br />

traumatismos, especialmente, na presença de abscesso anorretal ou<br />

de empalamento.<br />

Sangramento: O sangramento acontece, somente, quando há lesão<br />

de canal anal e da mucosa retal. Suas características são, em geral, a<br />

cor rutilante e a perda em pequena quantidade. As hemorragias<br />

copiosas são raras, estando associada, sobretudo, à presença de<br />

abscesso, piorréia e/ou mucorréia<br />

9.4. Diagnóstico<br />

É necessário realizar-se um rigoroso e minucioso exame físico. No<br />

paciente politraumatizado é imperativo, sobretudo, os procedimentos<br />

para manutenção da vida.<br />

O paciente com trauma anorretal deverá ser submetido a:<br />

Exame geral: Na palpação abdominal, a constatação de irritação<br />

abdominal com rigidez da parede e descompressão brusca dolorosa,<br />

além da presença de febre e sinais gerais de toxemia, fazem o<br />

diagnóstico de peritonite bacteriana.<br />

A febre não é sintoma freqüente, porém, quando presente e alta<br />

(acima de 39°), é indicativa de quadro infeccioso grave.<br />

Exame proctológico: É fundamental para a avaliação dos ferimentos<br />

anorretais. Todos deverão ser submetidos à inspecção estática e<br />

dinâmica do ânus e períneo, ao toque retal, à anuscopia e à<br />

retossigmoidoscopia.<br />

Na maioria dos pacientes, por causa da dor local, há necessidade de<br />

realizá-lo sob analgesia e, de preferência, em centro cirúrgico, para<br />

ser cuidadoso e completo.<br />

A presença de sangue na ampola retal, sua perda pelo orifício anal ou<br />

sua presença na luva, após o toque retal, é sinal de lesão anorretal.<br />

A existência de abscesso ou de fístula caracteriza-se pela presença de<br />

muco e/ou pus.<br />

Exame ginecológico e do trato urinário: Pela possibilidade da<br />

associação das lesões anorretais com órgãos adjacentes, é<br />

imprescindível a realização de rigoroso exame ginecológico e do trato<br />

urinário, concomitante ao proctológico.<br />

Exames por imagem: Os principais são:<br />

• Radiologia simples de abdome: deverá ser realizada sempre em<br />

três posições: ortostática, decúbito horizontal dorsal e de<br />

cúpulas frênicas. É importante para avaliação da presença de<br />

pneumoperitôneo, nas perfurações cólicas e do reto<br />

intraperitoneal. Diagnostica também, fraturas dos ossos da bacia<br />

e fornece a localização de objetos introduzidos no reto.<br />

• Radiologia contrastada de cólon: nos primeiros momentos da<br />

suspeita de lesão anorretal, ela é contra-indicada, pois pode<br />

38


provocar o extravasamento do contraste pelos ferimentos<br />

perfurantes, agravando-os. Passada a fase aguda do trauma,<br />

poderá ser realizada, com os cuidados necessários, para<br />

identificar trajetos fistulosos.<br />

• Ecografia, tomografia e/ou ressonância magnética (abdominal<br />

e/ou perineal): poderão ser muito importantes para detectar-se<br />

a presença de hematomas ou abscessos anorretais, dependendo<br />

da gravidade e da dificuldade de cada caso. O diagnóstico de<br />

corpo estranho no reto também, poderá ser observado.<br />

9.5. Tratamento<br />

A abordagem de todo paciente com traumatismo, está padronizada em<br />

três fases de atendimento:<br />

1ª) está indicada somente para os pacientes graves, em geral, os<br />

politraumatizados, nos quais se utiliza todos os cuidados para<br />

manutenção da vida.<br />

2ª) iniciada após estar o paciente com seus dados vitais regulares e<br />

mantidos, em venóclise, com sondagem nasogástrica e vesical,<br />

começa-se a fase da avaliação das lesões anorretais, por meio de<br />

todos os exames necessários, identificando-as em isoladas na região<br />

anorretal ou se associadas a outros traumas de períneo, pélvicos e/ou<br />

abdominais, envolvendo ou não, outros órgãos. O fato de não serem<br />

restritas ao reto e ao canal anal, agrava seu prognóstico.<br />

3ª) Efetuados os procedimentos diagnósticos necessários, passa-se à<br />

terceira fase, a da terapêutica, com freqüência, realizada por meio de<br />

cirurgia para reparação e/ou desbridamento do ferimento.<br />

Nos traumas anorretais, não há o tratamento ideal. O que ocorre é a<br />

busca da melhor conduta terapêutica, cirúrgica ou não, para os<br />

diferentes ferimentos, individualizando-se cada enfermo.<br />

Os fatores mais importantes que influem no tratamento, são:<br />

• estado geral e idade do paciente;<br />

• localização e extensão do trauma;<br />

• número de lesões e sua proximidade;<br />

• conteúdo intestinal no momento da lesão;<br />

• tempo decorrido entre o trauma e a terapêutica;<br />

• presença de choque ou instabilidade hemodinâmica;<br />

• presença de contaminação peritoneal;<br />

• lesão mesenterial do cólon ou do reto; e<br />

• presença de ferimentos em múltiplos órgãos.<br />

No trauma anorretal o emprego de antibioticoterapia é conduta<br />

obrigatória. São utilizados os de largo espectros, sendo nossa opção, a<br />

associação de cloranfenicol, aminoglicosídeo e cefalosporina (com ação<br />

39


nas bactérias anaeróbias e gram-negativas). Deve ser realizada,<br />

também, a profilaxia do tétano.<br />

Havendo traumatismo retal, é importante saber se o ferimento é<br />

extraperitoneal, intraperitoneal ou em ambos. Quando há lesão<br />

concomitante, as condutas para o trauma serão individualizadas para<br />

cada um dos segmentos comprometidos, como descritas a seguir:<br />

9.4.1. TRAUMA NO RETO INTRAPERITONEAL<br />

Nos pacientes com diagnóstico, ou mesmo a suspeita, de trauma no<br />

reto intraperitoneal estará indicada uma laparotomia exploradora para<br />

sua confirmação, sua avaliação e, se possível, o reparo cirúrgico do<br />

ferimento.<br />

Confirmado o trauma no reto intraperitoneal, as várias técnicas<br />

operatórias que podem ser empregadas para seu reparo, são:<br />

• sutura primária da lesão do reto intraperitoneal e feitura de<br />

sigmoidostomia (terminal ou em alça) de proteção;<br />

• sutura primária do ferimento do reto intraperitoneal sem<br />

colostomia de proteção ou<br />

• ressecção do segmento de reto com o ferimento e realização de<br />

sigmoidostomia terminal proximal com fechamento do reto<br />

distal, tipo Hartmann.<br />

De acordo com a literatura, a melhor conduta, é a sutura primária da<br />

lesão com reavivamento prévio de suas bordas. Contudo, para realizála,<br />

é necessário as seguintes condições:<br />

• o ferimento deverá ser menor que a metade da circunferência do<br />

reto;<br />

• deverá apresentar boas condições locais de vascularização;<br />

• paciente jovem e em bom estado geral;<br />

• ausência de lesões múltiplas ou próximas;<br />

• ausência de lesão de órgão adjacente;<br />

• curto período de tempo transcorrido entre o trauma e a cirurgia<br />

(menor que 6 horas) e<br />

• ausência de sinais de peritonite bacteriana.<br />

A colostomia de proteção deverá ser realizada sempre que ocorrer<br />

uma das seguintes condições:<br />

• longo período de tempo transcorrido entre o trauma retal e a<br />

realização da cirurgia (mais de 12 horas);<br />

• presença de peritonite fecal;<br />

• lesões do tipo explosivas, lacerantes ou amplos ferimentos<br />

estrelares;<br />

• destruição tecidual com hematoma intramural extenso;<br />

• traumatismo na vascularização mesentérica;<br />

• presença de grande hematoma retrorretal ou retroperitoneal e<br />

• lesões de múltiplos órgãos.<br />

40


A intenção desta colostomia, dita de “proteção”, é a derivação do<br />

trânsito fecal da área reparada do ferimento, com o intuito de diminuir<br />

a morbimortalidade das possíveis complicações pós-operatórias, tais<br />

como, deiscência ou fístulas da sutura.<br />

Nossa opção é pela colostomia terminal em cólon sigmóide, sempre<br />

que possível, e após dois ou três meses, estando a sutura íntegra,<br />

confirmada pela radiologia contrastada do reto, efetuamos a<br />

reconstrução do trânsito intestinal com o fechamento da colostomia.<br />

Com relação à drenagem da região do segmento retal suturado ou<br />

seccionado, poder-se-á fazê-la com o intuito de diagnosticar<br />

precocemente as possíveis complicações locais, embora sabendo que<br />

essa drenagem não as impeça. Nossa conduta, no entanto, é pela<br />

colocação de drenos somente nas regiões contaminadas pelo trauma,<br />

aonde poderá haver acumulo de secreções, sempre após limpeza<br />

exaustiva dessas áreas, lavando-as com soro fisiológico.<br />

9.4.2. TRAUMA NO RETO EXTRAPERITONEAL<br />

O tratamento das lesões retais extraperitoneais foi, durante anos, por<br />

meio da realização de uma colostomia proximal (sigmoidostomia) para<br />

a derivação do trânsito fecal. O advento dos antibióticos e o melhor<br />

conhecimento da fisiopatologia dos ferimentos infectados, alteraram<br />

este procedimento.<br />

Por isso, havendo uma lesão no reto extraperitoneal, devemos, de<br />

início, separá-las em:<br />

Pequena, única e superficial: A lesão do reto extraperitoneal<br />

pequena é a que tem até 3 cm de extensão, única e superficial, ou<br />

seja, atinje até a camada muscular circular do reto, sem lesá-la. A<br />

conduta nessas lesões será sua limpeza, reavivamento das bordas e<br />

sutura primária, sem necessidade de colostomia de proteção.<br />

Extensa, profunda e/ou múltiplas: O ferimento extenso é maior<br />

que 3cm, profundo, ou seja, agride, ou mesmo ultrapassa, a camada<br />

muscular circular do reto e/ou múltiplo. Tendo o cirurgião<br />

diagnosticado a integridade peritoneal, faz-se o desbridamento da<br />

lesão e sua sutura ou a reparação muscular, associando-se uma<br />

sigmoidostomia, na fossa ilíaca esquerda, sem necessidade de<br />

exploração da cavidade abdominal.<br />

Entretanto, estará indicada a laparotomia exploradora sempre que o<br />

cirurgião não estiver seguro de que o trauma no reto extraperitoneal<br />

manteve a integridade peritoneal.<br />

9.4.2. TRAUMA NO CANAL ANAL<br />

Nos ferimentos restritos ao canal anal, também, é preciso definir-se<br />

sua profundidade e extensão.<br />

41


A lesão anal é superficial quando não atinge o esfíncter anal externo e<br />

profunda, quando o atinge e/ou ultrapassa-o.<br />

Quando o ferimento anal compromete menos da metade do esfíncter<br />

anal externo, é considerado pequeno. Entretanto, quando atinge mais<br />

da metade desse esfíncter, e/ou na medida em que compromete,<br />

também, órgãos adjacentes, como vagina, uretra ou bexiga, é<br />

extenso.<br />

Nas lesões do canal anal, superficiais e/ou pequenas, a conduta será o<br />

desbridamento da ferida, com remoção dos tecidos não viáveis, sutura<br />

para reconstrução anatômica da musculatura do esfíncter externo<br />

(quando necessária), associando-se uma área perianal (cutânea) de<br />

drenagem.<br />

Há necessidade do acompanhamento rigoroso desses curativos e a<br />

observação minuciosa da presença de áreas de necrose e/ou gangrena<br />

na ferida operatória pois, quando presente, deve-se indicar novos<br />

desbridamentos até o ferimento permanecer limpo, vascularizado e<br />

sem infecção.<br />

Nas lesões do canal anal extensas e/ou profundas, a terapêutica, em<br />

geral, é em três etapas cirúrgicas:<br />

1ª) faz-se o desbridamento do ferimento, com remoção dos tecidos<br />

não viáveis, e realiza-se uma área de drenagem cutânea. Associa-se à<br />

essa limpeza uma colostomia terminal, se possível no cólon sigmóide<br />

proximal, para derivação do trânsito intestinal;<br />

2ª) completada a cicatrização da ferida operatória do canal anal,<br />

geralmente, dois a três meses após essa primeira intervenção, realizase<br />

uma esfincteroplastia anal, para reconstrução esfincteriana e<br />

preservação da continência fecal. O enfermo ainda deverá permanecer<br />

com a colostomia derivativa.<br />

3ª) passado mais dois ou três meses, estando a função esfincteriana<br />

normalizada, finalmente, efetua-se a reconstrução do trânsito<br />

intestinal, por meio do fechamento da sigmoidostomia.<br />

Empalamento:<br />

Em relação aos objetos introduzidos no reto, é importante conhecer<br />

alguns cuidados para sua remoção pelo ânus, para evitar a laceração<br />

do canal anal e/ou do reto durante esse procedimento. Esses cuidados,<br />

são:<br />

• escolha cuidadosa da melhor posição, se litotomia ou de Sims<br />

(decúbito lateral esquerdo), de acordo com o objeto a ser<br />

removido;<br />

• lubrificação do segmento intestinal distal;<br />

• delicadeza de movimentos e<br />

• bloqueio anestésico (quando necessário).<br />

42


Não se deve administrar laxativos, bem como, usar enemas, pois a<br />

evacuação forçada poderá provocar lesão intestinal pelo próprio objeto<br />

introduzido.<br />

Os copos, jarros, garrafas, etc., quando empalados no reto, por<br />

apresentarem uma abertura em uma de suas extremidades e um<br />

espaço vazio interno, podem provocar pressão negativa em seu<br />

interior e como conseqüência, eles poderão ficar aderidos à mucosa<br />

retocólica, causado pela sua aspiração para o interior do recipiente.<br />

Por isso, para sua retirada pela via transanal, é necessário colocar um<br />

cateter ou sonda até a extremidade do objeto aonde há vácuo e, por<br />

meio da injeção de ar, produzir-se uma pressão positiva, conseguindo<br />

sua liberação. Outra possibilidade é perfurar o fundo do objeto para<br />

soltá-lo.<br />

Em alguns casos, não há possibilidade da retirada do objeto através do<br />

ânus e para tal, é necessário fazer uma laparotomia para sua extração<br />

por meio da ordenha do objeto em direção ao reto, até atingir o canal<br />

anal. Quando isso não é possível, deve-se extraí-lo por meio de uma<br />

colotomia.<br />

Realizando-se essa colotomia com sua conseqüente colorrafia, haverá,<br />

também, alto risco de deiscência dessa sutura, por causa da<br />

contaminação, devendo-se considerar a necessidade da feitura de uma<br />

colostomia derivativa de proteção.<br />

Complicações:<br />

As principais complicações do tratamento dos ferimentos anorretais,<br />

são:<br />

Gangrena gasosa: é conseqüência da infecção por anaeróbios, em<br />

geral, por causa de lesão indevidamente drenada, limpa, desbridada e<br />

acompanhada. O quadro mimetiza a síndrome de Fournier,<br />

apresentando alta mortalidade. Nestes casos, é necessário a<br />

reintervenção cirúrgica de urgência, com amplo desbridamento<br />

cirúrgico.<br />

Deiscência e fístula: podem ocorrer quando é realizada sua sutura<br />

primária dos ferimentos, sem observação das condições necessárias a<br />

esse procedimento.<br />

Abscesso perianal e/ou pélvico: a conduta é sua drenagem imediata e<br />

ampla.<br />

A feitura de desbridamentos extensos nos traumatismos perianais e/ou<br />

pélvicos pode ocasionar, depois de cicatrizados, a estenose anal.<br />

Os traumatismos extensos da musculatura pelvirretal, podem<br />

ocasionar, também, a incontinência fecal, tanto a gases quanto a<br />

fezes. Após o tratamento do trauma, com sua completa cicatrização e<br />

constatada a incontinência, haverá a necessidade da reconstrução da<br />

musculatura esfincteriana lesada (esfincteroplastia).<br />

43


10. TUMORES DO CANAL ANAL<br />

10.1. Generalidades<br />

O canal anal é anatomicamente mal definido, clinicamente confundido,<br />

embriológicamente complexo e sede de tumores diversos.<br />

Esta região tem, aproximadamente, 4 cm de extensão e é delimitada<br />

pela linha anorretal a nível cranial e pela linha anocutânea a nível<br />

caudal 1,40 .<br />

Embora sejam menos freqüentes do que os tumores do cólon e reto, o<br />

câncer do canal anal tem grande importância para médicos e pacientes<br />

por causa da sua morbimortalidade e da sua relação com a continência<br />

fecal, pela localização anatômica próxima aos esfíncteres anorretais.<br />

10.2. Tumores Pré-malignos do Canal Anal<br />

10.2.1. LEUCOPLASIA<br />

É uma lesão pré-maligna caracterizada por ulceração superficial de<br />

diversas formas e tamanhos, podendo ocorrer na mucosa de transição<br />

da boca (gengiva) e do ânus. É mais comum no sexo masculino e<br />

ocasionalmente associada a retardo na cicatrização de feridas<br />

perianais pós-operatórias, tais como: hemorroidectomia, fissurectomia<br />

e ressecção de condilomas. Embora sua simples presença não<br />

represente uma condição maligna, há sempre a possibilidade de haver<br />

displasia com o risco de desenvolvimento de carcinoma epidermóide.<br />

Quadro Clínico: Os sintomas mais freqüentes são sangramento,<br />

geralmente rutilante (vivo), prurido e secreção perianal.<br />

Diagnóstico: É realizado pela presença de ulcerações superficiais no<br />

canal anal, de tamanho e formato variados, em geral, de difícil<br />

cicatrização, que, quando biopsiadas apresentam, ao exame<br />

histopatológico, áreas de metaplasia com hiperqueratose, com ou sem<br />

displasia.<br />

Tratamento: Excisão local da ulceração e acompanhamento pósoperatório<br />

até sua completa cicatrização.<br />

10.2.2. CONDILOMA ACUMINADO<br />

Enfermidade causada por vírus do papiloma humano (HPV), grupo<br />

Papova, com prevalência de transmissão por contato sexual, de alta<br />

44


incidência e com localização nas regiões genitais, perineal e retal.<br />

Considerada afecção pré-maligna, pois pode degenerar, embora<br />

raramente, para o carcinoma epidermóide perianal. O condiloma<br />

acuminado associado ao carcinoma epidermóide é também<br />

denominado de tumor de Buschke-Löewenstein (1925) 38,40 .<br />

Quadro Clínico: Geralmente, há queixa de crescimento de um tumor<br />

verrucoso, com áreas endurecidas, desconforto, umidade na região e<br />

odor característico, ocorrendo raramente, ulceração e sangramento.<br />

Diagnóstico: É feito pela presença perianal de lesão verrucosa,<br />

geralmente de grande extensão (gigante), com área ou áreas de<br />

transformação maligna, estrutura típica do carcinoma epidermóide. O<br />

exame histológico (biópsia) confirma o diagnóstico.<br />

Tratamento: É o mesmo dos tumores epidermóides do canal anal.<br />

10.3. Tumores Malignos do Canal Anal<br />

A incidência de lesão maligna no ânus é baixa, correspondendo de 1 a<br />

2% dos tumores do aparelho digestivo, e apresentam, na maioria,<br />

bom prognóstico. Segundo a classificação histológica proposta pela<br />

Organização Mundial da Saúde, cerca de 80% dessas neoplasias são<br />

do tipo epidermóide, subdivididos em tumores espinocelulares ou de<br />

células escamosas, basalóides (cloacogênicos) e muco-epidermóides.<br />

Os demais 20% incluem: adenocarcinomas originários da mucosa tipo<br />

retal que invade o canal anal, das glândulas anais ou das fístulas<br />

anorretais preexistentes; linfomas; melanoma; sarcoma de Kaposi;<br />

doença de Bowen e doença de Paget (Quadro 3).<br />

======== ENTRA QUADRO 3 =======<br />

Embora sejam menos freqüentes do que os tumores do cólon e reto, o<br />

câncer do canal anal tem grande importância para médicos e pacientes<br />

por sua morbi-mortalidade e sua relação com a continência fecal, pela<br />

localização anatômica próxima aos esfíncteres anorretais.<br />

Sua concomitância com doenças benignas do canal anal é muito<br />

comum, além de poder ocasionar lesões, facilmente confundidas com<br />

essas afecções. Por isso, deve-se proceder a cuidadoso exame clínico,<br />

pois esses tumores podem ser diagnosticados precocemente, ainda<br />

com dimensões reduzidas pela facilidade de acesso da região ao<br />

exame proctológico, permitindo melhor prognóstico.<br />

10.3.1. CARCINOMA EPIDERMÓIDE DO CANAL ANAL<br />

Os tumores espinocelulares ou escamosos são os mais freqüentes<br />

entre os epidermóides do ânus (80 a 85%) e correspondem a 2% das<br />

45


neoplasias do aparelho digestivo, originando-se no epitélio<br />

pluriestratificado queratinizado do canal anal. Sua maior incidência<br />

está entre a quinta e a sétima década de vida, com predomínio no<br />

sexo masculino 38,40 .<br />

Os basalóides ou cloacogênicos ocupam o segundo lugar em incidência<br />

(15 a 20%) e são originários do epitélio de transição existente no<br />

canal anal, sendo, pouco diferenciados e ocorrendo sua maior<br />

distribuição nas faixas etárias acima da quarta década, sem<br />

predominância de sexo.<br />

Os tumores epidermóides do canal anal se propagam mais comumente<br />

por continuidade e por metástases linfáticas, e menos pela via<br />

hematogênica. Sua progressão direta aos músculos esfincterianos, à<br />

parede retal e à pele perianal é precoce em mais da metade dos<br />

pacientes. A invasão da mucosa vaginal é mais comum que a da loja<br />

prostática.<br />

Nos tumores avançados, pode haver invasão do sacro, cóccix e<br />

paredes laterais da pelve. Metástases inguinais estão presentes em<br />

20% dos enfermos e metástases a distância ocorrem em cerca de<br />

10%, principalmente para fígado e pulmões, por ocasião do<br />

diagnóstico.<br />

Algumas enfermidades inflamatórias crônicas predispõem seu<br />

aparecimento, como a doença de Crohn, retocolite ulcerativa e fístulas<br />

anorretais.<br />

Quadro Clínico: Suas manifestações clínicas são incaracterísticas e,<br />

não raro, atribuídas à doença hemorroidária, retardando, na maioria<br />

das vezes, o diagnóstico correto. Os sintomas mais freqüentes são<br />

sangramento, dor, prurido e presença de nódulo anal de forma e<br />

tamanho variados ou de ulcerações de margens irregulares e<br />

endurecidas<br />

O sangramento, geralmente vermelho rutilante (vivo), em pequena<br />

quantidade, ocorre durante a evacuação, ocasionado pela ulceração.<br />

A dor relaciona-se à infiltração tumoral; inicialmente, associa-se às<br />

evacuações e, com o crescimento do tumor, torna-se persistente e, às<br />

vezes, insuportável. Com freqüência, o exame proctológico só é<br />

possível sob analgesia. Os sintomas podem evoluir para incontinência<br />

anal e secreção com odor fétido.<br />

Não é raro que a linfoadenopatia inguinal seja seu primeiro sinal. Os<br />

nódulos são endurecidos, indolores, tendendo à coalescência. O<br />

paciente pode confundir a invasão inguinal com hérnias. Edema dos<br />

membros inferiores, muitas vezes unilateral, decorre do bloqueio<br />

venoso ao nível dos vasos femurais, causado pelo tumor.<br />

46


Diagnóstico: Nas fases precoces, esses tumores podem apresentarse<br />

como lesões papulosas, de tamanho variado e endurecidas, fixas ou<br />

não aos planos musculares. A falta de um componente vascular, sua<br />

localização abaixo da linha pectínea e a freqüente fixação do nódulo<br />

aos planos mais profundos permite distingui-lo facilmente de um<br />

mamilo hemorroidário.<br />

O aspecto mais comum, à inspecção, porém, é o de lesão ulcerada de<br />

bordas elevadas, irregular, granulosa, que ao toque se mostra<br />

sangrante, dolorosa e endurecida.<br />

O diagnóstico diferencial com fissura anal crônica pode ser realizado<br />

não só pela inexistência da dor após a evacuação (típica da fissura),<br />

como pela localização atípica da ulceração, pois em aproximadamente<br />

90% dos casos de fissura anal a lesão é posterior, enquanto no câncer<br />

pode ocorrer em qualquer posição. O plicoma sentinela é raro no<br />

câncer do canal anal.<br />

Nos casos mais avançados, as lesões são ulcerovegetantes extensas,<br />

avançam para o períneo, com secreção malcheirosa e intensa dor, não<br />

só para evacuar como para urinar e andar.<br />

Nas lesões infiltrantes, o comprometimento esfinctérico do canal anal<br />

leva à estenose progressiva. Quando o tumor invade a pele perianal,<br />

há um aspecto característico denominado de “pele-de-laranja”: a pele<br />

torna-se brilhante, endurecida e finamente granular.<br />

O estudo histopatológico, através de biópsias da lesão (sob analgesia)<br />

confirma o diagnóstico e sua origem epitelial.<br />

Tratamento: Para o tratamento, é fundamental estabelecer sua:<br />

• posição em relação à linha pectínea;<br />

• sua extensão circunferencial;<br />

• o grau de infiltração aos planos profundos e<br />

• o comprometimento linfático locorregional e dos linfonodos<br />

inguinais.<br />

A cadeia linfática inguinal interna é a primeira a ser invadida (15 a<br />

30%). A disseminação venosa é menos freqüente e ocorre comumente<br />

nos tumores avançados.<br />

Sua abordagem é multidisciplinar, envolvendo: cirurgião, clínico,<br />

oncologista (radio e quimioterapêuta), etc.<br />

Seu tratamento padrão é com radioterapia pélvica associada à<br />

quimioterapia (esquema de Nigro, 1972, modificado), antecedendo a<br />

ressecção da lesão residual com margens seguras de radicalidade. As<br />

cirurgias alargadas, como as amputações abdominoperineais, estão<br />

limitadas aos casos de falha na rádio e na quimioterapia e/ou aos<br />

tumores muito avançados 38,40 .<br />

47


10.3.2. ADENOCARCINOMA DO CANAL ANAL<br />

É um tumor raro que se origina na mucosa retal que invade o ânus,<br />

nas glândulas anais (Chiari), nas glândulas apócrinas ou em fístulas<br />

anorretais crônicas, preexistentes 38,40 .<br />

Em vista da ausência de barreira epitelial no canal, os do ânus podem<br />

provocar metástases precocemente e, por isso, seu prognóstico é pior<br />

que o dos adenocarcinomas retais.<br />

Quadro Clínico: É semelhante ao dos tumores epidermóides do canal<br />

anal, tendo como principais sintomas o sangramento vermelho<br />

rutilante, geralmente associado à defecação, à dor e ao prurido.<br />

Diagnóstico: Como os tumores epidermóides, os adenocarcinomas do<br />

canal anal são, com freqüência, confundidos com afecções benignas,<br />

principalmente com a doença hemorroidária. Seu aspecto mais<br />

comum, à inspecção, é a ulceração de bordas elevadas, irregular e<br />

granulosa.<br />

Ao toque retal, apresenta-se sangrante, dolorosa, endurecida e fixa<br />

aos planos profundos.<br />

Tratamento: É cirúrgico, pela amputação abdominoperineal do canal<br />

anal e do reto associada à ressecção ampla dos tecidos perirretais.<br />

10.3.3. LINFOMA<br />

É doença maligna relacionada à proliferação neoplásica de células do<br />

sistema linfóide-reticular. O linfoma fungóide é a forma que afeta<br />

primariamente a pele. Atinge, preferencialmente, adultos masculinos,<br />

acima dos quarenta anos de idade, com sobrevida média de cinco<br />

anos, quando não tratada.<br />

Quadro Clínico: O prurido crônico generalizado constitui manifestação<br />

inicial inespecífica, com intensidade variável, às vezes intenso,<br />

podendo preceder em meses os sinais específicos.<br />

Diagnostico: A lesão específica é a presença de nódulo ou placa<br />

nódulo-infiltrativa, eritematosa ou eritematopigmentada, fundo em<br />

geléia. Pode ser lesão isolada ou múltipla. Progride para o<br />

aparecimento de tumores de cor vermelho-castanha, com dimensões<br />

variáveis e que freqüentemente ulceram.<br />

O diagnóstico é pelo exame histológico obtido na biópsia da lesão.<br />

Tratamento: A radioterapia associada à quimioterapia constituem o<br />

tratamento de escolha para o linfoma fungóide (cutâneo). Nas lesões<br />

48


esiduais à radioterapia, faz-se sua ressecção cirúrgica,porém sua<br />

abordagem é complexa.<br />

10.3.4. MELANOMA<br />

O melanoma ou melanoblastoma é tumor maligno de origem<br />

ectodérmica que acomete, freqüentemente, a pele e a retina, e<br />

raramente, o canal anal, embora seja sua terceira localização mais<br />

comum. Incidem na faixa etária da quinta e sexta década de vida, e<br />

têm a mesma distribuição por sexo. São geralmente de mau<br />

prognóstico pela alta malignidade e rapidez com que metastatizam<br />

para linfonodos.<br />

Quadro Clínico: Manifestam-se comumente com sangramento, dor e<br />

nódulo perianal identificado pelo paciente.<br />

Diagnóstico: O exame físico oferece poucos sinais e sintomas que<br />

contribuem para o seu diagnóstico, devendo-se, porém, sempre<br />

pesquisar adenopatia inguinal e hepatomegalia.<br />

O tumor polipóide é o mais freqüente, porém pode ser plano ou<br />

ulcerado. Caracteriza-se pela pigmentação escura da lesão, que ocorre<br />

em até 60% dos casos (devido à presença intracitoplasmática de<br />

melanina). Quando não apresentam sua pigmentação característica,<br />

podem, retardar o diagnóstico, sendo os sintomas imputados a<br />

doenças benignas do canal anal. O estudo histológico por meio de<br />

biópsias permite a comprovação diagnóstica.<br />

Tratamento: É cirúrgico, mediante amputação abdominoperineal do<br />

canal anal e do reto, quando se objetiva a cura. Como a maioria dos<br />

pacientes, porém, já apresenta, no momento do diagnóstico,<br />

metástases a distância para fígado, pulmões e/ou gânglios, a<br />

amputação só deverá ser indicada após rigoroso estadiamento da<br />

neoplasia. No aspecto multidisciplinar da terapêutica, pode-se associar<br />

quimioterapia e imunoterapia.<br />

10.3.5. SARCOMA DE KAPOSI<br />

Foi originalmente descrito como um sarcoma da pele de crescimento<br />

lento, originário das células endoteliais. Hoje, é mais comumente<br />

diagnosticado em pacientes com AIDS, ocorrendo em qualquer parte<br />

do trato gastrintestinal, no canal anal e na pele perianal.<br />

Quadro Clínico: As lesões do sarcoma de Kaposi são, com freqüência,<br />

assintomáticas.<br />

49


Diagnóstico: É caracterizada por várias lesões pequenas e separadas,<br />

de 0,5 a 2 cm de diâmetro, de cor púrpura ou negra, raramente<br />

sintomáticas. A biópsia deve ser realizada para confirmar o<br />

diagnóstico.<br />

Tratamento: Dado aos sérios problemas de imunocomprometimento<br />

dos pacientes com AIDS a terapia daqueles com o sarcoma de Kaposi<br />

é mais paliativo que curativo, podendo, na maioria das vezes,<br />

prescindir de qualquer tratamento. No entanto, como essas lesões são<br />

muito sensíveis à radio e à quimioterapia, em casos selecionados,<br />

essas terapias poderão ser empregados.<br />

10.3.6. DOENÇA DE BOWEN<br />

O carcinoma intra-epitelial de células escamosas foi descrito, em 1912,<br />

por John Templeton Bowen (1857-1940) e é raro. Suas áreas de<br />

predileção são a face, o tronco e às mãos. A de localização perianal é<br />

rara, sendo comum sua associação com outros tumores. Incide<br />

principalmente na sexta década, sem predominância entre os sexos.<br />

Vários autores já classificam a doença de Bowen como um carcinoma<br />

epidermóide intra-epitelial, com tendência de infiltração intraepidérmica<br />

e de crescimento muito lento; em longo prazo, um terço<br />

dos pacientes podem desenvolver um carcinoma invasivo com<br />

metastatização locorregional e à distância. Alguns autores sugerem<br />

que essa doença pode representar a manifestação cutânea de uma<br />

predisposição ao desenvolvimento do câncer 38,40 .<br />

Quadro Clínico: Os principais são o prurido, a umidade da região<br />

perianal e a queixa de desconforto anal. O sangramento é raro.<br />

Diagnóstico: São lesões eczematosas descamativas de limites nítidos,<br />

com polimorfismo, eritematosas, de crescimento e raramente<br />

ulceradas ou com pseudofissuras. Ao exame histológico (biópsia),<br />

observam-se células com hiper e paraqueratose, e as células de<br />

Bowen, de núcleo grande, hipercromático, com um halo não corado<br />

que as diferencia da célula de Paget. A biópsia deve ser múltipla para<br />

confirmar o diagnóstico e excluir a presença do carcinoma epidermóide<br />

invasivo ou psoríase ou, ainda, doença de Paget.<br />

Tratamento: É cirúrgico, com ressecção ampla da lesão, com<br />

margens seguras da sua radicalidade e acompanhamento rigoroso dos<br />

pacientes pela possibilidade de associação de outros carcinomas. Nos<br />

casos avançados, realiza-se o mesmo tratamento multidisciplinar do<br />

carcinoma epidermóide.<br />

50


10.3.7. DOENÇA DE PAGET<br />

É um adenocarcinoma intra-epitelial de localização perianal rara. Sir<br />

James Paget (1814-1899), descreveu uma doença, em 1884, da aréola<br />

mamária que poderia preceder o carcinoma da mama. Sua<br />

manifestação extramamária é pouco comum e pode ocorrer em<br />

regiões como bolsa escrotal, pênis, vulva, axila, pelve, boca, coxas e<br />

nádegas. Segundo vários autores, a maioria dos pacientes com essa<br />

afecção pode apresentar um carcinoma associado, sendo a lesão<br />

cutânea (Paget) e o carcinoma resultante de respostas diferentes ao<br />

mesmo estímulo carcinogênico. Quando a lesão dérmica degenera, é<br />

definida como um carcinoma in situ, ou seja, intra-epitelial, podendo,<br />

a longo prazo, evoluir para o câncer invasivo do córiun, comumente<br />

envolvendo as glândulas apócrinas, com metástases para linfonodos e<br />

outros órgãos. Na forma anal, afeta adultos dos trinta aos setenta<br />

anos, particularmente na sexta década, com predomínio do sexo<br />

feminino 38,40 .<br />

Quadro Clínico: Seus sintomas são prurido anal, exsudação<br />

serossangüinolenta perianal provocando sensação de umidade, dor ou<br />

desconforto perianal. O sangramento é menos freqüente.<br />

Diagnóstico: Seu diagnóstico clínico é difícil, pois as lesões são<br />

freqüentemente confundidas com dermatite eczematosa. A doença de<br />

Paget perianal caracteriza-se por lesão eczematosa plana, margens<br />

nítidas, com polimorfismo, úmida, eritematosa, às vezes<br />

esbranquiçada, endurecida, com tamanho variável de 0,5 a 15 cm de<br />

extensão; raramente, pode apresentar-se ulcerada.<br />

Ao exame histológico (biópsia), encontram-se as células de Paget, em<br />

anel de sinete contendo uma mucoproteina, a sialomucina, associada à<br />

hiperqueratose e acantose. Dada a freqüência da associação com o<br />

carcinoma retal ou perianal, é importante um rigoroso exame<br />

proctológico.<br />

Tratamento: A doença de Paget pode permanecer sem sinais de<br />

malignização por anos, e não existe terapia específica. A melhor<br />

opção, porém, é cirúrgica, com ressecção local de toda a lesão<br />

perianal. Quando há recidivas freqüentes, indica-se a amputação do<br />

canal anal e do reto, seguindo os critérios de radicalidade oncológica e<br />

a abordagem multidisciplinar.<br />

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54


49. Reis Neto JA, Quilici FA, Cordeiro F, Reis Jr. JA . Open versus semi-open<br />

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50. Ribeiro MC. Esfincterotomia subcutânceo mucosa no tratamento da fissura<br />

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56. Stein E. Proktologie. Lehrbuch und Atlas. Berlin, Springer-Verlag, 1990.<br />

QUADROS DO CAPÍTULO<br />

QUADRO 1:<br />

AFECÇÕES CRIPTOGLANDULARES: ETIOPATOGENIA<br />

1. CRIPTITE<br />

Trauma na cripta anal<br />

2. ABSCESSO ANORRETAL<br />

Contaminação da glândula anal<br />

3. FÍSTULA ANORRETAL<br />

Drenagem do abscesso<br />

55


QUADRO 2:<br />

TUMORES MALIGNOS DO CANAL ANAL<br />

1. EPIDERMÓIDES: - Espinocelulares (escamosos),<br />

- Basalóides (cloacogênicos), e<br />

- Muco-epidermóides.<br />

2. ADENOCARCINOMAS: - Glândulas anais,<br />

3. MELANOMAS<br />

4. SARCOMA DE KAPOSI<br />

5. DOENÇA DE BOWEN<br />

6. DOENÇA DE PAGET<br />

- Fístulas anorretais, e<br />

- Mucosa retal.<br />

56

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