12.10.2013 Views

Sobre as Ciências Sociais - FEP - Universidade do Porto

Sobre as Ciências Sociais - FEP - Universidade do Porto

Sobre as Ciências Sociais - FEP - Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Carlos Pimenta Complexidade e Interdisciplinaridade n<strong>as</strong> Ciênci<strong>as</strong> <strong>Sociais</strong> Versão 02<br />

podem dar lugar a situações complex<strong>as</strong> e que sistem<strong>as</strong> complexos podem dar lugar a situações (soluções)<br />

simples.<br />

A ideia de complexidade como hoje a consideramos já tem algum<strong>as</strong> décad<strong>as</strong> de existência.<br />

Sem se ir rebuscar origens nos primórdios da civilização greco-latina, onde será sempre possível<br />

encontrar afirmações que apontam para <strong>as</strong> preocupações que hoje <strong>as</strong>sumimos como sen<strong>do</strong> relacionad<strong>as</strong><br />

com a complexidade, parece váli<strong>do</strong> considerar 13 que a partir de mea<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s século XIX começam a surgir<br />

divers<strong>as</strong> referênci<strong>as</strong> à complexidade 14 e que com Bachelard (1934) 15 e Weaver (1948) 16 este conceito<br />

começa a adquirir precisão científica e visibilidade 17 , a qual foi definitivamente adquirida com o primeiro<br />

colóquio da <strong>Universidade</strong> d<strong>as</strong> Nações Unid<strong>as</strong>, em 1984 18 , intitula<strong>do</strong> “Ciência e Prática da Complexidade”<br />

e <strong>as</strong> conferênci<strong>as</strong> <strong>do</strong> Instituto de Estu<strong>do</strong> d<strong>as</strong> Ciênci<strong>as</strong> da Complexidade de Santa Fé, centro de<br />

investigação fundamental até aos nossos di<strong>as</strong> 19 . Contu<strong>do</strong> <strong>as</strong> “teori<strong>as</strong> da complexidade” ainda se<br />

apresentam mais como uma «manta de retalhos» unida por algum<strong>as</strong> «costur<strong>as</strong>» – a teoria <strong>do</strong><br />

sistem<strong>as</strong> 20 , a teoria d<strong>as</strong> catástrofes de Thom 21 , o determinismo caótico de Ruelle 22 , os fractais de<br />

Mandelbrot 23 , <strong>as</strong> estrutur<strong>as</strong> dissipativ<strong>as</strong> de Prigogine 24 , os esta<strong>do</strong>s críticos de Bale, a complexidade<br />

algorítmica de Kolmogorov 25 são alguns elementos destes retalhos 26 – que como um to<strong>do</strong> articula<strong>do</strong>,<br />

científica e epistemologicamente 27 . As teori<strong>as</strong> da complexidade continuam a ser ponto de discórdia entre<br />

cientist<strong>as</strong>, in<strong>do</strong> desde os que defendem a grande novidade de tais abordagens e a sua incompatibilidade<br />

com <strong>as</strong> meto<strong>do</strong>logi<strong>as</strong> científic<strong>as</strong> de raiz cartesiana até aos que consideram que é uma nova forma de<br />

colocar velhos problem<strong>as</strong>, não acrescentan<strong>do</strong> nov<strong>as</strong> pist<strong>as</strong> de prática científica, p<strong>as</strong>san<strong>do</strong> por muitos que<br />

pretendem <strong>do</strong>mesticar 28 a complexidade, isto é, colocá-la como referência inerte em velh<strong>as</strong> teori<strong>as</strong>. Por<br />

tu<strong>do</strong> isto não espanta que os conhecimentos científicos sobre o complexo, a complexidade, os sistem<strong>as</strong><br />

complexos e temátic<strong>as</strong> similares, ainda não se tenham derrama<strong>do</strong> convenientemente no conhecimento<br />

corrente, ainda não tenham molda<strong>do</strong> significativamente este.<br />

E quan<strong>do</strong> ao falarmos em “complexo” pensamos em “complica<strong>do</strong>” estamos ainda, como referimos e<br />

insistimos, perante uma incursão espontânea <strong>do</strong> conhecimento corrente no conhecimento científico.<br />

Por tu<strong>do</strong> isto dizíamos, há já alguns anos, que<br />

A adjectivação de uma situação como “complexa” reflecte estar atónito perante uma situação,<br />

uma ruptura com os comportamentos e raciocínios automáticos. É o simultâneo reconhecimento<br />

de que a realidade em que nos movemos comporta elementos que não estavam a ser<br />

considera<strong>do</strong>s e que existe uma dificuldade para os integrar na compreensão que temos da<br />

situação.<br />

E, no entanto, esses elementos não surgem por acidente, não são uma exogeneidade à nossa<br />

envolvência porque o concreto em que agimos é sempre uma totalidade constituída por múltipl<strong>as</strong><br />

relações, dinâmic<strong>as</strong> e elementos da qual apen<strong>as</strong> fazemos uma leitura parcial, eventualmente<br />

verdadeira se a p<strong>as</strong>sagem ao abstracto permite captar a natureza essencial <strong>do</strong> objecto de estu<strong>do</strong>.<br />

Falar em complexidade é explicitar o conjunto d<strong>as</strong> relações e processos concretos, é trazer para a<br />

visibilidade d<strong>as</strong> noss<strong>as</strong> observações <strong>as</strong> dificuldades de leitura e é, na postura de maior<br />

racionalidade, a tentativa de encontrar nov<strong>as</strong> matrizes de indagação e novos vectores de<br />

transformação da realidade em que nos movemos. (Pimenta, 1998)<br />

Continuemos com a minha dúvida. Afinal o que podemos entender por complexidade?<br />

Morin é um autor importante no entendimento da complexidade, quer pelos contributos que dá para o seu<br />

estu<strong>do</strong> 29 quer pelos desafios que lança em termos de ruptura com o p<strong>as</strong>sa<strong>do</strong>, de meto<strong>do</strong>logia, de desafios<br />

epistemológicos. Parte frequentemente <strong>do</strong> senti<strong>do</strong> etimológico da palavra complexo em que o<br />

entrelaçamento e a inseparabilidade são <strong>as</strong>pectos importantes. Por isso gosta de recordar um pensamento<br />

de P<strong>as</strong>cal, certamente pelo seu interesse, talvez para mostrar que não é uma noção tão recente quanto isso<br />

e que <strong>as</strong> dificuldades <strong>do</strong> seu estu<strong>do</strong> está mais na atitude <strong>do</strong>s cientist<strong>as</strong> – leia-se atitude da sociedade<br />

através <strong>do</strong>s cientist<strong>as</strong> e destes – que na surpresa <strong>do</strong> seu conteú<strong>do</strong>: “sen<strong>do</strong> tod<strong>as</strong> <strong>as</strong> cois<strong>as</strong> causad<strong>as</strong> e<br />

causantes, ajudad<strong>as</strong> e ajudantes, mediatamente e imediatamente, e manten<strong>do</strong>-se tod<strong>as</strong> por uma ligação<br />

natural e insensível que liga <strong>as</strong> mais af<strong>as</strong>tad<strong>as</strong> e <strong>as</strong> mais diferentes, acho impossível conhecer <strong>as</strong> partes<br />

sem conhecer o to<strong>do</strong>, tal como conhecer o to<strong>do</strong> sem conhecer particularmente <strong>as</strong> partes” 30 . O to<strong>do</strong> é<br />

diferente <strong>do</strong> conjunto d<strong>as</strong> partes e est<strong>as</strong> perdem significa<strong>do</strong> descontextualizad<strong>as</strong> <strong>do</strong> to<strong>do</strong>. Por isso o<br />

mesmo autor afirma que “complexidade é tecer junto, religar, rejuntar” (in Almeida, 1997, 30). Constata,<br />

pois, que não podemos considerar que a ordem rege “a Natureza e o mun<strong>do</strong>”, deven<strong>do</strong>-se antes considerar<br />

“o jogo entre a ordem, a desordem e a organização”, jogo a que chama “dialógico”. Constata<br />

consequentemente que “o princípio da separação” <strong>do</strong> to<strong>do</strong> n<strong>as</strong> partes segun<strong>do</strong> a meto<strong>do</strong>logia cartesiana<br />

Pág. 9

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!