Representações do sujeito feminino em O Despertar e Riacho Doce ...
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<strong>Representações</strong> <strong>do</strong> <strong>sujeito</strong> <strong>f<strong>em</strong>inino</strong> <strong>em</strong> O <strong>Despertar</strong> e <strong>Riacho</strong> <strong>Doce</strong>: um estu<strong>do</strong> comparativo<br />
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entre as protagonistas e o masculino, elas se ass<strong>em</strong>elham quan<strong>do</strong> elas não consegu<strong>em</strong><br />
oferecer a nenhuma dessas mulheres uma completude.<br />
Ao longo <strong>do</strong>s romances, as duas protagonistas mantêm ligações com diferentes<br />
homens. O texto de Kate Chopin mostra que Edna Pontellier desenvolve distintas<br />
relações amorosas: uma de cunho social, outra sexual e outras platônicas 64. A recorrência<br />
das relações platônicas reforça o caráter de incompletude <strong>do</strong> prazer que marca a<br />
personag<strong>em</strong>, uma vez que Edna não consegue sexualmente concretizar seus desejos.<br />
Estas relações acontec<strong>em</strong> com diferentes parceiros, o que também marca a busca<br />
constante desta mulher por uma possibilidade de atingir o seu Éden metafórico,<br />
simbolizan<strong>do</strong> a descoberta <strong>do</strong> parceiro que a complete. As ligações amorosas pelas quais a<br />
protagonista de O <strong>Despertar</strong> passa mostram que: “Edna, <strong>em</strong> resumo, é uma mulher numa<br />
busca <strong>em</strong>inente por companheirismo, e à medida que sua procura prossegue, ela está mais<br />
e mais infectada pela solidão” 65 (DELBANCO, 1988, p. 96).<br />
Com Léonce, por ex<strong>em</strong>plo, ela vive um contrato social, uma vez que é legalmente<br />
casada com ele. Como está expresso na narrativa, a ligação de Edna com o mari<strong>do</strong> é fruto<br />
de um acidente e não de uma decisão planejada, dan<strong>do</strong> à união <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is um senti<strong>do</strong><br />
negativo: “Seu casamento com Léonce Pontellier foi puramente acidental, parecen<strong>do</strong>-se<br />
muito, neste aspecto, com muitos outros casamentos que se fantasiam de decretos <strong>do</strong><br />
Destino” (CHOPIN, 1994, p. 31). A passag<strong>em</strong> citada aqui reforça a condição f<strong>em</strong>inina da<br />
época, que apresenta o casamento como o destino primeiro para a mulher.<br />
Embora o foco seja a união <strong>do</strong> casal Edna/Léonce, a passag<strong>em</strong> anterior alarga,<br />
ainda, seu campo de alcance ao identificar <strong>em</strong> outros casamentos o fracasso desta<br />
instituição. É retirada da ligação que mant<strong>em</strong> com Léonce qualquer possibilidade de<br />
64 Em linhas gerais, utilizamos o senti<strong>do</strong> platônico <strong>do</strong> amor para nos referirmos a um tipo específico de amor que<br />
não prevê o ato sexual. Dan<strong>do</strong> valor ao la<strong>do</strong> espiritual, esse tipo de amor se fortalece na ausência <strong>do</strong> outro – quanto<br />
mais distante e inacessível, mais intenso pode ser o amor. Constitui-se um anseio metafísico por uma totalidade<br />
inacessível. Esse tipo de amor foi t<strong>em</strong>a frequente da literatura medieval, se materializan<strong>do</strong> no que se convencionou<br />
chamar de Amor Cortês. É Platão, <strong>em</strong> O banquete, qu<strong>em</strong> diferencia os tipos de amor, ao dizer que: “é mau aquele<br />
amante popular, que ama o corpo mais que a alma; pois não é ele constante, por amar um objeto que também não é<br />
constante. [...] Ao contrário, o amante <strong>do</strong> caráter é que é bom, é constante por toda a vida, porque se fundiu o que é<br />
constante” (1970, p. 113). Do que fala o filósofo é que este conceito de amor platônico foi gera<strong>do</strong>. Diz<strong>em</strong>os que<br />
Edna nutriu amores platônicos porque seus objetos ama<strong>do</strong>s se encontravam s<strong>em</strong>pre inacessíveis fisicamente.<br />
65 “Edna, in short, is a woman in thwarted pursuit of partnership, and as her search proceeds, she is more and more<br />
infected by loneliness”.<br />
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