José Antônio Puppim de Oliveira - Cepal
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<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
Salvador<br />
2003
Série Construindo os Recursos do Amanhã, v. 3<br />
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das<br />
Experiências Nacional e Internacional<br />
Copyright © 2003 Centro <strong>de</strong> Recursos Ambientais (CRA)<br />
Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei nº 5.988, <strong>de</strong> 14/12/73.<br />
Nenhuma parte <strong>de</strong>ste livro po<strong>de</strong>rá ser reproduzida ou transmitida sem autorização<br />
prévia por escrito da Editora, sejam quais forem os meios empregados: eletrônicos,<br />
mecânicos, fotográficos, gravações ou quaisquer outros.<br />
GOVERNO DO ESTADO DA BAHIA<br />
PAULO SOUTO<br />
SECRETARIA DE MEIO AMBIENTE E RECURSOS HÍDRICOS<br />
JORGE KHOURY<br />
CENTRO DE RECURSOS AMBIENTAIS<br />
MARIA LUCIA CARDOSO DE SOUZA<br />
Catalogação na Fonte do Departamento Nacional do Livro<br />
O48i <strong>Oliveira</strong>, <strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> Pupim <strong>de</strong>.<br />
Instrumentos econômicos para gestão ambiental :<br />
lições das experiências nacional e internacional / <strong>José</strong><br />
<strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong>. – Salvador: Centro <strong>de</strong><br />
Recursos Ambientais : NEAMA, 2003.<br />
124 p. ; 21 cm. – (Construindo os recursos do amanhã ; v. 3)<br />
Inclui bibliografia.<br />
ISBN 85-88595-20-6<br />
1. Desenvolvimento sustentável. 2. Desenvolvimento<br />
econômico - Aspectos ambientais. 3. Planejamento urbano -<br />
Aspectos ambientais. I. Centro <strong>de</strong> Recursos Ambientais (BA).<br />
Núcleo <strong>de</strong> Estudo Avançados do Meio Ambiente (BA). III.<br />
Título. IV. Série.<br />
CENTRO DE RECURSOS AMBIENTAIS - CRA<br />
Rua São Francisco, 1 - Monte Serrat<br />
42425-060 - Salvador - BA - Brasil<br />
Tel.: (0**71) 310-1400 - Fax: (0**71) 310-1414<br />
cra@cra.ba.gov.br / www.cra.ba.gov.br<br />
CDD 363.7
Sobre o Autor<br />
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
Professor Adjunto da Escola Brasileira <strong>de</strong> Administração<br />
Pública e <strong>de</strong> Empresas (EBAPE) e do Centro<br />
Internacional <strong>de</strong> Desenvolvimento Sustentável<br />
(CIDS), Fundação Getulio Vargas (FGV), Rio <strong>de</strong><br />
Janeiro. Ph.D. em Planejamento, pelo Massachusetts<br />
Institute of Technology (MIT), EUA. Mestre em<br />
Ciências Ambientais, pela Universida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Hokkaido,<br />
Japão. Engenheiro pelo Instituto Tecnológico <strong>de</strong><br />
Aeronáutica (ITA), São <strong>José</strong> dos Campos (SP).<br />
puppim@alum.mit.edu
Produção Editorial<br />
Produção Artística<br />
Coor<strong>de</strong>nação Editorial<br />
e Projeto Gráfico<br />
Ricardo Baroud<br />
Revisão <strong>de</strong> Textos<br />
Ana Maria dos Santos F. Teles<br />
Editoração Eletrônica<br />
e Arte-finalização<br />
Patrícia Chastinet<br />
Concepção, Coor<strong>de</strong>nação,<br />
Capa e Ilustrações<br />
Magaly Nunesmaia<br />
Pintura (acrílica s/ tela)<br />
Márcia Barros<br />
Fotografia<br />
Carlos Eduardo Vita
Sumário<br />
Apresentação ........................................................................<br />
1 Introdução – a ascensão dos instrumentos econômicos<br />
na agenda ambiental ...........................................................<br />
2 Instrumentos <strong>de</strong> gestão ambiental ......................................<br />
3 Limitações alegadas dos instrumentos <strong>de</strong> comando-econtrole<br />
............................................................................<br />
4 Tipos <strong>de</strong> instrumentos econômicos e experiências<br />
internacionais ..................................................................<br />
4.1 Taxas <strong>de</strong> emissão ....................................................<br />
4.2 Cobrança pelo uso ..................................................<br />
4.3 Taxas por produtos .................................................<br />
4.4 Cobranças administrativas ......................................<br />
4.5 Licenças intercambiáveis ........................................<br />
4.6 Sistema <strong>de</strong> <strong>de</strong>pósito com reembolso ........................<br />
4.7 Subsídios ...............................................................<br />
4.8 Outros instrumentos econômicos ............................<br />
5 Instrumentos econômicos no Brasil ................................<br />
5.1 Royalties ou compensações financeiras do petróleo/<br />
gás natural, da energia hidrelétrica e da mineração<br />
5.1.1 Compensações financeiras do petróleo e <strong>de</strong> gás<br />
natural .........................................................<br />
5.1.2 Compensações financeiras <strong>de</strong> mineração ........<br />
9<br />
12<br />
18<br />
22<br />
26<br />
27<br />
29<br />
32<br />
32<br />
34<br />
36<br />
38<br />
40<br />
42<br />
43<br />
44<br />
53
5.1.3 Compensações financeiras advindas da geração<br />
<strong>de</strong> hidreletricida<strong>de</strong> .........................................<br />
5.2 Cobrança pelo uso da água .....................................<br />
5.2.1 Experiência do estado <strong>de</strong> São Paulo ...............<br />
5.2.2 Experiência do estado do Ceará .....................<br />
5.3 ICMS Ecológico .....................................................<br />
5.3.1 O ICMS Ecológico no Paraná ........................<br />
5.3.2 ICMS Ecológico em Minas Gerais .................<br />
5.3.3 Avaliação do ICMS Ecológico (ICMS-E) no<br />
Paraná e em Minas Gerais .............................<br />
6 Lições dos casos internacionais e nacionais ....................<br />
7 Obstáculos à implementação dos instrumentos<br />
econômicos no Brasil ......................................................<br />
8 Sugestões para o processo <strong>de</strong> implantação <strong>de</strong> instrumentos<br />
econômicos .....................................................................<br />
9 Propostas para implantação <strong>de</strong> instrumentos econômicos<br />
na Bahia ..........................................................................<br />
9.1 Proposta para implantação do ICMS Ecológico ou<br />
Cidadão ................................................................<br />
9.2 Proposta para implantação do ICMS - Unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />
Conservação (ICMS-UC) .......................................<br />
9.3 Royalties para o Fundo <strong>de</strong> Recursos para o Meio<br />
Ambiente (Ferfa) ...................................................<br />
9.4 Cobrança pelo uso da água .....................................<br />
9.5 Programa <strong>de</strong> incentivo aos produtos mais sustentáveis<br />
9.6 Programa <strong>de</strong> incentivo às empresas que vão além da<br />
legislação ...............................................................<br />
9.7 Linha <strong>de</strong> crédito e/ou incentivos fiscais para projetos<br />
<strong>de</strong> Produção Mais Limpa (P+L) .............................<br />
10 Consi<strong>de</strong>rações finais .......................................................<br />
Referências bibliográficas .....................................................<br />
58<br />
61<br />
62<br />
65<br />
68<br />
72<br />
75<br />
77<br />
82<br />
88<br />
92<br />
100<br />
101<br />
108<br />
109<br />
110<br />
111<br />
111<br />
112<br />
114<br />
117
Lista <strong>de</strong> Tabelas<br />
1 – Tipos <strong>de</strong> instrumentos <strong>de</strong> gestão ambiental .....................<br />
2 – Matriz <strong>de</strong> instrumentos para gestão ambiental .................<br />
3 – Distribuição <strong>de</strong> royalties sobre a produção <strong>de</strong> petróleo e <strong>de</strong><br />
gás natural ....................................................................<br />
4 – Arrecadação da CFEM no Brasil (em milhões <strong>de</strong> R$) ......<br />
5 – Arrecadação no estado da Bahia .....................................<br />
6 – Valores pagos aos municípios pela geração <strong>de</strong> eletricida<strong>de</strong><br />
(em milhões <strong>de</strong> R$) .......................................................<br />
7 – Valores pagos aos estados pela geração <strong>de</strong> eletricida<strong>de</strong> (em<br />
milhões <strong>de</strong> R$) ...............................................................<br />
8 – Compensação financeira para o estado da Bahia .............<br />
9 – Critérios para divisão do ICMS no Paraná .......................<br />
10 – Mudança no ranking dos municípios com a introdução do<br />
ICMS-E .........................................................................<br />
11 – Impacto do ICMS-E no total <strong>de</strong> ICMS recebido pelo<br />
município (janeiro-março <strong>de</strong> 1998) ................................<br />
12 – Municípios paranaenses beneficiados pelo ICMS Ecológico<br />
<strong>de</strong> 1992 a 1998 ...............................................................<br />
13 – Critérios <strong>de</strong> distribuição do ICMS em Minas Gerais ........<br />
19<br />
20<br />
48<br />
55<br />
56<br />
60<br />
60<br />
61<br />
73<br />
74<br />
74<br />
75<br />
76
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
8
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
Apresentação<br />
Foi com satisfação que elaborei este texto para o Núcleo <strong>de</strong><br />
Estudos Avançados para o Meio Ambiente (NEAMA), do Centro <strong>de</strong><br />
Recursos Ambientais (CRA), do Estado da Bahia. Nas últimas décadas,<br />
a Bahia tem <strong>de</strong>monstrado pioneirismo e inovação em questões<br />
relacionadas à gestão ambiental. A criação do NEAMA permite que<br />
temas mo<strong>de</strong>rnos sejam estudados e <strong>de</strong>batidos com o objetivo <strong>de</strong><br />
documentá-los, divulgá-los e tentar aplicá-los na prática. E nada é tão<br />
importante no <strong>de</strong>bate ambiental recente no Brasil e no Mundo que o<br />
uso dos instrumentos econômicos como ferramentas <strong>de</strong> implementação<br />
<strong>de</strong> políticas ambientais.<br />
Esta monografia busca refletir sobre a aplicação <strong>de</strong> instrumentos<br />
econômicos para gestão ambiental baseando-se em conceitos teóricos<br />
e experiências empíricas nacionais e internacionais. O trabalho foi feito<br />
através <strong>de</strong> pesquisa bibliográfica, visita <strong>de</strong> campo e entrevistas com<br />
técnicos do governo, especialistas, representantes <strong>de</strong> organizações nãogovernamentais<br />
e do setor privado, entre meados <strong>de</strong> setembro e meados<br />
<strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 2002.<br />
Espero, <strong>de</strong>sta forma, ter sintetizado, em tão pouco tempo, os<br />
principais pontos do tema instrumentos econômicos e que este texto possa<br />
servir como contribuição mo<strong>de</strong>sta para o <strong>de</strong>bate ambiental da Bahia.<br />
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
9
Separatriz 1<br />
1 Apresentação
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
12<br />
1 Introdução – a ascensão dos instrumentos<br />
econômicos na agenda ambiental<br />
Ouso <strong>de</strong> instrumentos<br />
econômicos (IEs)<br />
na gestão ambiental<br />
vem ganhando força nos<br />
últimos anos. Têm crescido<br />
os argumentos e experiências<br />
no Brasil e no Mundo<br />
com os IEs como alternativa<br />
para substituir ou complementar<br />
os instrumentos <strong>de</strong><br />
comando-e-controle<br />
(CEC). Essas experiências<br />
são em áreas tão diversas<br />
como gestão do uso do solo<br />
à gestão dos recursos hídricos,<br />
reciclagem e controle<br />
da poluição do ar.
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
O Princípio do Poluidor Pagador, já discutido na Conferência<br />
das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano <strong>de</strong> Estocolmo em<br />
1972, é a origem dos argumentos para a utilização dos instrumentos<br />
econômicos (IEs) para gestão ambiental. A idéia é que o agente<br />
causador da poluição ou <strong>de</strong>gradação ambiental <strong>de</strong>ve, <strong>de</strong> alguma forma,<br />
internalizar as externalida<strong>de</strong>s ambientais negativas das suas ativida<strong>de</strong>s<br />
econômicas ou compensar as pessoas afetadas e o meio ambiente.<br />
O uso dos IEs para gestão ambiental vem sendo propagado com<br />
bastante vigor, principalmente na última década. Esta ascensão dos IEs<br />
na agenda ambiental <strong>de</strong>ve-se a alguns fatores que têm influenciado<br />
<strong>de</strong> diferentes formas os instrumentos <strong>de</strong> gestão para implementação<br />
das políticas públicas.<br />
• Primeiro, as novas formas i<strong>de</strong>ológicas <strong>de</strong> pensar-se o Estado<br />
chamado mo<strong>de</strong>rno exigem uma disciplina fiscal que faz com<br />
que haja uma retração do papel do Estado na forma <strong>de</strong><br />
organizar a socieda<strong>de</strong>. Cada vez mais se espera que<br />
instrumentos <strong>de</strong> gestão pública com pouca intervenção do<br />
Estado, como os IEs, sejam introduzidos em diversas áreas<br />
que antes eram puramente estatais, como energia,<br />
telecomunicações, educação, etc.<br />
• Segundo, esta mesma disciplina fiscal faz com que seja<br />
enxugado o orçamento <strong>de</strong> diversas áreas, principalmente<br />
aquelas com pouco respaldo político como é a área ambiental.<br />
Por exemplo, o orçamento do Ministério do Meio Ambiente<br />
(MMA) tem sido reduzido drasticamente, nos últimos anos,<br />
<strong>de</strong> um valor já pequeno <strong>de</strong> 0,51% do orçamento da União<br />
em 1995 para apenas 0,13% em 2000 (CAMARGO;<br />
CAPOBIANCO; PUPPIM DE OLIVEIRA, 2002). Como<br />
reflexo disto, surge uma pressão para aumento <strong>de</strong> receita para<br />
financiar os órgãos públicos. Os IEs, teoricamente, são uma<br />
possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> incrementar as receitas dos órgãos ambientais.<br />
• Terceiro, a <strong>de</strong>scentralização <strong>de</strong> muitas políticas ambientais<br />
faz com que os órgãos estaduais e municipais, pelos mesmos<br />
13
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
14<br />
motivos <strong>de</strong>scritos no item anterior, busquem alternativas<br />
inovadoras para implementar suas políticas ambientais,<br />
muitas vezes baseadas somente em instrumentos <strong>de</strong> comandoe-controle.<br />
Assim, muitos estados estão introduzindo os IEs<br />
em suas ferramentas <strong>de</strong> gestão ambiental.<br />
• Quarto, com a globalização, cada vez mais ganha espaço o<br />
mercado como instituição que permeia as relações na<br />
socieda<strong>de</strong>. A própria limitação geográfica do Estado com suas<br />
fronteiras, faz com que muitas organizações privadas, que<br />
operam sem limites <strong>de</strong> fronteira, tenham maior abrangência<br />
geográfica nas suas ações. Assim, os instrumentos <strong>de</strong><br />
comando-e-controle se tornam muitas vezes inapropriados<br />
para uma gestão ambiental eficaz. Surgem aí alguns<br />
instrumentos que são mais compatíveis com uma economia<br />
<strong>de</strong> mercado, como os IEs e a auto-regulação voluntária (tipo<br />
certificações ISO 14001, FSC, etc.).<br />
• Quinto, os próprios instrumentos econômicos po<strong>de</strong>m oferecer<br />
alternativas eficazes como mecanismos <strong>de</strong> gestão ambiental,<br />
em <strong>de</strong>terminadas condições e se utilizados apropriadamente.<br />
Muitas experiências já existentes começam a revelar os<br />
sucessos e as limitações na aplicação dos instrumentos<br />
econômicos.<br />
Como será apresentado nesta publicação, há várias experiências<br />
nacionais e internacionais <strong>de</strong>stes instrumentos. Com a globalização e o<br />
aumento do papel do mercado como regulador das relações entre<br />
organizações e indivíduos na socieda<strong>de</strong>, os IEs surgem como alternativas<br />
inovadoras <strong>de</strong> gestão ambiental. Porém, o papel do Estado é fundamental<br />
para fazer com que os IEs funcionem <strong>de</strong> forma a<strong>de</strong>quada. O Estado<br />
<strong>de</strong>ve, por exemplo, li<strong>de</strong>rar as articulações para introdução dos IEs,<br />
divulgar informações a seu respeito, fiscalizar a sua execução e fazer<br />
cumprir os contratos para sua aplicação. Além disso, o Estado não <strong>de</strong>ve<br />
abrir mão do uso <strong>de</strong> muitos dos seus instrumentos <strong>de</strong> comando-econtrole,<br />
pois estes são fundamentais para manter padrões mínimos <strong>de</strong>
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
qualida<strong>de</strong> ambiental. Os IEs, geralmente, po<strong>de</strong>m servir para<br />
complementar os instrumentos <strong>de</strong> comando-e-controle e dar incentivos<br />
para que as organizações e indivíduos avancem além dos padrões<br />
estabelecidos pela legislação.<br />
Ao mesmo tempo, os incentivos econômicos <strong>de</strong>vem funcionar na<br />
administração pública como forma <strong>de</strong> fortalecer as instituições locais<br />
(municípios) e premiar aqueles que buscam a sustentabilida<strong>de</strong><br />
socioambiental como sua estratégia <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento.<br />
No Brasil atual, as discussões sobre a reforma tributária abrem<br />
uma oportunida<strong>de</strong> única para introduzir alguns <strong>de</strong>stes instrumentos no<br />
<strong>de</strong>bate e tentar aplicá-los em nível nacional, estadual e municipal. Da<br />
mesma forma que se tenta <strong>de</strong>sonerar da carga tributária a produção e<br />
o trabalho, po<strong>de</strong>r-se-ia pensar em <strong>de</strong>sonerar as ativida<strong>de</strong>s<br />
ambientalmente sustentáveis e passar boa parte da carga para as<br />
ativida<strong>de</strong>s menos sustentáveis. O objetivo final seria direcionar, através<br />
<strong>de</strong> incentivos tributários (positivos ou negativos), um <strong>de</strong>senvolvimento<br />
mais sustentável.<br />
Inicia-se a monografia com um estudo dos instrumentos <strong>de</strong> gestão<br />
ambiental, incluindo a parte conceitual dos instrumentos econômicos.<br />
Segue-se com uma <strong>de</strong>scrição dos diversos tipos <strong>de</strong> instrumentos<br />
econômicos e das experiências internacionais nos seus usos. Na<br />
continuação, é abordada a experiência brasileira com alguns dos<br />
instrumentos econômicos, particularmente os royalties governamentais,<br />
o ICMS Ecológico e a cobrança <strong>de</strong> água. Ao final, lições, análises e<br />
sugestões para sua implantação na Bahia são colocadas.<br />
15
Separatriz 2
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
18<br />
2 Instrumentos <strong>de</strong> gestão ambiental<br />
Ogestor público conta<br />
com vários tipos<br />
<strong>de</strong> instrumentos<br />
para proteção ambiental.<br />
Os especialistas divi<strong>de</strong>m os<br />
instrumentos em diversos<br />
tipos (TABELAS 1 e 2). Esses<br />
instrumentos têm características<br />
diferentes e impactos<br />
sociais, políticos e<br />
econômicos diversos sobre<br />
os atores sociais (TABELA 1;<br />
FIORINO, 1995).
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
TABELA 1 – Tipos <strong>de</strong> instrumentos <strong>de</strong> gestão ambiental<br />
FONTE – Fiorino, 1995, modificado<br />
19
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
TABELA 2 – Matriz <strong>de</strong> instrumentos para gestão ambiental<br />
FONTE – World Bank, 1997, modificado<br />
Os instrumentos <strong>de</strong> comando-e-controle (CEC) foram os<br />
primeiros a serem estabelecidos para proteção ambiental e, durante<br />
anos, foram os mais populares. Em muitos países, os CEC ainda<br />
permanecem como os únicos disponíveis para gestão ambiental pública.<br />
Porém, com o passar do tempo, a efetivida<strong>de</strong> e a eficiência dos<br />
instrumentos <strong>de</strong> CEC para proteção ambiental têm sido contestadas.<br />
Devido, principalmente, à entrada dos economistas nos <strong>de</strong>bates<br />
ambientais e à busca <strong>de</strong> soluções inovadoras, os instrumentos<br />
econômicos (IEs) começaram a ganhar força como alternativas para<br />
substituir ou complementar os instrumentos <strong>de</strong> CEC.<br />
20
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
Separatriz 3<br />
21
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
22<br />
3 Limitações alegadas dos instrumentos<br />
<strong>de</strong> comando-e-controle<br />
Com a percepção <strong>de</strong> que, possilvelmente,<br />
só mecanismos <strong>de</strong><br />
comando-e-controle (CEC)<br />
não conseguiriam proteger o meio ambiente<br />
<strong>de</strong> forma eficaz e eficiente, <strong>de</strong>fensores<br />
dos instrumentos econômicos<br />
(IEs) vêm aparecendo na aca<strong>de</strong>mia, no<br />
governo, nas organizações não-governamentais<br />
(ONGs) e nas agências multilaterais<br />
(p.ex.: BAUMOL; OATES,<br />
1979; PANAYOTOU, 1992; PEARCE,<br />
1990; OECD, 1991, 1994b; REPETTO,<br />
1992; WORLD BANK, 1992). Entre<br />
algumas das <strong>de</strong>svantagens do CEC em<br />
relação aos IEs citadas pelos especialistas,<br />
encontram-se o elevado custo<br />
dos mecanismos <strong>de</strong> CEC e o fato <strong>de</strong>,<br />
em geral, não atingirem os objetivos<br />
propostos. As críticas aos mecanismos<br />
<strong>de</strong> CEC incluem ausência <strong>de</strong> incentivos<br />
aos atores sociais regulados (BAR-<br />
DE; PEARCE, 1991), elaboração por<br />
pessoas que estão um pouco fora da realida<strong>de</strong><br />
local (COMMONER, 1987),<br />
favorecimento a alguns grupos <strong>de</strong> interesse,<br />
quebra dos direitos à proprieda<strong>de</strong><br />
privada (ANDERSON; LEAL,<br />
1992) e geração <strong>de</strong> clima <strong>de</strong> confrontação<br />
entre regulador e regulado (VIG;<br />
KAFTS, 1994).
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
Por outro lado, várias vantagens, pelo menos teoricamente, são<br />
colocadas ao uso a<strong>de</strong>quado <strong>de</strong> certos instrumentos econômicos (IEs),<br />
tais como:<br />
• po<strong>de</strong>m gerar recursos para o Estado e, conseqüentemente,<br />
serem usados para ajudar na capacitação institucional e na<br />
operação dos órgãos ambientais;<br />
• levam, teoricamente, a alocação mais eficiente <strong>de</strong> recursos<br />
econômicos agregados da socieda<strong>de</strong>, porque os agentes que<br />
tenham custos menores para reduzir farão mais redução do<br />
que aqueles com custos maiores; mas no agregado, a redução<br />
vai ser mais barata e po<strong>de</strong> ser maior do que se todos tivessem<br />
que reduzir igualmente;<br />
• incentivam o melhoramento tecnológico para aumentar a<br />
qualida<strong>de</strong> ambiental, já que empresas terão um incentivo<br />
permanente para reduzir seus gastos com meio ambiente, como<br />
taxas e tributos;<br />
• induzem os agentes econômicos à melhoria ambiental através<br />
<strong>de</strong> incentivos econômicos;<br />
• po<strong>de</strong>m direcionar os impostos e taxas para ativida<strong>de</strong>s mais<br />
<strong>de</strong>gradantes ambientalmente;<br />
• são menos litigiosos, pois têm mais aceitação pelos agentes<br />
econômicos tradicionais.<br />
Porém, como iremos analisar nas experiências empíricas com IEs,<br />
muitas <strong>de</strong>stas vantagens po<strong>de</strong>m não se realizar na prática. O tipo <strong>de</strong><br />
IE, a maneira como os IEs são introduzidos e as condições em que são<br />
implementados po<strong>de</strong>m <strong>de</strong>terminar o resultado <strong>de</strong> um sistema <strong>de</strong> gestão<br />
que utilize IEs.<br />
IEs e CEC. Caso: emissões atmosféricas<br />
Nos Estados Unidos, o nível <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> parte dos poluentes do ar<br />
caiu drasticamente entre 1977 e 1987, <strong>de</strong> acordo com a Agência <strong>de</strong> Proteção<br />
Ambiental americana (U.S. Environmental Protection Agency, USEPA).<br />
23
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
A diminuição foi <strong>de</strong> 21% no nível <strong>de</strong> particulados, 88% nas concentrações<br />
<strong>de</strong> chumbo, 35% nas <strong>de</strong> dióxido <strong>de</strong> enxofre e 25% nas <strong>de</strong> monóxido <strong>de</strong><br />
carbono (PORTNEY, 1990). Estes resultados foram conseguidos mesmo<br />
com o aumento <strong>de</strong> 25% da população e quase 60% na quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
veículos. O gran<strong>de</strong> responsável por catalisar esta mudança foi o<br />
estabelecimento do Clean Air Act na década <strong>de</strong> 1970, baseado em CEC.<br />
Embora esse relativo sucesso tenha sido conseguido com a<br />
implementação do Clean Air Act (CAA), esta lei tem sido criticada pelos<br />
altos custos impostos à socieda<strong>de</strong> e por uma certa falta <strong>de</strong> efetivida<strong>de</strong> em<br />
certas regiões, pois 86 milhões <strong>de</strong> americanos ainda viviam em áreas que<br />
não estavam <strong>de</strong>ntro dos padrões do CAA em 1991 (VIG; KREAP, 1994).<br />
Especialistas estimam que os custos anuais <strong>de</strong> implementação do CAA<br />
ultrapassaram em US$ 50 bilhões aqueles estabelecidos inicialmente<br />
(PORTNEY, 1990). Proponentes <strong>de</strong> instrumentos econômicos para<br />
proteção ambiental argumentam que os resultados teriam sido bem<br />
melhores com o uso <strong>de</strong> mecanismos <strong>de</strong> mercado, tanto em termos <strong>de</strong><br />
custo como em efetivida<strong>de</strong> (ANDERSON; LEAL, 1992).<br />
Experiências com instrumentos econômicos têm tido alguns<br />
resultados positivos. Taxas ambientais sobre a gasolina parecem ter<br />
reduzido a poluição atmosférica na Cida<strong>de</strong> do México. Essas taxas têm<br />
sido trabalhadas em conjunto com instrumentos <strong>de</strong> CEC, como padrões<br />
<strong>de</strong> emissão e programas <strong>de</strong> inspeção <strong>de</strong> veículos.<br />
No Brasil, existem evidências <strong>de</strong> que instrumentos <strong>de</strong> CEC para<br />
controle <strong>de</strong> poluição atmosférica têm tido certa efetivida<strong>de</strong> em alguns<br />
casos. Em Cubatão, a implementação dos instrumentos <strong>de</strong> CEC forçaram<br />
a redução razoável do nível <strong>de</strong> poluição do ar nas décadas <strong>de</strong> 1980 e<br />
1990 (LEMOS, 1998). Na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, o controle <strong>de</strong> tráfico<br />
por final da placa <strong>de</strong> carro alcançou certo sucesso também.<br />
Em alguns casos, porém, os instrumentos <strong>de</strong> CEC não têm sido<br />
tão efetivos. Na Cida<strong>de</strong> do México e em Atenas, por exemplo, a restrição<br />
<strong>de</strong> acesso ao centro <strong>de</strong> acordo com as placas dos veículos não alcançou<br />
os resultados esperados porque não tem sido respeitada <strong>de</strong>vido à falta<br />
<strong>de</strong> fiscalização (WORLD BANK, 1992).<br />
24
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
Separatriz 4<br />
25
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
26<br />
4 Tipos <strong>de</strong> instrumentos econômicos<br />
e experiências internacionais<br />
Especialistas <strong>de</strong>screvem várias tipologias<br />
para classificação dos<br />
instrumentos econômicos (IEs)<br />
para gestão ambiental (PANAYOTOU,<br />
1992; BARBE, 1994; FIORINO, 1995;<br />
WORLD BANK, 1997; RUSSEL; PO-<br />
WELL, 1996; SERÔA DA MOTTA;<br />
YOUNG, 1997). Porém, não há um<br />
consenso quanto ao seu número ou à<br />
sua forma. Essas tipologias variam na<br />
maneira como classificam o que são instrumentos<br />
econômicos e na maneira<br />
como os diferenciam. Em geral, os IEs<br />
são classificados em dois gran<strong>de</strong>s grupos.<br />
O primeiro refere-se aos instrumentos<br />
que servem como prêmios ou<br />
penalida<strong>de</strong>s sobre <strong>de</strong>terminado produto<br />
ou fator para direcionar a melhoria<br />
ambiental. Estes são os chamados incentivos<br />
econômicos na Tabela 1, ou o<br />
uso <strong>de</strong> mercados na Tabela 2. O segundo<br />
grupo refere-se aos mecanismos<br />
que atuam na forma <strong>de</strong> criação <strong>de</strong> um<br />
mercado para uma “mercadoria ambiental”,<br />
on<strong>de</strong> se negocia direta ou indiretamente<br />
algum certificado que reflete<br />
a escassez <strong>de</strong> algum recurso ambiental.<br />
Estes seriam os mecanismos <strong>de</strong><br />
mercado na Tabela 1, ou a criação <strong>de</strong><br />
mercado na Tabela 2.
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
Para esta publicação, não faremos a divisão dos dois gran<strong>de</strong>s<br />
grupos e classificaremos os instrumentos econômicos em sete tipos<br />
básicos, <strong>de</strong> acordo com uma tipologia da Organização <strong>de</strong> Cooperação<br />
e Desenvolvimento Econômicos (OCDE), listada a seguir (BARBE,<br />
1994):<br />
a) Taxas <strong>de</strong> emissão<br />
b) Cobrança pelo uso<br />
c) Taxas por produtos<br />
d) Cobranças administrativas<br />
e) Licenças intercambiáveis<br />
f) Sistema <strong>de</strong> <strong>de</strong>pósito com reembolso<br />
g) Subsídios<br />
Na seqüência, iremos <strong>de</strong>talhar cada um dos tipos mencionados<br />
e dar exemplos <strong>de</strong> experiências internacionais.<br />
4.1 Taxas <strong>de</strong> emissão<br />
Refere-se a taxas pagas pela quantida<strong>de</strong> e pela qualida<strong>de</strong> do<br />
poluente liberado, com o objetivo <strong>de</strong> criar um incentivo negativo<br />
para ações que levem a perda <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> ambiental. Possivelmente<br />
sejam o mais comum dos instrumentos econômicos. Hoje, utilizam-se<br />
taxas para gestão <strong>de</strong> recursos hídricos, controle <strong>de</strong> poluição do ar e<br />
resíduos sólidos.<br />
Coréia do Sul – combinação <strong>de</strong> elementos <strong>de</strong> tipo<br />
comando-e-controle e instrumentos econômicos<br />
A Coréia do Sul criou um sistema que cobra taxas por<br />
emissões atmosféricas e efluentes que ultrapassem limites<br />
estabelecidos pelo Estado. Existe um controle obrigatório com<br />
punições para casos <strong>de</strong> violação daqueles limites. O sistema inclui<br />
uma associação <strong>de</strong> instrumentos econômicos com comando-econtrole<br />
(MARGULIS, 1996).<br />
27
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
República Tcheca – imposto sobre a poluição do ar e da água<br />
Quando ainda era a Tchecoslováquia, em 1967, a atual República<br />
Tcheca introduziu um sistema <strong>de</strong> taxas por poluição do ar por fontes<br />
fixas e efluentes. Estas taxas tinham um valor básico para emissões<br />
abaixo <strong>de</strong> um certo padrão e um outro mais alto para emissões acima<br />
dos padrões estabelecidos. Para as pequenas indústrias havia uma taxa<br />
diferenciada. (MARGULIS, 1996).<br />
Malásia – controle <strong>de</strong> efluentes na indústria<br />
<strong>de</strong> azeite <strong>de</strong> palmeira<br />
O governo da Malásia implementou um sistema <strong>de</strong> licenciamento<br />
para reduzir os efluentes da indústria <strong>de</strong> azeite <strong>de</strong> palmeira. O<br />
licenciamento consiste, basicamente, <strong>de</strong> padrões ambientais e taxas<br />
para efluentes. Os padrões, gradualmente, ficaram mais restritos. A<br />
política foi implementada em quatro passos. As empresas tiveram um<br />
ano para instalar seus equipamentos <strong>de</strong> controle, e tiveram que reduzir<br />
sua carga <strong>de</strong> efluentes, usando DBO (Demanda Biológica <strong>de</strong> Oxigênio)<br />
como parâmetro principal. Esta redução passou <strong>de</strong> 25.000 mg/L <strong>de</strong><br />
efluente sem tratamento para 5.000 mg/L em 1978/79, para 500 mg/L<br />
em 1981, 100 mg/L em 1984 em diante.<br />
Além dos padrões, taxas foram cobradas sobre a carga <strong>de</strong> DBO<br />
lançada. Em 1978, esta taxa era cobrada pelo efluente exce<strong>de</strong>ndo<br />
5.000 mg/L. Em 1984, a cobrança era feita para a carga exce<strong>de</strong>ndo<br />
100 mg/L. Foi estabelecido um valor <strong>de</strong> aproximadamente US$ 40 por<br />
tonelada <strong>de</strong> carga <strong>de</strong> DBO para <strong>de</strong>scargas <strong>de</strong> efluente acima do<br />
padrão, e US$ 4 por tonelada <strong>de</strong> carga <strong>de</strong> DBO para <strong>de</strong>scargas igual<br />
ou abaixo do padrão. As empresas que reduziram significantemente<br />
suas cargas pelo <strong>de</strong>senvolvimento tecnológico foram recompensadas,<br />
pois pagaram taxas bem menores. O projeto <strong>de</strong> melhoria ambiental<br />
foi negociado em um conselho com representantes das indústrias, do<br />
governo e das comunida<strong>de</strong>s.<br />
Os resultados foram bastante animadores. A carga <strong>de</strong> DBO baixou<br />
<strong>de</strong> 563 toneladas para cinco toneladas entre 1978 e 1989, apesar do<br />
número <strong>de</strong> fábricas ter crescido <strong>de</strong> 131 para 254, e a produção total <strong>de</strong><br />
28
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
azeite <strong>de</strong> palmeira ter crescido <strong>de</strong> 1,79 milhão <strong>de</strong> toneladas para 6,06<br />
milhões <strong>de</strong> toneladas (WORLD BANK, 1997).<br />
Alemanha – taxa sobre a <strong>de</strong>scarga direta <strong>de</strong><br />
efluentes nos corpos d’água<br />
Des<strong>de</strong> 1981, a Alemanha cobra uma taxa sobre a carga <strong>de</strong><br />
efluentes lançada nos corpos d’água. O objetivo foi criar um sistema <strong>de</strong><br />
incentivos para que as indústrias adotassem tecnologias mais mo<strong>de</strong>rnas<br />
<strong>de</strong> controle e prevenção <strong>de</strong> poluição. O valor pago era estabelecido em<br />
função do índice <strong>de</strong> toxicida<strong>de</strong> dos efluentes, que é calculado a partir<br />
<strong>de</strong> um conjunto <strong>de</strong> poluentes como substâncias oxidáveis, organohalogenados,<br />
metais, fósforo e nitrogênio.<br />
O lançamento dos efluentes <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> autorização das<br />
autorida<strong>de</strong>s locais. Se a indústria atingisse <strong>de</strong>terminados padrões<br />
tecnológicos po<strong>de</strong>ria ter até 75% <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconto na taxa. Como a taxa<br />
somente era cobrada sobre os lançamentos diretos <strong>de</strong> águas residuais,<br />
os operadores das empresas <strong>de</strong> saneamento repassavam os valores<br />
correspon<strong>de</strong>ntes aos usuários dos seus sistemas <strong>de</strong> coleta <strong>de</strong> esgotos.<br />
Como no caso da Malásia, o valor da taxa teve aumento gradual<br />
<strong>de</strong> US$ 7, por unida<strong>de</strong> padrão <strong>de</strong> toxicida<strong>de</strong> (ut), em 1981, para um<br />
valor <strong>de</strong> cerca <strong>de</strong> US$ 43/ut em 1997. Os recursos arrecadados em<br />
1991 chegaram a US$ 207 milhões, dos quais 141 milhões (68%) foram<br />
gastos em medidas <strong>de</strong> proteção dos corpos d’água e 37 milhões (18%)<br />
foram alocados para administrar a cobrança da taxa (SERÔA DA<br />
MOTTA; MENDES, 1997).<br />
4.2 Cobrança pelo uso<br />
Equivale ao pagamento pelo uso <strong>de</strong> recurso natural ou custo<br />
<strong>de</strong> coleta e serviço <strong>de</strong> tratamento. São instrumentos para financiar<br />
serviços ambientais oferecidos por governos ou empresas privadas,<br />
tais como manutenção <strong>de</strong> parques e coleta e tratamento <strong>de</strong> resíduos<br />
sólidos e esgotos.<br />
29
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
China – cobrança pela água<br />
A adoção <strong>de</strong> instrumentos econômicos para gestão dos recursos<br />
hídricos tem acontecido na China. Um sistema <strong>de</strong>scentralizado <strong>de</strong><br />
cobrança pela água contribuiu para aumentar a eficiência no uso da<br />
água e acabar com os racionamentos forçados (ROSS, 1988;<br />
PANAYOTOU, 1992). Agricultores relataram que têm utilizado menos<br />
água para ter a mesma produção agrícola. Com isso, também foi possível<br />
aumentar a área <strong>de</strong> agricultura irrigada.<br />
Holanda – licença e cobrança por <strong>de</strong>scargas industriais<br />
Em 1970, a Holanda concebeu uma legislação que requeria que<br />
todos os poluidores industriais fossem licenciados e pagassem pela gestão<br />
<strong>de</strong> suas cargas <strong>de</strong> poluentes (BRESSERS, 1995). O sistema era gerido<br />
por conselhos <strong>de</strong> usuários. A taxa cobrada cresceu bastante <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a<br />
sua instalação. Subiu <strong>de</strong> 1,1 florins, por equivalente <strong>de</strong> população, em<br />
1969 para 55,1 florins em 1990. Os resultados foram bem sucedidos,<br />
com uma redução <strong>de</strong> 73% do volume <strong>de</strong> efluentes industriais entre<br />
1969 e 1990, apesar da produção industrial ter aumentado com o boom<br />
econômico. Valores significativos foram levantados com as taxas,<br />
chegando a 1,3 bilhão <strong>de</strong> florins em 1990 ou 0,5% da arrecadação do<br />
governo. Estes recursos ajudaram a financiar a construção e a operação<br />
<strong>de</strong> Estações <strong>de</strong> Tratamento <strong>de</strong> Efluentes (ETEs). Firmas também tiveram<br />
um alto grau <strong>de</strong> inovação tecnológica no setor.<br />
30<br />
Parques nacionais ao redor do mundo – taxas <strong>de</strong> entrada<br />
Unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Conservação (UCs) po<strong>de</strong>m servir como lugar <strong>de</strong><br />
recreação para um gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong> pessoas e, ao mesmo tempo,<br />
gerar recursos para sua gestão. Os parques nacionais americanos,<br />
por exemplo, constituem talvez o maior sistema turístico do mundo.<br />
270 milhões <strong>de</strong> pessoas visitaram esses parques em 1989 (UNEP;<br />
WTO, 1992). Os parques estaduais nos EUA recebem,<br />
conjuntamente, mais <strong>de</strong> 500 milhões <strong>de</strong> turistas ao ano. No Quênia,<br />
o turismo baseado nos parques nacionais tem sido a principal fonte<br />
<strong>de</strong> moeda estrangeira entrando no país, chegando a US$ 400 milhões
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
em 1989. Parte dos recursos são usados para custos <strong>de</strong> manutenção<br />
e operação dos parques. As fontes <strong>de</strong> recursos são significativas. Em<br />
Ruanda, antes da guerra civil, o Parc National <strong>de</strong>s Volcans coletava<br />
aproximadamente US$ 1 milhão ao ano. O Parque <strong>de</strong> Galápagos,<br />
no Equador, gerava, no início da década <strong>de</strong> 90, US$ 700 mil ao ano<br />
(UNEP; WTO, 1992). Porém, o que é possível cobrir com o volume<br />
<strong>de</strong> recursos gerado pelos parques varia. Nos EUA, as taxas <strong>de</strong> entrada<br />
cobriam cerca <strong>de</strong> 10% dos custos do sistema <strong>de</strong> parques nacionais,<br />
mas no sistema <strong>de</strong> parques do estado <strong>de</strong> New Hampshire, as suas<br />
receitas cobriam mais <strong>de</strong> 100% (LaPAGE, 1996). No Canadá,<br />
governos fe<strong>de</strong>ral e provinciais arrecadaram em 1995 mais <strong>de</strong> US$<br />
1,7 bilhão com o turismo baseado na natureza, mas gastam somente<br />
US$ 300 milhões neste programa.<br />
Tailândia – padrões <strong>de</strong> emissão e <strong>de</strong> tecnologia/fundo<br />
para o meio ambiente<br />
O Instituto <strong>de</strong> Pesquisa para o Desenvolvimento da Tailândia<br />
utilizou-se do princípio do poluidor pagador para criar um fundo do<br />
meio ambiente visando o controle ambiental das indústrias. Os recursos<br />
para aquele fundo viriam da cobrança <strong>de</strong> taxas <strong>de</strong> 1,0 bath por tonelada<br />
<strong>de</strong> resíduo sobre as 600 mil toneladas produzidas pelas maiores indústrias<br />
tailan<strong>de</strong>sas. A estimativa é <strong>de</strong> que os valores arrecadados iriam chegar<br />
a 0,3% do PIB originado nas 17 mil instalações industriais que produzem<br />
rejeitos perigosos, ou 1,5% <strong>de</strong> seus lucros líquidos. As taxas foram<br />
fixadas num nível capaz <strong>de</strong> cobrir os custos <strong>de</strong> transporte, tratamento e<br />
remoção <strong>de</strong> rejeitos perigosos, além <strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar uma margem para a<br />
execução do programa. A<strong>de</strong>mais, os recursos serviriam para a criação e<br />
a operação <strong>de</strong> instalações centrais <strong>de</strong> tratamento e <strong>de</strong>spejo para rejeitos<br />
perigosos coletados nas fábricas.<br />
A Tailândia utiliza também instrumentos econômicos, tais como:<br />
<strong>de</strong>scontos nas tarifas para importação <strong>de</strong> bens <strong>de</strong> capital <strong>de</strong>stinados à<br />
tecnologia <strong>de</strong> tratamento <strong>de</strong> rejeitos, subsídios à conservação <strong>de</strong> energia<br />
e diferenciação <strong>de</strong> preços para gasolina comum ou sem chumbo<br />
(WORLD BANK, 1992).<br />
31
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
32<br />
4.3 Taxas por produtos<br />
Inclui-se o pagamento em produtos que geram <strong>de</strong>gradação<br />
ambiental no seu processo <strong>de</strong> produção, consumo ou disposição. Estas<br />
taxas têm o objetivo <strong>de</strong> internalizar os custos diretos ou indiretos dos<br />
sistemas <strong>de</strong> coleta e tratamento dos poluentes.<br />
Este tipo <strong>de</strong> mecanismo tem potencial para ser utilizado no<br />
direcionamento do consumo <strong>de</strong> produtos mais ambientalmente ou<br />
socialmente responsáveis. Para isto, bastaria taxar-se diferenciadamente<br />
os produtos substitutos ou similares que fossem mais ambientalmente<br />
<strong>de</strong>gradantes.<br />
Coréia – taxas por produtos ambientalmente danosos<br />
Taxas que são aplicadas a produtos ambientalmente danosos e a<br />
produtos plásticos com o objetivo <strong>de</strong> financiar a coleta e a remoção<br />
(MARGULIS, 1996).<br />
Lubrificantes e combustíveis na Europa<br />
Muitos países na Europa aplicam uma taxa “ambiental” sobre<br />
lubrificantes e combustíveis. Exemplos on<strong>de</strong> estas taxas são aplicadas<br />
incluem lubrificantes (França e Holanda), e enxofre ou carbono em<br />
combustíveis (Países Nórdicos).<br />
4.4 Cobranças administrativas<br />
Refere-se ao valor pago em processos <strong>de</strong> licenciamento ou<br />
autorização para uso. Os recursos po<strong>de</strong>m servir para financiar sistemas<br />
<strong>de</strong> fiscalização e monitoramento. Vários países cobram pela licença <strong>de</strong><br />
entrada em <strong>de</strong>terminadas áreas da cida<strong>de</strong> ou pelo uso <strong>de</strong> produtos<br />
químicos ou radioativos.
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
Cingapura – sistema <strong>de</strong> licenças negociáveis para<br />
limitar a entrada em certas regiões da cida<strong>de</strong><br />
Cida<strong>de</strong>s como Cingapura adotam medidas <strong>de</strong> restrição <strong>de</strong><br />
trânsito, como exigir licenças para entrar em <strong>de</strong>terminada área da<br />
cida<strong>de</strong>, já há algum tempo com relativo êxito (WORLD BANK,<br />
1992; MARGULIS, 1996). Motoristas são obrigados a comprar<br />
licenças para entrar na parte central da cida<strong>de</strong>, <strong>de</strong> acordo com a<br />
hora. Isto tem feito com que várias pessoas mu<strong>de</strong>m seus hábitos,<br />
como utilizar mais o transporte público ou modificar seus horários<br />
para ir ao centro. Londres começou a adotar este tipo <strong>de</strong> mecanismo,<br />
para controle <strong>de</strong> tráfico e poluição no centro, em 2003 (LONDRES,<br />
2002). O governo londrino cobra, atualmente, até 5 libras (R$ 28,00,<br />
aproximadamente) para um veículo transitar por <strong>de</strong>terminadas<br />
regiões da cida<strong>de</strong>. Comerciantes das regiões controladas resistem à<br />
medida dizendo que isto prejudicará o comércio e que a medida<br />
viola o direito <strong>de</strong> ir e vir. Por outro lado, moradores dos distritos<br />
vizinhos temem que, para evitar a cobrança, parte do trânsito seja<br />
<strong>de</strong>sviada para suas regiões. Todo o dinheiro arrecadado será aplicado<br />
na melhoria do transporte público.<br />
Os efeitos do programa em Cingapura foram positivos. O tráfego<br />
nas zonas restritas caiu, inicialmente, 71% durante os períodos <strong>de</strong> pico;<br />
sete anos <strong>de</strong>pois do lançamento do programa, o tráfego <strong>de</strong> carros<br />
particulares já era 64% menor que antes do esquema <strong>de</strong> licenciamento.<br />
O transporte solidário aumentou <strong>de</strong> 10 para 40% do tráfego total. A<br />
participação do transporte em carros particulares caiu <strong>de</strong> 43% em 1974<br />
para apenas 22% em 1988, enquanto o programa ainda produzia vultosas<br />
receitas adicionais entre 1975 e 1989, ou seja, US$ 156,5 milhões, com<br />
custos operacionais e <strong>de</strong> capital somando apenas US$ 10 milhões. Do<br />
ponto <strong>de</strong> vista ambiental, o esquema resultou numa melhora substancial<br />
da qualida<strong>de</strong> do ar, com <strong>de</strong>clínio nos níveis <strong>de</strong> fumaça, <strong>de</strong> aci<strong>de</strong>z total,<br />
do óxido nítrico e do dióxido <strong>de</strong> nitrogênio (OECD, 1994b).<br />
Além disso, Cingapura executou com êxito um sistema <strong>de</strong> licenças<br />
negociáveis para limitar a venda e o uso <strong>de</strong> CFCs, e criou um sistema <strong>de</strong><br />
cotas <strong>de</strong> veículos <strong>de</strong>stinado a aumentar o custo da posse <strong>de</strong> um veículo.<br />
33
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
34<br />
4.5 Licenças intercambiáveis<br />
Baseia-se na compra <strong>de</strong> licenças intercambiáveis, em um<br />
mercado, para emissão <strong>de</strong> poluentes ou uso <strong>de</strong> recursos naturais. Assim,<br />
por exemplo, um teto é especificado para <strong>de</strong>terminado recurso natural<br />
ou poluente em certa área geográfica (bairro, cida<strong>de</strong>, bacia, ou até a<br />
Terra). Se uma empresa necessita <strong>de</strong> qualquer aumento <strong>de</strong> emissão<br />
ou uso <strong>de</strong> recursos naturais, ela <strong>de</strong>ve adquirir uma licença no mercado.<br />
Da mesma forma, se ela tem licenças extras, po<strong>de</strong> ven<strong>de</strong>r para empresas<br />
que necessitam aumentar suas emissões ou o uso <strong>de</strong> recursos naturais.<br />
O princípio é que as empresas mais eficientes reduzam suas cargas<br />
poluentes ou <strong>de</strong> consumo para reduzir seus encargos com licenças ou<br />
po<strong>de</strong>r vendê-las no mercado. Isto estimula a inovação e a<br />
competitivida<strong>de</strong> através da redução <strong>de</strong> poluentes ou da otimização<br />
do uso <strong>de</strong> recursos naturais. Além disso, com o uso <strong>de</strong>sse instrumento,<br />
flexibiliza-se o aumento da produção <strong>de</strong> fábricas já existentes e<br />
permite-se a instalação <strong>de</strong> novas fábricas que emitam poluentes<br />
controlados, as quais, para isto, necessitam comprar licenças no<br />
mercado. Estados Unidos e Alemanha têm estes mecanismos <strong>de</strong><br />
controle <strong>de</strong> poluição atmosférica para <strong>de</strong>terminados poluentes (como<br />
o SO 2 ) em algumas regiões. O Mecanismo <strong>de</strong> Desenvolvimento Limpo<br />
(MDL) no Protocolo <strong>de</strong> Quioto, ainda em discussão, é baseado nesse<br />
princípio para sua implementação.<br />
Títulos <strong>de</strong> CO 2 negociados nas bolsas <strong>de</strong> Chicago,<br />
Londres e Sydney<br />
Em 1997, a Costa Rica lançou os primeiros títulos <strong>de</strong> carbono,<br />
que têm sido negociados numa espécie <strong>de</strong> bolsa <strong>de</strong> valores <strong>de</strong> CO 2 ,<br />
criada pela Fundação Cantor Fitzgerald e pela consultoria<br />
Pricewaterhouse Coopers, ou em bolsas <strong>de</strong> valores tradicionais como as<br />
<strong>de</strong> Sydney, Londres e Chicago. A bolsa <strong>de</strong> Chicago também já negociou<br />
cotas <strong>de</strong> óxidos <strong>de</strong> nitrogênio e enxofre, como o SO 2 , responsáveis pela<br />
chuva ácida (EM DEFESA, 2001).
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
Estados Unidos – tra<strong>de</strong>able permits para a poluição do ar<br />
Os Estados Unidos talvez sejam o país que mais avançou no uso<br />
do mercado <strong>de</strong> licenças (MENDES; SERÔA DA MOTTA, 1997;<br />
USEPA, 2001). A política <strong>de</strong> comércio <strong>de</strong> emissões (Emissions Trading<br />
Policy), <strong>de</strong> 1982, permite a comercialização <strong>de</strong> créditos <strong>de</strong> redução <strong>de</strong><br />
emissões (ERC), que representam o exce<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> reduções <strong>de</strong> emissões<br />
conseguidos além dos níveis padrões <strong>de</strong> emissão propostos.<br />
O sistema <strong>de</strong> licenças po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong> diversos tipos:<br />
a) “bolhas” (bubbles), emissões <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>terminada área<br />
com compra <strong>de</strong> certificados <strong>de</strong> emissões;<br />
b) “compensações” (offsets), que fazem com que gran<strong>de</strong>s<br />
poluidores possam estabelecer-se em áreas já saturadas <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
que atendam aos padrões mais restritos existentes e que usem<br />
certificados adquiridos em outras áreas;<br />
c) “re<strong>de</strong>s” (netting), quando uma fonte pontual não precisa<br />
cumprir os padrões recentes introduzidos, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que não<br />
aumente suas emissões nem no local nem em outras<br />
localida<strong>de</strong>s;<br />
d) “bancos” (banking), on<strong>de</strong> as fontes guardam seus ERCs para<br />
usos futuros.<br />
O Acid Rain Program (Programa <strong>de</strong> Chuva Ácida) dos Estados<br />
Unidos é baseado em um sistema <strong>de</strong> teto <strong>de</strong> emissões e comercialização<br />
<strong>de</strong> certificados para redução <strong>de</strong> emissões na indústria <strong>de</strong> geração <strong>de</strong><br />
eletricida<strong>de</strong>. Exige uma redução nos níveis <strong>de</strong> emissão <strong>de</strong> óxidos <strong>de</strong><br />
nitrogênio (NO ) e tem uma meta <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> 50% dos níveis <strong>de</strong><br />
x<br />
emissão <strong>de</strong> 1980 para o dióxido <strong>de</strong> enxofre (SO ). 2<br />
Os dados mais recentes do relatório <strong>de</strong> emissões do Acid Rain<br />
Program <strong>de</strong> 2001 (USEPA, 2002) indicam progressos significativos. Os<br />
níveis <strong>de</strong> dióxido <strong>de</strong> enxofre estavam 10,6 milhões <strong>de</strong> toneladas menores<br />
que em 1990, ou seja, um terço <strong>de</strong> redução, além <strong>de</strong> terem baixado 5%<br />
dos níveis <strong>de</strong> 2000, e 17,3 milhões <strong>de</strong> toneladas abaixo dos níveis <strong>de</strong><br />
1980. Nos níveis <strong>de</strong> nitrogênio, as emissões baixaram 4,1 milhões <strong>de</strong><br />
toneladas em 2001 em relação a 1990, uma taxa <strong>de</strong> 25% <strong>de</strong> redução, e<br />
35
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
foram também 8% menos que em 2000. Estas reduções têm permitido<br />
uma diminuição significativa das chuvas ácidas e <strong>de</strong> contaminação do<br />
ar e das águas do país.<br />
Em discussão no congresso americano está o Clear Skies Act<br />
(Legislação dos Céus Claros) que busca reduções ainda maiores nas<br />
emissões <strong>de</strong> SO , NO e mercúrio das termelétricas americanas.<br />
2 x<br />
Programas <strong>de</strong> comercialização <strong>de</strong> certificados também foram<br />
estabelecidos para CFCs, <strong>de</strong>ntro do Protocolo <strong>de</strong> Montreal, e para<br />
emissões <strong>de</strong> veículos.<br />
36<br />
4.6 Sistema <strong>de</strong> <strong>de</strong>pósito com reembolso<br />
Cobra-se um <strong>de</strong>pósito para uso <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminado produto ou<br />
embalagem que será reembolsado quando do seu retorno. É muito utilizado<br />
para garrafas ou pneus, em <strong>de</strong>terminados países. No Brasil, seria equivalente<br />
aos <strong>de</strong>pósitos para cascos <strong>de</strong> bebidas, mas com objetivos ambientais.<br />
Japão – sistema <strong>de</strong> <strong>de</strong>pósitos para incentivar a reciclagem<br />
O Japão é um dos países que mais recicla resíduos sólidos. Suas<br />
taxas <strong>de</strong> reciclagem em 1990 chegavam a 92% nas garrafas <strong>de</strong> cerveja,<br />
50% no papel e 43% nas latas <strong>de</strong> alumínio (estes números <strong>de</strong>vem ter subido<br />
atualmente). Apesar <strong>de</strong> existirem legislações obrigando à reciclagem e<br />
campanhas <strong>de</strong> educação ambiental, a reciclagem é estimulada pela<br />
cobrança <strong>de</strong> uma taxa <strong>de</strong> <strong>de</strong>pósito e reembolso. Por exemplo, para as garrafas,<br />
é cobrada uma taxa que chegava, na época, a 300 yens (US$ 2.00) por<br />
engradado <strong>de</strong> 20 garrafas, e inci<strong>de</strong> sobre toda a ca<strong>de</strong>ia até o consumidor<br />
final. Governos locais, associações <strong>de</strong> moradores e ONGs também fazem<br />
mutirões para coleta <strong>de</strong> garrafas. O mesmo tipo <strong>de</strong> sistema é adotado para<br />
latas e outras embalagens (O´CONNOR, 1994).<br />
Taiwan – estimulando a reciclagem <strong>de</strong> PET<br />
Em Taiwan, foi estabelecido um sistema <strong>de</strong> cobrança <strong>de</strong> <strong>de</strong>pósito<br />
para PET em 1989. Os 104 fabricantes <strong>de</strong> recipientes PET, que produziam
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
260 milhões <strong>de</strong> recipientes ao ano, criaram uma organização sem fins<br />
lucrativos para gerenciar um fundo para financiar a coleta e a reciclagem<br />
das garrafas PET. O fundo era financiado pela cobrança <strong>de</strong> uma taxa<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>pósito. Foram abertos 14.000 pontos <strong>de</strong> coleta. As garrafas<br />
retornadas a estes pontos eram reembolsadas (US$ 0.08 por garrafa).<br />
Este sistema fez com que a taxa <strong>de</strong> reciclagem <strong>de</strong> PET atingisse 80%<br />
em 1992 (PAN, 1994).<br />
União Européia – sistema Ponto Ver<strong>de</strong><br />
Face à problemática relacionada com a produção <strong>de</strong> resíduos,<br />
em 1994, a União Européia (UE) criou uma diretiva comunitária,<br />
que responsabiliza os agentes econômicos que colocam embalagens<br />
no mercado pela sua gestão e <strong>de</strong>stino final. Contudo, essa<br />
responsabilida<strong>de</strong> po<strong>de</strong>, nos termos da lei, ser transferida para uma<br />
entida<strong>de</strong> <strong>de</strong>vidamente licenciada. Em face <strong>de</strong>ssa exigência, foi<br />
testado, primeiramente na Alemanha, o Sistema <strong>de</strong> Grüner Punkt,<br />
com êxito significativo, e <strong>de</strong>pois adaptado a vários países da UE. Em<br />
<strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1996, foi criada uma instituição (Pro-Europe - Packing<br />
Recovery Organization Europe) com o objetivo <strong>de</strong> promover a<br />
utilização do símbolo Ponto Ver<strong>de</strong>, em embalagens não-reutilizáveis,<br />
pelos países membros que tenham um sistema <strong>de</strong> gestão <strong>de</strong> resíduos<br />
<strong>de</strong> embalagens que aplique a Diretiva 94/62/CE (COMUNIDADE<br />
EUROPÉIA, 2001). A utilização do símbolo visa, também, evitar<br />
barreiras à circulação <strong>de</strong> mercadorias no espaço europeu, pela<br />
multiplicação <strong>de</strong> símbolos <strong>de</strong> significado semelhante.<br />
O sistema Ponto Ver<strong>de</strong> consiste no pagamento <strong>de</strong> taxas pelas<br />
embalagens dos produtos das empresas. O valor correspon<strong>de</strong>nte é<br />
recolhido por uma organização responsável pela gestão e <strong>de</strong>stino<br />
final <strong>de</strong>ssas embalagens. Este sistema é um exemplo <strong>de</strong><br />
implementação <strong>de</strong> políticas públicas alternativas, on<strong>de</strong> a socieda<strong>de</strong><br />
e as empresas envolvidas no processo se organizam em re<strong>de</strong> para o<br />
gerenciamento <strong>de</strong> embalagens. Os seus resultados, em todos os países<br />
on<strong>de</strong> tem sido adotado, são satisfatórios (POLZIN; PUPPIM DE<br />
OLIVEIRA, 2001).<br />
37
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
Países da União Européia – incentivos à renovação<br />
da frota <strong>de</strong> automóveis<br />
Um sistema <strong>de</strong> <strong>de</strong>pósitos reembolsáveis busca incentivar a<br />
renovação da frota <strong>de</strong> automóveis em países da União Européia, através<br />
do incentivo ao sucateamento das unida<strong>de</strong>s mais antigas e poluidoras.<br />
Na Grécia, há uma isenção <strong>de</strong> impostos para troca <strong>de</strong> um carro antigo<br />
por um novo. Na Noruega e na Suécia, o incentivo é também para a<br />
<strong>de</strong>stinação apropriada dos veículos sucateados (OECD, 1994a; SERÔA<br />
DA MOTTA; YOUNG, 1997).<br />
38<br />
4.7 Subsídios<br />
Inclui-se qualquer tipo <strong>de</strong> subsídio para incentivar a compra<br />
<strong>de</strong> produtos ou usos mais ambientalmente sustentáveis. Alguns países<br />
escandinavos subsidiam as energias alternativas, como solar ou eólica.<br />
O subsídio po<strong>de</strong> ser visto ao contrário, como retirar subsídios <strong>de</strong><br />
produtos ou usos ambientalmente incorretos que estimulem a<br />
<strong>de</strong>gradação ambiental, tal como os subsídios aos combustíveis fósseis<br />
em alguns países.<br />
Subsídios perversos para a água no mundo<br />
Alguns países vão na contramão da boa gestão dos recursos<br />
hídricos, <strong>de</strong> acordo com os proponentes dos instrumentos econômicos,<br />
porque subsidiam a água para uso urbano ou rural (PANAYOTOU,<br />
1992). Os subsídios po<strong>de</strong>m levar a uso irracional <strong>de</strong> recursos escassos,<br />
como a água. No Oriente Médio, muitos países sofrem com a escassez<br />
<strong>de</strong> água. Apesar disso, alguns <strong>de</strong>les subsidiam o uso da água. Mesmo<br />
países com abundância <strong>de</strong> recursos hídricos, por exemplo a Indonésia,<br />
têm dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> abastecimento em algumas regiões em certas épocas<br />
do ano, como na região central da populosa ilha <strong>de</strong> Java. Ainda assim,<br />
a água não era cobrada, ou era mantida bastante subsidiada, e o controle<br />
era feito por mecanismos <strong>de</strong> comando-e-controle (CEC) que não eram<br />
implementados.
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
Os subsídios para a água também têm acontecido nos países<br />
<strong>de</strong>senvolvidos, gerando custos altos para o setor público e <strong>de</strong>gradação<br />
ambiental. Nos Estados Unidos, fazen<strong>de</strong>iros têm tido água subsidiada<br />
para irrigação, causando supersafras que competem <strong>de</strong> forma<br />
privilegiada com a produção <strong>de</strong> países em <strong>de</strong>senvolvimento, que não<br />
têm os recursos para subsidiar. Além disso, subsídios resultam em excesso<br />
<strong>de</strong> irrigação, po<strong>de</strong>ndo causar salinização do solo, o que possivelmente<br />
não aconteceria sem eles (WORLD BANK, 1992).<br />
Taiwan – legislação ambiental/subsídios ambientais/meta ver<strong>de</strong><br />
Taiwan (China) conce<strong>de</strong> uma série <strong>de</strong> subsídios para melhoria<br />
da qualida<strong>de</strong> ambiental, incluindo a construção <strong>de</strong> estações <strong>de</strong><br />
tratamento <strong>de</strong> resíduos sólidos por governos locais, a aquisição <strong>de</strong> local<br />
para as instalações <strong>de</strong> tratamento <strong>de</strong> resíduos e a instalação <strong>de</strong><br />
equipamentos <strong>de</strong> controle <strong>de</strong> poluição (MARGULIS, 1996).<br />
Além disso, o país <strong>de</strong>finiu sua Meta Ver<strong>de</strong>, seguindo a tendência<br />
no sentido <strong>de</strong> formar uma consciência ambiental entre os<br />
consumidores. O Comitê da Meta Ver<strong>de</strong> fixa padrões específicos para<br />
produtos, aprova pedidos <strong>de</strong> certificados e trabalha em associação<br />
com as ONGs para avaliar o impacto ambiental das empresas, antes<br />
<strong>de</strong> lhes conce<strong>de</strong>r os certificados.<br />
Bangla<strong>de</strong>sh – redução <strong>de</strong> subsídios para fertilizantes<br />
Até 1978, o Governo <strong>de</strong> Bangla<strong>de</strong>sh subsidiava pesadamente sua<br />
indústria estatal <strong>de</strong> produção <strong>de</strong> fertilizantes agrícolas (RENFRO,<br />
1992). Apesar <strong>de</strong> terem gerado um aumento no uso <strong>de</strong> fertilizante,<br />
estes subsídios chegavam a quase 4% do orçamento do governo. Além<br />
disso, havia a preocupação <strong>de</strong> que a fabricação e o alto uso <strong>de</strong><br />
fertilizantes contaminassem os recursos hídricos do país. De 1978 a<br />
1983, foram retirados os subsídios aos fertilizantes. Houve economia <strong>de</strong><br />
recursos públicos, que pu<strong>de</strong>ram ser <strong>de</strong>sviados para outras áreas, e<br />
também um aumento na eficiência no uso dos fertilizantes.<br />
39
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
40<br />
4.8 Outros instrumentos econômicos<br />
Experiências ao redor do mundo também têm se utilizado <strong>de</strong><br />
instrumentos econômicos on<strong>de</strong> o Estado atua <strong>de</strong> forma inovadora, como<br />
nos exemplos a seguir.<br />
Compras ver<strong>de</strong>s no Governo<br />
Um instrumento que vem ganhando <strong>de</strong>staque recentemente é o<br />
direcionamento <strong>de</strong> certo volume das compras governamentais para os<br />
chamados produtos ver<strong>de</strong>s. Estes produtos têm <strong>de</strong>terminadas<br />
características que os colocam como mais ambientalmente responsáveis<br />
que seus similares, ou pela própria qualida<strong>de</strong> do produto ou processo<br />
(por exemplo, feito <strong>de</strong> certo material não tóxico ou <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira<br />
certificada), ou pela empresa (empresa com sistema <strong>de</strong> gestão ambiental<br />
certificado com ISO 14001), ou pelo próprio Estado. Este tipo <strong>de</strong> iniciativa<br />
é importante para alavancar ou criar escala <strong>de</strong> mercados <strong>de</strong> produtos<br />
ambientalmente ou socialmente responsáveis, que <strong>de</strong> outra forma não<br />
po<strong>de</strong>riam ser competitivos com os produtos ou processos tradicionais.<br />
Programa Buy-Recyclable<br />
Vários governos estaduais e locais, nos Estados Unidos, privilegiam<br />
a compra <strong>de</strong> uma parte dos produtos utilizados para sua operação com<br />
materiais feitos com matéria-prima reciclada (PUPPIM DE OLIVEIRA,<br />
2000). O produto mais comum é o papel com conteúdo <strong>de</strong> papel reciclado.<br />
Mas também existem programas para plásticos reciclados, tintas e outros<br />
materiais. Esta iniciativa tem viabilizado muitas empresas <strong>de</strong> reciclados<br />
que <strong>de</strong> outra forma não po<strong>de</strong>riam sobreviver.<br />
Utilização <strong>de</strong> pneus reciclados na Califórnia<br />
O estado da Califórnia incentiva o uso <strong>de</strong> asfalto com conteúdo<br />
<strong>de</strong> pneus reciclados para a pavimentação <strong>de</strong> parte <strong>de</strong> suas vias. Isto faz<br />
com que os pneus usados, que antes tinham pouca utilida<strong>de</strong> e eram<br />
um problema ambiental, passem a ser aproveitados.
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
Separatriz 5<br />
41
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
42<br />
5 Instrumentos econômicos no Brasil<br />
No Brasil, apesar <strong>de</strong> a<br />
lei da Política Nacional<br />
<strong>de</strong> Meio Ambiente<br />
(Lei n o 6.938/81) mencionar<br />
os incentivos à melhoria<br />
ambiental como instrumentos<br />
para sua implementação,<br />
muito pouco se tem<br />
utilizado <strong>de</strong>les. Na década <strong>de</strong><br />
1990, começou-se a introduzir<br />
alguns <strong>de</strong>stes instrumentos<br />
em algumas políticas estaduais,<br />
como o ICMS Ver<strong>de</strong><br />
no Paraná, passando pela<br />
cobrança pelo uso da água no<br />
Ceará e a canalização <strong>de</strong> parte<br />
dos royalties do petróleo<br />
para os fundos estaduais <strong>de</strong><br />
meio ambiente. A seguir, veremos<br />
alguns <strong>de</strong>sses exemplos<br />
como os royalties sobre mineração,<br />
eletricida<strong>de</strong> e petróleo,<br />
a cobrança pela água e o<br />
ICMS ecológico.
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
5.1 Royalties ou compensações financeiras<br />
do petróleo/gás natural, da energia<br />
hidrelétrica e da mineração<br />
A compensação financeira ou royalty inci<strong>de</strong>nte sobre os recursos<br />
hídricos para geração <strong>de</strong> energia elétrica, petróleo, gás natural e outros<br />
recursos minerais tem respaldo constitucional. A Constituição Fe<strong>de</strong>ral<br />
<strong>de</strong> 1988 no § 1º do Art. 20 coloca que a transferência <strong>de</strong>ssa compensação<br />
do proprietário do recurso natural (União) aos estados e municípios e a<br />
órgãos fe<strong>de</strong>rais da administração direta, na forma da lei.<br />
Art. 20. São bens da União:<br />
IX – os recursos minerais, inclusive os do subsolo;<br />
§ 1 o É assegurada, nos termos da lei, aos Estados, ao Distrito<br />
Fe<strong>de</strong>ral e aos Municípios, bem como a órgãos da administração<br />
direta da União, participação no resultado da exploração do<br />
petróleo ou gás natural, <strong>de</strong> recursos hídricos para fins <strong>de</strong><br />
geração <strong>de</strong> energia elétrica e <strong>de</strong> outros recursos minerais no<br />
respectivo território, plataforma continental, mar territorial<br />
ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira por<br />
essa exploração.<br />
A base para os royalties e a compensação financeira resi<strong>de</strong> no<br />
fato <strong>de</strong> que o aproveitamento do recurso natural culmina com a<br />
ocupação <strong>de</strong> fração do espaço territorial, que impe<strong>de</strong> o Estado <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>stiná-la a outras finalida<strong>de</strong>s.<br />
Na fase pré-Constituinte, estados e municípios estavam<br />
<strong>de</strong>sconfortáveis com a competência exclusiva da União para<br />
participar dos resultados da exploração dos recursos hídricos e<br />
minerais em seus territórios. Estados e municípios registravam perdas<br />
em tributos e tinham seus territórios inundados ou com impactos<br />
ambientais e sociais <strong>de</strong>correntes da mineração. Desta forma,<br />
43
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
pressionaram os constituintes para que uma distribuição <strong>de</strong><br />
compensações financeiras fosse aplicada.<br />
Estudos dos royalties e das compensações financeiras constatam<br />
que os critérios adotados são diversos, tanto do ponto <strong>de</strong> vista <strong>de</strong><br />
percentuais, como no que diz respeito à sua distribuição. A seguir,<br />
analisaremos alguns exemplos <strong>de</strong> experiências no Brasil.<br />
44<br />
5.1.1 Compensações financeiras do petróleo e <strong>de</strong> gás natural<br />
A flexibilização do monopólio do petróleo com a Lei no 9.478,<br />
<strong>de</strong> 1997, a chamada Lei do Petróleo, trouxe várias mudanças ao setor.<br />
Um dos <strong>de</strong>staques consiste na ampliação do recolhimento dos tributos<br />
vinculados à exploração e à produção <strong>de</strong> petróleo e gás nas<br />
participações governamentais. Esta lei criou novas participações dos<br />
diversos níveis <strong>de</strong> governo nas receitas do petróleo. O Decreto no 2.705, <strong>de</strong> 1998, <strong>de</strong>finiu os critérios para cálculo e cobrança referentes<br />
à participação governamental.<br />
Em 1997, as participações governamentais resumiam-se aos<br />
royalties <strong>de</strong> 5% sobre a produção <strong>de</strong> petróleo e gás. Com a nova Lei do<br />
Petróleo, as participações compõem-se <strong>de</strong> quatro parcelas diferentes<br />
(ANP, 2003) e também beneficiam proprietários privados:<br />
• Inicialmente, encontram-se os royalties aumentados para 10%<br />
sobre a produção <strong>de</strong> petróleo e gás, que correspon<strong>de</strong>ram à<br />
quantia <strong>de</strong> R$ 3,18 bilhões em 2002, passados a estados,<br />
municípios e união.<br />
• Em segundo, temos o bônus <strong>de</strong> assinatura relativo ao<br />
recolhimento do primeiro processo <strong>de</strong> licitação, no valor <strong>de</strong><br />
aproximadamente R$ 322 milhões, em 1999. Em 2001, o valor<br />
total arrecadado com o bônus <strong>de</strong> assinatura na Terceira<br />
Rodada <strong>de</strong> Licitações foi <strong>de</strong> R$ 594,9 milhões.<br />
• Em terceiro, o aluguel anual das áreas <strong>de</strong> concessão<br />
propiciou uma receita <strong>de</strong> R$ 124,7 milhões em 2001, para
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
pagamento pela ocupação ou retenção <strong>de</strong> 393 áreas. Além<br />
das participações governamentais, a Lei do Petróleo criou<br />
o pagamento pelos concessionários <strong>de</strong> uma participação<br />
aos proprietários das terras on<strong>de</strong> se realize a produção. Em<br />
2001, este pagamento somou R$ 28,6 milhões repassados a<br />
859 proprietários cadastrados <strong>de</strong> seis estados,<br />
correspon<strong>de</strong>ndo a um valor médio anual <strong>de</strong> R$ 33,3 mil<br />
por proprietário.<br />
• A quarta parcela, <strong>de</strong>nominada <strong>de</strong> participação especial,<br />
é cobrada sobre campos com altos volumes <strong>de</strong> produção<br />
e <strong>de</strong> alta rentabilida<strong>de</strong>. Devido à inclusão, em sua<br />
metodologia <strong>de</strong> cálculo, <strong>de</strong> um período <strong>de</strong> carência,<br />
encerrado em janeiro <strong>de</strong> 2000, não houve arrecadação<br />
em 1999. Seu valor chegou a R$ 1,7 bilhão no ano 2001,<br />
volume 65,8% superior ao arrecadado em 2000. Este valor<br />
foi distribuído conforme a Lei do Petróleo, cabendo 40%<br />
aos estados produtores ou confrontantes, 10% aos<br />
municípios produtores ou confrontantes, 40% ao<br />
Ministério <strong>de</strong> Minas e Energia (MME) e 10% ao<br />
Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e<br />
da Amazônia Legal (MMA).<br />
Esses recursos são distribuídos entre as três instâncias<br />
governamentais. Na União, eles financiam as seguintes ações: gestão da<br />
Agência Nacional <strong>de</strong> Petróleo (ANP); levantamento <strong>de</strong> dados geológicos<br />
e geofísicos, para realimentação do sistema; estudos e ações concretas<br />
na preservação do meio ambiente e na recuperação <strong>de</strong> danos ambientais<br />
causados pelas ativida<strong>de</strong>s da indústria do petróleo; fortalecimento naval,<br />
por meio do apoio ao Comando da Marinha; <strong>de</strong>senvolvimento científico<br />
e tecnológico; e necessida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> caixa do Tesouro Nacional que fazem<br />
frente a suas <strong>de</strong>mandas <strong>de</strong> investimento e <strong>de</strong> custeio.<br />
Aos estados produtores, cabe uma crescente parcela <strong>de</strong>sses<br />
tributos. Para se ter uma idéia, as previsões indicam que o estado do<br />
Rio <strong>de</strong> Janeiro ampliou a sua receita nas participações governamentais,<br />
<strong>de</strong> R$ 82 milhões, em 1997, para R$ 540 milhões, em 2000.<br />
45
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
Muitos outros municípios estão se beneficiando com essa<br />
política distributiva da nova arrecadação. São cerca <strong>de</strong> 700<br />
municípios beneficiados. Por exemplo, o município <strong>de</strong> Campos dos<br />
Goytacazes (RJ) recebeu R$ 3,9 milhões/ano <strong>de</strong> royalties em 1997,<br />
enquanto em 1999 esse valor subiu para aproximadamente R$ 50<br />
milhões/ano. Assim, consi<strong>de</strong>rando que o orçamento <strong>de</strong>sse município<br />
(excluindo os royalties), em 1999, foi da or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> R$ 120 milhões,<br />
isto representa um adicional <strong>de</strong> 42% ao seu orçamento original.<br />
Além disso, há a vantagem <strong>de</strong>, para arrecadar esse valor adicional,<br />
o custo administrativo ser nulo e não haver impacto sobre a carga<br />
tributária local.<br />
No Nor<strong>de</strong>ste, na região em torno <strong>de</strong> Mossoró (RN), a injeção <strong>de</strong><br />
recursos na economia local também é significativa. Este município<br />
recebeu mais <strong>de</strong> R$ 10 milhões em royalties em 2002.<br />
Apesar <strong>de</strong> todas essas vantagens, <strong>de</strong>ve-se dar uma atenção<br />
especial ao uso <strong>de</strong>sses recursos, pois são gerados a partir <strong>de</strong> riquezas<br />
esgotáveis. Tais receitas <strong>de</strong>vem ser bem administradas, incentivandose<br />
a formação <strong>de</strong> novas e permanentes ativida<strong>de</strong>s econômicas,<br />
in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes da produção <strong>de</strong> petróleo. Muitas das economias<br />
beneficiadas permanecem imersas no quadro das relações <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>pendência e <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s disparida<strong>de</strong>s sociais.<br />
Seria mais interessante se esses estados e municípios <strong>de</strong>cidissem<br />
pela formação <strong>de</strong> fundos que venham a dar sustentação em políticas<br />
públicas voltadas para o <strong>de</strong>senvolvimento regional sustentado. Fundos,<br />
em cuja administração a socieda<strong>de</strong> local tenha participação, que<br />
aproveitem essa oportunida<strong>de</strong> histórica para criar perenida<strong>de</strong> a partir<br />
da riqueza esgotável. Estes fundos po<strong>de</strong>m ser ambientais, como o Fecam<br />
no Rio <strong>de</strong> Janeiro que veremos mais adiante.<br />
46<br />
Distribuição dos royalties no Brasil<br />
Das quatro parcelas das participações governamentais, os royalties<br />
já existiam antes da Lei do Petróleo <strong>de</strong> 1997, mas em percentual inferior.<br />
O percentual dos royalties aumentou <strong>de</strong> 5% para até 10% sobre a
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
produção <strong>de</strong> petróleo e gás. Assim, os royalties representam a única<br />
parcela comum a 1997 e 1999 e por isso possibilitam uma análise<br />
comparativa. Além do aumento dos royalties, houve uma elevação na<br />
arrecadação <strong>de</strong>vido ao aumento na produção em 26%, no período. Sua<br />
arrecadação é diretamente proporcional ao volume <strong>de</strong> produção, cujos<br />
valores correspon<strong>de</strong>ram, em média, a 870 mil barris/dia em 1997 e 1,1<br />
milhão barris/dia em 1999. Assim, tem havido um aumento significativo<br />
nos valores distribuídos aos diversos níveis do governo. A receita dos<br />
royalties em 1999 foi <strong>de</strong> R$ 983 milhões, contra meros R$ 190 milhões<br />
no ano <strong>de</strong> 1997.<br />
Nos últimos anos a arrecadação <strong>de</strong> royalties tem crescido<br />
significantemente (TABELA 3). Em 2002, foram coletados R$ 3,18<br />
bilhões em royalties para diversas organizações do governo, distribuídos<br />
da seguinte forma: 32,1 % aos estados produtores ou confrontantes,<br />
33,6% aos municípios produtores ou confrontantes, 12,3% ao Ministério<br />
da Ciência e Tecnologia (MCT), 14,7% ao Comando da Marinha e<br />
7,3% ao Fundo Especial dos Estados e Municípios.<br />
A distribuição percentual <strong>de</strong> royalties por ente governamental<br />
beneficiado ficou assim, entre 1997/2000:<br />
• Rio <strong>de</strong> Janeiro, 42,7%<br />
• Sergipe, 2,5%<br />
• Amazonas, 2,5%<br />
• Bahia, 4,3%<br />
• Fundo Especial, 5,5%<br />
• Rio Gran<strong>de</strong> do Norte, 6,2%<br />
• Ministério da Ciência e Tecnologia, 8,3%<br />
• Ministério <strong>de</strong> Minas e Energia, 8,5%<br />
• Ministério da Marinha, 11,1%<br />
• Outros, 8,4%<br />
O estado da Bahia e seus municípios receberam mais <strong>de</strong> R$ 110<br />
milhões em 2001. Em 2002, este valor foi para mais <strong>de</strong> R$ 131 milhões,<br />
sendo R$ 77,7 milhões para o estado e 54,2 milhões para os municípios<br />
baianos.<br />
47
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
TABELA 3 – Distribuição <strong>de</strong> royalties sobre a produção <strong>de</strong> petróleo e <strong>de</strong> gás natural<br />
48<br />
(continua)
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
(continuação)<br />
(continua)<br />
49
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
(continuação)<br />
50<br />
FONTE – ANP/SPG, conforme as Leis n o 7.990/89 e n o 9.478/97 e o Decreto n o 2.705/98 (ANP, 2003)
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
Os royalties do petróleo no estado do Rio <strong>de</strong> Janeiro<br />
e seus municípios<br />
O Rio <strong>de</strong> Janeiro foi o estado mais beneficiado com os royalties em<br />
2002. Foram 44,3% do total dos R$ 3,1 bilhões <strong>de</strong> royalties distribuídos.<br />
Destes, 47,5% foram para o governo do estado e o resto para os municípios.<br />
Aproximadamente 86,9% das reservas provadas <strong>de</strong> petróleo (ou<br />
8,5 bilhões <strong>de</strong> barris) e 48,3% das reservas provadas <strong>de</strong> gás natural no<br />
país (em um total <strong>de</strong> 220 bilhões <strong>de</strong> metros cúbicos) estavam localizadas<br />
no estado do Rio <strong>de</strong> Janeiro em 31/12/2001 (ANP, 2003). Dos 91<br />
municípios do estado, 60 receberam as in<strong>de</strong>nizações do petróleo em 2000.<br />
Isso representa 66% do total <strong>de</strong> municípios, <strong>de</strong>ntre os quais estão os<br />
municípios confortantes da Bacia <strong>de</strong> Campos, que, ao lado do estado do<br />
Rio <strong>de</strong> Janeiro, são os maiores beneficiados. São eles: Campos dos<br />
Goytacazes, Macaé, Rio das Ostras, Quissamã, Cabo Frio, Armação dos<br />
Búzios, São João da Barra, Casimiro <strong>de</strong> Abreu e Carapebus (CIDE, 2001).<br />
Esses municípios receberam, em 2002, mais <strong>de</strong> R$ 552 milhões (ou<br />
74,6% do total arrecadado pelos municípios fluminenses no ano) e 39% <strong>de</strong><br />
tudo que foi apurado pelo estado do Rio <strong>de</strong> Janeiro e seus municípios com<br />
os royalties. Campos dos Goytacazes (23,3%), seguido <strong>de</strong> Macaé (18,9%) e<br />
Rio das Ostras (10,2%) são os municípios com maior participação no total<br />
<strong>de</strong> royalties distribuídos aos municípios fluminenses em 2002.<br />
Estes royalties são parte significativa das receitas dos municípios.<br />
Verifica-se que houve um crescimento significativo <strong>de</strong>ssas participações<br />
no período 1997-2000. Em Campos, esperava-se receber, em royalties,<br />
aproximadamente 62% <strong>de</strong> sua receita no ano <strong>de</strong> 2000 (CIDE, 2001).<br />
Em Quissamã, município fluminense, a receita <strong>de</strong> royalties é superior a<br />
um salário mínimo per capita por mês e financia mais <strong>de</strong> 90% do<br />
orçamento municipal.<br />
Destaque para o município <strong>de</strong> Rio das Ostras que, no primeiro<br />
semestre <strong>de</strong> 2000, recebeu o equivalente a R$ 40 milhões, os quais já<br />
representam 560% das transferências constitucionais do período.<br />
Esperava-se que este município ultrapassasse os R$ 2.180/habitante <strong>de</strong><br />
receitas do petróleo/gás, representando quase a meta<strong>de</strong> da renda per<br />
51
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
capita para o país em 2000. Ou seja, o que se esperava arrecadar em<br />
2000 com os royalties do petróleo em alguns dos municípios confrontantes<br />
do estado do Rio <strong>de</strong> Janeiro, divididos pela população <strong>de</strong>stes, é quase a<br />
meta<strong>de</strong> da renda per capita nacional esperada. Estas cifras evi<strong>de</strong>nciam a<br />
magnitu<strong>de</strong> <strong>de</strong>sses números para as finanças públicas daqueles municípios.<br />
Fecam - Fundo Estadual <strong>de</strong> Conservação Ambiental<br />
No estado do Rio <strong>de</strong> Janeiro, parte dos royalties repassados pela União<br />
vai para o Fundo Estadual <strong>de</strong> Conservação Ambiental e Desenvolvimento<br />
Urbano (Fecam), que os utiliza em obras <strong>de</strong> melhoria ambiental e <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>senvolvimento sustentável. A constituição estadual <strong>de</strong>termina que 20%<br />
dos valores dos royalties do petróleo sejam aplicados em projetos ambientais 1 .<br />
Além do dinheiro dos royalties, o Fecam sobrevive das multas cobradas <strong>de</strong><br />
empresas poluidoras e outros recursos. O Fecam foi criado através da Lei<br />
no 1.060, <strong>de</strong> 10 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1986, para aten<strong>de</strong>r às necessida<strong>de</strong>s<br />
financeiras <strong>de</strong> programas e projetos ambientais, instituídos em consonância<br />
com o disposto no Artigo 263 (EC 15/2000), da Constituição Estadual.<br />
Os recursos do Fecam são usados em projetos ambientais <strong>de</strong><br />
diversos órgãos públicos estaduais, prefeituras municipais, universida<strong>de</strong>s<br />
e organizações não-governamentais (ONGs) sem fins lucrativos, cujos<br />
objetivos estejam em consonância com o objeto Fecam.<br />
Um Conselho Superior gerencia o Fecam e é formado por membros<br />
dos seguintes órgãos:<br />
52<br />
• Secretaria <strong>de</strong> Estado responsável pelo gerenciamento dos<br />
recursos do meio ambiente e <strong>de</strong>senvolvimento sustentável;<br />
• Secretaria <strong>de</strong> Estado responsável pela política <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>senvolvimento urbano;<br />
• Secretaria <strong>de</strong> Estado responsável pela fazenda e controle geral;<br />
• Ministério Público;<br />
1 Em agosto <strong>de</strong> 2003, <strong>de</strong>vido à crise financeira que se instalava no estado, a governadora<br />
do estado, Rosinha Garotinho, com apoio do secretário estadual <strong>de</strong> meio ambiente,<br />
Luiz Paulo Con<strong>de</strong>, e da assembléia legislativa, modificou a legislação e reduziu para<br />
5% o valor dos royalties repassados ao Fecam.
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
• Fe<strong>de</strong>ração das Indústrias do Estado do Rio <strong>de</strong> Janeiro;<br />
• Fundação Estadual <strong>de</strong> Engenharia do Meio Ambiente (FEEMA);<br />
• Secretaria <strong>de</strong> Estado <strong>de</strong> Recursos Hídricos;<br />
• Assembléia Permanente das Entida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Defesa do Meio<br />
Ambiente do Estado do Rio <strong>de</strong> Janeiro (APEDEMA/RJ).<br />
Consi<strong>de</strong>rações sobre o Fecam<br />
Existem, porém, críticas sobre a não utilização dos recursos em<br />
projetos ambientais, e sim em estradas e outros projetos não-ambientais.<br />
Além disso, coloca-se que o Fecam não está utilizando seus recursos<br />
<strong>de</strong> forma ágil. O <strong>de</strong>putado estadual Carlos Minc coloca em 2000 que<br />
[...] dados do Siafem (Sistema Integrado <strong>de</strong> Acompanhamento<br />
Financeiro do Estado e dos Municípios) <strong>de</strong>monstram que o<br />
governo aplicou em projetos do Fecam R$ 400 mil em 1999,<br />
quando <strong>de</strong>veria ter investido R$ 41 milhões. Até novembro<br />
<strong>de</strong> 2000, <strong>de</strong>veria ter aplicado R$ 130 milhões, mas só investiu<br />
R$ 7 milhões. (CARLOS MINC, 2000).<br />
Os seguintes fatores têm sido apresentados como responsáveis<br />
pela ina<strong>de</strong>quada implementação do Fecam:<br />
• falta <strong>de</strong> continuida<strong>de</strong> administrativa no estado;<br />
• pouco apoio político das autorida<strong>de</strong>s da área ambiental junto<br />
ao governo, para que os recursos do Fecam sejam utilizados<br />
<strong>de</strong> forma apropriada;<br />
• inexistência <strong>de</strong> uma boa coor<strong>de</strong>nação entre os setores<br />
ambiental e fiscal do governo;<br />
• pouca transparência no uso dos recursos;<br />
• pouca articulação dos membros do Conselho Superior.<br />
5.1.2 Compensações financeiras <strong>de</strong> mineração<br />
Os royalties <strong>de</strong> mineração ou Compensação Financeira pela<br />
Exploração dos Recursos Minerais (CFEM), têm natureza jurídica <strong>de</strong><br />
53
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
preço público e caráter in<strong>de</strong>nizatório, não sendo assim interpretados<br />
como tributo (www.dnpm.gov.br), e estão sob as regras do direito civil<br />
(e não do direito tributário). A fiscalização da arrecadação da CFEM<br />
fica a cargo do Departamento Nacional <strong>de</strong> Produção Mineral (DNPM),<br />
autarquia fe<strong>de</strong>ral, vinculada ao Ministério <strong>de</strong> Minas e Energia.<br />
A CFEM foi criada na Constituição <strong>de</strong> 1988 no seu Artigo 20. A<br />
Lei no 8.001, <strong>de</strong> 13 <strong>de</strong> março <strong>de</strong> 1990 (e Decreto no 1, <strong>de</strong> 11 <strong>de</strong> janeiro<br />
<strong>de</strong> 1991), <strong>de</strong>fine que o faturamento líquido para cálculo da CFEM<br />
correspon<strong>de</strong> ao total das receitas <strong>de</strong> vendas sobre a comercialização do<br />
produto mineral, excluídos os tributos inci<strong>de</strong>ntes (ICMS, COFINS,<br />
PIS), as <strong>de</strong>spesas <strong>de</strong> transporte e as <strong>de</strong> seguro. O Decreto no 1, <strong>de</strong><br />
1991, Artigo 15, <strong>de</strong>fine como sendo a saída por venda do produto mineral<br />
das áreas da jazida, mina, salina ou <strong>de</strong> outros <strong>de</strong>pósitos minerais, sempre<br />
após a última etapa do processo <strong>de</strong> beneficiamento adotado e antes <strong>de</strong><br />
sua transformação industrial. Estabelece ainda que, no caso <strong>de</strong><br />
substâncias minerais extraídas sob o regime <strong>de</strong> permissão <strong>de</strong> lavra<br />
garimpeira, o valor da compensação será pago pelo primeiro adquirente.<br />
As alíquotas cobradas vão <strong>de</strong> 0,2 a 3%, <strong>de</strong> acordo com o mineral<br />
explorado, discriminando substâncias <strong>de</strong> mesma categoria, natureza<br />
ou classe. As alíquotas <strong>de</strong> alguns minerais são:<br />
• Minério <strong>de</strong> alumínio, manganês, sal-gema e potássio: 3%.<br />
• Ouro: 1%, quando extraído por empresas mineradoras. Os<br />
garimpeiros são isentos.<br />
• Ferro, fertilizante, carvão e <strong>de</strong>mais substâncias minerais: 2%.<br />
• Pedras preciosas, pedras coradas lapidáveis, carbonados e<br />
metais nobres: 0,2%.<br />
A distribuição dos recursos é feita da seguinte forma:<br />
• 23% para os estados e o Distrito Fe<strong>de</strong>ral.<br />
• 65% para os municípios.<br />
• 12% para o Departamento Nacional <strong>de</strong> Produção Mineral<br />
(DNPM). O DNPM <strong>de</strong>stinará 2% à proteção ambiental nas<br />
regiões mineradoras, através do Instituto Brasileiro do Meio<br />
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), ou<br />
outro órgão fe<strong>de</strong>ral competente que o substituir.<br />
54
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
A produção mineral do Brasil e a arrecadação da CFEM<br />
O Brasil tem uma produção mineral que inclui <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong><br />
minerais com uma participação significativa <strong>de</strong> ferro, bauxita, ouro,<br />
rochas ornamentais, rocha fosfática, alumínio e cobre. O país é autosuficiente<br />
em muitos dos produtos minerais, e gran<strong>de</strong> exportador,<br />
<strong>de</strong>stacando-se como o maior exportador <strong>de</strong> minério <strong>de</strong> ferro do mundo,<br />
e mais ouro, manganês, granito, bauxita/alumínio, nióbio, estanho,<br />
fosfato e gemas. Por outro lado, o Brasil importa, além do petróleo bruto,<br />
carvão metalúrgico, potássio e metais não-ferrosos, como o cobre.<br />
A produção do Brasil <strong>de</strong> bens minerais primários chega a mais <strong>de</strong><br />
US$ 11,3 bilhões, representando cerca <strong>de</strong> 2% do Produto Interno Bruto<br />
(PIB) do país (2001), po<strong>de</strong>ndo chegar a 33% do PIB, se agregarmos a<br />
transformação dos seus bens primários, como metais e ligas, cimento,<br />
cerâmicas, fertilizantes, vidro e compostos químicos, além <strong>de</strong> outros.<br />
A arrecadação do CFEM vem crescendo a cada ano (TABELA<br />
4). Entre 1997 e 2001, o crescimento médio foi <strong>de</strong> 23% ao ano, <strong>de</strong>vido,<br />
principalmente, ao aumento da fiscalização.<br />
TABELA 4 – Arrecadação da CFEM no<br />
Brasil (em milhões <strong>de</strong> R$)<br />
FONTE – DNPM (www.dnpm.gov.br)<br />
NOTA – (*) Dados iniciais fornecidos pelo DNPM<br />
em 5 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 2003<br />
55
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
A arrecadação do estado da Bahia vem tendo variações ao longo<br />
dos anos (TABELA 5).<br />
56<br />
TABELA 5 – Arrecadação no estado da Bahia<br />
FONTE – DNPM (www.dnpm.gov.br)<br />
NOTA – (*) Dados iniciais fornecidos pelo DNPM em 5 <strong>de</strong><br />
maio <strong>de</strong> 2003<br />
Utilização e aplicação da CFEM<br />
O argumento por trás da utilização da CFEM é que a exploração<br />
<strong>de</strong> recursos minerais <strong>de</strong>ve trazer não só benefícios para os que exploram,<br />
mas também para as comunida<strong>de</strong>s, municípios e estados on<strong>de</strong> a lavra<br />
acontece, pois a ativida<strong>de</strong> mineradora causa impactos econômicos,<br />
sociais e ambientais. Como as reservas minerais são finitas, é necessário<br />
que se utilize parte da renda obtida com o mineral para mitigar os<br />
impactos da ativida<strong>de</strong> mineradora e apoiar o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> outras<br />
ativida<strong>de</strong>s para o benefício não só da presente, mas também das<br />
gerações futuras. Os recursos dos royalties minerais (CFEM) não po<strong>de</strong>m<br />
ser utilizados em pagamento <strong>de</strong> dívida ou no quadro permanente <strong>de</strong><br />
pessoal da União, dos estados, Distrito Fe<strong>de</strong>ral e dos municípios. Assim,<br />
a lei indica que as respectivas receitas da CFEM <strong>de</strong>verão ser aplicadas<br />
em projetos, que direta ou indiretamente revertam em prol da
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
comunida<strong>de</strong> local, na forma <strong>de</strong> melhoria da infra-estrutura, da<br />
qualida<strong>de</strong> ambiental, da saú<strong>de</strong> e da educação.<br />
Existem críticos quanto à cobrança da CFEM, argumentando<br />
que ela mina a competitivida<strong>de</strong> internacional dos minerais brasileiros.<br />
Porém, a CFEM é o único mecanismo <strong>de</strong> apropriação e distribuição<br />
direta <strong>de</strong> parcela da renda gerada pela mineração, e as exportações<br />
estão isentas do recolhimento do ICMS. Além disso, a ativida<strong>de</strong><br />
exportadora permite o acesso a vários mecanismos <strong>de</strong> incentivo à sua<br />
competitivida<strong>de</strong>. Em nível interno, a CFEM não gera guerra fiscal já<br />
que é igual para todos os estados da Fe<strong>de</strong>ração.<br />
Um dos gran<strong>de</strong>s problemas da CFEM é a sonegação. Porém, <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
1998, há um Convênio <strong>de</strong> Cooperação Técnica entre o DNPM e os<br />
estados e municípios, que vem tentando coibir a sonegação. Isto po<strong>de</strong><br />
estar por trás do aumento <strong>de</strong> arrecadação visto nos últimos anos<br />
(TABELA 4). Além disso, um outro fator que impe<strong>de</strong> a arrecadação é<br />
a interposição <strong>de</strong> recursos judiciais que pe<strong>de</strong>m a protelação, a revisão<br />
ou o cancelamento do recolhimento.<br />
Em suma, a CFEM é uma forma <strong>de</strong> compensar o custo da<br />
exploração mineral que <strong>de</strong>ve ser internalizado pelos empreen<strong>de</strong>dores.<br />
Sua utilização <strong>de</strong>ve ser mais bem <strong>de</strong>finida. O novo governo <strong>de</strong> Luís Inácio<br />
Lula da Silva pensa em direcionar mais royalties minerais para a área<br />
ambiental. Entre as propostas ambientais do novo governo, que se instalou<br />
em janeiro <strong>de</strong> 2003 (COLIGAÇÃO LULA PRESIDENTE, 2002), estão:<br />
• Efetuar avaliação no sistema <strong>de</strong> concessão <strong>de</strong> pesquisa e lavra<br />
para ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> mineração e fortalecer os órgãos<br />
responsáveis pela regulamentação e fiscalização ambiental<br />
dos empreendimentos <strong>de</strong> mineração e garimpo.<br />
• Exercer maior controle sobre o cumprimento <strong>de</strong> planos <strong>de</strong><br />
controle ambiental e <strong>de</strong> recuperação <strong>de</strong> áreas <strong>de</strong>gradadas.<br />
• Reformular a política <strong>de</strong> incentivos à produção e exportação<br />
<strong>de</strong> minerais, direcionando-a para ativida<strong>de</strong>s com maior<br />
valor agregado.<br />
57
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
58<br />
• Garantir o uso <strong>de</strong> equipamentos que evitem a contaminação<br />
por mercúrio nos processos <strong>de</strong> garimpo <strong>de</strong> ouro.<br />
• Estudar, a partir da legislação atual, a questão do pagamento<br />
<strong>de</strong> royalties pela exploração <strong>de</strong> minério, a exemplo do que<br />
ocorre com o petróleo.<br />
5.1.3 Compensações financeiras advindas da geração <strong>de</strong><br />
hidreletricida<strong>de</strong><br />
O parágrafo 1 o do Artigo 20 da Constituição Fe<strong>de</strong>ral assegura<br />
aos estados, Distrito Fe<strong>de</strong>ral, municípios e União participação nos<br />
resultados da utilização dos recursos hídricos advindos da geração <strong>de</strong><br />
eletricida<strong>de</strong>. A Compensação Financeira pela Utilização <strong>de</strong> Recursos<br />
Hídricos (CFURH) consiste em um valor que as concessionárias e<br />
empresas autorizadas a produzir energia por geração hidrelétrica pagam<br />
ao Estado pela utilização <strong>de</strong> recursos hídricos. O órgão responsável<br />
pela cobrança e pela distribuição da CFURH é a Agência Nacional <strong>de</strong><br />
Energia Elétrica (ANEEL). A distribuição dos recursos é feita entre os<br />
municípios, os estados e a União. De forma similar são distribuídos os<br />
royalties da hidrelétrica binacional <strong>de</strong> Itaipu 2 .<br />
As concessionárias têm recolhido 6,75% do valor da energia<br />
produzida como CFURH. O cálculo do valor segue a seguinte fórmula:<br />
CFURH = energia gerada x tarifa atualizada <strong>de</strong> referência x 6,75%<br />
A tarifa atualizada <strong>de</strong> referência é <strong>de</strong> R$ 32,58/MWh<br />
(www.aneel.gov.br, consultado em 1 <strong>de</strong>z. 2002).<br />
2 A ANEEL chama <strong>de</strong> Royalties somente os valores pagos pela Itaipu. Para outras<br />
usinas a compensação é chamada <strong>de</strong> Compensação Financeira pela Utilização <strong>de</strong><br />
Recursos Hídricos (CFURH).
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
A divisão e o gerenciamento dos recursos da CFURH e dos<br />
royalties <strong>de</strong> Itaipu são ditados pela Lei no 8.001, <strong>de</strong> 13/03/1990, e<br />
por outras legislações que a modificaram posteriormente. A<br />
distribuição é mensal. Os 6,75% da CFURH são direcionados da<br />
seguinte forma:<br />
I - 45% (quarenta e cinco por cento) aos estados;<br />
II - 45% (quarenta e cinco por cento) aos municípios;<br />
III - 3% (três por cento) ao Ministério do Meio Ambiente;<br />
IV - 3% (três por cento) ao Ministério <strong>de</strong> Minas e Energia;<br />
V - 4% (quatro por cento) ao Fundo Nacional <strong>de</strong><br />
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT),<br />
criado pelo Decreto-Lei no 719, <strong>de</strong> 31 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 1969, e<br />
restabelecido pela Lei no 8.172, <strong>de</strong> 18 <strong>de</strong> janeiro <strong>de</strong> 1991;<br />
VI - O percentual <strong>de</strong> 0,75% <strong>de</strong> CFURH é repassado à Agência<br />
Nacional <strong>de</strong> Águas (ANA).<br />
Na distribuição da compensação financeira, o Distrito Fe<strong>de</strong>ral<br />
receberá o montante correspon<strong>de</strong>nte às parcelas <strong>de</strong> estado e <strong>de</strong><br />
município. Geradoras, caracterizadas como Pequenas Centrais<br />
Hidrelétricas (PCHs), são dispensadas da taxa.<br />
Itaipu<br />
Itaipu supre por volta <strong>de</strong> 25% da energia elétrica consumida<br />
no Brasil, e 90% da paraguaia, sendo uma das maiores hidrelétricas<br />
do mundo. O royalty pago pela Itaipu Binacional, embora represente<br />
uma compensação financeira, consiste, na verda<strong>de</strong>, em uma<br />
transferência <strong>de</strong> direitos da União, por força do Tratado <strong>de</strong> Itaipu,<br />
para os estados e municípios. Até o início <strong>de</strong> 1991, a produção <strong>de</strong><br />
Itaipu gerou créditos <strong>de</strong> royalties unicamente à União. O pagamento<br />
<strong>de</strong>sses créditos foi negociado para ocorrer entre 1992 e 2001. Porém,<br />
<strong>de</strong>vido a diversos problemas, Itaipu pagou somente 31% dos royalties<br />
creditados até 1995. A partir <strong>de</strong> 1996, o pagamento dos royalties voltou<br />
a ser feito no prazo previsto em lei e as parcelas em atraso foram<br />
também sendo quitadas.<br />
59
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
Valores arrecadados<br />
Em 2002, estados e municípios receberam R$ 425,4 milhões <strong>de</strong><br />
CFURH. Os royalties <strong>de</strong> Itaipu geraram R$ 347 milhões para estados e<br />
municípios (TABELAS 6 e 7).<br />
60<br />
TABELA 6 – Valores pagos aos municípios pela geração <strong>de</strong><br />
eletricida<strong>de</strong> (em milhões <strong>de</strong> R$)<br />
FONTE – ANEEL (www.aneel.gov.br)<br />
TABELA 7 – Valores pagos aos estados pela geração <strong>de</strong><br />
eletricida<strong>de</strong> (em milhões <strong>de</strong> R$)<br />
FONTE – ANEEL (www.aneel.gov.br)
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
A Compensação Financeira pela Utilização <strong>de</strong> Recursos Hídricos<br />
(CFURH) para o estado da Bahia e seus municípios está apresentada<br />
na Tabela 8. Em 2002, mais <strong>de</strong> R$ 38 milhões foram recebidos.<br />
TABELA 8 – Compensação financeira para o estado da Bahia<br />
FONTE – ANEEL (www.aneel.gov.br)<br />
5.2 Cobrança pelo uso da água<br />
Na última década, o Brasil <strong>de</strong>u alguns passos importantes visando<br />
encontrar uma solução para o setor dos recursos hídricos. Em termos<br />
legais e organizacionais, foi feita a estruturação do sistema nacional <strong>de</strong><br />
gerenciamento <strong>de</strong> recursos hídricos pela Lei Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Recursos<br />
Hídricos n o 9.433/97, com <strong>de</strong>staque para a criação da Agência Nacional<br />
<strong>de</strong> Águas (ANA), e está sendo discutida no Congresso uma<br />
reestruturação do setor <strong>de</strong> saneamento pelo projeto <strong>de</strong> lei do<br />
saneamento PL-147/01.<br />
A cobrança pelo uso da água tem sido utilizada como instrumento<br />
<strong>de</strong> gestão nas duas discussões. A cobrança é vista como uma fonte <strong>de</strong><br />
61
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
recursos para financiamento, <strong>de</strong> maneira a incentivar um uso mais<br />
sustentável dos recursos hídricos que levaria a redução do <strong>de</strong>sperdício,<br />
investimento em tecnologias mais sustentáveis, aumento dos níveis <strong>de</strong><br />
tratamento <strong>de</strong> efluentes e utilização da água para ativida<strong>de</strong>s econômicas<br />
<strong>de</strong> maior valor agregado.<br />
A Lei no 9.433/97 prevê a cobrança pela água bruta utilizada<br />
para o abastecimento urbano, industrial ou agrícola, ou para a diluição<br />
<strong>de</strong> efluentes. A idéia é que ela induza os usuários à melhor utilização<br />
dos recursos hídricos, principalmente o industrial e o agrícola. A lei<br />
possibilita que até 7,5% dos recursos arrecadados possam ser <strong>de</strong>stinados<br />
a cobrir os custos administrativos e <strong>de</strong> monitoramento do sistema <strong>de</strong><br />
gestão. O resto <strong>de</strong>ve ser aplicado como previsto no plano <strong>de</strong><br />
investimentos aprovado pelo comitê <strong>de</strong> bacia, na bacia hidrográfica<br />
on<strong>de</strong> for gerada a cobrança.<br />
A cobrança também está prevista para a provisão dos serviços <strong>de</strong><br />
abastecimento e coleta e tratamento <strong>de</strong> efluentes, ou pela água tratada.<br />
Esta é a cobrança que talvez possa influenciar mais diretamente o<br />
comportamento do usuário doméstico. Ela ten<strong>de</strong> a induzir os usuários<br />
individuais a reduzir o uso da água. Po<strong>de</strong>, ainda, prover recursos para<br />
operação e manutenção dos serviços nos níveis atuais e também<br />
aumentar a eficácia e a eficiência dos sistemas <strong>de</strong> coleta e tratamento<br />
dos efluentes e <strong>de</strong> abastecimento. Dentro <strong>de</strong>ste contexto, vários estados<br />
brasileiros vêm adotando legislações e criando instituições estaduais<br />
específicas para a cobrança <strong>de</strong> água, dos quais <strong>de</strong>stacamos aqui São<br />
Paulo e Ceará.<br />
62<br />
5.2.1 Experiência do estado <strong>de</strong> São Paulo<br />
O estado <strong>de</strong> São Paulo propôs um sistema <strong>de</strong> cobrança similar ao<br />
francês (SANTOS, 2002). De acordo com este sistema, haverá a<br />
<strong>de</strong>finição <strong>de</strong> preços unitários básicos (PUBs) para cada fator <strong>de</strong> cobrança<br />
<strong>de</strong> forma uniforme para todas as bacias hidrográficas do estado. Para o<br />
preço final, os PUBs serão multiplicados por coeficientes multiplicadores
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
fixados por cada comitê <strong>de</strong> bacia, em função <strong>de</strong> fatores como tipo <strong>de</strong><br />
uso, classe do corpo hídrico e sazonalida<strong>de</strong>. Os coeficientes serão<br />
implantados <strong>de</strong> forma gradativa, <strong>de</strong> maneira que busquem a eficiência<br />
econômica ao uso da água, uma vez que os preços passariam a refletir a<br />
escassez ou outros fatores consi<strong>de</strong>rados importantes na utilização dos<br />
recursos hídricos.<br />
O valor total da cobrança está dividido entre os seguintes fatores:<br />
• Cobrança por captação: estima-se que representará um valor<br />
variando entre R$ 0,01/m3 e R$ 0,015/m3 para o setor<br />
industrial e doméstico.<br />
• Cobrança por consumo: o valor proposto <strong>de</strong>verá variar entre<br />
R$ 0,02/m3 (US$ 0.009/m3 ) e R$ 0,03/m3 , em função dos<br />
coeficientes multiplicadores.<br />
• Cobrança por carga poluente remanescente <strong>de</strong>:<br />
- Demanda Bioquímica <strong>de</strong> Oxigênio (DBO)<br />
- Demanda Química <strong>de</strong> Oxigênio (DQO)<br />
- Resíduo Sedimentável (RS)<br />
- Carga Inorgânica (CI): correspon<strong>de</strong>nte a metais, cianetos<br />
e fluoretos<br />
A cobrança por poluição inci<strong>de</strong> sobre diversos fatores <strong>de</strong> carga<br />
poluente <strong>de</strong> forma cumulativa. A cobrança por carga orgânica será<br />
efetuada duplamente por incidir sobre o parâmetro DBO e DQO. A<br />
cobrança por carga inorgânica (CI) engloba a cobrança por metais, por<br />
exemplo. Neste caso, o Preço Unitário Básico (PUB) previsto para carga<br />
inorgânica tem os coeficientes multiplicadores para diluição <strong>de</strong> efluentes<br />
estimados em valores unitários entre R$ 1,00 a R$ 2,00/kg <strong>de</strong> metal<br />
(BARTH, 2000 citado por SANTOS, 2002). A cobrança não muda<br />
com o aumento da toxicida<strong>de</strong> do poluente e os valores cobrados são<br />
baixos quando comparados aos <strong>de</strong> outros países.<br />
A arrecadação total estimada para a cobrança no estado <strong>de</strong> São<br />
Paulo é <strong>de</strong> aproximadamente R$ 594,2 milhões/ano, <strong>de</strong> acordo com o<br />
Plano Estadual <strong>de</strong> Recursos Hídricos 2000-2003.<br />
63
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
Reflexão sobre o sistema <strong>de</strong> cobrança <strong>de</strong> São Paulo<br />
As expectativas <strong>de</strong> receita possivelmente não serão alcançadas<br />
(SANTOS, 2002). Primeiro, há grupos <strong>de</strong> interesse que impõem<br />
dificulda<strong>de</strong>s no pagamento. Por exemplo, cerca <strong>de</strong> 29% da receita<br />
<strong>de</strong>veria provir do setor agrícola, que ten<strong>de</strong> a ser isento ou pagar valores<br />
muito reduzidos visto manter forte lobby contra a cobrança. Segundo,<br />
a legislação proposta prevê uma bonificação nos valores cobrados às<br />
indústrias que reduzirem os efluentes lançados, através <strong>de</strong> melhorias<br />
no processo produtivo ou investimento no tratamento da água residual.<br />
Com o tempo haverá, gradativamente, uma diminuição da contribuição<br />
<strong>de</strong>ste setor caso os preços sejam mantidos. Finalmente, há uma série<br />
<strong>de</strong> outros fatores que po<strong>de</strong>m dificultar o atendimento <strong>de</strong> metas na<br />
receita, tais como a dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> iniciar a cobrança por todos os<br />
parâmetros <strong>de</strong> poluição previstos e as discrepâncias com a cobrança em<br />
águas <strong>de</strong> domínio da União.<br />
Assim, uma nova previsão, <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rando-se a cobrança do<br />
setor agrícola, po<strong>de</strong>rá alcançar cerca <strong>de</strong> R$ 420 milhões <strong>de</strong> receita<br />
(SANTOS, 2002). Isto dará uma arrecadação anual <strong>de</strong><br />
aproximadamente R$ 13,00/habitante, consi<strong>de</strong>rando-se a população<br />
do estado em aproximadamente 33 milhões <strong>de</strong> habitantes.<br />
Algumas das principais vantagens do sistema <strong>de</strong> cobrança paulista<br />
são (SANTOS, 2002):<br />
64<br />
• Simplicida<strong>de</strong>: as regras são relativamente claras, facilitando a<br />
compreensão, aplicação e aceitabilida<strong>de</strong> pelo público técnico<br />
e leigo.<br />
• Separação entre os tipos <strong>de</strong> cobrança: o sistema paulista busca<br />
a separação entre cobrança por poluição e cobrança por<br />
captação e por consumo, facilitando a compreensão e a<br />
aceitação entre os diversos usuários, uma vez que a segunda<br />
ten<strong>de</strong> a ser mais baixa que a primeira.<br />
• Introdução gradativa <strong>de</strong> novos fatores: a fórmula <strong>de</strong> cálculo<br />
prevê introduzir gradativamente novos coeficientes
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
multiplicadores dos PUBs, à medida que se alterem alguns<br />
fatores como disponibilida<strong>de</strong> hídrica da bacia, tipo <strong>de</strong><br />
manancial, finalida<strong>de</strong> do uso, sazonalida<strong>de</strong> e localização dos<br />
pontos <strong>de</strong> captação/lançamento em relação à zona <strong>de</strong> recarga<br />
dos aqüíferos. Isto po<strong>de</strong> ajustar o instrumento <strong>de</strong> acordo com<br />
as necessida<strong>de</strong>s e as mudanças, buscando eficiência<br />
econômica e menos impacto ambiental.<br />
Porém, surgem algumas críticas ao mo<strong>de</strong>lo paulista (SANTOS,<br />
2002). Primeiro, não se leva em consi<strong>de</strong>ração as diferentes toxicida<strong>de</strong>s<br />
dos poluentes inorgânicos na cobrança, sendo esta aplicada somente sobre<br />
a carga total remanescente. Isto simplifica a adoção inicial do sistema, já<br />
que lhe confere simplicida<strong>de</strong> e operacionalida<strong>de</strong>, mas <strong>de</strong>ve-se pensar<br />
em introduzir a atribuição futura <strong>de</strong> diferentes pesos aos diferentes<br />
poluentes, como metais e cianetos, que compõem este fator <strong>de</strong> cobrança.<br />
Segundo, alguns especialistas criticam a cobrança por poluição<br />
realizada pela massa <strong>de</strong> poluente e não pela vazão <strong>de</strong> diluição requerida,<br />
apesar da prática internacional <strong>de</strong>sta última. Pelo que preconiza a Lei no 9.433/97 e para levar-se em conta objetivos <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> ambiental fixados<br />
para o corpo hídrico, a cobrança por poluição <strong>de</strong>veria incidir sobre a<br />
vazão <strong>de</strong> diluição requerida e não sobre a massa <strong>de</strong> poluente emitida.<br />
Finalmente, a cobrança por carga orgânica <strong>de</strong> incidência dupla<br />
sobre DBO e DQO quebra a transparência do sistema <strong>de</strong> cobrança e po<strong>de</strong><br />
levar a questionamentos. O usuário, em geral, associa diretamente cobrança<br />
e custos <strong>de</strong> remoção. Como a mesma tecnologia abate tanto DBO quanto<br />
DQO, o que nem sempre ocorre com outros parâmetros <strong>de</strong> poluição, seria<br />
recomendável que a cobrança incidisse sobre apenas um dos fatores.<br />
5.2.2 Experiência do estado do Ceará<br />
A cobrança pelo uso da água no Ceará começou a ser pensada<br />
da mesma forma que os sistemas francês e paulista, mas com o tempo e<br />
o início da implementação, o sistema cearense ficou bem diferente do<br />
paulista. O Decreto Estadual n o 24.264, <strong>de</strong> 12 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1996,<br />
65
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
complementado por uma <strong>de</strong>liberação do Conselho Estadual <strong>de</strong> Recursos<br />
Hídricos (CONERH), constitui a cobrança da água sobre o volume <strong>de</strong><br />
água bruta livre, ou aduzida por canais, captado/fornecido ao usuário.<br />
Não era feita a cobrança por poluição, como programada em São Paulo.<br />
Trata-se <strong>de</strong> cobrança por captação e adução <strong>de</strong> água bruta<br />
num estado semi-árido, on<strong>de</strong> a escassez é um problema persistente.<br />
No Ceará a gestão <strong>de</strong> recursos hídricos é fundamental para o estado,<br />
visto que o regime hidrológico dos rios intermitentes é instável, <strong>de</strong>vido<br />
a um regime pluviométrico irregular, tanto em nível mensal quanto<br />
anual (MACEDO, 2000).<br />
O objetivo inicial da cobrança é prover-se <strong>de</strong> recursos para a<br />
gestão, a operação e a manutenção do conjunto <strong>de</strong> estruturas hidráulicas<br />
que garantem a disponibilida<strong>de</strong> hídrica no estado, e não gerar recursos<br />
para investimentos em infra-estrutura (SANTOS, 2002). Os custos <strong>de</strong><br />
gestão envolvem:<br />
• custos com os 300 funcionários da Companhia <strong>de</strong> Gestão dos<br />
Recursos Hídricos (COGERH), que foi criada para gerenciar<br />
os recursos hídricos do estado;<br />
• gestão do sistema <strong>de</strong> monitoramento, com sua operação,<br />
manutenção e ampliação;<br />
• gestão do sistema <strong>de</strong> macromedição <strong>de</strong> alguns dos usuários<br />
mais importantes.<br />
Os gastos mensais da COGERH estavam em torno <strong>de</strong> R$ 800<br />
mil em 2000. No atual mo<strong>de</strong>lo, estes valores eram cobertos integralmente<br />
pela cobrança. O total arrecadado em tarifas <strong>de</strong> água bruta foi <strong>de</strong><br />
aproximadamente R$ 7,8 milhões no ano <strong>de</strong> 2000, com R$ 9,5 milhões<br />
estimados para 2001 (SANTOS, 2002). Porém, outras fontes <strong>de</strong> recursos<br />
têm que ser buscadas para cobrir novos investimentos e <strong>de</strong>preciação<br />
<strong>de</strong> estruturas e equipamentos.<br />
As tarifas arrecadadas pela COGERH são diferenciadas por<br />
setor <strong>de</strong> usuário e por sistema <strong>de</strong> adução com critérios específicos.<br />
A Secretaria <strong>de</strong> Recursos Hídricos estabelece os valores para a água<br />
aduzida por canais ou adutoras, com o objetivo <strong>de</strong> promover a<br />
66
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
recuperação dos custos <strong>de</strong> operação e manutenção relativos à<br />
reserva e à adução.<br />
Reflexão sobre o sistema <strong>de</strong> cobrança do Ceará<br />
A cobrança por captação e por consumo <strong>de</strong> água no Ceará atinge<br />
valores relativamente elevados, mesmo em face dos valores <strong>de</strong> São<br />
Paulo, pois este é um estado muito mais rico. A explicação disto está<br />
na limitada disponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> água no estado nor<strong>de</strong>stino e na natureza<br />
da cobrança, que é diferente no Ceará, por São Paulo fazê-la também<br />
pela carga <strong>de</strong> poluição. Assim, a cobrança por captação e por consumo<br />
parece pesar bem no bolso dos cearenses, que têm renda menor. Em<br />
2000, a cobrança era <strong>de</strong> R$ 1,40/(habitante.ano), para uma renda per<br />
capita relativamente baixa (R$ 2.631,00 em 1999).<br />
Existe uma forte resistência à cobrança pelo setor agrícola, que<br />
sempre foi acostumado a ter água subsidiada ou praticamente grátis. A<br />
lei coloca a cobrança para irrigação em todo estado. Porém, até 2002,<br />
somente parte dos recursos hídricos do estado está sob cobrança,<br />
especialmente os irrigantes do Vale do Acarape (R$ 0,004/m³), do Vale<br />
do Jaguaribe e usuários do Canal do Trabalhador (R$ 0,01/m³)<br />
(SANTOS, 2002).<br />
Por outro lado, os industriais não têm reclamado da cobrança,<br />
pois mesmo sendo um pouco alta, ela representa somente meta<strong>de</strong> do<br />
valor cobrado pela companhia estadual <strong>de</strong> abastecimento (CAGECE)<br />
antes <strong>de</strong> existir a COGERH. O importante é que as indústrias têm um<br />
abastecimento mais confiável e gerenciável a curto e médio prazos.<br />
Outro setor bem afetado, o <strong>de</strong> abastecimento público <strong>de</strong> água, não tem<br />
resistido à cobrança da COGERH. Um dos fatores é que a CAGECE,<br />
on<strong>de</strong> inci<strong>de</strong> boa parte da cobrança do setor <strong>de</strong> abastecimento <strong>de</strong> água,<br />
pertence ao estado.<br />
No Ceará, os comitês <strong>de</strong> gestão <strong>de</strong> bacias não têm tanto po<strong>de</strong>r<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão como em São Paulo e outros estados. Outro ponto importante,<br />
é que a COGERH tomou o papel das agências <strong>de</strong> bacia. A COGERH<br />
<strong>de</strong>termina valores e aplicação dos recursos. Assim, mesmo seguindo a<br />
67
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
legislação, o mo<strong>de</strong>lo cearense é mais estatal e centralizador do que o<br />
mo<strong>de</strong>lo proposto pela Lei no 9.433/97, <strong>de</strong>ixando pouco espaço para a<br />
socieda<strong>de</strong> civil participar das <strong>de</strong>cisões.<br />
Porém, o mo<strong>de</strong>lo cearense po<strong>de</strong> ser apropriado às condições em<br />
que se encontram os recursos hídricos do estado. Mais que a escassez<br />
<strong>de</strong> água, o estado do Ceará tem quase todos seus recursos hídricos, e<br />
estes são bastante interligados, sob o domínio estadual. Além disso, a<br />
arrecadação da COGERH não é muito alta. Esta centralização po<strong>de</strong><br />
ser mais eficiente, pois evita a dispersão dos recursos entre várias<br />
agências <strong>de</strong> bacias, que teriam custos para manter capacida<strong>de</strong><br />
institucional a<strong>de</strong>quada. Especialistas indicam que o mo<strong>de</strong>lo po<strong>de</strong> ser o<br />
mais apropriado para outros estados do Nor<strong>de</strong>ste. Porém, para melhor<br />
acolher os princípios legais da cobrança, são sugeridas algumas<br />
adaptações à aplicação da cobrança da água no Ceará, como, por<br />
exemplo, a separação entre a cobrança e o fornecimento <strong>de</strong> água bruta<br />
e a aplicação dos recursos nas bacias que os geraram, como sugerido<br />
pela lei (SANTOS, 2002).<br />
68<br />
5.3 ICMS Ecológico<br />
O ICMS e o fe<strong>de</strong>ralismo fiscal<br />
Existem diversos tipos <strong>de</strong> transferências intergovernamentais, que<br />
representam um mecanismo <strong>de</strong> distribuição <strong>de</strong> recursos entre unida<strong>de</strong>s<br />
<strong>de</strong> governo: governo fe<strong>de</strong>ral, estados e municípios. Estas transferências<br />
asseguram o cumprimento <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong>s das unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> governo<br />
como entes fe<strong>de</strong>rativos. Para os municípios, as transferências são <strong>de</strong><br />
suma importância.<br />
As transferências <strong>de</strong> recursos fiscais significam uma<br />
importante ferramenta econômica <strong>de</strong>stinada a compensar os entes<br />
fe<strong>de</strong>rativos por arrecadação em seu território e a reduzir as<br />
diferenças econômico-sociais regionais, especialmente as <strong>de</strong>fasagens<br />
<strong>de</strong> renda e capacida<strong>de</strong> fiscal.
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
A distribuição <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong>s e competências entre os entes<br />
da fe<strong>de</strong>ração é um dos <strong>de</strong>bates atuais do nosso fe<strong>de</strong>ralismo,<br />
especialmente agora que vêm sendo discutidas as reformas fiscais e<br />
tributárias.<br />
Um dos argumentos mais relevantes, <strong>de</strong> natureza doutrinária,<br />
sobre o arranjo fe<strong>de</strong>rativo coloca que a distribuição dos recursos <strong>de</strong>ve<br />
basear-se no princípio <strong>de</strong> responsabilida<strong>de</strong> sobre os serviços públicos<br />
oferecidos pelo ente fe<strong>de</strong>rativo <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> sua respectiva função<br />
(WATSON; ROARELLI, 1992).<br />
Assim, tendo-se em conta a importância que assume o Imposto<br />
sobre a Circulação <strong>de</strong> Mercadorias e Serviços (ICMS) 3 , como fonte <strong>de</strong><br />
financiamento para boa parte dos estados e municípios, há que<br />
consi<strong>de</strong>rar-se que a introdução <strong>de</strong> qualquer variável que interfira no<br />
rateio dos recursos totais do ICMS po<strong>de</strong> ocasionar impactos significativos<br />
e gran<strong>de</strong>s polêmicas. Na maioria das vezes, isto implica que alguns<br />
entes saiam beneficiados e outros se sintam prejudicados com a nova<br />
distribuição <strong>de</strong> recursos.<br />
O ICMS e a participação dos municípios ganham importância<br />
ainda maior com a Constituição <strong>de</strong> 1988, na medida em que a base <strong>de</strong><br />
recursos aumenta, com a ampliação da base <strong>de</strong> incidência do ICMS.<br />
Esta passa a incluir a tributação sobre combustíveis, energia elétrica,<br />
transportes e comunicações e minerais que, antes <strong>de</strong> 1988,<br />
representavam fonte <strong>de</strong> recursos da União.<br />
Além disso, outro importante fator, presente nas modificações<br />
promovidas pela Constituição <strong>de</strong> 1988, foi a elevação do percentual <strong>de</strong><br />
participação dos municípios no conjunto da arrecadação do ICMS, <strong>de</strong><br />
20 para 25%.<br />
3 Criado pela Constituição <strong>de</strong> 1967, com o nome <strong>de</strong> ICM. O “S” <strong>de</strong> Serviços foi<br />
introduzido após a Constituição <strong>de</strong> 1988. Ele é cobrado pelos governos estaduais<br />
sobre a movimentação <strong>de</strong> mercadorias e os serviços <strong>de</strong> comunicações, transportes e<br />
energia elétrica em seu território. Substituiu o Imposto sobre Vendas a Varejo e<br />
Consignações (IVVC), que era cobrado pelos governos estaduais até 1960.<br />
69
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
O índice <strong>de</strong> participação dos municípios no ICMS, também<br />
chamado <strong>de</strong> cota-parte do ICMS, tem essencialmente natureza<br />
compensatória, para recompensar parcialmente o retorno aos<br />
municípios dos recursos oriundos <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s econômicas sediadas<br />
na região. Ele teria a função primordial <strong>de</strong> gerar recursos para obras<br />
<strong>de</strong> infra-estrutura e serviços <strong>de</strong>stinadas a dar suporte e melhorar a<br />
logística das organizações do setor produtivo instaladas em seu<br />
território. Porém, apesar da natureza compensatória do ICMS, na<br />
realida<strong>de</strong> ele distribui recursos, por isso tem também como resultado<br />
uma natureza distributiva.<br />
Do total arrecadado com o ICMS, 25% seriam distribuídos<br />
aos municípios, segundo o que dispuser legislação estadual, e os<br />
75% restantes <strong>de</strong> acordo com o valor adicionado fiscal (VAF). Porém,<br />
muitos estados distribuíam os recursos correspon<strong>de</strong>ntes aos 25%,<br />
que po<strong>de</strong>riam sê-lo via legislação estadual, fundamentalmente sobre<br />
uma base <strong>de</strong> valor adicionado fiscal (VAF), que leva em<br />
consi<strong>de</strong>ração exclusivamente o nível <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> econômica do<br />
município.<br />
Desta forma, a ausência <strong>de</strong> novos critérios <strong>de</strong> distribuição dos<br />
recursos, associada muitas vezes à não regulamentação do percentual<br />
disponível via legislação estadual, tornava o mecanismo <strong>de</strong> distribuição<br />
do ICMS aos municípios altamente concentrador, visto que poucos<br />
municípios concentravam uma infra-estrutura <strong>de</strong> produção <strong>de</strong> bens e<br />
serviços e razoável nível <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> econômica. Para se ter uma idéia,<br />
no estado do Espírito Santo, a distribuição <strong>de</strong> ICMS per capita para a<br />
capital Vitória foi <strong>de</strong> R$ 433,63, contra R$ 51,70 no município vizinho<br />
<strong>de</strong> Cariacica, na Gran<strong>de</strong> Vitória (GARCIA, 2002), ou seja, uma<br />
diferença <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> oito vezes.<br />
Começam, porém, a surgir iniciativas que introduzem novos<br />
critérios <strong>de</strong> distribuição do ICMS aos municípios, induzindo a uma<br />
<strong>de</strong>sconcentração <strong>de</strong> receitas. Habilitadas pelas modificações feitas<br />
na Constituição <strong>de</strong> 1988, legislações estaduais introduzem novos<br />
critérios <strong>de</strong> distribuição da parcela <strong>de</strong> 25% dos recursos do ICMS aos<br />
municípios, tais como nível <strong>de</strong> saneamento, existência <strong>de</strong> políticas<br />
70
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
válidas <strong>de</strong> educação, cultura e proteção do patrimônio histórico e<br />
unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> conservação.<br />
Muitas das legislações estaduais têm o objetivo <strong>de</strong> reduzir o nível<br />
<strong>de</strong> concentração <strong>de</strong> receitas em poucos municípios. Elas tentam levar<br />
em conta as particularida<strong>de</strong>s regionais na distribuição, <strong>de</strong> maneira a<br />
buscar viabilização autônoma <strong>de</strong> políticas públicas <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento<br />
local em todas as regiões do estado.<br />
Entretanto, alguns especialistas apontam este caminho como uma<br />
saída parcial e não <strong>de</strong>finitiva, uma vez que o mecanismo <strong>de</strong> transferência<br />
do ICMS em análise tem natureza compensatória, e não redistributiva,<br />
diferentemente da que caracteriza o fundo <strong>de</strong> participação dos<br />
municípios, o FPM (para distribuição dos recursos do imposto <strong>de</strong> renda<br />
e IPI do governo fe<strong>de</strong>ral). Além disso, tem-se os limites e restrições do<br />
cálculo do valor adicionado fiscal, que <strong>de</strong>correm da dificulda<strong>de</strong> na<br />
apuração do agregado produzido pela área agrícola, ora pela isenção<br />
tributária <strong>de</strong> alguns produtos agropecuários, ora pela relação assimétrica<br />
existente entre os preços <strong>de</strong>stes produtos e os dos produtos industriais<br />
que absorvem produtos primários. Por outro lado, muitos estados não<br />
incluíram critérios mais redistributivos na regulamentação por meio <strong>de</strong><br />
legislações específicas da Constituição Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> 1988.<br />
O fe<strong>de</strong>ralismo institucionalizado <strong>de</strong>ve levar a uma ação <strong>de</strong><br />
coor<strong>de</strong>nação e cooperação para solucionar esses impasses, uma vez que<br />
se faz necessária a articulação das unida<strong>de</strong>s fe<strong>de</strong>radas na busca pela<br />
ação conjunta e cooperada. A distribuição do ICMS, assim como outros<br />
mecanismos <strong>de</strong> transferências fiscais, exige uma análise <strong>de</strong> seus efeitos<br />
e impactos, a mensuração e a compreensão <strong>de</strong> seus objetivos quando<br />
da formulação e da institucionalização dos objetivos sociais, econômicos<br />
e ambientais da socieda<strong>de</strong>.<br />
Esses objetivos incluem a redução das disparida<strong>de</strong>s regionais<br />
em seus aspectos socioeconômicos, a indução <strong>de</strong> políticas públicas,<br />
incluindo as políticas ambientais, e o aumento na capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua<br />
implementação, melhorando assim a qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida nos municípios.<br />
A iniciativa do ICMS Ecológico vai nesta direção.<br />
71
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
72<br />
5.3.1 O ICMS Ecológico no Paraná<br />
O ICMS Ecológico (ICMS-E) tem-se tornado uma importante<br />
ferramenta fiscal introduzida com a finalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> trazer recursos para<br />
os municípios que, <strong>de</strong> alguma forma, contribuem para a proteção<br />
ambiental em seus territórios. Tem sido, também, um incentivo à<br />
elaboração <strong>de</strong> políticas públicas municipais <strong>de</strong>stinadas à proteção<br />
ambiental.<br />
Primeiramente criado no estado do Paraná, o ICMS-E tem sido<br />
adotado em suas diversas formas por outros estados da fe<strong>de</strong>ração como<br />
importante suporte à criação e à administração <strong>de</strong> políticas ambientais.<br />
Ele simplesmente introduz novos critérios na repartição <strong>de</strong> receitas <strong>de</strong><br />
ICMS que são, por sua vez, repassadas aos municípios, via índice <strong>de</strong><br />
participação dos municípios no ICMS. Embora as avaliações existentes<br />
do ICMS-E ainda sejam preliminares, a implementação da idéia teve<br />
um impacto no curto prazo fazendo com que outros estados da fe<strong>de</strong>ração<br />
introduzissem legislações semelhantes, como em São Paulo e no Rio<br />
Gran<strong>de</strong> do Sul em 1993, e em Minas Gerais em 1995.<br />
A Constituição Fe<strong>de</strong>ral da República, <strong>de</strong> 1988, permitiu ao<br />
legislador estadual dispor livremente sobre os critérios <strong>de</strong> repartição<br />
<strong>de</strong> receitas entre os entes estadual e municipal, em relação à<br />
arrecadação da parcela <strong>de</strong> 25% do ICMS repassada ao município.<br />
Aproveitando esta possibilida<strong>de</strong> legal, o legislador, no caso do estado<br />
do Paraná, introduziu duas variáveis ambientais na composição dos<br />
recursos que seriam distribuídos aos municípios: unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />
conservação e <strong>de</strong> proteção <strong>de</strong> mananciais.<br />
A lei estadual do ICMS Ecológico (Lei Complementar Estadual<br />
n o 59 <strong>de</strong> 01/10/1991) introduz o critério ambiental nos 25% do ICMS<br />
que são repassados aos municípios. Ela estabelece que 5% do total <strong>de</strong><br />
ICMS que é repassado aos municípios sejam direcionados segundo<br />
critérios ambientais, levando-se em consi<strong>de</strong>ração a existência <strong>de</strong><br />
unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> conservação e a qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua gestão, e a proteção <strong>de</strong><br />
mananciais <strong>de</strong> recursos hídricos que abasteçam municípios vizinhos<br />
(TABELA 9).
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
TABELA 9 – Critérios para divisão do ICMS no Paraná<br />
FONTE – Loureiro, 1998, citando Secretaria <strong>de</strong> Estado da Fazenda do Paraná e Lei<br />
Complementar Estadual n o 9.491/90<br />
A iniciativa pioneira paranaense introduz uma dimensão<br />
ambiental que compensa os municípios do custo <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong> pela<br />
não utilização <strong>de</strong> parcelas <strong>de</strong> seu território para ativida<strong>de</strong>s econômicas<br />
tradicionais, como pecuária extensiva, agricultura e indústria. A nova<br />
lei criou uma fonte importante <strong>de</strong> recursos para aqueles municípios<br />
que com poucas alternativas <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento econômico têm boa<br />
parte <strong>de</strong> seu território sob conservação legal. Muitos políticos, às vezes<br />
com o apoio <strong>de</strong> populações locais, achavam que seus municípios eram<br />
prejudicados pela adoção <strong>de</strong> restrições ambientais, como a criação <strong>de</strong><br />
unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> conservação. Eles viam a impossibilida<strong>de</strong> legal <strong>de</strong> usarem<br />
seus recursos naturais para ativida<strong>de</strong>s tradicionais, como um<br />
impedimento ao <strong>de</strong>senvolvimento do município.<br />
O resultado da implementação do ICMS-E no Paraná aponta<br />
para diversos impactos no estado, como aumento da capacida<strong>de</strong><br />
financeira <strong>de</strong> alguns municípios entre os mais pobres, o crescimento<br />
no número e superfície <strong>de</strong> unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> conservação no estado, e a<br />
melhoria na qualida<strong>de</strong> da gestão das unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> conservação<br />
(LOUREIRO, 1998).<br />
73
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
Alguns municípios, entre os que antes recebiam somente poucos<br />
recursos do ICMS, foram amplamente beneficiados pelo ICMS-E. Por<br />
exemplo, a Tabela 10 mostra que os municípios <strong>de</strong> Antonina, Morretes<br />
e Guaraqueçaba tiveram mudança acentuada em sua classificação<br />
relativa no ranking <strong>de</strong> repasse do ICMS aos municípios pelo estado<br />
(BACHA, 1996). Para alguns municípios, o ICMS-E representa mais<br />
<strong>de</strong> 70% do ICMS repassado pelo estado (TABELA 11). Ao longo dos<br />
anos, também vem crescendo o número <strong>de</strong> municípios beneficiados<br />
pelo ICMS-E (TABELA 12).<br />
74<br />
TABELA 10 – Mudança no ranking dos municípios com a<br />
introdução do ICMS-E<br />
FONTE – Loureiro, 1994, p. 15, citado por Bacha, 1996<br />
TABELA 11 – Impacto do ICMS-E no total <strong>de</strong> ICMS recebido pelo<br />
município (janeiro-março <strong>de</strong> 1998)<br />
FONTE – Loureiro, 1998
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
TABELA 12 – Municípios paranaenses beneficiados pelo ICMS Ecológico<br />
<strong>de</strong> 1992 a 1998<br />
FONTE – Loureiro, 1998, citando DIBAP/IAP<br />
5.3.2 ICMS Ecológico em Minas Gerais<br />
No caminho da experiência inovadora do Paraná, o estado <strong>de</strong><br />
Minas Gerais introduziu a Lei no 12.040, <strong>de</strong> 1995, que visa a reformular<br />
os critérios <strong>de</strong> redistribuição <strong>de</strong> recursos do ICMS.<br />
Anteriormente, o Decreto-Lei no 32.771, <strong>de</strong> 1991, criou critérios<br />
para distribuição do ICMS aos municípios, que repassavam 94,1%,<br />
segundo o valor adicionado fiscal (VAF), 5,6% para os municípios<br />
mineradores e 0,3% para os recém-emancipados. Desta forma, os<br />
municípios com pouca ativida<strong>de</strong> econômica recebiam um percentual<br />
muito baixo <strong>de</strong> repasse.<br />
A Lei no 12.040/95 buscava novos critérios <strong>de</strong> redistribuição<br />
dos 25% do ICMS repassados aos municípios por legislação estadual,<br />
<strong>de</strong> tal forma que estes critérios levassem em consi<strong>de</strong>ração fatores<br />
ambientais, culturais e sociais dos municípios, além dos puramente<br />
econômicos como o VAF.<br />
Apesar <strong>de</strong> ser influenciada pela legislação paranaense, a<br />
legislação mineira inovava, pois ia além dos critérios ambientais. Para<br />
distribuição do ICMS eram consi<strong>de</strong>rados fatores como superfície do<br />
município, indicadores <strong>de</strong> educação, gastos com saú<strong>de</strong>, patrimônio<br />
cultural e geração <strong>de</strong> receita própria pelo município (ver TABELA 13).<br />
Por ser uma lei que redistribui os recursos do ICMS, a Lei n o 12.040/95 é<br />
chamada <strong>de</strong> Lei Robin Hood. Em 2000, foram introduzidas no governo<br />
Itamar Franco modificações na lei do ICMS-E <strong>de</strong> Minas Gerais, via Lei<br />
n o 13.803/2000, com novos critérios <strong>de</strong> redistribuição (TABELA 13).<br />
75
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
TABELA 13 – Critérios <strong>de</strong> distribuição do ICMS em Minas Gerais<br />
FONTE – Minas Gerais, 2003, citado por Gonçalves, 2003<br />
O percentual <strong>de</strong> ICMS no estado <strong>de</strong> Minas Gerais, <strong>de</strong>stinado<br />
aos municípios por critérios ambientais, é <strong>de</strong> 1%, ou 1/25, dos 25% da<br />
cota-parte distribuída aos municípios mineiros. Este percentual <strong>de</strong> 1%<br />
é distribuído aos municípios que dispõem <strong>de</strong> sistemas <strong>de</strong> tratamento ou<br />
disposição final <strong>de</strong> lixo ou esgoto sanitário com operação licenciada<br />
pelo órgão ambiental responsável e pelo Índice <strong>de</strong> Conservação dos<br />
Municípios (ICM). O ICM leva em consi<strong>de</strong>ração as unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />
conservação estaduais, fe<strong>de</strong>rais, municipais e particulares cadastradas<br />
junto ao órgão ambiental estadual.<br />
Houve um aumento na superfície das unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> conservação no<br />
estado, nos últimos anos; entre os fatores que explicam este aumento está<br />
possivelmente a introdução do ICMS Ecológico. Embora em Minas Gerais<br />
76
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
a parcela do ICMS <strong>de</strong>stinada ao meio ambiente seja menor que no estado<br />
do Paraná (1% em MG contra 5% no PR), a Lei Robin Hood parece ter<br />
estimulado uma ampliação das unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> conservação no estado. No<br />
período entre os anos <strong>de</strong> 1995 e 2000, os parques e reservas estaduais<br />
aumentaram 66,5% e os municipais 236%. No mesmo período, houve um<br />
crescimento <strong>de</strong> 77% nas Áreas <strong>de</strong> Proteção Ambiental (APAs) e <strong>de</strong> 68%<br />
nas Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs) (MAY et al., 2002).<br />
Algumas pesquisas indicam que o ICMS-E, apesar <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r ser<br />
um mecanismo importante para captação <strong>de</strong> recursos pelos municípios,<br />
ainda é <strong>de</strong>sconhecido por muitos políticos e técnicos municipais, sem<br />
falar da população em geral (MAY et al., 2002).<br />
Um aspecto fundamental da Lei Robin Hood em Minas Gerais é<br />
a complexida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua elaboração, negociação e implementação. As<br />
diversida<strong>de</strong>s regionais e culturais, as diferenças econômicas e o gran<strong>de</strong><br />
número <strong>de</strong> municípios do estado (aproximadamente 600) tornam difícil<br />
o consenso e a satisfação <strong>de</strong> todas as partes. Os municípios mais<br />
importantes economicamente, aqueles que têm mais po<strong>de</strong>r político e<br />
mais recebem ICMS, em geral resistem a mudanças nas regras <strong>de</strong><br />
distribuição do ICMS, porque receiam perda <strong>de</strong> receitas em um ambiente<br />
<strong>de</strong> restrição fiscal crescente. Na Lei Robin Hood, foi introduzida uma<br />
mudança gradual <strong>de</strong> 1995 a 1998 com <strong>de</strong>créscimo do percentual do VAF<br />
no cálculo do índice <strong>de</strong> participação dos municípios, ao mesmo tempo<br />
em que crescia o percentual dado ao critério ambiental. Este último<br />
subiu gradativamente <strong>de</strong> 0% em 1995 para 1% em 1998, enquanto o<br />
VAF caiu <strong>de</strong> 19,1% para 6,9% no mesmo período. Com a Lei no 13.803/00,<br />
o percentual do VAF ficou em 4,6% e houve um aumento da cota-mínima,<br />
que é distribuída a todos os municípios, <strong>de</strong> 3,89% para 5,5%.<br />
5.3.3 Avaliação do ICMS Ecológico (ICMS-E) no Paraná e<br />
em Minas Gerais<br />
Os efeitos do ICMS Ecológico como incentivo à proteção<br />
ambiental nos estados do Paraná e <strong>de</strong> Minas Gerais são ainda difíceis<br />
77
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
<strong>de</strong> serem observados <strong>de</strong>vido ao pouco tempo <strong>de</strong> seu estabelecimento e<br />
da influência <strong>de</strong> diversos outros fatores, mas alguns especialistas 4 e<br />
estudos realizados já expressam algumas consi<strong>de</strong>rações (LOUREIRO,<br />
1998; VEIGA NETO, 2000; MAY et al., 2002; GONÇALVES, 2003).<br />
O ICMS-E compensa os municípios que têm comprometido parte <strong>de</strong><br />
seu território para conservação ambiental. O imposto ecológico favorece<br />
àqueles municípios que intencionalmente buscam a proteção ambiental.<br />
Muitos <strong>de</strong>les <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> ver as Unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Conservação (UCs) <strong>de</strong><br />
forma negativa, e passam a vê-las como fonte geradora <strong>de</strong> receitas.<br />
Porém, gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong> municípios não está sequer ciente do<br />
ICMS-E. Outros, ainda, não se importam tanto porque o ICMS-E gera<br />
valores irrisórios para eles. Assim, um <strong>de</strong>safio é aumentar a cota do<br />
ICMS-E em alguns estados, para que se torne uma parte importante do<br />
total, e gerar uma campanha <strong>de</strong> informação sobre o ICMS-E entre os<br />
municípios dos estados on<strong>de</strong> ele já está estabelecido.<br />
O ICMS-E incentiva a criação <strong>de</strong> parcerias entre os setores público,<br />
privado e ONGs para conservação ambiental. Devido ao ICMS-E, em<br />
muitos municípios acontecem parcerias, entre os diversos setores da<br />
socieda<strong>de</strong>, para ampliar a área <strong>de</strong> conservação com RPPNs ou APAs.<br />
Os altos custos <strong>de</strong> criação <strong>de</strong> Unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Conservação (UCs) não<br />
permitem, muitas vezes, que os municípios tenham uma política mais<br />
ativa <strong>de</strong> estabelecimento <strong>de</strong> UCs públicas. Porém, em inúmeros casos,<br />
tem havido parceria para criação <strong>de</strong> RPPNs, com incentivo do município<br />
e uso <strong>de</strong> parte do ICMS-E gerado para dar algum benefício às RPPNs,<br />
como melhores acessos para ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> ecoturismo.<br />
A escolha dos critérios <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> ambiental para gerar o ICMS-E<br />
po<strong>de</strong> ser importante para criar os incentivos. Os critérios ambientais <strong>de</strong><br />
divisão do ICMS-E variam <strong>de</strong> um estado para outro. A geração <strong>de</strong><br />
critérios claros e facilmente mensuráveis ajuda no uso do instrumento<br />
e na sua comunicação aos municípios.<br />
4 Foram feitas consultas, por meio <strong>de</strong> entrevistas pessoais e por telefone, com<br />
especialistas do Instituto Ambiental do Paraná (IAP) e da Secretaria <strong>de</strong> Meio<br />
Ambiente e Desenvolvimento Sustentável <strong>de</strong> Minas Gerais (SEMAD).<br />
78
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
O ICMS-E tem servido para melhorar a percepção e a relação das<br />
comunida<strong>de</strong>s vizinhas com as UCs. Em alguns casos, com o ICMS-E as<br />
comunida<strong>de</strong>s ao redor das UCs têm modificado suas percepções daquelas<br />
como um impedimento a suas ativida<strong>de</strong>s econômicas e passam a vê-las<br />
como fonte <strong>de</strong> possíveis benefícios. Além disso, algumas <strong>de</strong>ssas<br />
comunida<strong>de</strong>s recebem benefícios do município, provenientes do ICMS-<br />
E, para implantar projetos, como reflorestamento e ecoturismo.<br />
Os recursos do ICMS-E não necessariamente são utilizados para<br />
ativida<strong>de</strong>s ligadas à proteção ambiental. Municípios não costumam utilizar<br />
os recursos do ICMS-E para ativida<strong>de</strong>s ambientais. Porém, alguns <strong>de</strong>les<br />
estabeleceram legislação específica ou políticas <strong>de</strong> utilização dos recursos<br />
do ICMS-E para fins <strong>de</strong> proteção ambiental. Outros aplicam os recursos<br />
para possibilitar o uso econômico das UCs, como melhoria <strong>de</strong> acesso ou<br />
divulgação.<br />
O ICMS-E tem uma característica redistributiva. Nos dois casos<br />
examinados, porém mais evi<strong>de</strong>nte no Paraná, o ICMS-E beneficia muitos<br />
municípios com poucas opções para <strong>de</strong>senvolver ativida<strong>de</strong>s econômicas<br />
tradicionais, e que não recebiam, antes do ICMS-E, muitos recursos<br />
do repasse do ICMS.<br />
Aspectos políticos e institucionais são importantes para introdução <strong>de</strong><br />
legislação <strong>de</strong> ICMS-E. No Paraná, a mudança na constituição foi a janela<br />
<strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong> política para introduzir o ICMS-E via legislação<br />
estadual. O aumento da cota <strong>de</strong> ICMS repassado aos municípios pelo<br />
estado, <strong>de</strong> 20 para 25%, evitou a ocorrência <strong>de</strong> redistribuições que<br />
geram conflitos entre municípios ganhadores e per<strong>de</strong>dores. Em Minas<br />
Gerais, a gradualida<strong>de</strong> na introdução da Lei Robin Hood amenizou a<br />
resistência dos municípios que, possivelmente, iriam per<strong>de</strong>r mais com<br />
a diminuição do peso do VAF e o aumento dos critérios ambientais.<br />
79
Separatriz 6
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
82<br />
6 Lições dos casos internacionais e nacionais<br />
Aanálise dos casos<br />
apresentados nesta<br />
publicação mostra-nos<br />
algumas lições fundamentais<br />
para enten<strong>de</strong>r os benefícios<br />
e as condições <strong>de</strong><br />
aplicabilida<strong>de</strong> dos instrumentos<br />
econômicos (IEs). Muitas<br />
vezes, economistas exaltam as<br />
vantagens dos IEs como se<br />
fossem a solução <strong>de</strong> todos os<br />
problemas ambientais (AN-<br />
DERSON; LEAL, 1992).<br />
Apesar <strong>de</strong> alguns dos inegáveis<br />
benefícios inovadores<br />
dos IEs, muitas das vantagens<br />
apresentadas são colocadas<br />
<strong>de</strong> forma teórica. Estudos<br />
empíricos mostram que existem<br />
limitações no uso <strong>de</strong> IEs.<br />
Estes, assim como os mecanismos<br />
<strong>de</strong> comando-e-controle<br />
(CEC), são <strong>de</strong> difícil<br />
implementação. Os pontos, a<br />
seguir, ilustram algumas lições<br />
que po<strong>de</strong>mos tirar dos<br />
instrumentos econômicos<br />
aplicados até agora.
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
A introdução dos instrumentos econômicos (IEs) não significa<br />
que os mecanismos <strong>de</strong> comando-e-controle não sejam necessários.<br />
Boa parte dos instrumentos econômicos utilizados conta com o<br />
respaldo <strong>de</strong> regulações tipo comando-e-controle (CEC). Estas<br />
regulações são necessárias para garantir um patamar mínimo a<strong>de</strong>quado<br />
<strong>de</strong> limites <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> ambiental individual e coletiva. Os IEs servem<br />
muitas vezes para dar incentivos aos que querem melhorar seus padrões<br />
além da regulação <strong>de</strong> comando-e-controle estabelecida e, assim,<br />
incentivar os que estão em patamares menores. Os casos <strong>de</strong> gestão dos<br />
recursos hídricos da China e da Holanda, vistos anteriormente, são<br />
exemplos <strong>de</strong> como isto po<strong>de</strong> ser feito. Assim, uma compatibilida<strong>de</strong> e<br />
uma interação entre os mecanismos <strong>de</strong> comando-e-controle e os<br />
instrumentos econômicos <strong>de</strong>vem ser pensadas em qualquer política <strong>de</strong><br />
adoção <strong>de</strong> IEs na gestão ambiental.<br />
Os instrumentos econômicos exigem um aparato institucional<br />
e legal para que funcionem bem.<br />
Não parece verda<strong>de</strong>ira a visão <strong>de</strong> que os instrumentos econômicos,<br />
<strong>de</strong> maneira geral, necessitem <strong>de</strong> menos aparato organizacional e legal do<br />
Estado para sua implementação a<strong>de</strong>quada do que os <strong>de</strong> CEC. Para a boa<br />
aplicação dos instrumentos econômicos é necessária uma série <strong>de</strong><br />
instituições, que farão com que os mercados funcionem da forma <strong>de</strong>sejada<br />
para a melhoria ambiental. Estas instituições somente existirão com o<br />
aparato organizacional do Estado para garantir, por exemplo, os direitos<br />
<strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong>, os cumprimentos dos contratos, o monitoramento e<br />
fiscalização ambientais e evitar os abusos do po<strong>de</strong>r econômico. O aparato<br />
organizacional para tanto exige recursos humanos e financeiros. Em todos<br />
os casos <strong>de</strong> instrumentos econômicos vistos, o papel do Estado foi<br />
fundamental para fazê-los funcionar.<br />
Muitos mecanismos <strong>de</strong> comando-e-controle fazem o papel<br />
<strong>de</strong> instrumentos econômicos.<br />
Alguns mecanismos <strong>de</strong> comando-e-controle, como as multas,<br />
servem como instrumentos econômicos para incentivar organizações a<br />
83
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
adotarem medidas <strong>de</strong> melhoria <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> ambiental. No caso dos<br />
efluentes industriais da China, a aplicação <strong>de</strong> multas recorrentes levou<br />
a um melhoramento da qualida<strong>de</strong> ambiental dos efluentes. A lição,<br />
neste caso, é que se po<strong>de</strong> formatar legalmente e organizacionalmente<br />
os mecanismos <strong>de</strong> comando-e-controle <strong>de</strong> maneira que introduzam<br />
incentivos econômicos para aquela finalida<strong>de</strong>.<br />
Em vários casos <strong>de</strong> aplicação dos instrumentos econômicos<br />
houve a participação <strong>de</strong> organizações do terceiro setor.<br />
As organizações não-governamentais (ONGs) têm <strong>de</strong>sempenhado<br />
um papel relevante na aplicação dos instrumentos econômicos. O próprio<br />
crescimento da importância da questão ambiental faz um paralelo com o<br />
crescimento das ONGs e dos sistemas <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão participativos, como os<br />
comitês gestores no Brasil. A diminuição do papel do estado e a ampliação<br />
do papel da <strong>de</strong>mocracia nas <strong>de</strong>cisões públicas fazem com que as ONGs<br />
aumentem seu espaço <strong>de</strong> atuação. Estas organizações muitas vezes têm a<br />
flexibilida<strong>de</strong> para atuar e inovar, que muitas vezes não existe no setor<br />
estatal ou mesmo no privado. Com isto elas criam parcerias e inventam<br />
novas formas <strong>de</strong> atuação na área ambiental. Vemos esta participação em<br />
vários casos que <strong>de</strong>screvemos nesta publicação. Na Holanda, os comitês<br />
<strong>de</strong> gestão <strong>de</strong> efluentes, com a participação <strong>de</strong> empresários e associações<br />
<strong>de</strong> moradores locais, foram fundamentais na implementação do sistema<br />
<strong>de</strong> cobrança por efluentes. Os próprios comitês <strong>de</strong> bacia que estão surgindo<br />
no Brasil utilizam muitos dos princípios dos comitês da Holanda. O<br />
Sistema Ponto Ver<strong>de</strong> <strong>de</strong> gestão <strong>de</strong> embalagens, que agora se encontra<br />
implantado em vários países da Europa, também se utiliza <strong>de</strong> uma<br />
organização não-governamental em interação com governos locais para<br />
a implementação do sistema.<br />
84<br />
Os instrumentos econômicos, muitas vezes, não são autosustentáveis<br />
financeiramente ou não servem para levantar<br />
recursos <strong>de</strong>stinados aos órgãos ambientais.<br />
O argumento <strong>de</strong> que os IEs servem para autofinanciar a gestão<br />
ambiental não parece válido em muitos casos. Apesar <strong>de</strong> ainda
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
necessitarmos <strong>de</strong> mais experiências empíricas para conhecermos o seu<br />
potencial, os IEs contribuem para levantar fundos para o Estado; a análise<br />
<strong>de</strong> alguns dos casos mais antigos <strong>de</strong> IEs na gestão ambiental, como a<br />
cobrança por entrada nos parques americanos, revelam-nos resultados<br />
diversos. Vemos que há casos em que são autofinanciáveis, como o<br />
sistema <strong>de</strong> parques estaduais <strong>de</strong> alguns estados dos EUA, como New<br />
Hampshire. Experiências recentes com RPPNs (Reservas Particulares<br />
do Patrimônio Natural) no Brasil mostram que elas po<strong>de</strong>m ser<br />
autofinanciáveis e até gerar lucros com ativida<strong>de</strong>s sustentáveis, como<br />
o turismo natural. Experiências em Bonito (MS) revelam que RPPNs<br />
po<strong>de</strong>m se pagar 5 . Em outros casos, como no sistema <strong>de</strong> parques nacionais,<br />
as receitas dos parques cobrem muito pouco dos investimentos <strong>de</strong><br />
implantação e dos custos <strong>de</strong> manutenção. No Brasil, o sistema <strong>de</strong><br />
parques nacionais é outro exemplo on<strong>de</strong> pouco se paga com a cobrança<br />
<strong>de</strong> entrada. Talvez, um dos poucos parques que autofinancia sua<br />
manutenção seja o <strong>de</strong> Iguaçu. Assim, o Estado não <strong>de</strong>ve esperar que os<br />
IEs sejam autofinanciáveis ou que possam gerar receitas para outros<br />
fins, mas sim que tenha que cobrir muitas vezes a aplicação <strong>de</strong> IEs na<br />
gestão ambiental pública.<br />
É importante um gradualismo na introdução dos instrumentos<br />
econômicos.<br />
As experiências empíricas <strong>de</strong>monstraram que a introdução dos<br />
instrumentos econômicos <strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong> forma gradual nos valores e padrões<br />
para permitir ajuste dos valores e adaptações dos atores regulados. Os<br />
casos <strong>de</strong> relativo sucesso dos IEs no controle dos efluentes das indústrias<br />
<strong>de</strong> azeite <strong>de</strong> palmeira na Malásia e na cobrança por efluentes na<br />
Holanda, assim como o ICMS-E em Minas Gerais, exemplificam como<br />
o gradualismo po<strong>de</strong> ser implementado. Mudanças muito bruscas na<br />
cobrança por taxas po<strong>de</strong>m causar resistência dos afetados e perda <strong>de</strong><br />
apoio político a medidas <strong>de</strong> proteção ambiental.<br />
5 Informação conseguida através <strong>de</strong> entrevistas com proprietários <strong>de</strong> RPPNs em<br />
Bonito (MS).<br />
85
Separatriz 7
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
88<br />
7 Obstáculos à implementação dos<br />
instrumentos econômicos no Brasil<br />
Apesar <strong>de</strong> todos os<br />
possíveis benefícios<br />
da introdução <strong>de</strong><br />
instrumentos econômicos<br />
(IEs) para implementação<br />
<strong>de</strong> políticas ambientais, a literatura<br />
e os diversos casos<br />
estudados sugerem uma série<br />
<strong>de</strong> fatores que dificultam<br />
ou po<strong>de</strong>m dificultar a sua<br />
implementação, assim como<br />
dos instrumentos <strong>de</strong> comando-e-controle.<br />
No Brasil, os<br />
principais problemas encontrados<br />
incluem:
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
• Escassez <strong>de</strong> recursos financeiros, técnicos e humanos <strong>de</strong> muitos<br />
dos órgãos ambientais do Brasil. Um estudo feito pelo próprio<br />
Ministério do Meio Ambiente sobre a gestão ambiental no Brasil<br />
mostra que a situação dos órgãos estaduais, integrantes do<br />
Sistema Nacional do Meio Ambiente, não é das melhores.<br />
Muitos não possuem recursos humanos e financeiros a<strong>de</strong>quados<br />
às suas responsabilida<strong>de</strong>s (BRASIL, 2001).<br />
• Inexistência, muitas vezes, <strong>de</strong> uma coor<strong>de</strong>nação a<strong>de</strong>quada<br />
das políticas ambientais com as políticas <strong>de</strong> outros setores da<br />
administração pública, e da socieda<strong>de</strong> em geral. A<br />
implementação <strong>de</strong> instrumentos econômicos (IEs) exige uma<br />
integração das políticas ambientais com as <strong>de</strong> outros setores<br />
para que tenha apoio político e organizacional e dê os<br />
resultados esperados.<br />
• Falta <strong>de</strong> apoio político para o setor ambiental. Políticas ambientais<br />
têm pouco apoio político se comparadas com outros tipos <strong>de</strong><br />
políticas mais ligadas a <strong>de</strong>senvolvimento econômico, como infraestrutura,<br />
energia e indústria. Este apoio é importante para<br />
introduzir os instrumentos econômicos e integrá-los com as<br />
políticas setoriais (PUPPIM DE OLIVEIRA, 2002).<br />
• Escassez <strong>de</strong> capacitação <strong>de</strong> técnicos para a introdução <strong>de</strong><br />
instrumentos econômicos na gestão ambiental. Seria<br />
necessária uma capacitação a<strong>de</strong>quada em economia e<br />
ciências sociais aplicadas, ou até mesmo a contratação <strong>de</strong><br />
novos quadros, para que os instrumentos econômicos possam<br />
ser <strong>de</strong>senhados e implementados nos órgãos ambientais.<br />
• Inexistência <strong>de</strong> capacida<strong>de</strong> institucional e técnica para<br />
implementação dos IEs, como equipamentos para<br />
monitoração, avaliação, etc.<br />
• Necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> um marco legal para<br />
habilitar a aplicação dos IEs no Brasil e compatibilizá-los com<br />
os instrumentos já existentes. Talvez uma reforma na legislação<br />
dos instrumentos <strong>de</strong> comando-e-controle seja importante.<br />
89
Separatriz 8
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
92<br />
8 Sugestões para o processo <strong>de</strong><br />
implantação <strong>de</strong> instrumentos econômicos<br />
Sugerimos que a introdução<br />
<strong>de</strong> instrumentos<br />
econômicos (IEs) nos<br />
órgãos do governo fe<strong>de</strong>ral,<br />
dos estados e municípios <strong>de</strong>ve<br />
seguir uma série <strong>de</strong> três etapas<br />
<strong>de</strong> análise que englobariam<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o objetivo inicial<br />
dos instrumentos até ao seu<br />
financiamento e à capacitação<br />
humana para implementá-los<br />
(baseado em ACQUA-<br />
TELLA, 2000). A seguir listamos<br />
algumas <strong>de</strong>stas etapas,<br />
especificamente para o caso<br />
do estado da Bahia.
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
Etapa 1 – Análise da política<br />
Os IEs <strong>de</strong>vem ser mecanismos utilizados <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> políticas<br />
públicas ambientais ou setoriais. Antes <strong>de</strong> <strong>de</strong>finir-se o mecanismo <strong>de</strong>vese<br />
pensar um passo antes, e ver quais políticas po<strong>de</strong>riam utilizar-se <strong>de</strong><br />
IEs para atingir seus objetivos. Assim, uma análise <strong>de</strong> política para<br />
implantação <strong>de</strong> IEs <strong>de</strong>ve:<br />
• Discutir nas esferas políticas a<strong>de</strong>quadas o uso <strong>de</strong> IEs. No<br />
caso da Bahia, um amplo <strong>de</strong>bate no Conselho Estadual <strong>de</strong><br />
Meio Ambiente (CEPRAM), e com técnicos <strong>de</strong> todos os<br />
órgãos do governo que serão possivelmente impactados, <strong>de</strong>ve<br />
ocorrer.<br />
• Definir o objetivo da política ambiental para uso dos IEs.<br />
Estes são instrumentos <strong>de</strong> gestão para atingir <strong>de</strong>terminados<br />
objetivos e não os objetivos da política em si.<br />
• Analisar os instrumentos <strong>de</strong> comando-e-controle existentes<br />
para implementar os objetivos da política ambiental. Como<br />
visto, os IEs <strong>de</strong>vem atuar coor<strong>de</strong>nados com os mecanismos<br />
<strong>de</strong> comando-e-controle para suplementá-los e complementálos,<br />
e não para substituí-los totalmente.<br />
• Avaliar os instrumentos fiscais e tributários que po<strong>de</strong>m ser<br />
incentivos perversos à melhoria da qualida<strong>de</strong> ambiental.<br />
Existem subsídios e tributos que incentivam negativamente<br />
os atores econômicos para preservação ambiental. Antes da<br />
introdução dos IEs, <strong>de</strong>ve-se buscar a retirada <strong>de</strong>stes<br />
instrumentos ou tentar utilizá-los <strong>de</strong> forma positiva para a<br />
proteção ambiental.<br />
• I<strong>de</strong>ntificar as causas e conseqüências dos problemas<br />
ambientais que a política ambiental preten<strong>de</strong> atacar e suas<br />
interações com os setores econômicos. Isto é importante para<br />
compreen<strong>de</strong>r as motivações e os papéis dos atores econômicos<br />
na geração dos problemas e na aceitação <strong>de</strong> suas<br />
conseqüências.<br />
93
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
Etapa 2 – Análise do tipo <strong>de</strong> instrumento econômico mais<br />
a<strong>de</strong>quado<br />
Uma vez <strong>de</strong>finida a política em que os IEs estarão trabalhando e<br />
os objetivos buscados, uma série <strong>de</strong> ações <strong>de</strong>verão ser implementadas<br />
para <strong>de</strong>finir que IE utilizar, tais como:<br />
94<br />
• Estudar teoricamente as diferentes opções <strong>de</strong> instrumentos<br />
econômicos existentes. Com isso, po<strong>de</strong>rá ter-se uma idéia <strong>de</strong><br />
quais possíveis impactos eles terão sobre os objetivos <strong>de</strong>sejados<br />
da política. Através <strong>de</strong> estudos e simulações po<strong>de</strong>-se estimar<br />
quanto <strong>de</strong> impacto <strong>de</strong>verão ter os IEs para atingir os objetivos<br />
ambientais <strong>de</strong>sejados.<br />
• Avaliar casos <strong>de</strong> experiências no uso dos IEs escolhidos. O<br />
conhecimento empírico <strong>de</strong> experiências bem e mal sucedidas<br />
dos IEs em outros lugares, através <strong>de</strong> estudos <strong>de</strong> caso,<br />
entrevistas e visitas técnicas. Deve-se levar em consi<strong>de</strong>ração<br />
as condições sociais, econômicas, culturais e institucionais<br />
em que as experiências com os IEs aconteceram.<br />
• Avaliar os impactos econômicos e sociais que cada IE po<strong>de</strong><br />
gerar na socieda<strong>de</strong>. Um estudo estimando estes impactos po<strong>de</strong><br />
servir para saber qual o nível a<strong>de</strong>quado do IE para que se<br />
obtenham os ajustes necessários. Deverá estimar-se os<br />
impactos positivos e negativos nos principais atores envolvidos<br />
(quem ganha e quem per<strong>de</strong>).<br />
• Avaliar qual a capacida<strong>de</strong> técnica, humana e organizacional<br />
necessária para implantação do IE <strong>de</strong>ntro do estado. A<br />
máquina do estado, nos diversos órgãos envolvidos com o<br />
projeto em questão, <strong>de</strong>verá estar preparada para tal.<br />
Possivelmente, equipamentos, pessoas com qualificação<br />
a<strong>de</strong>quada, reformulação organizacional e treinamento serão<br />
necessários para implantação do IE.<br />
• Estimar os custos e benefícios para aplicação do IE. Será<br />
necessária uma avaliação do impacto do IE na capacida<strong>de</strong>
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
<strong>de</strong> arrecadação do órgão ambiental. Po<strong>de</strong>rá estimar-se quais<br />
os custos, ou benefícios, os IEs implicaram na estrutura<br />
organizacional do Estado.<br />
• Avaliar as barreiras organizacionais e legais que possam existir<br />
para implementação das opções <strong>de</strong>sejadas. Os IEs, em geral,<br />
afetam alguns setores da economia e po<strong>de</strong>m ter barreiras<br />
legais e organizacionais para sua implementação. Uma<br />
avaliação <strong>de</strong>stas barreiras po<strong>de</strong> antecipar-se aos futuros<br />
problemas que os IEs escolhidos enfrentarão.<br />
• Analisar possíveis resistências ao uso dos IEs. Muitos <strong>de</strong>les<br />
terão impactos financeiros e econômicos em diversos atores<br />
individuais e organizacionais da socieda<strong>de</strong> civil. Uma<br />
negociação com estes atores, e até uma certa compensação<br />
em alguns casos, po<strong>de</strong> atenuar estes impactos. Porém, em<br />
geral, os atores privados são muitas vezes os que mais apóiam<br />
o uso <strong>de</strong> IEs.<br />
• Estudar os impactos na percepção pública. A falta <strong>de</strong><br />
informação, ou má interpretação dos objetivos para introduzir<br />
os IEs, po<strong>de</strong> causar resistências ou <strong>de</strong>sconhecimento na sua<br />
aplicação e impedir a obtenção dos resultados <strong>de</strong>sejados. Uma<br />
ampla consulta, colocando os principais impactos econômicos,<br />
sociais e ambientais dos IEs aos principais atores afetados,<br />
po<strong>de</strong> minimizar este ponto.<br />
Etapa 3 – Implementação do instrumento<br />
Uma vez <strong>de</strong>finidos os instrumentos econômicos a serem utilizados,<br />
uma série <strong>de</strong> ações <strong>de</strong>verá ser realizada para que eles possam ser<br />
implementados a<strong>de</strong>quadamente. Essas ações <strong>de</strong>vem incluir:<br />
• Informar aos diferentes atores sociais <strong>de</strong>ntro do CEPRAM<br />
e <strong>de</strong> outros setores do governo, das empresas e da socieda<strong>de</strong><br />
da intenção <strong>de</strong> aplicação dos IEs escolhidos. Desta forma,<br />
os atores sociais estarão preparados para a introdução dos<br />
95
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
96<br />
IEs e po<strong>de</strong>rão ajudar na divulgação e facilitar a<br />
implementação.<br />
• Definir e confirmar a função <strong>de</strong> cada um dos atores<br />
governamentais e não-governamentais na aplicação dos IEs.<br />
Uma discussão sobre como cada uma das organizações do<br />
governo irá atuar servirá para ajustar a coor<strong>de</strong>nação na<br />
implementação do instrumento.<br />
• Definir como serão gerenciados os recursos gerados no IE.<br />
Deverá ser <strong>de</strong>terminado, em acordo com diferentes órgãos<br />
do governo e com a socieda<strong>de</strong> civil, <strong>de</strong> que forma serão<br />
arrecadados os recursos advindos da aplicação do IE, quem<br />
irá gerenciá-los e <strong>de</strong> que forma serão gastos. Caso incorram<br />
custos para o estado, <strong>de</strong>verá ser indicado <strong>de</strong> on<strong>de</strong> será retirado<br />
o recurso para cobri-los.<br />
• Preparar os instrumentos legais para aplicação dos IEs. Gerar<br />
uma legislação, e aprová-la nos meios cabíveis, para que os<br />
IEs <strong>de</strong>finidos possam ser aplicados com respaldo legal. Nesta<br />
legislação, o papel <strong>de</strong> cada ator governamental e nãogovernamental<br />
po<strong>de</strong>rá ser <strong>de</strong>finido.<br />
• Capacitar os diversos órgãos governamentais para aplicação<br />
dos IEs. Deverá ser gerada capacida<strong>de</strong> técnica, humana e<br />
organizacional visando sua implementação. Po<strong>de</strong>rá ser<br />
necessário, para o funcionamento a<strong>de</strong>quado dos IEs, a compra<br />
<strong>de</strong> equipamentos, o treinamento, a contratação ou o<br />
remanejamento <strong>de</strong> pessoal e novos rearranjos organizacionais<br />
no órgão ambiental, em outros órgãos do governo, ou entre<br />
diferentes órgãos. Isto <strong>de</strong>ve ser feito, se possível, antes da<br />
aplicação do instrumento.<br />
• Gerar metas ambientais, econômicas e financeiras para o IE.<br />
O IE aplicado <strong>de</strong>verá ter suas metas ambientais, econômicas<br />
e financeiras <strong>de</strong> curto, médio e longo prazos <strong>de</strong>finidas visando<br />
uma política <strong>de</strong> adaptação do instrumento para buscar-se os<br />
resultados <strong>de</strong>sejados.
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
• Criar um sistema <strong>de</strong> monitoramento e avaliação dos impactos<br />
ambientais, econômicos e sociais do IE adotado. Este sistema<br />
servirá para saber <strong>de</strong> que forma as metas estão ou não sendo<br />
atingidas e <strong>de</strong> que forma adaptar o IE para atingir os objetivos<br />
<strong>de</strong>sejados. O sistema <strong>de</strong> metas, monitoramento e avaliação<br />
<strong>de</strong>verá ser divulgado publicamente e, possivelmente,<br />
acompanhado pelo CEPRAM.<br />
97
Separatriz 9
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
100<br />
9 Propostas para implantação <strong>de</strong><br />
instrumentos econômicos na Bahia<br />
Esta seção apresenta<br />
uma série <strong>de</strong> propostas<br />
<strong>de</strong> instrumentos<br />
econômicos que po<strong>de</strong>riam ser<br />
implantados na Bahia. A formatação<br />
final <strong>de</strong>stas propostas<br />
<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma discussão<br />
maior com as diferentes<br />
partes interessadas do governo<br />
e da socieda<strong>de</strong> civil para<br />
averiguar suas viabilida<strong>de</strong>s<br />
econômico-financeira, social<br />
e política. Porém, elas po<strong>de</strong>m<br />
servir como ponto <strong>de</strong> partida<br />
para um <strong>de</strong>bate mais profundo<br />
sobre a efetiva implantação<br />
<strong>de</strong> instrumentos econômicos<br />
na Bahia, especialmente<br />
agora que começa a discutir-se,<br />
nos diversos níveis<br />
<strong>de</strong> governo e na socieda<strong>de</strong><br />
civil, a reforma tributária.
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
9.1 Proposta para implantação do ICMS<br />
Ecológico ou Cidadão<br />
Como vimos anteriormente, o ICMS Ecológico ou Cidadão<br />
(ICMS-E) vem sendo usado em vários estados brasileiros. As evidências<br />
iniciais apontam que o ICMS-E tem tido um impacto positivo na<br />
efetivida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ações locais que buscam um <strong>de</strong>senvolvimento mais<br />
sustentável.<br />
A proposta para a introdução do ICMS-E na Bahia, aqui<br />
apresentada, objetiva a criação <strong>de</strong> um instrumento que impulsione os<br />
municípios a incrementar suas políticas <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento sustentável.<br />
Primeiro, o ICMS-E po<strong>de</strong> criar um incentivo econômico, através <strong>de</strong><br />
mais repasses do ICMS, para os municípios que avançarem na melhoria<br />
<strong>de</strong> alguns aspectos ligados ao <strong>de</strong>senvolvimento sustentável. Isto os<br />
estimularia a pensar nestes aspectos como uma estratégia <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>senvolvimento. Hoje, não existe nenhum mecanismo que apóie ou<br />
incentive os municípios na implementação <strong>de</strong> melhorias ambientais,<br />
diretamente. Esse incentivo seria importante principalmente para os<br />
municípios com poucas fontes <strong>de</strong> geração <strong>de</strong> recursos públicos, em geral<br />
os mais pobres. O ICMS-E po<strong>de</strong>ria servir como uma fonte <strong>de</strong> recursos<br />
para implementação <strong>de</strong> políticas <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento sustentável<br />
municipais. Estes recursos po<strong>de</strong>m, inclusive, ter sua utilização<br />
contingenciada para áreas específicas, como gestão <strong>de</strong> Unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />
Conservação (UCs) e mananciais. Finalmente, o ICMS-E seria uma<br />
forma <strong>de</strong> os municípios serem “pagos” por seus serviços ecológicos (como<br />
proteção da biodiversida<strong>de</strong> e <strong>de</strong> mananciais) e por abrir mão da utilização<br />
<strong>de</strong> espaços para outros fins que po<strong>de</strong>riam gerar receitas municipais<br />
(como a implantação <strong>de</strong> indústrias).<br />
Para a criação do ICMS-E na Bahia, uma modificação na<br />
legislação estadual <strong>de</strong> distribuição do ICMS <strong>de</strong>ve ser introduzida. Neste<br />
caso, critérios socioambientais participariam na <strong>de</strong>finição do índice <strong>de</strong><br />
participação dos municípios, responsável pela distribuição <strong>de</strong> 25% do<br />
total da cota do ICMS que são repassados àqueles via princípios da<br />
legislação estadual.<br />
101
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
A proposta<br />
Esta proposta é baseada, em linhas gerais, nas experiências<br />
<strong>de</strong> ICMS-E dos estados do Paraná e <strong>de</strong> Minas Gerais e em uma<br />
outra <strong>de</strong> ICMS Cidadão inicialmente discutida, internamente, no<br />
âmbito do Centro <strong>de</strong> Recursos Ambientais (CRA) e com alguns<br />
parceiros.<br />
O valor sugerido para o ICMS-E correspon<strong>de</strong> a 5% do total da<br />
parcela <strong>de</strong> ICMS repassada aos municípios. Este percentual é o mesmo<br />
adotado no estado pioneiro do Paraná, que tem alcançado bons<br />
resultados na sua implementação.<br />
O ICMS-E seria distribuído aos municípios <strong>de</strong> acordo com o índice<br />
<strong>de</strong> participação daqueles, usando critérios socioambientais. Sugere-se<br />
a utilização <strong>de</strong> três critérios que gerariam o índice <strong>de</strong> participação<br />
referido:<br />
102<br />
• conservação ambiental (2%), que virá do Índice <strong>de</strong><br />
Conservação Ambiental (ICA);<br />
• saneamento ambiental (2%), que virá do Índice <strong>de</strong><br />
Saneamento Ambiental (ISA);<br />
• proteção dos mananciais (1%), que virá do Índice <strong>de</strong> Proteção<br />
<strong>de</strong> Mananciais (IPM).<br />
Estes critérios seriam calculados utilizando indicadores-se<br />
quantitativos e qualitativos, que iriam refletir o tamanho dos recursos<br />
protegidos e a qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> gestão <strong>de</strong>stes mesmos recursos.<br />
O indicador <strong>de</strong> participação do ICMS-E <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminado<br />
município “i” seria o somatório <strong>de</strong> ICA, ISA e IPM. O percentual total<br />
para todos os municípios <strong>de</strong>ve totalizar 5%.<br />
I ICMS-Ei = ICA i + ISA i + IPM i
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
Critério <strong>de</strong> conservação ambiental – Índice <strong>de</strong> Conservação<br />
Ambiental - ICA (2%)<br />
Este critério seria responsável por 2%, no índice <strong>de</strong> participação<br />
dos municípios no ICMS-E, e refletiria as unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> conservação<br />
(UCs) existentes no município, sejam elas fe<strong>de</strong>rais, estaduais ou<br />
municipais. Ele seria dividido entre critérios quantitativos (Auc e Cuc)<br />
e qualitativo (Guc), explicados a seguir, os quais gerarão um Índice <strong>de</strong><br />
Conservação Ambiental (ICA).<br />
Os critérios quantitativos refletiriam dados objetivos existentes<br />
sobre a unida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conservação, e seriam proporcionais à superfície<br />
<strong>de</strong>sta área e sua categoria <strong>de</strong> acordo com o Sistema Nacional <strong>de</strong><br />
Unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Conservação (SNUC).<br />
O primeiro critério é a Área da Unida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Conservação (Auc).<br />
Para serem consi<strong>de</strong>radas para fins do ICMS-E, as UCs <strong>de</strong>vem ser<br />
reconhecidas oficialmente pelo estado e estarem registradas no<br />
Cadastro Estadual <strong>de</strong> Unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Conservação (CEUC). Para serem<br />
registradas no CEUC as UCs <strong>de</strong>vem conter: (i) publicação oficial do<br />
diploma legal instituidor da UC; (ii) cópia do comprovante <strong>de</strong><br />
dominialida<strong>de</strong> para Unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Conservação <strong>de</strong> domínio público; (iii)<br />
plano <strong>de</strong> manejo contendo o zoneamento da UC, <strong>de</strong>vidamente aprovado<br />
pelo órgão responsável (se for uma UC fe<strong>de</strong>ral ou municipal) e pela<br />
respectiva Câmara Municipal. As leis <strong>de</strong> uso e ocupação do solo<br />
municipal <strong>de</strong>vem estar compatíveis com o zoneamento proposto; (iv)<br />
mapa e memorial <strong>de</strong>scritivo, o qual <strong>de</strong>verá ser assinado e conter o<br />
registro profissional do(s) técnico(s) responsável(s) pelas informações.<br />
O memorial <strong>de</strong>scritivo tem como objetivo apresentar o perfil da área,<br />
contendo seus limites <strong>de</strong>finidos, dimensão territorial, importância<br />
ecológica e <strong>de</strong>scrições básicas (em um documento a ser <strong>de</strong>finido<br />
posteriormente pelas autorida<strong>de</strong>s responsáveis).<br />
Um fator multiplicador relacionado à categoria da UC no SNUC,<br />
ou Categoria da Unida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Conservação (Cuc), será <strong>de</strong>terminado <strong>de</strong><br />
maneira a consi<strong>de</strong>rar as diferentes limitações <strong>de</strong> uso do solo <strong>de</strong>stas<br />
áreas. Os valores <strong>de</strong>ste fator po<strong>de</strong>m ser sugeridos como:<br />
103
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
• Cuc = 1,0 para UC <strong>de</strong> Proteção Integral<br />
• Cuc = 0,5 para UC <strong>de</strong> Uso Sustentável<br />
Um critério qualitativo irá refletir a qualida<strong>de</strong> da Gestão da<br />
Unida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Conservação (Guc). Isto implica a existência <strong>de</strong> ações <strong>de</strong><br />
planejamento, implementação e manutenção das UCs, através <strong>de</strong> um<br />
Plano <strong>de</strong> Gestão com execução comprovada <strong>de</strong> projetos e programas<br />
<strong>de</strong> conservação e <strong>de</strong>senvolvimento da área. Este critério po<strong>de</strong>rá variar<br />
<strong>de</strong> 0,0 a 1,0 (com escalas <strong>de</strong> 0,1) e será multiplicativo. Para UCs<br />
municipais, esta informação <strong>de</strong>ve ser fornecida pelo Conselho Municipal<br />
<strong>de</strong> Meio Ambiente ao órgão competente do estado, que fará inspeções<br />
periódicas para verificação das informações apresentadas. Caso não<br />
seja produzido, ele será consi<strong>de</strong>rado 0 (zero).<br />
O índice “ICA ” <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminado município “i”, que estabeleceria<br />
i<br />
o quanto dos 2% do ICMS-E ele receberia, seria o somatório da<br />
multiplicação dos critérios Auc, Cuc e Guc, para todas as unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />
conservação (ou parte <strong>de</strong>las) cadastradas em seu território (j), divididos<br />
pelo somatório da multiplicação dos critérios Auc, Cuc e Guc, para<br />
todas as Unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Conservação (ou parte <strong>de</strong>las) cadastradas no<br />
território do estado da Bahia:<br />
ICA i = 2% x [Σ (Auc j x Cuc j x Guc j ) i ] / [Σ (Auc x Cuc x Guc) total ]<br />
104<br />
A soma <strong>de</strong> todos os índices municipais totaliza 2%.<br />
Critério <strong>de</strong> saneamento ambiental (2%)<br />
Este critério será refletido por meio <strong>de</strong> um Índice <strong>de</strong> Saneamento<br />
Ambiental (ISA), que espelhará as condições <strong>de</strong> gestão (coleta e<br />
disposição a<strong>de</strong>quada) do lixo e do esgoto. O ISA será composto dos<br />
indicadores <strong>de</strong> Gestão do Lixo Doméstico (GLD), <strong>de</strong> Gestão <strong>de</strong> Coleta<br />
Seletiva (GCS) e <strong>de</strong> Gestão <strong>de</strong> Esgotamento Sanitário (GES).<br />
a) Gestão do Lixo Doméstico (GLD) com valor 1,0 se o<br />
município dispuser a<strong>de</strong>quadamente o lixo doméstico, através
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
<strong>de</strong> sistema(s) <strong>de</strong>vidamente licenciado(s) ambientalmente,<br />
com atendimento a pelo menos 90% da população urbana do<br />
município;<br />
b) Gestão <strong>de</strong> Coleta Seletiva (GCS) com valor 0,5 se o município<br />
mantiver sistema <strong>de</strong> coleta seletiva com reaproveitamento<br />
<strong>de</strong> pelo menos 40% do material reciclável;<br />
c) Gestão <strong>de</strong> Esgotamento Sanitário (GES) com valor 0,5 se o<br />
município tratar a<strong>de</strong>quadamente os esgotos domésticos,<br />
através <strong>de</strong> sistema(s) <strong>de</strong>vidamente licenciado(s) pelo<br />
CEPRAM, com atendimento a pelo menos 50% da população<br />
urbana do município.<br />
As informações serão fornecidas pelo Conselho Municipal <strong>de</strong> Meio<br />
Ambiente ao órgão competente do estado, que fará inspeções periódicas<br />
para verificação das informações apresentadas.<br />
O Índice <strong>de</strong> Saneamento Ambiental “ISAi” <strong>de</strong> um município<br />
“i” será calculado para distribuir os 2% do ICMS-E. Ele seria o somatório<br />
dos critérios GLD, GCS e GES do município, divididos pelo somatório<br />
<strong>de</strong> GLD, GCS e GES para todos os municípios do estado da Bahia.<br />
ISA i = 2% x (GLD j + GCS j + GES i ) / [Σ (GLD + GCS + GES) total ]<br />
A soma <strong>de</strong> todos os índices municipais totaliza 2%.<br />
Critério <strong>de</strong> proteção dos mananciais (1%)<br />
Este critério irá gerar o Índice <strong>de</strong> Proteção <strong>de</strong> Mananciais (IPM)<br />
para aqueles municípios que contenham mananciais <strong>de</strong> água para<br />
abastecimento público <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> seus territórios. O IPM terá critérios<br />
quantitativo e qualitativo. O critério quantitativo será a Área do<br />
Manancial (AM), que <strong>de</strong>verá ter sua criação <strong>de</strong>terminada oficialmente<br />
pelo Conselho Municipal <strong>de</strong> Meio Ambiente e cadastrada junto ao<br />
órgão competente do estado. Haverá também um Indicador <strong>de</strong> Gestão<br />
105
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
(IG) da boa qualida<strong>de</strong> do manancial, que será aferida através da<br />
verificação <strong>de</strong> respeito ambiental à área do manancial e <strong>de</strong> inexistência<br />
<strong>de</strong> quaisquer lançamentos <strong>de</strong> efluentes, industriais ou domésticos, não<br />
tratados, diretamente em suas águas. Este critério po<strong>de</strong>rá variar <strong>de</strong> 0,0<br />
a 1,0 (com escalas <strong>de</strong> 0,1) e será multiplicativo. O IG <strong>de</strong>ve ser<br />
comunicado oficialmente, a cada ano, pelo Conselho Municipal <strong>de</strong><br />
Meio Ambiente ao órgão competente do estado, que fará inspeções<br />
periódicas para verificação das informações apresentadas.<br />
O Índice <strong>de</strong> Proteção <strong>de</strong> Mananciais “IPMi” <strong>de</strong> um município<br />
“i” será calculado para distribuir 1% do ICMS-E. Ele seria o somatório<br />
da multiplicação dos critérios AM e IG <strong>de</strong> todos os mananciais do<br />
município (j), divididos pelo somatório <strong>de</strong> AM x IG para todos os<br />
mananciais cadastrados do estado da Bahia:<br />
106<br />
IPM i = 1% x [Σ (AM j x IG j ) i ] / [Σ (AM x IG) total ]<br />
Coleta das informações para os indicadores do ICMS-E<br />
Todas as informações para a <strong>de</strong>finição dos indicadores ambientais<br />
municipais citados serão fornecidas pelos Conselhos Municipais <strong>de</strong> Meio<br />
Ambiente ao órgão estadual competente, anualmente. Caso o município<br />
não tenha um conselho municipal <strong>de</strong> meio ambiente, este <strong>de</strong>verá ser<br />
criado por legislação municipal com a participação da socieda<strong>de</strong> civil<br />
organizada. O órgão estadual competente <strong>de</strong>terminará inspeções<br />
periódicas para verificação das informações apresentadas. Uma vez<br />
estabelecidos os índices, que terão valida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um ano, o órgão<br />
competente irá repassá-los para a Secretaria <strong>de</strong> Fazenda do Estado.<br />
Os indicadores e sua coleta têm que ser simples para facilitar, e<br />
não onerar, a gestão do ICMS-E. Indicadores complexos e sistemas<br />
complicados <strong>de</strong> coleta po<strong>de</strong>m inviabilizar a execução do ICMS-E, ou<br />
drenar parte dos seus recursos para sua gestão, principalmente em um<br />
estado como a Bahia com mais <strong>de</strong> 400 municípios.
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
Valores estimados para o ICMS-E na Bahia<br />
Seria direcionado um valor <strong>de</strong> 5% do ICMS distribuído aos<br />
municípios baianos para o ICMS Ecológico. Em 2002, foi repassado algo<br />
em torno <strong>de</strong> 1,24 bilhão <strong>de</strong> reais aos municípios baianos por conta do<br />
ICMS (BAHIA, 2003). Desta forma, 5% <strong>de</strong>ste valor (ICMS-E)<br />
representaria um montante <strong>de</strong> aproximadamente 62 milhões <strong>de</strong> reais<br />
anuais. Para se ter uma idéia, este valor correspon<strong>de</strong>ria a 86% do valor<br />
total <strong>de</strong>dicado à gestão ambiental pelo estado em 2002, ou seja, um<br />
pouco mais <strong>de</strong> 72 milhões <strong>de</strong> reais (BAHIA, 2003). Portanto, o ICMS-<br />
E po<strong>de</strong> contribuir <strong>de</strong> forma significativa para a implementação <strong>de</strong> ações<br />
na área <strong>de</strong> gestão ambiental.<br />
Po<strong>de</strong>rá ser proposta uma inovação por meio da obrigatorieda<strong>de</strong><br />
da aplicação <strong>de</strong> parte dos recursos do ICMS-E, via lei municipal, em<br />
gestão ambiental municipal. É notório que muitos municípios não<br />
utilizam as transferências do ICMS-E para melhorar a gestão<br />
ambiental.<br />
O processo político<br />
No momento, começam a ser discutidas em nível nacional as<br />
reformas tributária, previ<strong>de</strong>nciária e trabalhista. A reforma tributária<br />
po<strong>de</strong>rá ser uma “janela <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong>” para modificações no índice<br />
<strong>de</strong> participação dos municípios na distribuição do ICMS, ou <strong>de</strong> algum<br />
imposto <strong>de</strong> valor agregado (IVA) que po<strong>de</strong>rá vir no lugar do ICMS.<br />
Nos estados analisados neste estudo (Minas e Paraná) e em outros<br />
casos, a introdução do ICMS-E foi possível <strong>de</strong>vido à oportunida<strong>de</strong><br />
existente <strong>de</strong> uma modificação mais ampla na legislação tributária<br />
(na Constituição <strong>de</strong> 1988) <strong>de</strong> distribuição do ICMS. Ou seja, houve<br />
uma janela <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong> política para a discussão. Com a futura<br />
reforma tributária, a maneira <strong>de</strong> arrecadar e distribuir o ICMS<br />
possivelmente será alterada, criando, assim, uma oportunida<strong>de</strong> para<br />
introdução <strong>de</strong> critérios socioambientais, tanto nas discussões sobre<br />
legislações fe<strong>de</strong>rais, como, principalmente, sobre as modificações nas<br />
legislações estaduais que irão se seguir. Assim, uma proposta concreta<br />
do Governo da Bahia, através do CRA, em articulação com outros<br />
107
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
órgãos do governo, principalmente a Secretaria <strong>de</strong> Fazenda, e<br />
entida<strong>de</strong>s da socieda<strong>de</strong> civil, é fundamental para que, quando se<br />
chegar às discussões sobre mudanças nos tributos, já exista uma<br />
alternativa minimamente consensuada.<br />
Haverá uma potencial resistência à introdução do ICMS-E por<br />
parte dos municípios que, possivelmente, sairão per<strong>de</strong>ndo com as novas<br />
regras <strong>de</strong> distribuição do ICMS. Estes municípios, em geral, representam<br />
os que arrecadam mais ICMS por critérios <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong> econômica.<br />
Deverá haver um trabalho junto aos políticos e técnicos <strong>de</strong>stes<br />
municípios para que se possa viabilizar politicamente o ICMS-E. Também<br />
é sugerida uma gradualida<strong>de</strong> na introdução do percentual do ICMS-<br />
E. Por exemplo, este po<strong>de</strong>ria ser <strong>de</strong> 1%, no primeiro ano, e crescer<br />
gradualmente até chegar aos 5% propostos.<br />
108<br />
9.2 Proposta para implantação do ICMS -<br />
Unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Conservação (ICMS-UC)<br />
A idéia do ICMS-UC é <strong>de</strong>dicar parte dos recursos do ICMS<br />
arrecadados para o estado à gestão <strong>de</strong> Unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Conservação<br />
estaduais. Estes recursos seriam administrados por um órgão estadual<br />
competente. O ICMS-UC, diferente do ICMS-E, não tem caráter<br />
compensatório, e sim objetiva criar uma fonte estável estadual <strong>de</strong><br />
recursos para gerenciar o gran<strong>de</strong> patrimônio ambiental que são as<br />
Unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Conservação do estado da Bahia. Somente as 25 APAs<br />
estaduais equivalem a 2,3 milhões <strong>de</strong> hectares ou 4% do território do<br />
estado (CRA, 2003). Como valor inicial sugerido, po<strong>de</strong>r-se-ia <strong>de</strong>dicar<br />
ao ICMS-UC o equivalente a 0,5% do ICMS que vai para o estado<br />
(75% do total arrecadado, já que 25% vão para os municípios). Assim,<br />
o montante do ICMS-UC seria <strong>de</strong> aproximadamente 18,6 milhões <strong>de</strong><br />
reais anuais (em valores <strong>de</strong> 2002). Seria necessário <strong>de</strong>linear mecanismos<br />
para utilização <strong>de</strong>stes recursos, <strong>de</strong>terminando em que tipo <strong>de</strong> gastos<br />
eles po<strong>de</strong>riam ser utilizados.
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
9.3 Royalties para o Fundo <strong>de</strong> Recursos<br />
para o Meio Ambiente (Ferfa)<br />
O Governo do Estado da Bahia recebe diversos royalties por<br />
ativida<strong>de</strong>s ligadas à extração mineral, exploração <strong>de</strong> petróleo/gás e<br />
geração <strong>de</strong> hidreletricida<strong>de</strong>. Muitas <strong>de</strong>stas ativida<strong>de</strong>s causam impactos<br />
ambientais ou têm gran<strong>de</strong> potencial <strong>de</strong> riscos ambientais. Com isso, há<br />
uma justificativa para a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma compensação na forma <strong>de</strong><br />
projetos e programas ambientais visando remediar e prevenir os<br />
problemas ambientais causados por estas ativida<strong>de</strong>s, ou mesmo financiar<br />
outros projetos socioambientais prioritários no estado. Uma forma <strong>de</strong><br />
conseguir isto é através do reforço do Fundo <strong>de</strong> Recursos para o Meio<br />
Ambiente (Ferfa), com parte dos royalties, como faz o estado do Rio <strong>de</strong><br />
Janeiro com os royalties do petróleo/gás.<br />
Inicialmente, o Ferfa po<strong>de</strong>ria contar com 20% dos royalties<br />
recebidos ligados à extração mineral, exploração <strong>de</strong> petróleo/gás e<br />
geração <strong>de</strong> hidreletricida<strong>de</strong>. Em valores <strong>de</strong> 2002, eles representaram,<br />
respectivamente, R$ 3,4 milhões, R$ 77,7 milhões e R$ 19,1 milhões,<br />
totalizando R$ 100,2 milhões, o que significaria um montante estimado<br />
em aproximadamente R$ 20 milhões anuais (valores <strong>de</strong> 2002) (20%)<br />
para o Ferfa.<br />
A criação <strong>de</strong>stes recursos <strong>de</strong>ve ser feita via lei estadual, ou seja,<br />
é essencial o convencimento <strong>de</strong> pares e pessoas-chave <strong>de</strong>ntro do governo<br />
para que a lei seja viabilizada.<br />
Os recursos dos royalties po<strong>de</strong>riam ser utilizados em projetos<br />
ambientais dos órgãos públicos estaduais e prefeituras (com ou sem<br />
contrapartida) e, possivelmente, com parceria <strong>de</strong> universida<strong>de</strong>s e<br />
organizações não-governamentais (ONGs) sem fins lucrativos. Um<br />
Conselho Superior <strong>de</strong> Gerência po<strong>de</strong>ria ser formado junto ao CEPRAM<br />
para <strong>de</strong>finição e aprovação dos projetos financiados com recursos dos<br />
royalties. Po<strong>de</strong>r-se-ia colocar restrições ao uso, tais como a não utilização<br />
para pagamento <strong>de</strong> pessoal ou para <strong>de</strong>terminados tipos <strong>de</strong> projetos, além<br />
da <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> uma contrapartida da instituição proponente do projeto.<br />
109
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
110<br />
9.4 Cobrança pelo uso da água<br />
A cobrança pelo uso da água surge como instrumento importante<br />
<strong>de</strong> gestão, referenciado pela Lei no 9.433/97 (Lei das Águas). A cobrança<br />
serve tanto como incentivo à utilização <strong>de</strong> forma mais eficiente dos<br />
recursos hídricos por parte dos usuários, quanto como fonte <strong>de</strong> recursos<br />
para financiamento dos custos da estrutura <strong>de</strong> gestão e <strong>de</strong> projetos <strong>de</strong><br />
melhoria da qualida<strong>de</strong> ambiental dos corpos d’água.<br />
A cobrança para rios estaduais po<strong>de</strong> ser feita pela diluição <strong>de</strong><br />
efluentes ou pela água bruta utilizada para o abastecimento urbano,<br />
industrial ou agrícola. Para ser implementada, <strong>de</strong>ve-se criar os comitês<br />
<strong>de</strong> bacia, que contam com a participação da socieda<strong>de</strong> civil. É no<br />
âmbito <strong>de</strong>stes comitês que serão <strong>de</strong>finidas as regras para cobrança.<br />
No Brasil, estão sendo adotados mo<strong>de</strong>los diferentes para satisfazer as<br />
características locais e regionais <strong>de</strong> <strong>de</strong>manda e oferta <strong>de</strong> água e as<br />
condições ambientais e sociais.<br />
Baseando-se no mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> alguns estados, especialmente São<br />
Paulo, a cobrança po<strong>de</strong> incluir:<br />
• Captação, que po<strong>de</strong> ser para uso doméstico, industrial ou<br />
agrícola;<br />
• Consumo (diferença entre o volume <strong>de</strong> água que entra e o<br />
que sai);<br />
• Cobrança por Carga Poluente, que po<strong>de</strong> incluir: Demanda<br />
Bioquímica <strong>de</strong> Oxigênio (DBO), Demanda Química <strong>de</strong><br />
Oxigênio (DQO), Resíduo Sedimentável (RS) e Carga<br />
Inorgânica (CI) – correspon<strong>de</strong>nte a metais, cianetos e<br />
fluoretos.<br />
O peso e o valor <strong>de</strong> cada um dos itens anteriores serão<br />
<strong>de</strong>terminados por legislação estadual e/ou pelos comitês <strong>de</strong> bacia para<br />
se adaptarem às condições locais.<br />
Quando da <strong>de</strong>finição da forma <strong>de</strong> cálculo dos valores <strong>de</strong> uso da<br />
água, <strong>de</strong>ve-se ter em mente que os recursos <strong>de</strong>vem, a princípio, cobrir:
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
• totalmente os custos do aparato <strong>de</strong> gestão (monitoramento,<br />
avaliação, estudos, etc.);<br />
• totalmente, ou parcialmente, os investimentos com infraestrutura<br />
<strong>de</strong> melhoramento da qualida<strong>de</strong> dos corpos d’água.<br />
A formação dos comitês <strong>de</strong> bacia e seu funcionamento com a<br />
brevida<strong>de</strong> possível <strong>de</strong>vem ser priorizados para evitar a gradual<br />
<strong>de</strong>gradação dos recursos hídricos do estado.<br />
9.5 Programa <strong>de</strong> incentivo aos produtos<br />
mais sustentáveis<br />
A exemplo do que é feito em alguns governos fora do Brasil, o<br />
Governo do Estado po<strong>de</strong>ria incentivar as compras <strong>de</strong> produtos mais<br />
ambientalmente sustentáveis através do direcionamento <strong>de</strong> parte <strong>de</strong> suas<br />
licitações para estes produtos, nos diversos órgãos públicos do estado.<br />
Isto iria estimular a produção <strong>de</strong> novos produtos ambientalmente<br />
sustentáveis, alavancar sua escala <strong>de</strong> produção (o que po<strong>de</strong>ria reduzir<br />
custos e preços, tendo, assim, um efeito catalisador) e, possivelmente,<br />
criar novas empresas com especialização em produtos mais sustentáveis.<br />
A lista <strong>de</strong>stes produtos po<strong>de</strong> incluir, por exemplo, papel com certo<br />
conteúdo <strong>de</strong> papel reciclado, material com pouca embalagem ou produtos<br />
<strong>de</strong> empresas com sistema <strong>de</strong> gestão ambiental instalado. Na licitação as<br />
qualida<strong>de</strong>s ambientais po<strong>de</strong>riam entrar como quesito <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> do<br />
produto. A <strong>de</strong>stinação <strong>de</strong> 10% a 20% das licitações para <strong>de</strong>terminados<br />
produtos ambientalmente mais sustentáveis ten<strong>de</strong> a gerar uma diferença<br />
significativa na <strong>de</strong>manda <strong>de</strong>stes produtos.<br />
9.6 Programa <strong>de</strong> incentivo às empresas<br />
que vão além da legislação<br />
No momento, só existe incentivo direto para as empresas<br />
melhorarem seus padrões ambientais até o cumprimento da legislação.<br />
111
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
Não há nenhum incentivo para ir além dos padrões legais. Porém, muitas<br />
empresas têm condições técnicas <strong>de</strong> ir além da legislação em seus<br />
indicadores ambientais. Apesar <strong>de</strong> não estarem fazendo mais do que a<br />
socieda<strong>de</strong> espera, como boas empresas cidadãs, a criação <strong>de</strong> incentivos<br />
econômicos para empresas que ultrapassem <strong>de</strong>terminados padrões <strong>de</strong><br />
qualida<strong>de</strong> ambiental po<strong>de</strong>ria estimular uma busca contínua <strong>de</strong><br />
melhoramento ambiental, e a criação <strong>de</strong> um grupo <strong>de</strong> empresas “lí<strong>de</strong>res”<br />
que po<strong>de</strong>riam “puxar o batalhão” <strong>de</strong> outras empresas na busca da<br />
excelência. Os recursos para estes incentivos po<strong>de</strong>riam vir do aumento<br />
da taxa <strong>de</strong> uso ou da multa sobre as empresas que estão abaixo dos<br />
padrões legais.<br />
112<br />
9.7 Linha <strong>de</strong> crédito e/ou incentivos<br />
fiscais para projetos <strong>de</strong> Produção<br />
Mais Limpa (P+L)<br />
Um dos gran<strong>de</strong>s entraves para a execução <strong>de</strong> projetos no Brasil é<br />
a dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> se conseguir recursos financeiros para sua alavancagem.<br />
Apesar <strong>de</strong> muitas vezes os projetos serem economicamente viáveis, a<br />
parte financeira inviabiliza-os. No Brasil, é praticamente inexistente<br />
uma linha <strong>de</strong> créditos preferenciais para projetos <strong>de</strong> melhoria ambiental,<br />
como os <strong>de</strong> produção mais limpa. A criação <strong>de</strong> linha <strong>de</strong> crédito especial<br />
para este tipo <strong>de</strong> projeto, ou até mesmo algum tipo <strong>de</strong> benefício fiscal,<br />
po<strong>de</strong> servir como forma <strong>de</strong> estimular a melhoria ambiental com retornos<br />
<strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida e redução <strong>de</strong> custos futuros, tanto para as empresas<br />
quanto para a socieda<strong>de</strong> em geral. A transparência na gestão dos projetos<br />
é essencial para gerar uma legitimida<strong>de</strong> do mecanismo. Os membros<br />
do CEPRAM po<strong>de</strong>m ter um papel fundamental nas regras <strong>de</strong> gestão da<br />
linha <strong>de</strong> crédito, no mapeamento dos tipos <strong>de</strong> projetos a priorizar e dos<br />
valores correspon<strong>de</strong>ntes.
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
Separatriz 10<br />
113
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
114<br />
10 Consi<strong>de</strong>rações finais<br />
O uso <strong>de</strong> instrumentos econômicos<br />
(IEs) na gestão ambiental vem crescendo<br />
consi<strong>de</strong>ravelmente nos últimos<br />
anos. Já existem várias experiências<br />
nacionais e internacionais<br />
que mostram alguns dos benefícios<br />
e limitações <strong>de</strong>stes instrumentos.<br />
Por um lado, o interesse da socieda<strong>de</strong><br />
brasileira como um todo pelas<br />
questões ambientais tem aumentado<br />
(BRASIL; ISER, 1997, 2001).<br />
Isto tem gerado uma pressão política<br />
para um melhor controle <strong>de</strong>stas<br />
questões. Por outro lado, com a globalização,<br />
cresce o papel do mercado<br />
como regulador <strong>de</strong> organizações<br />
e indivíduos, já que as regulações<br />
típicas do Estado, como comandoe-controle,<br />
têm limitações geográficas<br />
<strong>de</strong> atuação. Neste contexto,<br />
os IEs surgem como alternativas efetivas<br />
<strong>de</strong> gestão ambiental, pois buscam<br />
implementar o princípio do<br />
poluidor-pagador, ao mesmo tempo<br />
em que po<strong>de</strong>m servir como instrumentos<br />
reguladores atuando via<br />
mercado.
Instrumentos Econômicos para Gestão Ambiental: Lições das Experiências Nacional e Internacional<br />
Todavia, o papel do Estado é crucial para que os IEs possam ser<br />
implementados e ter os resultados esperados. Em quase todos os exemplos<br />
vistos, o Estado <strong>de</strong>sempenhou um papel <strong>de</strong> negociador, indutor, monitor,<br />
fiscalizador e/ou gerente dos IEs.<br />
Os IEs também <strong>de</strong>vem gerar incentivos <strong>de</strong>ntro da própria<br />
administração pública, premiando órgãos governamentais, estados e<br />
municípios que tenham a melhoria socioambiental como sua estratégia<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento.<br />
Muitas vezes, é difícil conseguir apoio político para criar os IEs<br />
<strong>de</strong> maneira isolada, pois há uma potencial resistência <strong>de</strong> setores da<br />
socieda<strong>de</strong> que, possivelmente, per<strong>de</strong>riam com tal iniciativa. As<br />
discussões recentes sobre reformas fiscal, tributária e trabalhista abrem<br />
uma janela <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong> rara para introdução <strong>de</strong> IEs em todos os<br />
níveis <strong>de</strong> governo. No âmbito da <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> alternativas <strong>de</strong> políticas<br />
<strong>de</strong> arrecadação e distribuição entre os diversos entes fe<strong>de</strong>rados, setor<br />
privado, trabalhadores e socieda<strong>de</strong> em geral, a colocação dos IEs no<br />
<strong>de</strong>bate corre, possivelmente, menos riscos <strong>de</strong> sofrer uma resistência,<br />
já que eles seriam uma variável a mais sendo discutida entre diversas<br />
outras variáveis. Estados, municípios e socieda<strong>de</strong> civil organizada têm<br />
uma chance única nos próximos anos <strong>de</strong> ver diversos IEs<br />
implementados.<br />
115
<strong>José</strong> <strong>Antônio</strong> <strong>Puppim</strong> <strong>de</strong> <strong>Oliveira</strong><br />
116
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