Volume 3 Parte 1 - Portal do Professor - Ministério da Educação

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26 aprender. As crianças desde cedo descobrem o prazer funcional de realizar uma mesma atividade, de repeti-la pelo gosto de repetir, pelo gosto de explorar ou investigar modos de compreender e realizar, de enfrentar e resolver problemas que elas mesmas se colocam. Gosto de aprender, não só pelas consequências, não só como um meio para outro fim, mas como um fim em si mesmo. Como conservar na escola este modo de se relacionar com os processos de aprendizagem? Um modo que a reconhece como solução para um problema interessante? Que valoriza a aprendizagem não apenas por suas consequências futuras (algo difícil de ser entendido por uma criança), mas pelo prazer funcional de realizá-la em um contexto de problemas, tarefas ou desafios que comportam significações presentes, atuais, para os alunos? Uma característica de certas formas de aprendizagem é que, em sendo adquiridas, se estabelecem como hábitos ou padrões condicionados. Funcionam como modos de respostas que, uma vez adquiridas, nos possibilitam responder de modo pronto, imediato aos problemas do cotidiano. Mesmo que seus processos de formação tenham sido ativos, presentes, pouco a pouco vão se tornando habituais. Se estas respostas são suficientes, tudo bem. Se não, muitas vezes temos desistências, desinteresses, ocorrências de padrões emocionais negativos. Além disso, nelas o interesse é sustentado por consequências (ameaças, reforços) externas que substituem, agora, o prazer funcional da própria ação. Fazemos porque é necessário fazer, porque deve ser feito. Há outras formas de aprendizagem que sempre deverão conservar o sabor e o desafio de seus modos de construção. Sempre terão algo original, novo como forma ou conteúdo, que nunca será suficiente repetir ou aplicar o já conhecido. Não é assim, por exemplo, em uma situação de jogo? Por mais que seus objetivos e regras sejam conhecidos, por mais que a estrutura (sistema de normas e valores) se mantenha, cada partida tem sua especificidade, tem problemas e desafios cuja resolu- ção não se reduz a um conhecido ou controlável. Ou seja, não basta repetir ou seguir um hábito ou resposta aprendida. É necessário estar presente, sensível, atento aos diferentes aspectos que caracterizam o desenrolar de uma partida. É necessário manter o foco (concentração), saber planejar, antecipar, fazer boas inferências, tornar-se um observador de si mesmo, do oponente e do próprio jogo. Além disso, nesta situação o sujeito deve se manter ativo, não passivo nem distraído, consciente de que suas ações têm consequências e que supõem boa capacidade de leitura e de tomada de decisão. Esta forma de aprendizagem – como se pôde observar – tem todas as características que qualificam uma pessoa competente e habilidosa. Aprender é muito importante, dentro e fora da escola. Qual a diferença entre estes dois ambientes? Na escola, a aprendizagem se refere a domínios que só ela pode melhor prover. São aprendizagens que supõem professores e gestores, intencionalidade pedagógica, projeto curricular, materiais e recursos didáticos, todo um complexo e caro sistema de ensino e avaliação que sustenta e legitima os conhecimentos pelos quais a escola é socialmente responsável por sua transmissão e valorização. Fora da escola, todos estes aspectos não estão presentes, só o ter de aprender é que se mantém. Seja por exigências externas (dos pais, por exemplo) ou por exigências internas (a criança quer brincar ou usar um objeto e o que já sabe não é suficiente para isso). Necessidade constante de aprender combina com características de nossa sociedade atual: tecnológica, consumista, globalizada e influenciada pelo conhecimento científico. São muitos interesses, problemas, informações, novidades a serem adquiridos, consumidos. E não basta poder comprar ou possuir uma tecnologia, é preciso aprender a usá-la e, de preferência, a usá-la bem. Como oferecer na escola as bases para as aprendizagens fora dela? Como reconhecer e assumir que em uma cultura tecnológica derivada do conhecimento científico, em uma sociedade de consumo, globalizada, os MATEMATICA ENSINO FUNDAMENTAL V3.indd 26 24/8/2009 15:45:10

conhecimentos e seus modos de produção, os valores e suas orientações positivas e negativas, são cada vez mais uma decisão pessoal e coletiva ao mesmo tempo? No âmbito da escola, a aprendizagem é gerida pelos profissionais da educaçã. Fora dela, trata-se de uma gestão de pessoas sobre algo, cuja complexidade e importância requerem habilidades e competências aplicáveis ao contexto profissional, mas igualmente para as formas de conduzir a própria vida e suas implicações ambientais e coletivas. O que significa competência? Consideremos os principais significados propostos no dicionário (Aurélio Eletrônico, por exemplo): 1. Faculdade concedida por lei a um funcionário, juiz ou tribunal para apreciar e julgar pleitos ou questões. 2. Qualidade de quem é capaz de apreciar e resolver certo assunto, fazer determinada coisa; capacidade, habilidade, aptidão, idoneidade. 3. Oposição, conflito, luta. O significado 1 indica que se trata de um poder atribuído a alguém para fazer julgamentos, tomar decisões. Destaquemos aqui dois aspectos: competência requer uma instituição ou órgão com legitimidade para esta atribuição e que confere ou transfere aos seus possuidores um poder para. O significado 2 qualifica estes poderes em termos de capacidade, habilidade, idoneidade de uma pessoa. O significado 3 caracteriza o contexto ( situações de oposição, conflito ou luta) em que a competência se aplica. Depreende-se da proposição do dicionário que o melhor exemplo de competência é aquela que se verifica, ou que deveria se verificar, no sistema jurídico. Depreende-se, também, pelo significado 3, que competência se refere a situações nas quais as pessoas envolvidas em uma situação de conflito ou oposição não podem ou não sabem elas mesmas darem conta do problema, recorrendo à justiça para que se decida pela melhor solução para o conflito. Como transpor estas significações para o campo educacional, sobretudo para a esco- la fundamental? Por que fazer isto? O que se conserva, o que se modifica em relação ao que está proposto no dicionário? O que se conserva é que uma instituição – a escola – mantém o direito e a obrigação de legitimar o ensino que transmite aos alunos. Este ensino corresponde a competências e habilidades, não profissionais no sentido estrito, mas fundamentais seja para a aprendizagem de uma profissão ou, principalmente, para o cuidado da própria vida. Vida cuja natureza complexa, interdependente, exige tomadas de decisão e enfrentamentos em contexto de muitas oposições, conflitos, oportunidades diversas ou impedimentos e dificuldades que se expressam de muitas formas. Na educação básica, como mencionado, as competências a serem desenvolvidas não são relativas a profissões em sua especificidade. Como se viu no dicionário, a significação tradicional de competência refere-se à capacidade ou habilidade de um profissional, legitimado por uma instituição, para apreciar, julgar ou decidir situações que envolvem conflito, luta, oposição. Por exemplo, uma pessoa que está doente recorre a um médico para ser tratada. Do ponto de vista dos gestores e dos professores, ou seja, dos profissionais da educação (ou da aprendizagem), o mesmo acontece; espera-se que eles sejam competentes para cuidar das necessidades fundamentais das crianças (aprender a ler e a escrever, etc.), pois nenhuma delas pode fazer isto por si mesma. Seus recursos são insuficientes e em caso de conflito relacional, brigas, disputas, nem sempre podem chegar por si mesmas a uma boa solução destes impasses. Nestes dois exemplo, limites para a aprendizagem escolar e dificuldades ou problemas relacionais, gestores e professores são profissionais qualificados, ou devem ser, para transformarem estas limitações em oportunidades de construção de conhecimento. Defender no currículo da educação básica o desenvolvimento de competências e habilidades significa ampliar sua função tradicional – relacionada especificamente ao âmbito profissional, considerando-as também na MATEMATICA ENSINO FUNDAMENTAL V3.indd 27 24/8/2009 15:45:10 2727

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aprender. As crianças desde ce<strong>do</strong> descobrem<br />

o prazer funcional de realizar uma mesma<br />

ativi<strong>da</strong>de, de repeti-la pelo gosto de repetir,<br />

pelo gosto de explorar ou investigar mo<strong>do</strong>s<br />

de compreender e realizar, de enfrentar e resolver<br />

problemas que elas mesmas se colocam.<br />

Gosto de aprender, não só pelas consequências,<br />

não só como um meio para outro<br />

fim, mas como um fim em si mesmo. Como<br />

conservar na escola este mo<strong>do</strong> de se relacionar<br />

com os processos de aprendizagem? Um<br />

mo<strong>do</strong> que a reconhece como solução para<br />

um problema interessante? Que valoriza a<br />

aprendizagem não apenas por suas consequências<br />

futuras (algo difícil de ser entendi<strong>do</strong><br />

por uma criança), mas pelo prazer funcional<br />

de realizá-la em um contexto de problemas,<br />

tarefas ou desafios que comportam significações<br />

presentes, atuais, para os alunos?<br />

Uma característica de certas formas de<br />

aprendizagem é que, em sen<strong>do</strong> adquiri<strong>da</strong>s,<br />

se estabelecem como hábitos ou padrões<br />

condiciona<strong>do</strong>s. Funcionam como mo<strong>do</strong>s<br />

de respostas que, uma vez adquiri<strong>da</strong>s, nos<br />

possibilitam responder de mo<strong>do</strong> pronto, imediato<br />

aos problemas <strong>do</strong> cotidiano. Mesmo<br />

que seus processos de formação tenham<br />

si<strong>do</strong> ativos, presentes, pouco a pouco vão<br />

se tornan<strong>do</strong> habituais. Se estas respostas são<br />

suficientes, tu<strong>do</strong> bem. Se não, muitas vezes<br />

temos desistências, desinteresses, ocorrências<br />

de padrões emocionais negativos. Além<br />

disso, nelas o interesse é sustenta<strong>do</strong> por<br />

consequências (ameaças, reforços) externas<br />

que substituem, agora, o prazer funcional <strong>da</strong><br />

própria ação. Fazemos porque é necessário<br />

fazer, porque deve ser feito.<br />

Há outras formas de aprendizagem que<br />

sempre deverão conservar o sabor e o desafio<br />

de seus mo<strong>do</strong>s de construção. Sempre terão<br />

algo original, novo como forma ou conteú<strong>do</strong>,<br />

que nunca será suficiente repetir ou aplicar<br />

o já conheci<strong>do</strong>. Não é assim, por exemplo,<br />

em uma situação de jogo? Por mais que seus<br />

objetivos e regras sejam conheci<strong>do</strong>s, por mais<br />

que a estrutura (sistema de normas e valores)<br />

se mantenha, ca<strong>da</strong> parti<strong>da</strong> tem sua especifici<strong>da</strong>de,<br />

tem problemas e desafios cuja resolu-<br />

ção não se reduz a um conheci<strong>do</strong> ou controlável.<br />

Ou seja, não basta repetir ou seguir um<br />

hábito ou resposta aprendi<strong>da</strong>. É necessário<br />

estar presente, sensível, atento aos diferentes<br />

aspectos que caracterizam o desenrolar<br />

de uma parti<strong>da</strong>. É necessário manter o foco<br />

(concentração), saber planejar, antecipar, fazer<br />

boas inferências, tornar-se um observa<strong>do</strong>r<br />

de si mesmo, <strong>do</strong> oponente e <strong>do</strong> próprio jogo.<br />

Além disso, nesta situação o sujeito deve se<br />

manter ativo, não passivo nem distraí<strong>do</strong>, consciente<br />

de que suas ações têm consequências<br />

e que supõem boa capaci<strong>da</strong>de de leitura e de<br />

toma<strong>da</strong> de decisão. Esta forma de aprendizagem<br />

– como se pôde observar – tem to<strong>da</strong>s<br />

as características que qualificam uma pessoa<br />

competente e habili<strong>do</strong>sa.<br />

Aprender é muito importante, dentro e fora<br />

<strong>da</strong> escola. Qual a diferença entre estes <strong>do</strong>is<br />

ambientes? Na escola, a aprendizagem se refere<br />

a <strong>do</strong>mínios que só ela pode melhor prover.<br />

São aprendizagens que supõem professores<br />

e gestores, intencionali<strong>da</strong>de pe<strong>da</strong>gógica,<br />

projeto curricular, materiais e recursos didáticos,<br />

to<strong>do</strong> um complexo e caro sistema de<br />

ensino e avaliação que sustenta e legitima os<br />

conhecimentos pelos quais a escola é socialmente<br />

responsável por sua transmissão e valorização.<br />

Fora <strong>da</strong> escola, to<strong>do</strong>s estes aspectos<br />

não estão presentes, só o ter de aprender é<br />

que se mantém. Seja por exigências externas<br />

(<strong>do</strong>s pais, por exemplo) ou por exigências internas<br />

(a criança quer brincar ou usar um objeto<br />

e o que já sabe não é suficiente para isso).<br />

Necessi<strong>da</strong>de constante de aprender combina<br />

com características de nossa socie<strong>da</strong>de atual:<br />

tecnológica, consumista, globaliza<strong>da</strong> e influencia<strong>da</strong><br />

pelo conhecimento científico. São<br />

muitos interesses, problemas, informações,<br />

novi<strong>da</strong>des a serem adquiri<strong>do</strong>s, consumi<strong>do</strong>s.<br />

E não basta poder comprar ou possuir uma<br />

tecnologia, é preciso aprender a usá-la e, de<br />

preferência, a usá-la bem.<br />

Como oferecer na escola as bases para<br />

as aprendizagens fora dela? Como reconhecer<br />

e assumir que em uma cultura tecnológica<br />

deriva<strong>da</strong> <strong>do</strong> conhecimento científico, em<br />

uma socie<strong>da</strong>de de consumo, globaliza<strong>da</strong>, os<br />

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