Volume 3 Parte 1 - Portal do Professor - Ministério da Educação

Volume 3 Parte 1 - Portal do Professor - Ministério da Educação Volume 3 Parte 1 - Portal do Professor - Ministério da Educação

portaldoprofessor.mec.gov.br
from portaldoprofessor.mec.gov.br More from this publisher
18.08.2013 Views

20 As competências como referência 2 O currículo por competências constitui hoje um paradigma dominante na educação escolar, no Brasil e em quase todos os demais países da América, da Europa e até países asiáticos. Na África, também vem sendo adotado como organizador de várias propostas de reforma educacional e curricular. Nestes Referenciais, as competências são entendidas como organizadores dos conteúdos curriculares a serem trabalhados nas escolas públicas estaduais. Essa onipresença das competências no discurso e nas propostas educacionais, nem sempre se faz acompanhar de explicações para tornar o conceito mais claro no nível das escolas, o que motiva estes Referenciais a estenderem-se no exame da questão. Como a maior parte dos conceitos usados em pedagogia, o de competências responde a uma necessidade e uma característica de nossos tempos. Na verdade, surge como resposta à crise da escola na segunda metade do século 20 provocada, entre outros fenômenos, pela então incipiente revolução tecnológica e pela crescente heterogeneidade dos alunos. Essa crise levou a uma forte crítica dos currículos voltados para objetivos operacionalizados e observáveis, que fragmentava o processo pedagógico. As competências são introduzidas como um conjunto de operações mentais, que são resultados a serem alcançados nos aspectos mais gerais do desenvolvimento do aluno. Em outras palavras, caracterizaram-se, no início, pela sua generalidade e transversalidade, não relacionadas com nenhum conteúdo curricular específico, mas entendidas como indispensáveis à aquisição de qualquer conhecimento. O exame das muitas definições de competência permite destacar o que está presente em todas elas. A competência, nas várias definições, se refere a: • um conjunto de elementos.... • que o sujeito pode mobilizar.... • para resolver uma situação.... • com êxito. Existem diferenças não substantivas quanto ao que se entende de cada uma dessas palavras, o que não é incomum quando se trata de descrever aspectos psicológicos cognitivos ou emotivos. Em uma definição os elementos são designados como recursos, em outras, como conhecimentos, em outras, como saber. Mobilizar para uns significa colocar em ação, para outros colocar esquemas em operação e ainda selecionar e coordenar. Situação é caracterizada como uma atividade complexa, como um problema e sua solução, como uma representação da situação, pelo sujeito. O êxito é entendido como exercício conveniente de um papel, função ou atividade, ou como realizar uma ação eficaz, ou responder de modo pertinente às demandas da situação ou ainda como ação responsável, realizada com conhecimento de causa. Analisando o conteúdo dos diversos termos utilizados para caracterizar o conceito de competência, pode-se afirmar que não há polissemia, isto é, diferentes significados de competência, e apesar das diferenças terminológicas todos têm em comum uma abordagem que entende a competência como algo que acontece, existe e é acionado desde processos internos ao sujeito. Este aspecto essencial, ou seja, de que a competência não está na situação, nem em conhecimentos ou saberes do currículo, e sim naquilo que a situação de aprendizagem e esses saberes constituíram no aluno, é o que importa para fins pedagógicos por duas razões. A primeira é a de que, se esses processos internos do aluno são constituídos, eles podem e devem ser aprendidos. A segunda é a de que um currículo por competências se expressa, manifesta e valida pelas aprendizagens 2 Deste ponto em diante este documento incorpora algumas ideias das discussões e dos textos de trabalho do grupo responsável pela concepção do currículo na Secretaria da Educação do Estado de São Paulo. MATEMATICA ENSINO FUNDAMENTAL V3.indd 20 24/8/2009 15:45:09

que constituiu no aluno e que este coloca em ação de determinada maneira em determinada situação. Os objetivos de ensino podem ser expressos naquilo que o professor faz, nos materiais que manipula, nos contúdos que seleciona e nas operações que realiza para explicar. Mas o que valida o currículo não são os objetivos de ensino e sim os processos que se constituíram no aluno e se expressam pela competência de saber, de saber fazer e de saber porque sabe. Um currículo que tem as competências como referência, organiza-se por operadores curriculares transversais, que se referem às competências gerais que devem ser perseguidas em todas as áreas ou disciplinas, porque são competências indispensáveis para aprender qualquer conteúdo curricular. Estes Referenciais adotam como competências para aprender as cinco grandes competências do ENEM, que podem ser consideradas seus operadores transversais: •Dominar a norma culta e fazer uso das linguagens matemática, artística e científica; •Construir e aplicar conceitos das várias áreas do conhecimento para a compreensão de fenômenos naturais, de processos histórico-geográficos, da produção tecnológica e das manifestações artísticas; •Selecionar, organizar, relacionar, interpretar dados e informações representados em diferentes formas, para tomar decisões e enfrentar situações-problema; •Relacionar informações, representadas de diferentes formas, e conhecimentos disponíveis em situações concretas, para construir argumentação consistente; •Recorrer aos conhecimentos desenvolvidos na escola para elaborar propostas de intervenção solidária na realidade, respeitando os valores humanos e considerando a diversidade sociocultural. Mas um currículo é constituído por conteúdos e é preciso que as competências transversais para aprender, como as do ENEM, sejam articuladas com as competências a serem constituídas em cada uma das áreas ou disciplinas. Na ausência dessa articulação instaura-se uma aparente ruptura entre competências e conteúdos curriculares, que tem levado ao entendimento equivocado de que a abordagem por competências não valoriza os conteúdos curriculares, quando na verdade eles são nucleares e imprescindíveis para a constituição de competências. A inseparabilidade entre competência e conhecimento Um currículo por competências não elimina nem secundariza os conteúdos. Sem conteúdos, recursos intelectuais, saberes ou conhecimentos, não há o que possa ser mobilizado pelo sujeito para agir pertinentemente numa situação dada, portanto não se constituem competências. Os conteúdos são a substância do currículo e para tanto se organizam em áreas do conhecimento ou disciplinas. É preciso, portanto, construir um currículo que não se limite apenas às disciplinas, mas inclua necessariamente as situações em que esses conteúdos devem ser aprendidos para que sejam constituintes de competências transversais. 2121 Isso significa que um currículo referido a competências só tem coerência interna se conteúdos disciplinares e procedimentos de promover, orientar e avaliar a aprendizagem sejam inseparáveis. Para isso é preciso identificar, em cada conteúdo ou disciplina, os conceitos mais importantes e as situações nas quais eles devem ser aprendidos de forma a constituírem competências transversais como as do ENEM. A ausência desse trabalho resultou, no Brasil, na anomia curricular instalada nos anos recentes, de currículos em ação nas escolas que são divorciados das normas curriculares mais gerais e dos pressupostos teóricos que as orientam. MATEMATICA ENSINO FUNDAMENTAL V3.indd 21 24/8/2009 15:45:09

20<br />

As competências como referência 2<br />

O currículo por competências constitui hoje<br />

um paradigma <strong>do</strong>minante na educação escolar,<br />

no Brasil e em quase to<strong>do</strong>s os demais países<br />

<strong>da</strong> América, <strong>da</strong> Europa e até países asiáticos.<br />

Na África, também vem sen<strong>do</strong> a<strong>do</strong>ta<strong>do</strong> como<br />

organiza<strong>do</strong>r de várias propostas de reforma<br />

educacional e curricular. Nestes Referenciais,<br />

as competências são entendi<strong>da</strong>s como organiza<strong>do</strong>res<br />

<strong>do</strong>s conteú<strong>do</strong>s curriculares a serem<br />

trabalha<strong>do</strong>s nas escolas públicas estaduais.<br />

Essa onipresença <strong>da</strong>s competências no discurso<br />

e nas propostas educacionais, nem sempre<br />

se faz acompanhar de explicações para tornar<br />

o conceito mais claro no nível <strong>da</strong>s escolas, o<br />

que motiva estes Referenciais a estenderem-se<br />

no exame <strong>da</strong> questão.<br />

Como a maior parte <strong>do</strong>s conceitos usa<strong>do</strong>s<br />

em pe<strong>da</strong>gogia, o de competências<br />

responde a uma necessi<strong>da</strong>de e uma característica<br />

de nossos tempos. Na ver<strong>da</strong>de,<br />

surge como resposta à crise <strong>da</strong> escola na<br />

segun<strong>da</strong> metade <strong>do</strong> século 20 provoca<strong>da</strong>,<br />

entre outros fenômenos, pela então incipiente<br />

revolução tecnológica e pela crescente<br />

heterogenei<strong>da</strong>de <strong>do</strong>s alunos. Essa<br />

crise levou a uma forte crítica <strong>do</strong>s currículos<br />

volta<strong>do</strong>s para objetivos operacionaliza<strong>do</strong>s<br />

e observáveis, que fragmentava o<br />

processo pe<strong>da</strong>gógico.<br />

As competências são introduzi<strong>da</strong>s como<br />

um conjunto de operações mentais, que são<br />

resulta<strong>do</strong>s a serem alcança<strong>do</strong>s nos aspectos<br />

mais gerais <strong>do</strong> desenvolvimento <strong>do</strong> aluno.<br />

Em outras palavras, caracterizaram-se, no<br />

início, pela sua generali<strong>da</strong>de e transversali<strong>da</strong>de,<br />

não relaciona<strong>da</strong>s com nenhum conteú<strong>do</strong><br />

curricular específico, mas entendi<strong>da</strong>s<br />

como indispensáveis à aquisição de qualquer<br />

conhecimento.<br />

O exame <strong>da</strong>s muitas definições de competência<br />

permite destacar o que está presente<br />

em to<strong>da</strong>s elas. A competência, nas<br />

várias definições, se refere a:<br />

• um conjunto de elementos....<br />

• que o sujeito pode mobilizar....<br />

• para resolver uma situação....<br />

• com êxito.<br />

Existem diferenças não substantivas quanto<br />

ao que se entende de ca<strong>da</strong> uma dessas<br />

palavras, o que não é incomum quan<strong>do</strong><br />

se trata de descrever aspectos psicológicos<br />

cognitivos ou emotivos. Em uma definição<br />

os elementos são designa<strong>do</strong>s como recursos,<br />

em outras, como conhecimentos, em<br />

outras, como saber. Mobilizar para uns significa<br />

colocar em ação, para outros colocar<br />

esquemas em operação e ain<strong>da</strong> selecionar<br />

e coordenar. Situação é caracteriza<strong>da</strong> como<br />

uma ativi<strong>da</strong>de complexa, como um problema<br />

e sua solução, como uma representação<br />

<strong>da</strong> situação, pelo sujeito. O êxito é entendi<strong>do</strong><br />

como exercício conveniente de um papel,<br />

função ou ativi<strong>da</strong>de, ou como realizar uma<br />

ação eficaz, ou responder de mo<strong>do</strong> pertinente<br />

às deman<strong>da</strong>s <strong>da</strong> situação ou ain<strong>da</strong> como<br />

ação responsável, realiza<strong>da</strong> com conhecimento<br />

de causa.<br />

Analisan<strong>do</strong> o conteú<strong>do</strong> <strong>do</strong>s diversos termos<br />

utiliza<strong>do</strong>s para caracterizar o conceito<br />

de competência, pode-se afirmar que não há<br />

polissemia, isto é, diferentes significa<strong>do</strong>s de<br />

competência, e apesar <strong>da</strong>s diferenças terminológicas<br />

to<strong>do</strong>s têm em comum uma abor<strong>da</strong>gem<br />

que entende a competência como<br />

algo que acontece, existe e é aciona<strong>do</strong> desde<br />

processos internos ao sujeito. Este aspecto<br />

essencial, ou seja, de que a competência não<br />

está na situação, nem em conhecimentos ou<br />

saberes <strong>do</strong> currículo, e sim naquilo que a<br />

situação de aprendizagem e esses saberes<br />

constituíram no aluno, é o que importa para<br />

fins pe<strong>da</strong>gógicos por duas razões.<br />

A primeira é a de que, se esses processos<br />

internos <strong>do</strong> aluno são constituí<strong>do</strong>s, eles podem<br />

e devem ser aprendi<strong>do</strong>s. A segun<strong>da</strong> é<br />

a de que um currículo por competências se expressa,<br />

manifesta e vali<strong>da</strong> pelas aprendizagens<br />

2 Deste ponto em diante este <strong>do</strong>cumento incorpora algumas ideias <strong>da</strong>s discussões e <strong>do</strong>s textos de trabalho <strong>do</strong> grupo responsável pela concepção <strong>do</strong> currículo<br />

na Secretaria <strong>da</strong> <strong>Educação</strong> <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> de São Paulo.<br />

MATEMATICA ENSINO FUNDAMENTAL V3.indd 20 24/8/2009 15:45:09

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!