Diversidade Sexual na Educação: problematizações sobre a ...
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Um dos desejos mais comuns dos pais é que seus/suas filhos/as “sejam perfeitos e saudáveis”. Penso que as expectativas em relação ao nascimento de um bebê vão muito além dessa premissa, pois almejamos em relação à prole muito mais do que a saúde, uma vez que o conceito de perfeição refere-se, muitas vezes, também ao desejo de corresponder a certos padrões ideais e normais valorizados pela cultura. Por exemplo, o desejo de que a criança seja de um sexo específico, tenha uma heterossexualidade imperativa, apresente potenciais intelectuais para profissões importantes, realize uma vida futura plena de recursos financeiros, viva uma estabilidade emocional, desenvolva vínculos afetivos duradouros, amorosos e sexuais, quando adulto, constitua uma família, tenha um desempenho sexual satisfatório, corresponda bem aos padrões estéticos desejáveis etc. Com estes exemplos já é possível perceber que as expectativas sobre a descendência vão além da perfeição física e, é claro, não incluem nem ocorrência de “desvios”, como a homossexualidade, a transexualidade, nem tampouco a ocorrência de deficiências visuais, auditivas, físicas ou cognitivas. Por isso, o processo de luto do “filho/a perfeito/a” é muitas vezes vivido por famílias quando do nascimento de uma criança com algum tipo de deficiência ou comprometimento no desenvolvimento. Dito isso, vivemos em uma sociedade em que não há espaço para a deficiência como uma condição vantajosa e desejada, pois a vida das pessoas com alguma incapacidade limitante é extremamente difícil; a competitividade é a regra nos meios sociais e uma condição orgânica considerada desvantajosa é sinônimo de fracasso eminente. Partindo dessa premissa, Luís Celso Marcondes de Moura ( 99 ) comenta que quando alguém com uma limitação consegue realizar algum feito passa de “coitadinho” (punido pelos deuses ou pelos demônios pela deficiência) à super herói (por ser alguém ou produzir algo lucrativo, a despeito da deficiência). Mas, quando se pensa que a deficiência é percebida como “defeito”, “falha” ou “falta de” (PAULA, 99 ; MOURA 99 ; MAIA, 00 ), torna-se necessário considerar que o efeito social desta “falta” é representar, como condição desvantajosa, uma incapacidade que só o é em uma sociedade capitalista marcada pelo produtivismo. Não é qualquer “falta” ou “diferença” que faz de alguém uma pessoa com deficiência. Desde que essa falta ou diferença não atrapalhe as condições de adaptação social, isto é, os padrões de produtividade relacionados ao trabalho e à vida reprodutiva, ela não será identificada como tal. 4 4 Lembre-se, por exemplo, que crianças com altas habilidades, que foram consideradas na literatura como “excepcionais”, hoje merecem igualmente condições especiais, adaptações curriculares na escola ou, ainda, são também chamadas de “portadoras de necessidades educacionais especiais”. No entanto, é significativamente diferente a ocorrência de possíveis manifestações de discriminação e de preconceito da família, da comunidade escolar e da sociedade em geral perante este tipo de “diferença”. São crianças e 272
É bastante sintomático que, visando explicitamente a uma adaptação social, certas “diferenças”, por exemplo, a falta de um membro, uma orelha de abano, um nariz saliente, mamas caídas, barrigas flácidas, sejam minimizadas, isto é, “consertadas” por uma grande rede de profissionais e de especialistas, obviamente só disponíveis para quem tem recursos econômicos e pode investir em tratamentos estéticos e/ou em cirurgias corretivas. Também há pequenas diferenças, como cor de pele, tipo de cabelo e estatura, que desagradam à maioria, para a qual se oferece um enorme aparato de produtos industrializados, alisamentos de cabelos, uso de saltos altos etc... que vão contra qualquer princípio de saúde e, ao mesmo, tempo, são incentivados em grande escala pelos modelos televisivos como solução para a beleza de homens e mulheres. Porém, há marcas das deficiências que são por demais visíveis, ou em outra perspectiva, há pessoas que não podem usufruir destes meios de disfarce de diferenças. Há aquelass cujo grau de comprometimento social interfere em demasia na possibilidade de adaptação educacional, econômica e social. Há diferenças que implicam um enorme investimento econômico e emocional pessoal e da família, quando não do Estado, para que esta pessoa sobreviva minimamente com dignidade. Neste contexto de diferenças que se articulam em vários graus de comprometimento, ao discutir a questão da normalidade, não me refiro nem às pessoas que disfarçam as estrias com vestimenta específica nem às pessoas que necessitam de ajuda para se alimentar e sobreviver. Refiro-me a uma grande parcela da população que apresenta alguma diferença em relação ao desenvolvimento dos sentidos (audição, visão), motor e/ou cognitivo. Para estas pessoas, o estereótipo da anormalidade é um desafio que inclui seus familiares e toda a sociedade, caso esta almeje ser inclusiva. O que são pessoas deficientes, não-normais? São aquelas que não correspondem aos padrões físicos e intelectuais desejados pela sociedade capitalista e competitiva? São aquelas que não correspondem ao imperativo de se inserirem no mercado de trabalho e produzirem renda? São aquelas que não conseguem constituir famílias e cuidar a contento de seus filhos e filhas? São aquelas que são dependentes financeira e emocionalmente de seus cuidadores? Aquelas que são compreendidas como eternas crianças, e cujas expectativas da vida adulta são inexistentes? futuros adultos altamente produtivos e acabam sendo “valorizados”, e não marginalizados por todos. 273
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e saudáveis”. Penso que as expectativas em relação ao <strong>na</strong>scimento de um bebê<br />
vão muito além dessa premissa, pois almejamos em relação à prole muito mais do<br />
que a saúde, uma vez que o conceito de perfeição refere-se, muitas vezes, também<br />
ao desejo de corresponder a certos padrões ideais e normais valorizados pela<br />
cultura. Por exemplo, o desejo de que a criança seja de um sexo específico, tenha<br />
uma heterossexualidade imperativa, apresente potenciais intelectuais para profissões<br />
importantes, realize uma vida futura ple<strong>na</strong> de recursos fi<strong>na</strong>nceiros, viva uma estabilidade<br />
emocio<strong>na</strong>l, desenvolva vínculos afetivos duradouros, amorosos e sexuais,<br />
quando adulto, constitua uma família, tenha um desempenho sexual satisfatório,<br />
corresponda bem aos padrões estéticos desejáveis etc.<br />
Com estes exemplos já é possível perceber que as expectativas <strong>sobre</strong> a descendência<br />
vão além da perfeição física e, é claro, não incluem nem ocorrência de “desvios”,<br />
como a homossexualidade, a transexualidade, nem tampouco a ocorrência de<br />
deficiências visuais, auditivas, físicas ou cognitivas. Por isso, o processo de luto do<br />
“filho/a perfeito/a” é muitas vezes vivido por famílias quando do <strong>na</strong>scimento de uma<br />
criança com algum tipo de deficiência ou comprometimento no desenvolvimento.<br />
Dito isso, vivemos em uma sociedade em que não há espaço para a deficiência como<br />
uma condição vantajosa e desejada, pois a vida das pessoas com alguma incapacidade<br />
limitante é extremamente difícil; a competitividade é a regra nos meios sociais e<br />
uma condição orgânica considerada desvantajosa é sinônimo de fracasso eminente.<br />
Partindo dessa premissa, Luís Celso Marcondes de Moura ( 99 ) comenta<br />
que quando alguém com uma limitação consegue realizar algum feito passa de<br />
“coitadinho” (punido pelos deuses ou pelos demônios pela deficiência) à super<br />
herói (por ser alguém ou produzir algo lucrativo, a despeito da deficiência). Mas,<br />
quando se pensa que a deficiência é percebida como “defeito”, “falha” ou “falta de”<br />
(PAULA, 99 ; MOURA 99 ; MAIA, 00 ), tor<strong>na</strong>-se necessário considerar<br />
que o efeito social desta “falta” é representar, como condição desvantajosa, uma<br />
incapacidade que só o é em uma sociedade capitalista marcada pelo produtivismo.<br />
Não é qualquer “falta” ou “diferença” que faz de alguém uma pessoa com deficiência.<br />
Desde que essa falta ou diferença não atrapalhe as condições de adaptação<br />
social, isto é, os padrões de produtividade relacio<strong>na</strong>dos ao trabalho e à vida reprodutiva,<br />
ela não será identificada como tal. 4<br />
4 Lembre-se, por exemplo, que crianças com altas habilidades, que foram consideradas <strong>na</strong> literatura como<br />
“excepcio<strong>na</strong>is”, hoje merecem igualmente condições especiais, adaptações curriculares <strong>na</strong> escola ou, ainda,<br />
são também chamadas de “portadoras de necessidades educacio<strong>na</strong>is especiais”. No entanto, é significativamente<br />
diferente a ocorrência de possíveis manifestações de discrimi<strong>na</strong>ção e de preconceito da<br />
família, da comunidade escolar e da sociedade em geral perante este tipo de “diferença”. São crianças e<br />
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