Diversidade Sexual na Educação: problematizações sobre a ...
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222 “A cinderela e o conquistador” (LOPES, 000: ) Deparamos-nos, nessas imagens e no programa de TV, com elementos de representações hegemônicas de gênero e de sexualidade masculina e feminina, no singular, que podemos ver funcionando também em políticas e programas públicos (por exemplo, em algumas abordagens de prevenção às DSTs/HIV-Aids), quando incorporam o pressuposto de que os homens ‘são infiéis por natureza’; o sexo é um instinto incontrolável e uma necessidade biológica básica dos homens; eles mais facilmente desvinculam sexo de amor etc.; ou reforçando a idéia de uma relação intrínseca entre mulher e monogamia (que hoje até já inclui a perspectiva de ter um parceiro depois do outro, mas não dois ao mesmo tempo) e aceitando o pressuposto de que amor e confiança são requisitos femininos para a relação amorosa e sexual (Cf. MEYER e cols., 004). Nesse sentido, Jane Felipe e Bianca Guizzo ( 004) enfatizam que as relações amorosas e as múltiplas possibilidade de vivê-las são temas que precisariam ser melhor examinados quando se trata de discussões que envolvem gênero, sexualidade e relações de poder, sobretudo se quisermos entender como elas se conectam com (e materializam como) atos violentos entre homens e mulheres, mas também entre homens e entre mulheres. A meu ver, trata-se de perguntar, mais demorada e repetidamente: o que aprendemos com essas pedagogias sobre amor, sexualidade e relações afetivas e sexuais? E onde, sobretudo como, as fazemos? Esta é uma questão importante se trabalharmos com a noção de que educação envolve o conjunto de processos através do qual indivíduos são transformados ou se transformam em sujeitos de uma cultura. Tornar-se sujeito de uma cultura envolve um complexo de forças e de processos de aprendizagem que hoje deriva de uma infinidade de instituições e “lugares pedagógicos” para além da família, da igreja e da escola, e engloba uma ampla e variada gama de processos educativos, incluindo aqueles que são chamados em outras teorizações de “socialização”. Eles podem, grosso modo, ser divididos em intencionais e não-intencionais, sendo que
quase tudo o que aprendemos a definir como educação nos cursos de formação de professores/as e também o que se privilegia discutir como objeto específico desse campo se inclui na categoria de processos educativos intencionais (que poderiam, ainda, ser desdobrados em formais e não-formais). Os processos educativos nãointencionais têm sido muito pouco (re)conhecidos, visibilizados e problematizados, a não ser em alguns campos específicos que se ocupam, por exemplo, de gênero, raça e sexualidade, onde eles assumem uma importância capital, uma vez que a produção dessas identidades resulta, na maioria das vezes, de pedagogias que envolvem estratégias sutis, refinadas e naturalizadas, exaustivamente repetidas e atualizadas que quase não percebemos como tais (MEYER et al., 004). As pedagogias culturais que são colocadas para funcionar através de artefatos culturais da mídia contemporânea, dentre outros, têm-se revelado, pois, como processos educativos potentes quando se trata de instituir relações entre corpo, gênero e sexualidade. E o corpo feminino é um destes lugares onde uma pedagogia incessante articula e (re)produz o estímulo constante ao “cuidado de si”, nos termos de Foucault ( 98 ). Esse cuidado de si pode ser operado sobre o corpo como estímulo decorrente da ação de um outro ou como iniciativa do próprio sujeito. Algumas dessas relações de poder que constroem corpos femininos – e que, como contraponto, podem nos desafiar a pensar como se dá a construção de corpos masculinos nas mesmas relações são analisadas por Sandra Andrade ( 00 ) tomando como referência a revista Boa Forma. A autora descreve o corpo que a revista apresenta como ideal e desejável que pode, desde a perspectiva da Boa Forma, ser modelado, transformado, adaptado e projetado através da minuciosa execução dos diversos programas de emagrecimento e remodelagem que, nela, são assumidos e colocados em circulação. As leitoras são incentivadas a escrever sobre suas experiências, focando tanto suas dificuldades quanto, sobretudo, suas vitórias que são, via de regra, temperadas por uma força de vontade férrea: perder no mínimo uma meia dúzia de quilos num curto período de tempo e, com muita dedicação, seguir a dieta de restrição calórica, fazer os exercícios físicos e modificar o contorno de seu corpo com determinação e garra, de modo que sua história seja capaz de emocionar e interpelar leitoras para seguirem o programa no próximo ano. Pesquisas como esta ajudam-nos a perceber que o corpo magro, malhado, saudável, jovem e bonito funciona na atualidade como um imperativo e um objetivo de vida que pode produzir, ao mesmo tempo, prazer, liberdade, aumento da auto-estima, contenção e uma eterna insatisfação consigo mesmo; e que isto, 223
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quase tudo o que aprendemos a definir como educação nos cursos de formação de<br />
professores/as e também o que se privilegia discutir como objeto específico desse<br />
campo se inclui <strong>na</strong> categoria de processos educativos intencio<strong>na</strong>is (que poderiam,<br />
ainda, ser desdobrados em formais e não-formais). Os processos educativos nãointencio<strong>na</strong>is<br />
têm sido muito pouco (re)conhecidos, visibilizados e problematizados,<br />
a não ser em alguns campos específicos que se ocupam, por exemplo, de<br />
gênero, raça e sexualidade, onde eles assumem uma importância capital, uma vez<br />
que a produção dessas identidades resulta, <strong>na</strong> maioria das vezes, de pedagogias<br />
que envolvem estratégias sutis, refi<strong>na</strong>das e <strong>na</strong>turalizadas, exaustivamente repetidas<br />
e atualizadas que quase não percebemos como tais (MEYER et al., 004).<br />
As pedagogias culturais que são colocadas para funcio<strong>na</strong>r através de artefatos<br />
culturais da mídia contemporânea, dentre outros, têm-se revelado, pois, como processos<br />
educativos potentes quando se trata de instituir relações entre corpo, gênero<br />
e sexualidade. E o corpo feminino é um destes lugares onde uma pedagogia incessante<br />
articula e (re)produz o estímulo constante ao “cuidado de si”, nos termos de<br />
Foucault ( 98 ). Esse cuidado de si pode ser operado <strong>sobre</strong> o corpo como estímulo<br />
decorrente da ação de um outro ou como iniciativa do próprio sujeito.<br />
Algumas dessas relações de poder que constroem corpos femininos – e<br />
que, como contraponto, podem nos desafiar a pensar como se dá a construção<br />
de corpos masculinos <strong>na</strong>s mesmas relações são a<strong>na</strong>lisadas por Sandra Andrade<br />
( 00 ) tomando como referência a revista Boa Forma. A autora descreve o corpo<br />
que a revista apresenta como ideal e desejável que pode, desde a perspectiva da<br />
Boa Forma, ser modelado, transformado, adaptado e projetado através da minuciosa<br />
execução dos diversos programas de emagrecimento e remodelagem que,<br />
nela, são assumidos e colocados em circulação. As leitoras são incentivadas a escrever<br />
<strong>sobre</strong> suas experiências, focando tanto suas dificuldades quanto, <strong>sobre</strong>tudo,<br />
suas vitórias que são, via de regra, temperadas por uma força de vontade férrea:<br />
perder no mínimo uma meia dúzia de quilos num curto período de tempo<br />
e, com muita dedicação, seguir a dieta de restrição calórica, fazer os exercícios<br />
físicos e modificar o contorno de seu corpo com determi<strong>na</strong>ção e garra, de modo<br />
que sua história seja capaz de emocio<strong>na</strong>r e interpelar leitoras para seguirem o<br />
programa no próximo ano.<br />
Pesquisas como esta ajudam-nos a perceber que o corpo magro, malhado,<br />
saudável, jovem e bonito funcio<strong>na</strong> <strong>na</strong> atualidade como um imperativo e um objetivo<br />
de vida que pode produzir, ao mesmo tempo, prazer, liberdade, aumento<br />
da auto-estima, contenção e uma eter<strong>na</strong> insatisfação consigo mesmo; e que isto,<br />
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