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Eremitismo em Portugal na época Moderna : homens e imagens ...

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116 José Adriano de Freitas Carvalho<br />

confrontando-a com a do ex<strong>em</strong>plum do Diálogo da tribulação, procurando fazer<br />

confluir, s<strong>em</strong>pre que possível, as considerações dispersas pelos outros diálogos.<br />

Logo de início, um dos coloquiantes – três Peregrinos: um português,<br />

um italiano e um flamenco que se encontram numa «fresca ribeira que corria por<br />

entre um alto arvoredo» <strong>na</strong> «alta e fragosa» montanha de Montsinisa, entre o<br />

Piamonte e Saboia – declara que «por causas importantes [andava] della [vida<br />

solitaria] apartado e distrahido, todavia foy t<strong>em</strong>po <strong>em</strong> que [foi] dado algum<br />

tanto a ella e como experimentado [pode] nella praticar» 119 , test<strong>em</strong>unho<br />

importante que sela a sua «defesa e ilustração» da vida solitária com o fruto da<br />

experiência, ajudando a perceber melhor que, como o autor da Imag<strong>em</strong>, esse<br />

«Peregino português» é um monge do mosteiro de Belém da ord<strong>em</strong> de S.<br />

Jerónimo <strong>em</strong> Lisboa 120 que, como ele também, viajou a Roma <strong>em</strong> negócios da<br />

ord<strong>em</strong> 121 . S<strong>em</strong> que aqui nos interesse a discussão do valor da vida activa no<br />

mundo frente à vida solitária e cont<strong>em</strong>plativa – uma discussão <strong>em</strong> que se<br />

desfiam autoridades, ex<strong>em</strong>plos e reflexões sobre o «ócio humanístico» –,<br />

not<strong>em</strong>os que a «inquietaçam [da alma] <strong>na</strong>sce <strong>na</strong> vida tumultuosa cercada de<br />

pubricos negocios e a quietaçam <strong>na</strong>sce <strong>na</strong> vida solitaria» 122 , donde não só «claro<br />

está que he a solitaria mais excellente» 123 , mas também que para alcançar a<br />

outra é necessário fugir o mundo. E esta fuga, que t<strong>em</strong> de ser olhada como uma<br />

vitória – um t<strong>em</strong>a que desenvolve sob a autoridade de S. Jerónimo 124 –,<br />

significa, de um modo absoluto, «fugir de si» 125 , isto é, encontrar-se só consigo,<br />

pois, Séneca dixerat, «o principal si<strong>na</strong>l dhüa alma b<strong>em</strong> orde<strong>na</strong>da he poder estar<br />

quieta e morar consigo mesma» 126 , quer dizer, livre de «tam crueis e poderosos<br />

inmigos como são os seus proprios desejos» 127 . E essa quietação – repouso...,<br />

quietação..., vida quieta... são neste diálogo constantes sinónimos de vida<br />

solitária – é um dom de Deus, pois, apartando-os «da huma<strong>na</strong> conversam», «aos<br />

seus muyto amados tira Deos das companhias munda<strong>na</strong>s, e os leva à vida<br />

solitaria, onde lhe ensi<strong>na</strong> grandes mysterios». «No deserto andava Moisés...»,<br />

«só estava Isaías...», «só no deserto andava Elias...», «no ermo andava S. João<br />

Baptista...», «S. João Evangelista no deserto andava, <strong>na</strong> ilha de Patmos...»<br />

119<br />

Hector PINTO, Imag<strong>em</strong> da vida christam..., ed. cit., Dialogo da vida solitaria, 2, I, 311-312.<br />

120<br />

Hector PINTO, Imag<strong>em</strong> da vida christam..., ed. cit., Dialogo da vida solitaria, 11, I, 397.<br />

121<br />

Luis Fer<strong>na</strong>ndo de Carvalho DIAS, Fr. Heitor Pinto (Novas achegas para a sua biografia),<br />

Coimbra, 1953, 18-28.<br />

122<br />

Hector PINTO, Imag<strong>em</strong> da vida christam..., ed. cit., Dialogo da vida solitaria, 11, I, 397.<br />

123<br />

Hector PINTO, Imag<strong>em</strong> da vida christam..., ed. cit., Dialogo da vida solitaria, 3, I, 325.<br />

124<br />

Hector PINTO, Imag<strong>em</strong> da vida christam..., ed. cit., Dialogo da vida solitaria, 3, I, 320.<br />

125<br />

Hector PINTO, Imag<strong>em</strong> da vida christam..., ed. cit., Dialogo da vida solitaria, 3, I, 325.<br />

126<br />

Hector PINTO, Imag<strong>em</strong> da vida christam..., ed. cit., Dialogo da vida solitaria, 2, I, 318.<br />

127<br />

Hector PINTO, Imag<strong>em</strong> da vida christam..., ed. cit., Dialogo da vida solitaria, 3, I, 325.

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