Eremitismo em Portugal na época Moderna : homens e imagens ...
Eremitismo em Portugal na época Moderna : homens e imagens ...
Eremitismo em Portugal na época Moderna : homens e imagens ...
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
108 José Adriano de Freitas Carvalho<br />
vezes – do século XV ao século XVIII – a um er<strong>em</strong>itismo de tipo cenobítico<br />
concorrente, sob a égide de aprovações episcopais ou de simples cartas de<br />
fraternidade 84 , de outras experiências er<strong>em</strong>íticas. É curioso, por ex<strong>em</strong>plo, que<br />
algum companheiro de Fr. Baltasar da Encar<strong>na</strong>ção, no século XVIII, tenha<br />
passado aos arrábidos com qu<strong>em</strong> a nóvel ord<strong>em</strong> dos monges descalços de S.<br />
Paulo mantinha, por afinidades de práticas, estreitas relações 85 .<br />
Geograficamente, essa «colonização ideal del territorio» português – ape<strong>na</strong>s a<br />
perspectiva mais profunda do seu «orde<strong>na</strong>miento sagrado», que era,<br />
<strong>na</strong>turalmente, era muito mais vasto, pois para ele contribuiam também as casas<br />
das ordens e institutos religiosos e todos aqueles que cuidavam das ermidas –<br />
parece, hoje por hoje, mais visível por algumas zo<strong>na</strong>s do Alentejo...de Trás-osmontes<br />
e das Beiras... Estas parec<strong>em</strong> ter sido, mesmo no imaginário dessa<br />
Época Moder<strong>na</strong>, o território dos que, fugindo do mundo, levavam ou queriam<br />
levar, <strong>em</strong> <strong>Portugal</strong>, vida solitária e apartada. Fr. Gaspar da Piedade convidando<br />
para a festa de S. Paulo, Primeiro er<strong>em</strong>ita, outros er<strong>em</strong>itas da Beira assim o<br />
sugere, tal como o convite que, <strong>em</strong> Lisboa, de uns solitários da Beira, recebeu,<br />
antes de 1655, aquele er<strong>em</strong>ita castelhano Francisco, amigo da célebre brigiti<strong>na</strong><br />
Brígida de Santo António. O convite veio a revelar-se tentação diabólica –<br />
porque não existiam esses er<strong>em</strong>itas –, mas o facto de o Diabo ter feito partir da<br />
Beira o convite, parece sugerir que, para então, a Beira gozava da fama de terra<br />
de a<strong>na</strong>coretas... Também Sintra, a «fresca serra de Cintra» ou a «frígida serra de<br />
Cintra» 86 – o superlativo deverá ser, <strong>em</strong> algum caso, uma questão de decoro<br />
retórico – povoada de ermidas, foi, igual que outras serras, um foco de<br />
er<strong>em</strong>itismo onde alguns er<strong>em</strong>itas escolheriam os «sítios ásperos e solitários».<br />
N<strong>em</strong> s<strong>em</strong>pre, porém, estes lugares seriam assim «ásperos» – <strong>em</strong> S. Salvador da<br />
Pesqueira, Fr. Gaspar da Piedade, habitava, cerca de 1615, uma Fragoa que,<br />
apesar da sua grande altitude sobranceira ao Douro, era, com a sua «variedade<br />
vida consagrada. Variaciones sobre el canon 603 in Commentarium pro religiosis et missio<strong>na</strong>riis,<br />
68 (1987), 99-124, o er<strong>em</strong>itismo constituiu s<strong>em</strong>pre um «mundo abigarrado, que los clásicos, y los<br />
concílios, pe<strong>na</strong>ban por orde<strong>na</strong>rlo» (101).<br />
84<br />
Jorge CARDOSO, Agiologio Lusitano, II, ed, cit., 520 recorda os estatutos dados por D.<br />
Agostinho Ribeiro aos er<strong>em</strong>itas das Fur<strong>na</strong>s <strong>em</strong> 1517; <strong>em</strong> 1587, encontram-se umas Constituciones<br />
hechas entre los hermitaños del reyno de Navarra en virtud de u<strong>na</strong> provision acordada Su<br />
Magestad y su visorey, regente, del su Real Consejo y obispo de Pamplo<strong>na</strong> sobre la reformación de<br />
los dichos hermitaños dia de Santa Cruz de mayo del año de mil quinientos y ochenta y siete (Ms.<br />
5/785 da Biblioteca Nacio<strong>na</strong>l de Madrid) que Palma MARTÍNEZ DE BURGOS GARCÍA, Ut<br />
pictura <strong>na</strong>tura: la imagen plástica del santo ermitaño en la literatura espiritual del siglo XVI in<br />
NORBA-Arte, IX (1989), 15-27 já utilizou; Fortu<strong>na</strong>to de ALMEIDA, Historia da Igreja <strong>em</strong><br />
<strong>Portugal</strong>, ed. cit., II, 200 parece sugerir que a passag<strong>em</strong> de Baltasar da Encar<strong>na</strong>ção e seus<br />
companheiros a «instituto» religioso não teria outro apoio jurídico que uma carta de confraternidade<br />
passada pelos Er<strong>em</strong>itas da Serra de Ossa.<br />
85<br />
ANÓNIMO, Vida do Padre Balthasar da Encar<strong>na</strong>ção in Cronica dos monges descalços de S.<br />
Paulo, primeiro er<strong>em</strong>ita, ms cit., 18r-22v.<br />
86<br />
Jorge CARDOSO, Agiológio Lusitano, II, ed. cit., 468, 477.