relatório sobre os usos e costumes no posto administrativo de chinga
relatório sobre os usos e costumes no posto administrativo de chinga
relatório sobre os usos e costumes no posto administrativo de chinga
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
Relatório <strong>sobre</strong> <strong>os</strong> us<strong>os</strong> e c<strong>os</strong>tumes <strong>no</strong> P<strong>os</strong>to Administrativo <strong>de</strong> Chinga<br />
preto macua não faz uso da pasta Couraça 25 , nem elixires <strong>de</strong>ntífric<strong>os</strong> <strong>de</strong><br />
espécie alguma e «cientificamente» preparad<strong>os</strong> <strong>de</strong> tal forma que, alguns,<br />
«cientificamente» arruinam <strong>os</strong> <strong>de</strong>ntes. O preto, termi nada a refeição, vai<br />
acto contínuo bochechar a boca com água simples.<br />
Não quer isto dizer que a<strong>os</strong> pret<strong>os</strong> não caiam <strong>os</strong> <strong>de</strong>ntes, vendo-se alguns,<br />
mas pouc<strong>os</strong>, com <strong>de</strong>ntes a men<strong>os</strong>, chegando mesmo a cair tod<strong>os</strong>,<br />
<strong>de</strong>vido a uma doença a que chamam nihôca [nihoka] 26 ; e a<strong>os</strong> velh<strong>os</strong>,<br />
como é natural, caem como ele mesmo há-<strong>de</strong> cair na sepultura. No indígena,<br />
é rara a cal vície, e quando tal facto se dá atribuem a Deus que<br />
mandou cair o cabelo. À expressão «cair o cabelo» dizem n’tari [ntari] 27 .<br />
O albinismo 28 <strong>no</strong> preto não há, <strong>no</strong> entanto, em alguns apenas aparece<br />
n<strong>os</strong> olh<strong>os</strong> ou num uma mancha branca sem brilho, a que chamam<br />
mŭana [mwàna], filho, isto porque dizem eles «o olho tem filho que o<br />
não <strong>de</strong>ixa ver».<br />
Deformações <strong>de</strong> nascença há algumas e interessantes, bem como a<br />
loucura a que chamam nêpa [nepa] 29 .<br />
O preto tem geralmente um belo olfacto, vista e ouvid<strong>os</strong> muito apurad<strong>os</strong><br />
(vista, quando não tenha filho <strong>no</strong> olho), o que se po<strong>de</strong> avaliar<br />
pela facilida<strong>de</strong> em <strong>de</strong>scobrirem <strong>os</strong> divers<strong>os</strong> animais <strong>no</strong> mato, em pont<strong>os</strong><br />
distantes que a minha vista não alcança e, acompanhando-n<strong>os</strong> na caça,<br />
andam com as ventas afiladas à moda <strong>de</strong> cão e o caso é que, pelo cheiro,<br />
dão muitas vezes com a presença <strong>de</strong> caça. Pinta-se para isto o preto da<br />
Angonia, <strong>no</strong> Distrito <strong>de</strong> Tete. Sobre paladar, acho <strong>de</strong>testável, pelo que<br />
<strong>de</strong>ixei dito quando tratei da <strong>de</strong>ntadura. Infelizmente, a atitu<strong>de</strong> mais vulgar<br />
<strong>no</strong> preto é a do repouso, para o que se pinta, e só a muita necessida<strong>de</strong><br />
ou or<strong>de</strong>m emanada da autorida<strong>de</strong> o faz cair daquela p<strong>os</strong>ição, <strong>de</strong> inacção<br />
em que é hábito viver 30 . Os homens sentam -se, geralmente, <strong>no</strong> chão, é<br />
25 Havia nessa altura pasta <strong>de</strong>ntífrica Couraça <strong>no</strong> mercado?<br />
26 Aliás, nihoka; não se trata <strong>de</strong> uma doença conforme diz o autor; é o <strong>no</strong>me que se dá ao espaço<br />
on<strong>de</strong> cai o doente.<br />
27 Ntari é o <strong>no</strong>me que se dá à careca; o homem calvo é <strong>de</strong>signado por nantari (o que tem careca).<br />
28 A aparente inexistência <strong>de</strong> albinismo na época po<strong>de</strong> ser explicada pelo facto d<strong>os</strong> recém -nascid<strong>os</strong><br />
«<strong>de</strong>feitu<strong>os</strong><strong>os</strong>» serem eliminad<strong>os</strong> nesse tempo pelas parteiras. No idioma emakhuwa o albi<strong>no</strong> ou a albina<br />
é <strong>de</strong>signado pelas palavras napwere ou ethàtuwa.<br />
29 A nepa é a <strong>de</strong>signação genética <strong>de</strong> loucura. Ao louco dá-se o <strong>no</strong>me <strong>de</strong> nànepa.<br />
30 O autor faz aqui juízo <strong>sobre</strong> a indolência e apatia congénita do preto. Esquece-se do modus vivendi<br />
dum camponês, da época em que escreve, e entra em contradição com a psico logia do preto para<br />
com o europeu, como escreveu mais atrás.<br />
2008 E-BOOK CEAUP<br />
51