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Jornais e a formação continuada de professores - Associação de ...

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<strong>Jornais</strong> e a <strong>formação</strong> <strong>continuada</strong> <strong>de</strong> <strong>professores</strong><br />

Juvenal Zancheta, Unesp – Campus <strong>de</strong> Assis<br />

Nesta breve exposição, procuramos mostrar a importância do trabalho com<br />

jornais na escola, bem como tentamos <strong>de</strong>finir o lugar da <strong>formação</strong> necessária para esse<br />

trabalho. Num segundo momento, procuramos efetuar análise <strong>de</strong> material midiático,<br />

cujo objetivo é exemplificar o modo como concebemos a possível interação entre os<br />

meios <strong>de</strong> comunicação, a aca<strong>de</strong>mia, os <strong>professores</strong> e a escola.<br />

O espaço <strong>de</strong> <strong>formação</strong> <strong>continuada</strong> é o mais apropriado para trabalhar com meios<br />

midiáticos<br />

O jornal impresso ou eletrônico, os telejornais bem como os <strong>de</strong>mais meios <strong>de</strong><br />

comunicação <strong>de</strong> massa compõem terreno fértil para a <strong>formação</strong> <strong>continuada</strong> <strong>de</strong><br />

<strong>professores</strong>. Por ‘<strong>formação</strong> <strong>continuada</strong>’, compreen<strong>de</strong>mos os momentos, mesmo escassos<br />

e fragmentados, em que o professor tem condições <strong>de</strong> pesquisar novos elementos para<br />

elaborar a continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua prática pedagógica. Pensamos em eventos como este, em<br />

oficinas específicas, em programas <strong>de</strong> aprimoramento e até mesmo em exercícios<br />

coletivos <strong>de</strong> investigação, tão raros, mas possíveis <strong>de</strong> serem realizados mesmo nos<br />

horários <strong>de</strong> trabalho pedagógico <strong>de</strong>ntro das escolas. E por que consi<strong>de</strong>ramos o período<br />

posterior à licenciatura como privilegiado para esse trabalho?<br />

A <strong>formação</strong> inicial não tem espaço para isso. Num contexto em que os cursos <strong>de</strong><br />

licenciatura continuam a sua sina <strong>de</strong> <strong>de</strong>sprestígio, mesmo <strong>de</strong>ntro das instituições<br />

formadoras, e agora numa época em que os cursos na área <strong>de</strong> ciências humanas<br />

parecem, para muitos, perfumaria, a tendência <strong>de</strong> investimento em conteúdos<br />

específicos ganha ainda mais força. Com isso, mesmo que a legislação insista na<br />

integração e tenha ampliado a exigência em termos <strong>de</strong> horas <strong>de</strong> estágio e <strong>de</strong> prática <strong>de</strong><br />

ensino, a distância entre os dois tipos <strong>de</strong> conteúdo parece continuar a história do 3 + 1.<br />

Dentro dos cursos <strong>de</strong> <strong>formação</strong>, mesmo naqueles em que existe empenho para a<br />

<strong>formação</strong> <strong>de</strong> <strong>professores</strong>, calcada na comunhão entre conteúdos específicos e<br />

componente pedagógica, há dificulda<strong>de</strong>s diversas. Sabe-se que o conhecimento<br />

específico não é propriamente conhecimento escolar. Professores das disciplinas<br />

específicas sempre reclamam <strong>de</strong> que têm pouco tempo para ensinar os alunos. Estes, por


sua vez, precisam apren<strong>de</strong>r para ensinar esses conteúdos. Quem <strong>de</strong>ve fazer esse<br />

exercício são os <strong>professores</strong> ligados à área pedagógica.<br />

Ora, o currículo básico da licenciatura prevê poucos espaços para esse exercício,<br />

em geral condicionados nas aulas <strong>de</strong> Prática <strong>de</strong> Ensino. Nos períodos em que são<br />

ministradas as aulas <strong>de</strong> Prática <strong>de</strong> Ensino, por sua vez, os alunos estão lidando com seus<br />

estágios e vivem um dos momentos mais difíceis <strong>de</strong> sua trajetória, caso tenham algum<br />

interesse em se tornar <strong>professores</strong>: o choque com a realida<strong>de</strong> da escola. Os alunos não<br />

são aqueles que i<strong>de</strong>alizamos, nem mesmo aqueles que nossos <strong>professores</strong>, na faculda<strong>de</strong>,<br />

por uma questão didática, para tornar mais fácil a explicação teórica, sugeriram como<br />

silenciosos e ávidos pelo conhecimento.<br />

Enfim, não há espaço para o jornal ou para a mídia, <strong>de</strong>ntro da faculda<strong>de</strong>. Os<br />

<strong>professores</strong> <strong>de</strong> conteúdos específicos precisam ensinar tais conteúdos, po<strong>de</strong>m até utilizar<br />

conteúdos <strong>de</strong> imprensa, mas, <strong>de</strong> maneira geral, esse tratamento será ilustrativo ou, em<br />

última instância, pontual. Não há nenhum compromisso em lei que obrigue o professor<br />

a trabalhar apenas com eles. Por outro lado, os <strong>professores</strong> das disciplinas pedagógicas,<br />

além <strong>de</strong> cuidarem <strong>de</strong> seus próprios conteúdos, po<strong>de</strong>m investir na produção <strong>de</strong> materiais<br />

específicos para a sala <strong>de</strong> aula – ou na conversão <strong>de</strong> conhecimento científico em saber<br />

escolar – mas isso <strong>de</strong>manda um tempo <strong>de</strong> que ele não dispõe e <strong>de</strong> uma <strong>formação</strong> que<br />

muitas vezes ele não tem. Basta notar a escassez <strong>de</strong> material paradidático nas mais<br />

diversas áreas.<br />

Po<strong>de</strong>-se pensar que a argumentação que utilizamos é pragmática <strong>de</strong>mais. E isso<br />

não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser verda<strong>de</strong>. Entretanto, ao dizermos que não há espaço na <strong>formação</strong><br />

inicial, não estamos dizendo que isso não <strong>de</strong>va aparecer no currículo, ao menos como<br />

proposição ou carta <strong>de</strong> intenções. Apenas não acredito que seja possível enfrentar as<br />

múltiplas faces da mídia no espaço disponível para a prática <strong>de</strong> ensino. Aliás, é<br />

fundamental que o esforço <strong>de</strong> didatização <strong>de</strong> conteúdos específicos seja a<strong>de</strong>quado<br />

porque, no futuro, ele será um dos instrumentos importantes para fazer com que o<br />

professor aju<strong>de</strong> a <strong>de</strong>sconstruir o discurso midiático, quando julgar pertinente. Somente<br />

um profissional com sólida <strong>formação</strong> é capaz <strong>de</strong> criticar e propor alternativas para<br />

informações equivocadas, parcimoniosas, problemáticas, que ele vê no jornal ou na<br />

televisão.<br />

O espaço da <strong>formação</strong> <strong>continuada</strong> torna-se um momento mais convidativo para<br />

esse exercício. Isso não acontece apenas por exclusão, mas por fatores diversos.<br />

Primeiramente, o texto midiático é um texto presente, ele trata <strong>de</strong> questões do presente.


Embora possamos consi<strong>de</strong>rar que tais questões são arquetípicas, recorrentes,<br />

requentadas, a análise <strong>de</strong>ssas informações e sensações <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da sua inscrição num<br />

<strong>de</strong>terminado contexto. Daí, por exemplo, uma curiosida<strong>de</strong> sobre textos <strong>de</strong> jornal e textos<br />

<strong>de</strong> livros didáticos. Aqueles são muito mais convidativos para se tratar no momento em<br />

que as informações ainda estão “quentes”, mas ficam profundamente sem graça quando<br />

o assunto se distancia no tempo. Faz parte da cultura do consumo. Tomemos qualquer<br />

assunto <strong>de</strong> enorme impacto na mídia há seis meses e vamos lidar com ele em sala <strong>de</strong><br />

aula. Haverá como sustentá-lo? Os próprios alunos cuidarão <strong>de</strong> rechaçá-lo, exceto em<br />

caso excepcional, por uma razão ou condução incomum por parte do professor.<br />

Distanciado no tempo, o texto do livro didático ten<strong>de</strong> a ser mais aceito pelo aluno, pois<br />

foi escolhido para ter sobrevida. Nesse sentido, a concomitância entre o tratamento da<br />

mídia e a vivência <strong>de</strong>sse cenário é algo que parece ser pertinente.<br />

A produção <strong>de</strong> materiais <strong>de</strong> auxílio pedagógico é algo importante para a escola<br />

em qualquer área. Ainda mais numa época como a nossa, em que a diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

alunos faz com que o professor tenha que proporcionar múltiplas alternativas <strong>de</strong><br />

trabalho, para tentar dar conta <strong>de</strong> públicos cada vez mais inquietos. Essa produção não é<br />

possível na <strong>formação</strong> inicial, mas po<strong>de</strong> acontecer na <strong>formação</strong> <strong>continuada</strong>. Não só como<br />

para ampliar a bagagem <strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> trabalho, mas também para atualizá-las,<br />

revisá-las. Ao mesmo tempo, esse espaço é propício para a troca <strong>de</strong> experiências, para a<br />

composição <strong>de</strong> materiais que possam ser multiplicados e aplicados em outros cenários.<br />

Na <strong>formação</strong> <strong>continuada</strong>, o professor ten<strong>de</strong> a interagir com outros <strong>professores</strong>, com<br />

alguma experiência concreta. Na <strong>formação</strong> inicial, os alunos não têm essa condição. Se<br />

isso vale para qualquer conteúdo, vale também para o jornal e para o estudo da mídia.<br />

A preparação em serviço é também importante, no caso da mídia, por causa da<br />

própria compleição dos meios <strong>de</strong> comunicação. Cada vez mais híbridos, os meios<br />

passam por mutações permanentes, para se adaptar a um mundo carregado <strong>de</strong><br />

tecnologias as mais diversas. A característica da provisorieda<strong>de</strong>, que marca a cultura do<br />

consumo, faz também com que os modos <strong>de</strong> lidar com os meios, em termos<br />

pedagógicos, tenham <strong>de</strong> mudar. O trabalho que se fazia com o jornal nos anos 1980 e<br />

1990, com a leitura <strong>de</strong> trechos <strong>de</strong> matérias jornalísticas, por exemplo, hoje parece<br />

obsoleto. Talvez não tenha mudado o princípio que <strong>de</strong>ve nortear o trabalho com o<br />

jornal e com a própria mídia, o que muda é a maneira <strong>de</strong> fazer isso. Para se ter idéia<br />

disso, basta comparar o trabalho proposto por um livro didático <strong>de</strong> Língua Portuguesa,<br />

nos anos 1980 e 1990, e um livro recomendado pelo MEC em sua última avaliação.


Finalmente, concordamos com a idéia <strong>de</strong> que a escola tem seu tempo próprio e<br />

seus próprios conteúdos e que ela não <strong>de</strong>ve se ren<strong>de</strong>r, sem reflexão, às propostas <strong>de</strong><br />

grupos <strong>de</strong> prestígio, que sugerem, por exemplo, a) maior participação da iniciativa<br />

privada nos rumos da escola; b) maior voluntarismo por parte do professor, para<br />

enfrentar as adversida<strong>de</strong>s do dia-a-dia; c) assimilação <strong>de</strong> conteúdos e práticas<br />

tipicamente midiáticas (como a produção <strong>de</strong> mensagens), a fim <strong>de</strong> fazer com que os<br />

jovens se apropriem <strong>de</strong>sse universo e, com isso, se mostrem mais aptos a enfrentar o<br />

universo midiático; d) maior envolvimento da família ou maior afeto no trabalho<br />

pedagógico, como se esses elementos fossem fundamentais para o ensinoaprendizagem.<br />

Em que pese o fato <strong>de</strong> estudos dizerem que tais fatores contribuem para a<br />

melhoria das relações na escola, eles não são <strong>de</strong>cisivos – tanto é assim que os problemas<br />

escolares, como os <strong>de</strong> <strong>de</strong>sempenho, continuam os mesmos; e) insistência em idéias<br />

salvacionistas, saídas <strong>de</strong> gabinete e colocadas <strong>de</strong> ‘cima para baixo’, na escola. No<br />

entanto, boa parte dos estudos sobre o perfil diferenciado da escola não leva em conta as<br />

rápidas transformações a que a escola tem sido submetida. Se é certo que as tentativas<br />

<strong>de</strong> mudança, por parte <strong>de</strong> organismos governamentais, correspon<strong>de</strong>m a esforço <strong>de</strong><br />

resistência equivalente, também é certo que, nos últimos anos, as modificações na<br />

estrutura e no modo <strong>de</strong> funcionamento das escolas mudou muito. Basta lembrar as<br />

tantas reestruturações promovidas pelo governo do PSDB, em São Paulo, nos últimos<br />

12 anos. Nesse sentido, a escola tem sido abalada em suas características <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e<br />

isso tem gerado um ciclo <strong>de</strong> <strong>de</strong>sestímulo que se agrava. Ou seja: a escola está sendo<br />

obrigada a mudar muito rapidamente.<br />

Cabe à escola assegurar um mínimo <strong>de</strong> distanciamento em relação ao mundo, até<br />

para que os jovens possam refletir sobre ele e escolher os rumos futuros. A escola vem<br />

sendo forçada a participar <strong>de</strong> uma engrenagem <strong>de</strong> mercado e <strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong>. A<br />

revisão crítica e permanente das funções da escola, dos seus modos <strong>de</strong> participação na<br />

arena política (em boa parte ancorada na mídia), cabe melhor nos momentos <strong>de</strong><br />

atualização pedagógica.


Problemas para o tratamento dos jornais<br />

Embora seja o meio <strong>de</strong> comunicação mais próximo da escolarização, por ser um<br />

suporte impresso e com materiais em geral mais curtos, adaptáveis à cultura do excerto,<br />

tão comum na escola, o tratamento mais crítico do jornal não se ajusta às diretrizes<br />

curriculares. As competências e habilida<strong>de</strong>s cobradas pelo ENEM, por exemplo, que<br />

norteiam boa parte da educação básica contemporânea no país, <strong>de</strong>limitam esse trabalho,<br />

quando muito, aos exercícios <strong>de</strong> análise <strong>de</strong> textos ou <strong>de</strong> comparação entre textos. Ficam<br />

outros diversos procedimentos jornalísticos, sobretudo os que escapam dos limites dos<br />

textos verbais propriamente ditos, como a imagem e os <strong>de</strong>mais elementos icônicos, o<br />

projeto gráfico, a questão editorial, o mapa político da mídia regional e nacional.<br />

A nova onda <strong>de</strong> apostilamento que atravessa as escolas, tanto estaduais como<br />

municipais, restringe <strong>de</strong>mais qualquer trabalho menos linear e mais reflexivo. As<br />

apostilas, como modo <strong>de</strong> regrar não só os conteúdos, mas também o tempo e as próprias<br />

ações do professor, além <strong>de</strong> tirar sua autonomia, dificulta a inserção <strong>de</strong> qualquer<br />

conteúdo que não seja, mais tar<strong>de</strong>, mensurável.<br />

O jornal, como objeto físico, é <strong>de</strong> difícil trato, sobretudo para os mais jovens e<br />

para a situação <strong>de</strong> sala <strong>de</strong> aula, em que vários alunos precisam dividir os exemplares<br />

disponíveis, quando isso acontece. Não é por acaso que uma das práticas mais comuns<br />

entre <strong>professores</strong> é falar sobre assuntos jornalísticos, mas sem o próprio jornal. O<br />

comentário substitui a versão impressa.<br />

O jornal não é feito para alunos, mas para consumidores <strong>de</strong> jornal. Há várias<br />

dinâmicas implícitas num jornal diário: a) a organização <strong>de</strong> conteúdos para chamar a<br />

atenção <strong>de</strong> qualquer leitor em potencial, mas, sobretudo, adulto, com po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> compra;<br />

b) a organização <strong>de</strong> conteúdos baseada em um público fiel ao jornal, em geral assinante,<br />

que se acostumou não apenas com <strong>de</strong>terminados conteúdos, mas com <strong>de</strong>terminadas<br />

práticas ligadas à distribuição dos jornais (com implicações em termos <strong>de</strong> fechamento,<br />

<strong>de</strong> conteúdos mais ou menos prestigiados, e assim por diante); c) a organização política<br />

e administrativa do jornal, que se preocupa com as suas posições na arena política e<br />

também com seus anunciantes – sua principal forma <strong>de</strong> rendimento; d) a dinâmica<br />

interna, que diz respeito aos interesses, certezas, dúvidas, reticências, idiossincrasias,<br />

dos componentes responsáveis pela produção do jornal. Ora, nenhuma <strong>de</strong>ssas<br />

dinâmicas, exceto inci<strong>de</strong>ntalmente, refere-se a alunos, exceto em ca<strong>de</strong>rnos muito<br />

específicos, em alguns casos. Como melhorar o processo <strong>de</strong> interação do aluno com um


produto que não é feito para ele. Se o objetivo <strong>de</strong> longo prazo é a <strong>formação</strong> do cidadão<br />

ou a preparação do jovem para as coisas da vida, esse objetivo parece muito abstrato<br />

para os jovens.<br />

Mesmo em termos <strong>de</strong> conteúdos, uma porta <strong>de</strong> entrada mais rápida para o<br />

trabalho com o jornal, há problemas. À exceção <strong>de</strong> conteúdos ligados à língua<br />

portuguesa ou, ocasionalmente, a outras disciplinas, <strong>de</strong> maneira geral o jornal não se<br />

converte facilmente em material <strong>de</strong> trabalho. Pensemos em disciplinas como a física, a<br />

química e mesmo a história.<br />

Alternativas<br />

Para as sugestões que faremos a seguir, algumas premissas precisam ser levadas<br />

em conta: a) é preciso repensar os projetos <strong>de</strong> <strong>formação</strong> <strong>continuada</strong>, atualmente feitos<br />

sob a forma <strong>de</strong> palestras ampliadas, pois, se não é fácil assistir a 45 minutos <strong>de</strong> fala, o<br />

que dirá um período inteiro ou dois, aos sábados, como faz a Secretaria <strong>de</strong> Estado da<br />

Educação, em projetos como o “Teia do Saber” (o que não diminui a importância <strong>de</strong>ssa<br />

proposta)?; b) as alternativas que elencamos adiante procuram <strong>de</strong> algum modo dialogar<br />

com as diretrizes curriculares; não é possível <strong>de</strong>sprezá-las, pois isso inviabilizaria<br />

qualquer iniciativa programática que se pretenda mais duradoura; c) é preciso pensar em<br />

estratégias concretas, com os recursos já disponíveis; d) finalmente, é preciso pensar nas<br />

possibilida<strong>de</strong>s oferecidas pelo jornal, como um dos meios <strong>de</strong> comunicação que<br />

compõem a mídia. Seguem algumas sugestões:<br />

a) A preparação <strong>de</strong> <strong>professores</strong> para lidar com conteúdos midiáticos é inevitável, e <strong>de</strong>ve<br />

estar associada à produção dos materiais midiáticos. Em primeiro lugar, sugerimos a<br />

produção <strong>de</strong> livros didáticos eletrônicos voltados ao tema do jornal e da própria mídia.<br />

A atualização constante <strong>de</strong>sse material oferece ao professor oportunida<strong>de</strong> para tratar <strong>de</strong><br />

temas relacionados à mídia muitas vezes quase em concomitância com a divulgação<br />

<strong>de</strong>ste ou daquele tema. Por outro lado, espaços propiciados por iniciativas como o<br />

programa “Teia do Saber” po<strong>de</strong>m ser utilizados para a <strong>formação</strong> dos <strong>professores</strong> e para<br />

a produção <strong>de</strong> materiais pedagógicos ligados à mídia. Tem-se aí um terreno em que se<br />

po<strong>de</strong> observar a convergência entre a experiência pessoal e a experiência pedagógica


dos <strong>professores</strong>, bem como as possibilida<strong>de</strong>s e as limitações <strong>de</strong> alternativas <strong>de</strong> trabalho<br />

para a área;<br />

b) A reivindicação <strong>de</strong> que o município e o estado realizem nos sítios oficiais a<br />

publicação <strong>de</strong> informações <strong>de</strong> forma legível e explicativa para o jovem estudante.<br />

Atualmente, os sítios oficiais <strong>de</strong> in<strong>formação</strong> são meros canais <strong>de</strong> serviço e <strong>de</strong><br />

propaganda <strong>de</strong> governos e organismos. Isso <strong>de</strong>manda pressão política e não recursos<br />

adicionais. Basta lembrar o volume gigantesco <strong>de</strong> textos atualizados dia a dia nesses<br />

portais. Um exemplo <strong>de</strong> pesquisa sobre a economia paulista é suficiente para dar a<br />

dimensão da dificulda<strong>de</strong> que é ter acesso, minimimante orgânico, a dados referentes ao<br />

Estado. Embora pareça simples, um exercício como esse é raro, em se tratando <strong>de</strong><br />

organismos públicos. Esses mesmos dados, por outro lado, não são atraentes para<br />

publicação em revistas como Superinteressante ou Galileu (ainda que o uso <strong>de</strong><br />

expedientes gráficos e <strong>de</strong> redação usados por essas revistas possa ser um dos caminhos<br />

para tornar a in<strong>formação</strong> oficial mais atraente para o público jovem);<br />

c) O investimento não apenas no tratamento <strong>de</strong> questões específicas, relacionadas ao<br />

jornal, mas principalmente a atenção para o fomento <strong>de</strong> espaços para a leitura e <strong>de</strong>bate<br />

sobre as questões jornalísticas. Um professor apren<strong>de</strong> muito rápido a questão técnica do<br />

jornal. E utilizará esse ensinamento em duas ou três semanas, no máximo. A leitura do<br />

jornal em sala <strong>de</strong> aula ten<strong>de</strong> a ser uma prática problemática: como qualquer suporte que<br />

exija maior fôlego para a leitura, o jornal <strong>de</strong>manda condições específicas para o seu<br />

enfrentamento. Po<strong>de</strong> ser mais produtivo o trabalho diário, com pequenos grupos <strong>de</strong><br />

alunos, fora da sala <strong>de</strong> aula. Para isso, existe a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se propor trabalhos com<br />

temáticas diversas, <strong>de</strong>ntro e fora da sala <strong>de</strong> aula, que dêem aos alunos possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

escolha. Exercícios como esse, feitos <strong>de</strong> maneira sistemática, enfrentando-se, com<br />

referências <strong>de</strong> diversos suportes, temas como a própria violência, po<strong>de</strong> levar a outros<br />

temas e planos <strong>de</strong> percepção sobre as preferências dos estudantes. A expectativa é a<br />

busca da autonomia do aluno para a ativida<strong>de</strong> e para a leitura. Diferentemente disso, se<br />

houver a disponibilização <strong>de</strong> espaços e roteiros para que os alunos possam ler, sozinhos<br />

e em pequenos grupos, fora da sala, com compromissos pré-estabelecidos ou não, isso<br />

ten<strong>de</strong> a amadurecer alternativas não só para enfrentar a falta <strong>de</strong> recursos como também a<br />

dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> se propor uma só ativida<strong>de</strong> para toda a turma;


d) Tendo em vista a dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> se assinar jornais nas escolas, bem como a<br />

dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> se trabalhar com esse suporte em sala <strong>de</strong> aula (em função do gran<strong>de</strong><br />

número <strong>de</strong> alunos e da pouca disponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> exemplares), alternativas po<strong>de</strong>m ser<br />

criadas levando-se em conta a própria participação dos alunos e as práticas escolares<br />

cotidianas. Uma <strong>de</strong>las é a produção, por alunos, <strong>de</strong> jornais murais diários ou<br />

bissemanais, com assuntos <strong>de</strong> interesse coletivo, com o compromisso permanente <strong>de</strong><br />

expansão <strong>de</strong> conteúdos possíveis <strong>de</strong> tratamento (num trabalho mediado pelos<br />

<strong>professores</strong>). Esse exercício <strong>de</strong>manda fontes variadas, incluindo sítios <strong>de</strong> in<strong>formação</strong> na<br />

internet. A razão <strong>de</strong>ssa prática é menos a novida<strong>de</strong> em si e estimulo para a leitura, e<br />

mais a consolidação <strong>de</strong> um espaço <strong>de</strong> preocupações coletivas e <strong>de</strong> busca por caminhos<br />

<strong>de</strong> pesquisa, <strong>de</strong>limitando-se hipertextos aos quais alunos e <strong>professores</strong> possam ter<br />

acesso regular;<br />

e) Responsáveis pelas bibliotecas <strong>de</strong>vem ser preparados juntamente com os <strong>professores</strong>,<br />

sobretudo em estratégias concretas <strong>de</strong> estímulo à leitura, inclusive <strong>de</strong> suportes<br />

midiáticos. De improvisados organizadores <strong>de</strong> acervos, <strong>de</strong>vem ser incentivados, por<br />

meio <strong>de</strong> preparação específica, a auxiliar na difusão da cultura da leitura, mas em<br />

proposta que vá além do mero discurso <strong>de</strong> superfície que atravessa os procedimentos<br />

diretivos nessa área;<br />

f) A <strong>formação</strong> dos agentes escolares <strong>de</strong>ve centrar-se nos diversos aspectos da produção<br />

e da recepção midiática, mas também na perspectiva <strong>de</strong> incentivo à organização <strong>de</strong><br />

trabalhos diversificados pelos alunos, individualmente ou em pequenos grupos, <strong>de</strong>ntro e<br />

fora da sala <strong>de</strong> aula. Professores não <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> ser mediadores, apenas <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> estar<br />

ao lado do aluno (e <strong>de</strong> todos os alunos) o tempo todo. Esse exercício in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da<br />

orientação teórico-pedagógica da escola, estando ligado principalmente ao empenho<br />

para a consolidação <strong>de</strong> novos espaços e ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> leitura e reflexão;<br />

g) Novos <strong>professores</strong> ou estagiários, em muito ocupados em funções ‘tapa-buraco’,<br />

ministrando aulas que não po<strong>de</strong>m ficar vagas, ou então em estágios <strong>de</strong> ‘observação’ não<br />

raramente inócuos, po<strong>de</strong>m ser preparados da mesma maneira, para auxiliar <strong>professores</strong> e<br />

alunos, no trabalho <strong>de</strong> pesquisa, <strong>de</strong> leitura, <strong>de</strong> entretenimento com os suportes<br />

midiáticos disponíveis.


Exemplo <strong>de</strong> exercício possível 1<br />

Vamos utilizar este folheto <strong>de</strong> propaganda (ver anexo), para fazer uma análise<br />

que tente ilustrar a proposta esboçada anteriormente. Po<strong>de</strong> parecer estranho falar até<br />

agora sobre o jornal e passar à análise da publicida<strong>de</strong>. Eis as razões da escolha: a) é<br />

preciso converter os materiais midiáticos em materiais pedagógicos e o panfleto em<br />

questão é um material midiático, aliás, <strong>de</strong> enorme exposição; b) ele se avizinha, em<br />

termos <strong>de</strong> imagem, aos procedimentos comuns <strong>de</strong> tratamento ético e gráfico da imagem<br />

encontrados nos jornais; c) trata-se <strong>de</strong> assunto dialogável com a imprensa, não apenas<br />

em termos <strong>de</strong> temática, mas também pelas questões outras que essa imagem acaba por<br />

suscitar. Façamos <strong>de</strong> maneira esquemática uma análise do material 2 :<br />

O panfleto em si tem uma finalida<strong>de</strong> pedagógica: levar as pessoas à consciência<br />

do quanto a <strong>de</strong>ngue está próxima <strong>de</strong> nossas casas e famílias. Essa finalida<strong>de</strong> basta ao<br />

panfleto e basta para muitos <strong>professores</strong>. O que mais há a fazer com um objeto <strong>de</strong>sse<br />

tipo? A leitura no plano <strong>de</strong>notativo já foi feita, isto é, sabemos o objetivo da mensagem:<br />

levar à conscientização quanto à necessida<strong>de</strong> e urgência <strong>de</strong> nos mobilizarmos para nos<br />

precavermos contra o mosquito da <strong>de</strong>ngue. Resta agora o plano conotativo.<br />

Há várias “entradas” para a leitura da imagem, porém, um dos sentidos mais<br />

evi<strong>de</strong>ntes sugere a idéia <strong>de</strong> fragilida<strong>de</strong>, <strong>de</strong> necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> proteção, atenção e vigilância.<br />

A criança exposta é um símbolo categórico. Encerramos a leitura? Para as diretrizes<br />

curriculares, estaria <strong>de</strong> ótimo tamanho. Para a escola, também. A mensagem foi<br />

observada em sua proposição e em seu sentido figurado. Mas o que tem isso a ver com a<br />

<strong>formação</strong> <strong>continuada</strong>? A observação atenta iria perceber várias mentiras embutidas na<br />

narrativa que se mostra ao público:<br />

. o mosquito não está lá: seria muita coincidência um fotógrafo flagrar um mosquito<br />

naquela situação;<br />

. o bebê não é representativo: a escolha <strong>de</strong> um bebê tão robusto e claro diz respeito à<br />

idéia <strong>de</strong> se obter contraste em relação ao mosquito. Para tanto, utiliza-se uma criança<br />

com feição “nórdica”;<br />

1<br />

Em razão da diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> imagens necessárias à explicação dos exercícios propostos na palestra,<br />

optamos por reproduzir apenas um <strong>de</strong>les.<br />

2<br />

Para esta análise, utilizamos a sugestão <strong>de</strong> Maria Helena Martins (O que é leitura. 17.ed. Brasiliense,<br />

1994) relativa aos modos <strong>de</strong> ler: leitura sensorial, leitura emocional e leitura racional.


. a cena é mentirosa: o fotógrafo não faria aquilo; a mãe não <strong>de</strong>ixaria; mas a mãe foi<br />

fotografada com a criança, o que mostra que houve a foto, com consentimento, pois, se<br />

não houvesse, o fotógrafo po<strong>de</strong>ria ser processado (ele precisaria <strong>de</strong> autorização para<br />

fotografar). Se a mãe autorizou a fotografia, ela <strong>de</strong>veria ser processada! O senso comum<br />

aceita situação <strong>de</strong> <strong>de</strong>scompromisso tão gran<strong>de</strong>, por parte <strong>de</strong> uma mãe? Mesmo que o<br />

mosquito não esteja lá, a foto da mãe com o bebê po<strong>de</strong> ter sido feita. De início, a<br />

suposta mãe qual era a intenção da imagem. A mulher aceitou ser fotografada enquanto<br />

dormia. Parece evi<strong>de</strong>nte que a tranqüilida<strong>de</strong> diante do fotógrafo indica que a moça é, na<br />

verda<strong>de</strong>, uma mo<strong>de</strong>lo ou alguém próximo <strong>de</strong>ssa função. Chegamos aqui a um segundo<br />

gran<strong>de</strong> caminho para a explicação da imagem: po<strong>de</strong>-se estar diante <strong>de</strong> uma montagem:<br />

uma mulher, um bebê, um mosquito. É bem provável que este tenha sido, <strong>de</strong> fato, o<br />

percurso que gerou a peça publicitária. Foi o percurso mais cômodo e verossímil: três<br />

imagens superpostas. A foto do bebê, por exemplo, po<strong>de</strong> ter sido inclusive cedida, tendo<br />

em vista o caráter “educativo” da campanha. Neste caso, passamos a aceitar como<br />

plausíveis as posturas das personagens envolvidas, entretanto, ainda assim, continua<br />

sendo (tanto quanto antes) falsa a estratégia utilizada para compor a cena, e, mais ainda,<br />

continua sendo falso o cotidiano que se quis imprimir com ela. Reproduz-se a cultura da<br />

montagem, tão comum nos dias <strong>de</strong> hoje, por conta dos recursos digitais disponíveis.<br />

Descortinamos, enfim, diversos elementos históricos da imagem. Ela <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong><br />

ser um instrumento do “bem”, para ser algo mais problemático. Mas não paramos aí. A<br />

análise <strong>de</strong>sse tipo <strong>de</strong> material, sob essa vertente, implica um processo. É preciso que<br />

alguém <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ie a análise, para que os <strong>professores</strong> aprendam, recor<strong>de</strong>m, se sintam<br />

estimulados a fazer o mesmo. Aí estão duas questões <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m coletiva. A primeira, a<br />

or<strong>de</strong>m do fazer conjuntamente. A segunda, da or<strong>de</strong>m da divulgação: como passar aos<br />

<strong>de</strong>mais a alternativa <strong>de</strong> trabalho? Isso carece <strong>de</strong> um circuito, que po<strong>de</strong> incluir<br />

organismos governamentais ou mesmo um link com o meio jornal.<br />

Um material assim ganha vida quando po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>batido socialmente. A<br />

<strong>de</strong>núncia ou mesmo o comunicado ao governo, tratando da asneira embutida no folheto<br />

é uma forma concreta <strong>de</strong> restabelecer o papel formador dos <strong>professores</strong>. Afora o<br />

trabalho pedagógico realizado em sala <strong>de</strong> aula, a síntese <strong>de</strong>ssa discussão <strong>de</strong>ve ser levada<br />

adiante. O jornal torna-se aí um canal importante <strong>de</strong> divulgação. Nesse caso, ele se<br />

mostra como um ponto <strong>de</strong> chegada e não um ponto <strong>de</strong> partida.


Afora isso, observando-se o subsídio proveniente das propostas acadêmicas para<br />

o tratamento da mídia, é possível, por exemplo, buscar outros modos <strong>de</strong> se fazer ver,<br />

com os alunos, a inverossimilhança da imagem. O uso da paródia é um <strong>de</strong>les. A simples<br />

construção <strong>de</strong> títulos, dos mais explicativos até os mais escrachados, é suficiente para<br />

levar o estudante a ver, pelo traço humorístico a inconsistência da proposta. Encerramos<br />

nossa fala com algumas <strong>de</strong>ssas possibilida<strong>de</strong>s:<br />

. “Não posso ter mais nenhum momento <strong>de</strong> privacida<strong>de</strong>”, diz mosquito<br />

. Bebê infectado afirma que vai processar sua mãe<br />

. “O fotógrafo podia ter evitado isso”, diz bebê<br />

. Revoltado, bebê quer ver sua mãe com <strong>de</strong>ngue

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