O CRIME, A PENA E O DIREITO EM ÉMILE DURKHEIM ... - Conpedi
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Num primeiro momento, pode-se parecer que o fato social denominado suicídio, título do livro homônimo,<br />
publicado por É. Durkheim, nada tenha a ver com o crime, a pena e o direito. Ao se examinar o suicídio,<br />
sobretudo, do ponto de vista histórico e nas maneiras de pensar, agir e sentir, exteriorizadas pelo suicida,<br />
esse tipo de fato social deixa de se apresentar apenas com características puramente pessoais, como pode<br />
aparecer ao interessado num primeiro momento.<br />
Primeiramente, o autor procura demonstrar que o fato social crime não era penalizável por muitos povos, até<br />
que o cristianismo formalmente o proibiu e, a partir desse momento, o corpo do suicida passou a ser objeto<br />
de penalidades, executadas através das mais diferentes formas, conforme se verá mais adiante.<br />
A propósito da penalização do cadáver do suicida, manifestou É. Durkheim (1977, p. 386) de maneira<br />
seguinte:<br />
Mal as sociedades cristãs apareceram, logo o suicídio foi formalmente proibido. Em 452, o Concílio de<br />
Arles proclamou que o suicídio era um crime e que só podia ser a consequência de uma fúria demoníaca.<br />
Mas só no século seguinte, em 563, no Concílio de Praga, é que esta prescrição recebe uma sanção penal.<br />
Reforçando o entendimento desta citação, deve-se acrescentar outra argumentação, no dizer do antropólogo<br />
B. Malinowski, referente aos habitantes do arquipélago de Trobriand, ao constatar o caráter de expiação da<br />
prática do suicídio. "Em nosso relato tocamos em dois pontos importantes: o uso da bruxaria como meio de<br />
coerção e a prática do suicídio como expiação e desafio" (MALINOWSKI, 1973, p. 103).<br />
Como se pode verificar, nas sociedades sob influência do cristianismo e, consequentemente, debaixo de sua<br />
orientação, com amparo na legislação religiosa e de efeito civil, - pois o civil e o religioso constituíam uma<br />
única unidade - o fato social tipificado como suicídio foi proibido e tornou-se punível.<br />
Mas, como penalizar o suicida?<br />
Conforme o lugar, onde acontecia o suicídio, as penas recaiam sobre o cadáver e, de acordo com as<br />
circunstâncias, sobre seus bens. A título de ilustração, pode-se citar o fragmento seguinte, extraído de É.<br />
Durkheim (1977, p. 387):<br />
Encontra-se uma legislação semelhante em todos os povos cristãos que, aliás, conserva a severidade inicial<br />
durante muito mais tempo do que a francesa. Em Inglaterra, logo no século X, o rei Edgar assemelha, num<br />
dos Cânones que publicou, os suicidas aos ladrões, aos assassinos de toda a espécie. Até 1823, houve o<br />
hábito de arrastar o corpo do suicida pelas ruas com um pau atravessado e enterrá-lo no campo sem<br />
nenhuma cerimônia. Ainda hoje o enterro se faz à parte. O suicida era declarado e os bens passavam para a<br />
coroa. Só em 1870 é que esta disposição é abolida assim como todas as confiscações tendo por motivo a<br />
rebelião.<br />
Na medida em que foram ocorrendo separações entre a jurisdição eclesiástica e a jurisdição civil, entre as<br />
práticas de caráter público e de interesse privado, a legislação civil abandonou a prática de punir o suicida.<br />
Contudo, até a realização do Concílio Vaticano II, na segunda metade do século XX, a legislação<br />
eclesiástica católica ainda punia o suicida. Algumas penalidades consistiam em não permitir os funerais<br />
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010<br />
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