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O Trágico do Estado Pós-colonial.pdf - Estudo Geral

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sem Esta<strong>do</strong>. 97 Parece aliás existir hoje entre os historia<strong>do</strong>res um consenso no que diz<br />

respeito às presenças <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>, como fenómeno em mutação, no decorrer <strong>do</strong> século XIX<br />

em África, que poderia ser resumi<strong>do</strong> com recurso a duas palavras: premência (<strong>do</strong> Esta<strong>do</strong>) e<br />

diversidade das suas formas. Assim, segun<strong>do</strong> Thierno Bah (que interpreta o século XIX<br />

africano como um momento de intensas mudanças internas em muitas áreas), se, por volta<br />

de 1800, o Esta<strong>do</strong> não representa a forma de organização mais difundida no continente<br />

africano, oitenta anos mais tarde, ou seja, na altura da segunda fase de invasões europeias,<br />

constata-se uma presença muito mais forte <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s, que surpreendem tanto pela sua<br />

diversidade como pelo carácter irresistível da sua progressão (Bah em M’Bokolo, 2004: 13).<br />

Num senti<strong>do</strong> semelhante, Ki-Zerbo, na sua impressionante síntese da história da<br />

África negra (1978), fez da evolução <strong>do</strong>s diversos modelos de Esta<strong>do</strong> o motor <strong>do</strong><br />

desenvolvimento e <strong>do</strong> progresso no sub-continente. A sua descrição <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> Lunda<br />

(séculos XVI-XIX), por exemplo, revela uma organização complexa, com diversos graus de<br />

poderes e contrapoderes, com fronteiras sociais fluidas que facilitavam a integração de<br />

outros grupos e culturas. 98 Mais a norte (Buganda), Mamdani também notava a existência<br />

de instituições que permitiam um determina<strong>do</strong> grau de controlo <strong>do</strong> poder <strong>do</strong> Rei<br />

(Mamdani, 1996: 42). Por fim, para continuar na mesma região, Chrétien (1985, 2000)<br />

descreve as sociedades centralizadas pré-coloniais <strong>do</strong> atual Ruanda, e sobretu<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

Burundi, como sen<strong>do</strong> caracterizadas, por um la<strong>do</strong>, por um aparelho de Esta<strong>do</strong><br />

desenvolvi<strong>do</strong> e, por outro, por uma porosidade das fronteiras sociais que favorecia a<br />

circulação entre as classes – assim um camponês Hutu podia, em reconhecimento de<br />

serviços presta<strong>do</strong>s, «subir» na escala social e tornar-se um Tutsi.<br />

Ao suprimir os contra-poderes, ao tornar mais rígidas as fronteiras sociais, os<br />

coloniza<strong>do</strong>res lançaram as bases <strong>do</strong> poder local absoluto, como bem resume Mamdani:<br />

The rise of the nineteenth-century conquest states gave a fillip to the administrative<br />

variant of chiefship, but it was not until the <strong>colonial</strong> period that the administrative<br />

chief emerged as the full-blown village-based despot, shorn of rule-based restraint.<br />

(Mamdani, 1996: 43)<br />

97 O que confirma Ade-Ajayi, historia<strong>do</strong>r nigeriano: «Ces deux types ne <strong>do</strong>ivent pas être considérés comme<br />

opposés, mais comme les deux extrémités d’un éventail à l’intérieur duquel se situaient la plupart des États<br />

selon diverses combinaisons des deux catégories d’éléments. Il n’y avait pas de société ‘sans État’ parce que,<br />

même dans les sociétés non centralisées reculées […], il existait un sens de la communauté et du<br />

gouvernement or<strong>do</strong>nné» (Ade-Ajayi, 1997: 35).<br />

98 «Ce système […] était ajustable à n’importe quelle structure préexistante, et assurait à la fois l’efficacité<br />

interne de l’organisation lounda et son rayonnement à l’extérieur.» (Ki-Zerbo, 1978: 328)<br />

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