Iracema - Repositório Institucional UFC
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mel significa a doçura “no peito do mais valente guerreiro” 357 . Do nome do quati, formou-<br />
se o verbo coatiá, pintar. Martim foi, pois, coatiabo, pintado. O arco e o tacape<br />
completaram a investidura do guerreiro, juntamente com o “cocar e a araçóia, ornatos dos<br />
chefes ilustres”. Faltava as iguarias do festim, bem como os vinhos de jenipapo e mandioca.<br />
Danças e cantos bélicos, “em torno dos fogos da alegria” 358 , animaram a celebração<br />
noturna.<br />
2.12 Os deuses e o maravilhoso épico<br />
O maravilhoso épico em <strong>Iracema</strong> concilia a crença cristã com a religião ameríndia.<br />
Tratando-se de um matrimônio entre uma virgem tabajara e um guerreiro cristão, simbólico<br />
de uma miscigenação cultural e política, não parece contraditório nem incoerente tal<br />
conciliação mitológica. Aos olhos dos indianistas mais zelosos e fundamentalistas, porém,<br />
tal atitude mitopoética pode parecer uma fragilidade cultural.<br />
O primeiro e o último capítulos do romance-poema mencionam o nome “Deus”. No<br />
primeiro, o narrador exprime o voto da intervenção divina no salvamento do “airoso barco”<br />
em que Martim, Moacir e o cão regressam às praias do Ceará 359 . No último, depois da<br />
referência à fundação à mairi dos cristãos e às negras vestes do sacerdote que vinha<br />
“plantar a cruz na terra selvagem” 360 , o narrador alude ao batismo cristão de Poti com o<br />
“nome do santo, cujo era o dia” 361 , para assinalar o sucesso missionário no Ceará, referindo<br />
expressamente a germinação da “palavra do Deus verdadeiro na terra selvagem” 362 .<br />
No entanto, o nome de Tupã é constantemente evocado e invocado ao longo dos<br />
restantes capítulos. Ele é o deus dos guerreiros tabajaras, do seu sacerdote Pajé, de <strong>Iracema</strong>,<br />
sua virgem consagrada, a quem era confiado o segredo da jurema. É Ele que traz o<br />
357 Ib., p. 64.<br />
358 Ib., p. 68<br />
359 “Deus te leve a salvo, brioso e altivo barco, por entre as vagas revoltas, e te poje nalguma enseada amiga.<br />
Soprem para ti as brandas auras; e para ti jaspeie a bonança mares de leite” (Cap. I, p. 14).<br />
360 Cap. XXXIII, p. 87.<br />
361 Ib.<br />
362 “A mairi que Martim erguera à margem do rio, nas praias do Ceará, medrou. Germinou a palavra do Deus<br />
verdadeiro na terra selvagem; e o bronze sagrado ressoou nos vales onde rugia o maracá” (Ib.).<br />
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