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Iracema - Repositório Institucional UFC

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certamente, de um triângulo amoroso. Aliás, na Carta ao Dr. Jaguaribe, Alencar refere<br />

explicitamente “a amizade heróica que o [Camarão] ligava a Soares Moreno” 320 . Trata-se,<br />

sim, de uma tríade, formada por laços conjugais entre Martim e <strong>Iracema</strong>, e pelos laços da<br />

amizade, entre Martim e Poti.<br />

No capítulo XXIX, já no crepúsculo da vida de <strong>Iracema</strong> e da narrativa, nasce<br />

Moacir, o fruto do sofrimento e também do amor da “virgem de lábios de mel”, no<br />

momento exato em que o esposo festejava a derrota dos guaraciabas.<br />

Malogradamente, quando Martim regressa, no capítulo XXXII, após oito meses de<br />

ausência, <strong>Iracema</strong> já se encontra agonizante e é em vão que, já com o filho nos braços por<br />

ela apresentado, tenta cercar a esposa de carícias. “o estame de sua flor se rompera” 321 .<br />

A evocação de um passado feliz, no cenário das plagas e das “verdes folhas a cuja<br />

sombra dormia a formosa tabajara”, será a consolação a que recorrerá doravante o herói<br />

fundador, num clima de “agra saudade” 322 .<br />

A última frase do romance é uma espécie de epifonema, de sabor sapiencial, tão<br />

recorrente no mundo clássico greco-romano, especialmente em ambientes estóicos, mas<br />

também epicuristas e, curiosamente acalentado no mundo medieval e humanista dos<br />

séculos XVI a XVIII. “Tudo passa sobre a terra”. Grito da fugacidade e efemeridade da<br />

vida, tal epifonema comenta a mudança operada no canto da fiel jandaia: “A jandaia<br />

cantava ainda no olho do coqueiro; mas não repetia já o mavioso nome de <strong>Iracema</strong>” 323 .<br />

A técnica narrativa de Alencar lança mão de outra herança homérica e virgiliana: a<br />

prolepse. Em contraste com a analepse, anuncia profeticamente acontecimentos futuros. É<br />

própria da narrativa mítica e está associada ao caráter sagrado do gênero profético, cujo<br />

conhecimento e revelação estão reservados aos deuses.<br />

A primeira profecia de <strong>Iracema</strong> é anunciada por Pajé, num tom grave e lento:<br />

“-Se a virgem abandonou ao guerreiro branco a flor de seu corpo, ela morrerá; mas<br />

o hóspede de Tupã é sagrado; ninguém o ofenderá; Araquém o protege” 324 .<br />

O conflito entre o amor da virgem de Tupã ao estrangeiro e a traição operada pela<br />

quebra da sua virgindade origina a trágica morte de <strong>Iracema</strong>. Ela, mais do que Martim,<br />

320 “Carta ao Dr. Jaguaribe, op. cit.<br />

321 Cap. XXXII, p. 85.<br />

322 “Muitas vezes ia sentar-se naquelas doces areias, para cismar e acalentar no peito a agra saudade” (Cap.<br />

XXXIII, p. 87).<br />

323 Ib.<br />

324 Cap. XI, p. 35.<br />

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