Iracema - Repositório Institucional UFC
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abandonar <strong>Iracema</strong>, sem uma palavra justificativa 301 . Uma e outra não abonam muito em<br />
favor do guerreiro cristão.<br />
Quando regressa, depois da vitória dos pitiguaras sobre os tabajaras, aliados dos<br />
brancos tapuias do Mearim, o cristão, apesar de sentir o renascimento do amor 302 , não<br />
consegue resistir ao “ermo” 303 da sua existência, consumindo-se em saudades da pátria e<br />
destilando “do seio da dor lágrimas doces de alívio e consolo” 304 . Na ótica compreensiva do<br />
narrador, a personagem européia era torturada por um duplo mal: as saudades do exílio e as<br />
exigências da sua ambição épica.<br />
Apesar de se doer das lágrimas da esposa 305 , apesar da profecia que ela anuncia<br />
acerca da própria morte 306 , a sede de glória épica 307 conduz Martim a novo combate, desta<br />
vez contra os “guerreiros brancos inimigos” 308 , aliados aos “tupinambás” 309 , deixando a<br />
esposa só no momento do parto 310 .<br />
Volvidos oito meses de ausência, depois de vencer os “guaraciabas, na baía dos<br />
papagaios” 311 e depois de ver erguida a fortaleza dos franceses, aliados dos tupinambás, nas<br />
praias do Mearim, Martim, ao regressar, receia os “olhos tristes e magoados da esposa”,<br />
duvidando se achará “a paz no seio da esposa solitária; ou terá a saudade matado em suas<br />
entranhas o fruto do amor” 312 . Por isso, o seu passo é vacilante. Só depois de reencontrar a<br />
“desventurada mãe” que lhe apresenta o filho recém-nascido e imediatamente desfalece,<br />
“como a jetica, se lhe arrancam o bulbo” 313 , é que o esposo viu “como a dor tinha<br />
301 “- Podes partir. <strong>Iracema</strong> seguirá teu rasto; chegando aqui, verá tua serra, e obedecerá à tua vontade” (Ib.).<br />
302 “O cristão amou a filha do sertão, como nos primeiros dias, quando parece que o tempo nunca poderá<br />
estancar o coração. Mas breves sóis bastaram para murchar aquelas flores de uma alma exilada da pátria”<br />
(Cap. XXVII, p. 74).<br />
303 “Como o imbu na várzea, era o coração do guerreiro branco na terra selvagem. A amizade e o amor o<br />
acompanharam e fortaleceram durante algum tempo, mas agora longe de sua casa e de seus irmãos, sentia-se<br />
no ermo. O amigo e a esposa não bastavam mais à sua existência, cheia de grandes desejos e nobres<br />
ambições” (Ib.).<br />
304 Ib.,<br />
305 “- Teu corpo está aqui; mas tua alma voa à terra de teus pais e busca a virgem branca, que te espera”.<br />
Martim doeu-se. Os grandes olhos negros que a indiana pousara nele o tinham ferido no íntimo” (Cap.<br />
XXVIII, p. 75).<br />
306 “- Quando teu filho deixar o seio de <strong>Iracema</strong>, ela morrerá, como o abati depois que deu seu fruto. Então o<br />
guerreiro branco não terá mais quem o prenda na terra estrangeira” (Ib., p. 76).<br />
307 “- A voz do guerreiro branco chama seus irmãos para defender a cabana de <strong>Iracema</strong> e a terra de seu filho,<br />
quando o inimigo vier” (Cap. XXVIII, p. 76).<br />
308 Cap. XXIX, p. 77.<br />
309 Ib.<br />
310 Cf. Cap. XXIX, p. 79.<br />
311 Cap. XXXII, p. 84.<br />
312 Ib., p. 85<br />
313 Ib.<br />
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