20.06.2013 Views

Iracema - Repositório Institucional UFC

Iracema - Repositório Institucional UFC

Iracema - Repositório Institucional UFC

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Tragicamente, porém, nova profecia de <strong>Iracema</strong> sublinha o contraste entre a alegria<br />

desse nascimento promissor e a profunda tristeza que a sua morte provocaria: como a<br />

abelha não prova a doçura do mel que produziu, também esta mãe ver-se-á privada de<br />

desfrutar das delícias de ver crescer o seu filho 231 .<br />

As cores do drama trágico vão-se adensando no interior desta personagem<br />

sacrificial, num pathos crescente. Definindo-se como “a rola que o caçador tirou do<br />

ninho” 232 , <strong>Iracema</strong> compara-se, num topos romântico por excelência, à “estrela que só<br />

brilha à noite” 233 , para exprimir o clima da sua tristeza, provocada pelo abandono do<br />

esposo: “Só os olhos do esposo podem apagar a sombra em seu rosto” 234 .<br />

Mas a personagem épica assume, ainda, uma nova forma de luta, ao abandonar “os<br />

seios mimosos” aos filhos da irara 235 . Ato de bravura e coragem, esta estratégia ardilosa<br />

mostra a têmpera desta combatente que não olha os meios para salvar a vida do filho:<br />

“<strong>Iracema</strong> curte dor, como nunca sentiu; mas os seios vão-se intumescendo; apojaram afinal,<br />

e o leite, ainda rubro do sangue de que se formou, esguicha” 236 . Moacir, agora, recebe a<br />

significação do nome pela segunda vez: “Ele é agora duas vezes filho de sua dor, nascido<br />

dela e também nutrido” 237 .<br />

E eis que se consuma o sacrifício da personagem. Após dois meses de ausência,<br />

regressa o esposo, mas não chegará a tempo de restituir o sorriso alegre à esposa, cujo “belo<br />

corpo”, entretanto se consumira, sem deixar de nele morar a formosura, “como o perfume<br />

na flor caída do manacá” 238 . Num derradeiro gesto ofertorial, entrega o filho ao pai 239 , para,<br />

em seguida, exalar o último suspiro 240 .<br />

231 “- A jati fabrica o mel no tronco cheiroso do sassafrás; toda a lua das flores voa de ramo em ramo,<br />

colhendo o suco para encher os favos; mas ela não prova sua doçura, porque a irara devora em uma noite toda<br />

a colmeia. Tua mãe também, filho da minha angústia, não beberá em teus lábios o mel de teu sorriso” (Cap.<br />

XXX, p. 80).<br />

232 Cap. XXXI, p. 82.<br />

233 Ib.<br />

234 Ib.<br />

235 “Põe no regaço um por um os filhos da irara; e lhes abandona os seios mimosos, cuja teta rubra como a<br />

pitanga ungiu do mel da abelha. Os cachorrinhos famintos sugam os peitos ávidos de leite” (Ib., p. 83).<br />

236 Ib.<br />

237 Ib.<br />

238 Cap. XXXII, p. 85.<br />

239 “A triste esposa e mãe soabriu os olhos, ouvindo a voz amada. Com esforço grande, pôde erguer o filho<br />

nos braços, e apresentá-lo ao pai, que o olhava extático em seu amor.<br />

- Recebe o filho de teu sangue. Era tempo; meus seios ingratos já não tinham alimento para dar-lhe!” (Ib.).<br />

240 “Pousando a criança nos braços paternos, a desventurada mãe desfaleceu, como a jetica, se lhe arrancam o<br />

bulbo” (Ib.).<br />

77

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!