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Iracema - Repositório Institucional UFC

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profecia do Pajé, consumando, na “gruta profunda”, nas “entranhas da terra” 209 , numa<br />

espécie de catábasis, o amor com o guerreiro branco 210 . No entanto, novo contraste se<br />

esboça entre a doçura dos beijos de <strong>Iracema</strong> durante o sonho e o seu amargor na vida<br />

real 211 . Como uma interpretação da vida humana, tal contraste sugere a distância entre o<br />

sonho e a realidade, a liberdade e a responsabilidade: a virgem de Tupã, ao entregar-se ao<br />

estrangeiro, perdia o seu estatuto de pessoa consagrada, com as conseqüências inerentes 212 .<br />

Esta entrega desencadeia, porém, novo conflito, desta vez mais de ordem cultural do<br />

que moral. Temendo abusar das leis da hospitalidade 213 , Martim recusa aceitar a companhia<br />

de sua nova esposa, estremecendo perante a consciência desta revelação 214 . Com efeito,<br />

aquilo que parecia um simples divertimento trazia graves conseqüências: a traição do<br />

segredo da jurema 215 .<br />

O amor conjugal de <strong>Iracema</strong> supera o fraternal. Confrontada com o apoio de Caubi,<br />

seu irmão, ao chefe dos tabajaras 216 , a virgem guerreira prefere que seja ela a derramar o<br />

sangue fraterno, em vez do esposo amado 217 . Mais tarde, quando Caubi visita a irmã, já<br />

depois que ela dera á luz, esta, desconfiada, salta para proteger o filho, pensando que<br />

aquele vem movido pela vingança 218 . E é ela que salva o esposo das mãos já vitoriosas não<br />

já de seu irmão, mas de Irapuã 219 , não sendo, no entanto, necessário que tal intervenção<br />

209 Cap. XIV, p. 43.<br />

210 Cf. Ca.p. XV.<br />

211 “Os beijos de <strong>Iracema</strong> são doces no sonho; o guerreiro branco encheu deles sua alma. Na vida, os lábios da<br />

virgem de Tupã amargam e doem como o espinho da jurema” (cap. XV, P. 46).<br />

212 “Tupã já não tinha sua virgem na terra dos tabajaras” (Ib., p. 46).<br />

213 “Um guerreiro de minha raça jamais deixou a cabana do hóspede, viúva de sua alegria. Araquém abraçará<br />

sua filha, para não amaldiçoar o estrangeiro ingrato” (Cap. XVII, p. 50).<br />

214 “-<strong>Iracema</strong> te acompanhará, guerreiro branco, porque ela já tua esposa.<br />

Martim estremeceu” (Ib.).<br />

215 “-O guerreiro branco sonhava, quando Tupã abandonou sua virgem. A filha do Pajé traiu o segredo da<br />

jurema” (Ib., p. 50).<br />

216 “O irmão de <strong>Iracema</strong> veio direito ao estrangeiro, que arrancara a filha de Araquém à cabana hospitaleira; o<br />

faro da vingança o guia; a vista da irmã assanha a raiva em seu peito. O guerreiro Caubi assalta com furor o<br />

inimigo” (Cap. XVIII, p. 52).<br />

217 “<strong>Iracema</strong> antes quer que o sangue de Caubi tinja sua mão que a tua; porque os olhos de <strong>Iracema</strong> vêem a ti,<br />

e a ela não” ( Ib., p. 53 ).<br />

218 “A esposa de Martim ergueu-se de um ímpeto e saltou avante para proteger o filho. Seu irmão levantou da<br />

rede a ela uns olhos tristes, e falou com a voz ainda mais triste:<br />

- Não foi a vingança que arrancou o guerreiro Caubi aos campos dos tabajaras; ele já perdoou. Foi a vontade<br />

de ver <strong>Iracema</strong>, que trouxe consigo toda a sua alegria” (Cap. XXX, p. 80).<br />

219 “<strong>Iracema</strong> silvou como a boicininga; e arrojou-se contra a fúria do guerreiro tabajara. A arma rígida tremeu<br />

na destra possante do chefe e o braço caiu desfalecido” (Cap. XVIII., p. 53).<br />

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