Iracema - Repositório Institucional UFC
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2.7 O sacrifício da conciliação de opostos<br />
Críticos renomados, como Alfredo Bosi, têm comentado a caracterização da<br />
constante conciliação dos opostos, como forma de diluir os conflitos no interior dos<br />
romances alencarianos, principalmente em <strong>Iracema</strong>. Contrariamente ao que preconizava o<br />
processo histórico-dialético do embate entre tese e antítese, a literatura romântica brasileira<br />
teria diluído a contradição entre o dominador e o dominado. Teria, deste modo,<br />
transformado o processo de conquista violenta, que o europeu impôs ao índio brasileiro, na<br />
temática da dominação passiva, em que o índio rebelde, primitivo e natural, se vestiria de<br />
ornamentos artificiais europeus, configurando a idéia da civilização européia do “bom<br />
selvagem”, como podemos ver na postura etnocêntrica de Alfredo Bosi no texto “Um mito<br />
sacrificial: o indianismo de Alencar” 192 .<br />
Assim, os protagonistas <strong>Iracema</strong> e Martim produziriam uma neutralização das<br />
oposições, através da configuração poética dos valores românticos. Nele, vemos a figura de<br />
Martim, representando Portugal, ou melhor, o dominador, que domesticaria as terras<br />
brasileiras, representadas na figura de <strong>Iracema</strong>, cheia de “bons sentimentos portugueses”.<br />
Por amor, <strong>Iracema</strong> submete-se ao colonizador, aceitando passivamente o seu domínio,<br />
traindo, assim, seu próprio povo, seus valores e costumes. José de Alencar, portanto,<br />
mostraria em sua obra uma conjunção erótico-política, projetada no par romântico<br />
Martim/<strong>Iracema</strong>, consolidando as nações de Portugal e do Brasil, o que quebra, dessa<br />
forma, com a própria proposta estética romântica, a da identidade e autonomia nacionais.<br />
Assim, o índio não ocuparia o lugar que lhe caberia, o papel de rebelde. Por isso, o<br />
sentido do “complexo sacirifcial” é apontado por Bosi na mitologia romântica de Alencar, a<br />
partir da imolação voluntária dos protagonistas mais fracos, no caso, os índios brasileiros.<br />
Nele, o colonizador tornar-se-ia o herói e o índio transformar-se-ia no escravo passivo,<br />
sacrificando seus ritos e costumes em favor do branco.<br />
192 BOSI, Alfredo. Dialética da colonização. São Paulo: Companhia das Letras, 1992.<br />
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