Iracema - Repositório Institucional UFC
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amigo e a esposa não bastavam mais à sua existência, cheia de grandes desejos e nobres<br />
ambições” 187 .<br />
Em pleno dissabor, <strong>Iracema</strong> profetiza a própria morte, que ocorrerá em seguida ao<br />
nascimento do filho. Novo combate se dá entre as tribos inimigas e Martim parte<br />
novamente, sem se dar conta da tristeza de <strong>Iracema</strong>. Nova vitória dos Pitiguaras; nasce<br />
Moacir, o filho do sofrimento de <strong>Iracema</strong>, que recebe a visita de Caubi, seu irmão. Este<br />
encontra a irmã muito debilitada, por não se alimentar; o leite, fonte de alimento do recém-<br />
nascido, já está secando no peito materno; e as forças da frágil mãe se acabando. Caubi diz<br />
que veio em paz, para saber notícias. <strong>Iracema</strong> pede-lhe que retorne e diga ao pai que já<br />
morreu, para evitar maior vergonha e o sofrimento do velho Pajé.<br />
Martim volta depois de oito meses e encontra <strong>Iracema</strong> à beira da morte. À porta da<br />
cabana, e no limite extremo da debilidade, a pobre moribunda só tem tempo de entregar-lhe<br />
o filho e pedir que fosse sepultada sob o coqueiro que ele amava, para que, quando o vento<br />
soprasse nas palhas, ela pensasse que era a voz do esposo entre seus cabelos:“O esposo viu<br />
então como a dor tinha consumido seu belo corpo”. 188<br />
É neste lugar que nasce o Ceará, colonizado por Martim, logo que volta de Portugal,<br />
para onde levara o filho, mas onde não conseguira permanecer.<br />
Martim retornou para sua terra, levando o filho: "O primeiro cearense, ainda no<br />
berço, emigrava da terra da pátria. Havia aí a predestinação de uma raça?" 189 .<br />
Quatro anos depois, eles voltaram para o Ceará 190 , onde Martim implantou a fé<br />
cristã. Poti se tornou cristão e continuou fiel amigo de Martim. Os dois ajudaram o<br />
comandante Jerônimo de Albuquerque a vencer os tupinambás e a expulsar o branco tapuia.<br />
De vez em quando, Martim revia o local onde fora feliz e se doía de saudade. A jandaia<br />
permanecia cantando no coqueiro, ao pé do qual <strong>Iracema</strong> fora enterrada. Mas a ave não<br />
repetia mais o nome de <strong>Iracema</strong>. "Tudo passa sobre a terra 191 ”. Desta forma, Alencar<br />
romantizou, através do amor entre <strong>Iracema</strong> e Martim, o processo de colonização do Ceará,<br />
simbolicamente representativo do processo de colonização do Brasil.<br />
187 Cap. XXVII, p.74<br />
188 Cap.XXXII, p.85<br />
189 Cap. XXXIII, p.86<br />
190 “Afinal volta Martim de novo às terras, que foram de sua felicidade, e são agora de amarga saudade.<br />
Quando seu pé sentiu o calor das brancas areias, em seu coração derramou-se um fogo que o requeimou: era o<br />
fogo das recordações que ardiam como a centelha sob as cinzas” (Cap. XXXIII, p. 86).<br />
191 Cf. Cap. XXXII, p.85.<br />
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