Iracema - Repositório Institucional UFC

Como podemos perceber, ambas as donzelas, embora pertencentes a mundos tão
distantes, são muitos parecidas, tanto pela beleza física, quanto em seus atributos
capacitivos. São personagens de coragem e ousadia, que enfrentam as forças masculinas e
os horrores da guerra sem, sequer, se intimidarem.
3.8 A predestinação
Associada ao maravilhoso, a predestinação, elemento também comum à tragédia, é
uma característica fundamental do discurso épico. Os deuses, em especial Zeus/Júpiter, são
responsáveis pelo cumprimento do fatum, pois este lhes transcende.
Por isso, a profecia de Júpiter, na Eneida, faz menção desse elemento essencial da
lógica épica. Tranquilizando Vênus, sua filha lacrimosa, o pai dos deuses garante a
realização do desígnio providencial acerca da missão de seu filho Enéias como fundador de
um povo grandioso 473 .
Por isso também o herói-fundador é impulsionado para as costas italianas pelo
Destino: “qui primus ab oris / Italiam fato profugus” 474 .
Na catábasis aos Infernos, Enéias suplica à Sibila de Cumas um reino no Lácio,
compatível com o seu fatum 475 . Aí, Anquises, seu pai, revela-lhe a “glória que há-de seguir
a Dardânia geração” 476 , bem como o seu próprio destino 477 .
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473 “Sorrindo-lhe, o criador de homens e deuses, / com o rosto com que serena o céu e as tempestades, / beijou
de leve a filha e assim falou: / “Não tenhas medo, Citereia. Imutáveis permanecem / os destinos dos teus;
verás a cidade e de Lavínio / as prometidas muralhas; aos astros siderais há-de erguer o magnânimo Eneias. A
minha sentença não mudou! / E este (vou profetizar-to, já que este cuidado te aflige, e desenrolar-te os
arcanos do destino) / fará na Itália uma grande guerra, domará / povos ferros, imporá aos seus homens
costumes e muralhas, / até que o terceiro estio o tenha visto reinar no Lácio, e três Invernos tenham decorrido
sobre a submissão dos Rútulos.” (Aen., I, 254-266).
474 “o primeiro que, das plagas troianas, / perseguido pelo destino, aportou à Itália” (Aen., I, 1-2).
475 “E tu, profetisa tão santa, / tu, que o futuro conheces, concede (não peço um reino / que ao meu fado não
seja devido) que no Lácio se fixem os Teucros, / os seus deuses errantes e os baldeados numes de Tróia”
(Aen., VI, 65-68).
476 “Vou descrever-te qual a glória que há-de seguir / a Dardânia geração, quais os netos que virão da Ítala
gente, / almas ilustres, futuros herdeiros do nosso nome” (Aen., VI, 756-758).
477 “et te tua fata docebo” - e os teus póprios destinos vou ensinar-te (Aen., VI, 759).