20.06.2013 Views

Iracema - Repositório Institucional UFC

Iracema - Repositório Institucional UFC

Iracema - Repositório Institucional UFC

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

os seus companheiros, para fundar, com os autóctones, o novo reino. As suas armas e os<br />

seus feitos militares garantem a legitimidade da sua obra fundacional.<br />

Dirigindo-se ao presumível leitor, José de Alencar utiliza uma estratégia retórica<br />

aparentemente despretensiosa, apelativa da fruição estética do deleite espiritual 422 . No<br />

entanto, tal estratégia é um caminho indireto e pedagógico para lhe suscitar o apetite das<br />

coisas pátrias, o “mesmo aroma silvestre e bravio que lhe vem da várzea” 423 . A intenção<br />

claramente nacionalista não tarda a ser esboçada, em termos de uma metáfora do olhar<br />

interativo entre o filho e a mãe: “Essa onda é a inspiração da pátria que volve a ela, agora e<br />

sempre, como volve de contínuo o olhar do infante para o materno semblante que lhe<br />

sorri” 424 .<br />

E, em frase-sumário, acrescenta: “O livro é cearense” 425 . A identificação do objeto<br />

épico do livro começa pela genuinidade do seu cenário inspirador 426 . Tem como<br />

destinatário o leitor local, no ambiente tranquilo e ameno da casa rústica, do pomar ou da<br />

praia 427 . E, como tal, é enviado para o “que é o berço seu” 428 . Todavia, o autor receia a<br />

indiferença no acolhimento da obra de um filho ausente e esquecido 429 . Não receia a<br />

autenticidade do povo cearense 430 , mas o olhar desconfiado de quem se confronta com um<br />

estranho 431 .<br />

A esperança, porém, do bom acolhimento do fruto de um filho ausente, em sinal de<br />

solidariedade nos momentos adversos, como o topônimo Mocoripe, o morro da alegria,<br />

105<br />

pressagia, anima aquele que foi inspirado pelo amor do ninho pátrio 432 . Acompanha essa<br />

422 “Abra então este livrinho, que lhe chega da corte imprevisto. Percorra suas páginas para desenfastiar o<br />

espírito das coisas graves que o trazem ocupado” (“Prólogo da Primeira Edição”, op. cit., p. 9).<br />

423 “Talvez me desvaneça o amor do ninho, ou se iludam as reminiscências da infância avivadas recentemente.<br />

Se não, creio que, ao abrir o pequeno volume, sentirá uma onda do mesmo aroma silvestre e bravio que lhe<br />

vem da várzea. Derrama-o, a brisa que perpassou nos espatos da carnaúba e na ramagem das aroeiras em flor”<br />

(Ib.).<br />

424 Ib.<br />

425 Ib.<br />

426 “Foi imaginado aí, na limpidez desse céu de cristalino azul, e depois vazado no coração cheio de<br />

recordações vivaces de uma imaginação virgem” (Ib. pp. 9-10).<br />

427 “Escrevi-o para ser lido lá, na varanda da casa rústica ou na fresca sombra do pomar, ao doce embalo da<br />

rede, entre os múrmuros do vento que crepita na areia, ou farfalha nas palmas dos coqueiros” (Ib. p.10).<br />

428 “Para lá, pois, que é o berço seu, o envio” (Ib.).<br />

429 Mas assim mandado por um filho ausente, para muitos estranho, esquecido talvez dos poucos amigos, e só<br />

lembrado pela incessante desafeição, qual sorte será a do livro?” (Ib.).<br />

430 “Que lhe falte hospitalidade, não há que temer. As auras de nossos campos parecem tão impregnadas dessa<br />

virtude primitiva, que nenhuma raça habitual habita aí, que não a inspire com o hálito vital” (Ib.).<br />

431 “Receio, sim, que o livro seja recebido como estrangeiro e hóspede na terra dos meus” (Ib.).<br />

432 “Se, porém, ao abordar as plagas do Mocoripe, for acolhido pelo bom cearense, prezado de seus irmãos<br />

ainda mais na adversidade do que nos tempos prósperos, estou certo que o filho de minha alma achará na terra

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!