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O CLAUSTRO ESTÁ NA RUA! - Universidade de Coimbra

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VOLUME 1 - 5 DE NOVEMBRO 2010 - BIMESTRAL<br />

Do. Pela Professora Isabel Alberto*<br />

Do conjunto <strong>de</strong> pessoas que fazem parte da nossa família, a(o)<br />

única que resulta <strong>de</strong> uma escolha é a(o) companheira(o), o<br />

amor da nossa vida, aquela(e) com quem <strong>de</strong>cidimos partilhar a<br />

vida, o tempo, o espaço, o corpo, o EU. Tudo em nome do<br />

amor romântico, que trespassa o imaginário <strong>de</strong> qualquer cultura,<br />

em qualquer época, emoldurado por Eros na Grécia,<br />

pelo Cupido em Roma, por Romeu e Julieta <strong>de</strong> W. Shakespeare<br />

ou o Livro do Cântico dos Cânticos: “Grava-me como<br />

um selo no teu coração, como um selo no teu braço, porque o<br />

amor é forte como a morte e a paixão é violenta como o abismo.”<br />

E <strong>de</strong>s<strong>de</strong> Eros e Cupido que o amor se acompanha <strong>de</strong> setas, e<br />

feridas… com os <strong>de</strong>uses do Amor surgindo acompanhados<br />

pelos <strong>de</strong>uses da Guerra. Morre-se <strong>de</strong> amor…morre-se por<br />

amor…e mata-se em nome do amor. Da expressão “não posso<br />

viver sem ti” até ao acto “a morte nos separe” há um pequeno<br />

<strong>de</strong>slize, um momento apenas, e entre a paixão e o crime parece<br />

existir uma ténue linha <strong>de</strong> <strong>de</strong>marcação.<br />

Em nome <strong>de</strong>sse amor para a vida, e segundo a Family Violence<br />

Prevention Fund (FVPF) no mundo, uma em cada três mulheres<br />

é vítima <strong>de</strong> abuso físico, sexual ou emocional. Dados da<br />

OMS indicam que do total <strong>de</strong> mulheres vítimas <strong>de</strong> homicídio,<br />

entre 40-70% foram mortas pelos seus companheiros. Mas há<br />

mortes que não têm direito a estatísticas, as mortes lentas,<br />

aquelas que se vão consumando pelas palavras explodidas em<br />

raiva, humilhação, até a vítima <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> se sentir gente: “Eu<br />

não como o pão que o diabo amassou. Eu sou o pão que o<br />

diabo amassou!”<br />

Numa relação paradoxal, em que um cônjuge baralha as palavras,<br />

os afectos, as acções, e as torna a dar, manipulando a<br />

relação <strong>de</strong> casal como se fosse um jogo <strong>de</strong> cartas, bate-se,<br />

ridiculariza-se, reduz-se a zero a companheira que se diz amar,<br />

* Professora na FPCEUC<br />

Ex. Por Marta Chelinho*<br />

Terminei o meu Mestrado Integrado em Psicologia Clínica<br />

e Saú<strong>de</strong> há dois anos. O tempo passa <strong>de</strong>masiado rápido. Se<br />

me perguntarem como é que está a minha vida neste<br />

momento, respon<strong>de</strong>rei: instável. Talvez mais instável do<br />

que nunca. Estou perante opções que terei <strong>de</strong> escolher e<br />

que po<strong>de</strong>rão, qualquer uma <strong>de</strong>las, fazer uma gran<strong>de</strong> diferença<br />

na minha vida – para pior ou para melhor.<br />

Creio que a maior dificulda<strong>de</strong> que um recém-licenciado<br />

sente quando termina a vida académica, é „<strong>de</strong>si<strong>de</strong>alizar‟;<br />

<strong>de</strong>scontruir na sua cabeça aquilo que criou ao longo dos<br />

anos: “quando terminar o curso vou começar uma vida<br />

nova, vou ser mais in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte”; “vou crescer, ter um<br />

trabalho, dinheiro e a minha vida vai andar para a frente”.<br />

Isto poucas vezes acontece. Procuramos trabalho, enviamos<br />

centenas <strong>de</strong> currículos e o “sim” parece nunca chegar. O<br />

valor que sentíamos ter no passado, parece não ser agora<br />

consi<strong>de</strong>rado, e todos nos passam à frente. Percebemos,<br />

* Psicóloga e Case Manager Junior na empresa Albenture, ex-aluna da FPCEUC<br />

PÁGI<strong>NA</strong> 25<br />

com discursos diários do “faço isto porque te amo; preciso <strong>de</strong><br />

ti; eu amo-te mas tu nunca estás à altura…!”<br />

Na outra ponta <strong>de</strong>sta corda bamba, está alguém que ainda quer<br />

acreditar que aquele “é o amor da minha vida”, que há esperança,<br />

“um dia ele vai mudar”, apesar das estatísticas revelarem<br />

uma realida<strong>de</strong> mais negra, caracterizada por Gelles e<br />

Straus pela divisa “licença para casar como uma licença para<br />

bater”.<br />

Algures na década <strong>de</strong> 90, Romeu e Julieta <strong>de</strong>u lugar à “Mulher<br />

que ia contra as portas” <strong>de</strong> Roddy Doyle. Nesta história não há<br />

romance, nem dádiva. Há fragmentos <strong>de</strong> uma vida a dois: “Ele<br />

per<strong>de</strong>u a cabeça. E bateu-me…mandou-me pelo ar…Depois<br />

vi os pés <strong>de</strong>le, a seguir as pernas…Parecia estar muito acima<br />

<strong>de</strong> mim. Quilómetros acima…Depois baixou-se até ao pé <strong>de</strong><br />

mim. –„tás bem?...- Caíste – disse. - sentia-se culpado, terrível.<br />

Gostava outra vez <strong>de</strong> mim. O que aconteceu? Eu provoquei-o.<br />

A culpa era minha.”<br />

Estas são mulheres presas como moscas numa teia! Se se<br />

mexem, são atacadas, se ficam quietas, são atacadas! Ali estão,<br />

presas entre a esperança, a expectativa e a memória!<br />

“Fechava-me fora e fechava-me <strong>de</strong>ntro. Magoou-me e magoou<br />

-me e magoou-me. Matou partes <strong>de</strong> mim. Matou a maior<br />

parte <strong>de</strong> mim. Matou-me toda….passavam-se meses e não<br />

acontecia nada, mas estava sempre ali – a promessa daquilo….À<br />

espera da mão, à espera do sorriso” (Doyle, 1997,<br />

p.180).<br />

Que todas as mulheres, todos os homens, todas as crianças<br />

que vivem secretamente a violência, a <strong>de</strong>squalificação, a morte<br />

aos bocadinhos, <strong>de</strong>ntro das portas fechadas dos seus lares não<br />

sejam esquecidos!<br />

neste momento, que esta situação não acontece só aos<br />

outros.<br />

É preciso continuar a tentar e é fulcral enten<strong>de</strong>rmos que o<br />

problema não está em nós, que não somos nós que não<br />

temos valor ou capacida<strong>de</strong>s. Muitas vezes é, tão simplesmente,<br />

não termos, no meio <strong>de</strong> centenas ou milhares <strong>de</strong><br />

candidatos, uma oportunida<strong>de</strong> para mostrar o que valemos.<br />

Outras vezes são as cunhas, outras ainda a falta <strong>de</strong> verbas<br />

para contratar técnicos.<br />

Pessoalmente, acho que quando pomos o pé na rua e percebemos<br />

que os tempos <strong>de</strong> estudante já lá vão, precisamos <strong>de</strong><br />

nos fazer à vida, <strong>de</strong> tentar e tentar e voltar a tentar, porque<br />

um dia a oportunida<strong>de</strong> surgirá.<br />

Dêem o melhor <strong>de</strong> vós, peguem nas vossas competências e<br />

criativida<strong>de</strong> e façam a diferença!

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