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88 Tor Sellström mas também quem, com grande habilidade e sem comprometer os seus próprios princípios, contornou os perigos da sua divisão em linhas políticas ou ideológicas. Teve uma importância decisiva o facto de a organização que Mondlane representava ser o incontestado movimento de libertação nacional de Moçambique. Apesar de existirem grupos de oposição e de terem feito sentir a sua presença, o papel de liderança da FRELIMO nunca sofreu contestação interna nem foi colocado em questão no estrangeiro. Além disso, a FRELIMO manteve sempre um posicionamento não-alinhado, nomeadamente face ao conflito sino-soviético. 30 A luta nacionalista em Angola eclodiu para a cena internacional no início de 1961, mas a oposição moçambicana ao domínio colonial português foi mais dispersa e rudimentar. Os portugueses tentaram isolar Moçambique das mudanças que se verificavam na altura, noutros pontos de África, mas grande parte da população, cerca de meio milhão em qualquer altura do processo, 31 trabalhava como emigrantes nos países vizinhos e estava exposta a ideias políticas que eram reprimidas no seu próprio país. Os moçambicanos no estrangeiro estavam em melhor posição para reagir à primeira onda de descolonização em África, que se verificou em finais dos anos cinquenta, formando um conjunto de movimentos, sobretudo regionais ou étnicos, dos quais os mais importantes foram a UDE- NAMO e a MANU. A União Democrática Nacional de Moçambique (UDENAMO) fora formada por pessoas oriundas do sul de Moçambique e que viviam na Rodésia, em 1960, enquanto a Mozambique African National Union (MANU) 32 apareceu como uma organização étnica, de auto-ajuda dos makonde, constituída em Tanganica em 1961 e que representava interesses do norte de Moçambique. Uma terceira organização, a União Nacional Africana de Moçambique Independente (UNAMI), foi criada nessa mesma altura, congregando pessoas residentes no estrangeiro (terras do Niassa) e oriundas de Moçambique central. Incentivados pelo CONCP e guiados por Julius Nyerere de Tanganica e Kwame Nkrumah do Gana, 33 os três movimentos juntaram-se para realizar uma conferência da unidade, em Dar es Salaam, no mês de Junho de 1962, e na qual foi criada a Frente para a Libertação de Moçambique (FRELIMO), o primeiro movimento de libertação verdadeiramente nacional de Moçambique. Três meses depois, ou seja, em Setembro de 1962, o movimento foi realmente lançado, aquando do seu congresso inaugural, no qual, entre outros aspectos, foram enunciados os objectivos da frente, a saber ”promover a união entre os moçambicanos; desenvolver a alfabetização, a formação das mulheres e de quadros [...]; e procurar uma ampla base de apoio internacional para a eminente luta para a libertação de Moçambique”. 34 Já prevendo a luta, a FRELIMO não tardou em enviar jovens voluntários para a recém-independente Argélia, para treino militar. Por fim, o congresso inaugural nomeou Eduardo Mondlane, 35 o moçambicano negro mais desta- 30. Independentemente disso, a FRELIMO foi incluída na lista dos chamados movimentos ”genuínos” da aliança de Cartum, apoiada pela União Soviética. 31. Marcum (1969) op. cit., p. 195. 32. Nome original em inglês. 33. Mondlane escreveu mais tarde que Nyerere e Nkrumah instaram fortemente os moçambicanos a unir-se ou, ”pelo menos, a evitar a divisão trágica, que está neste momento a lesar a causa da liberdade em Angola” (Eduardo Mondlane: ”A luta pela independência em Moçambique” sem indicação de data nem de local, mas provavelmente Dar es Salaam, Abril de 1963]). 34. Citado em Marcum (1969) op. cit., p. 284. 35. Oriundo de uma família de camponeses do distrito de Gaza, no sul de Moçambique, depois da instrução primária concluída em Moçambique e dos estudos secundários feitos na África do Sul, Mondlane conseguiu uma bolsa de

Os Mondlane e a FRELIMO de Moçambique cado e, na altura, professor assistente de antropologia na Universidade de Syracuse, em Nova Iorque, como o primeiro presidente da FRELlMO. Muito conhecido e respeitado pelas suas posições nacionalistas, Mondlane foi um candidato de compromisso, uma vez que não estava demasiado conotado com nenhum dos movimentos anteriormente existentes. Marcelino dos Santos da UDENAMO foi eleito Secretário para os Assuntos Externos. Os primeiros passos da FRELlMO foram pejados de dificuldades. 36 Logo após o congresso inaugural, Mondlane voltou ao Estados Unidos para um último ano de ensino, e o movimento só começou de facto a congregar apoios após o seu regresso definitivo a Dar es Salaam em 1963. 37 Durante o ano que se seguiu, Mondlane começou activamente a construir uma base internacional de apoio para a FRELlMO, que em 1963 tinha já sido reconhecida pela OUA como o único movimento de libertação representativo de Moçambique pela OUA. Juntamente com Janet Rae Mondlane, criou também o Instituto Moçambicano em Dar es Salaam, para dar instrução primária e ensinar conhecimentos de enfermagem a jovens refugiadas moçambicanas, preparando-as para a continuação dos estudos. Ao mesmo tempo, continuavam os preparativos para a luta armada, que começaria a 25 de Setembro de 1964. estudo na Universidade de Witwatersrand em Joanesburgo. Contudo, em 1949, foi expulso, por ser um ”nativo estrangeiro”. De regresso a Lourenço Marques, Mondlane foi preso pelos portugueses, acabando por conseguir ir para Lisboa em meados de 1950, onde se inscreveu na Faculdade de Letras. Comentaria mais tarde que ”tanto quanto sei, fui o primeiro moçambicano negro a alguma vez entrar na Universidade de Lisboa” (Mondlane op. cit.). Estando ainda em Lisboa, Mondlane conheceu vários estudantes e intelectuais das colónias portuguesas, como Agostinho Neto e Mário de Andrade de Angola, Amílcar Cabral da Guiné e Marcelino dos Santos, seu compatriota. Constantemente perseguido pela polícia secreta, deixou Portugal e foi para os Estados Unidos em finais de 1951, onde obteve um doutoramento em sociologia pela Northwestern University, do Illinois. Em 1957, Mondlane entrou para o Departamento de Protectorados das Nações Unidas em Nova Iorque, e trabalhou nos quatro anos que se seguiram como responsável de investigação para a situação de Tanganica, Sudoeste Africano e Camarões. Visitou Moçambique como funcionário das Nações Unidas em 1961, mas demitiu-se da organização mundial no final desse ano e entrou para a Universidade de Syracuse em Nova Iorque, como professor assistente de antropologia. Ao mesmo tempo, aderiu abertamente ao movimento nacionalista moçambicano e foi convidado a participar na conferência fundadora da FRELIMO, em Junho de 1962 36. Um conjunto de grupos mais pequenos saiu da FRELlMO em 1962–63. Em Junho de 1965 coligaram-se, formando o Comité Revolucionário de Moçambique (COREMO), e constituindo a sua sede em Lusaca, com autorização do governo zambiano. Falando da ajuda sueca ao Instituto Moçambicano da FRELlMO e reivindicando ter a organização mais de quatro mil moçambicanos a seu cargo na Zâmbia, em Junho de 1966, a COREMO fez um pedido não coroado de êxito à ASDI, pedindo apoio financeiro (Carta de Mazunzo M. Bobo, COREMO Secretário Nacional para os Negócios Estrangeiros, a Ernst Michanek, Director-Geral da ASDI, Lusaca, 15 de Junho de 1966) (SDA). Por essa altura, a organização foi conhecida pelos do Comités da África Austral de Lund e Uppsala. Juntamente com a FRELlMO, o boletim de informação Syd- och Sydvästafrika apresentava da seguinte forma a COREMO: ”outra organização de combatentes, a funcionar na parte sul de Moçambique” (Nº 10, 1966, p. 5), enquanto o comité de Uppsala, em meados de 1967, numa determinada fase, incluía a COREMO no rol dos dez movimentos de libertação da África Austral em prol de quem fazia recolha de fundos (Comité da África Austral de Uppsala: ”Verksamhetsberättelse för tiden 23 februari 1967–29 februari 1968”/”Relatório do período entre 23 de Fevereiro de 1967 e 29 de Fevereiro de 1968”, Uppsala, 17 de Fevereiro de 1968) (UPA). 37. De volta aos Estados Unidos depois do Congresso da FRELlMO em Setembro de 1962, Mondlane deixou a gestão do movimento ao seu ”representante pessoal”, um negro norte-americano chamado Leo Clinton Aldridge (ou Leo Milas, de pseudónimo). Nascido no Texas, nos EUA, Aldridge fazia-se passar por um moçambicano de pais Zulus. Confrontado com o facto de ser um impostor, passou a expulsar vários funcionários, recém-eleitos da FRELlMO, contribuindo assim, em grande medida, para os problemas e dissensões iniciais no seio do movimento. De forma extraordinária, Aldridge, promovido ao cargo de Secretário da Defesa e Segurança, continuou na FRELl- MO até Agosto de 1964, altura em que foi finalmente desmascarado e expulso. Em contrapartida, acusou Eduardo Mondlane de ser agente da Central Intelligence Agency (CIA) dos Estados Unidos. 89

Os M<strong>on</strong>dlane e a FRELIMO de Moçambique<br />

cado e, na altura, professor assistente de antropologia na Universidade de Syracuse, em<br />

Nova Iorque, como o primeiro presidente da FRELlMO. Muito c<strong>on</strong>hecido e respeitado<br />

pelas suas posições naci<strong>on</strong>alistas, M<strong>on</strong>dlane foi um candidato de compromisso, uma<br />

vez que não estava demasiado c<strong>on</strong>otado com nenhum dos movimentos anteriormente<br />

existentes. Marcelino dos Santos da UDENAMO foi eleito Secretário para os Assuntos<br />

Externos.<br />

Os primeiros passos da FRELlMO foram pejados de dificuldades. 36 Logo após o<br />

c<strong>on</strong>gresso inaugural, M<strong>on</strong>dlane voltou ao Estados Unidos para um último ano de ensino,<br />

e o movimento só começou de facto a c<strong>on</strong>gregar apoios após o seu regresso definitivo<br />

a Dar es Salaam em 1963. 37 Durante o ano que se seguiu, M<strong>on</strong>dlane começou<br />

activamente a c<strong>on</strong>struir uma base internaci<strong>on</strong>al de apoio para a FRELlMO, que em<br />

1963 tinha já sido rec<strong>on</strong>hecida pela OUA como o único movimento de libertação representativo<br />

de Moçambique pela OUA. Juntamente com Janet Rae M<strong>on</strong>dlane, criou<br />

também o Instituto Moçambicano em Dar es Salaam, para dar instrução primária e ensinar<br />

c<strong>on</strong>hecimentos de enfermagem a jovens refugiadas moçambicanas, preparando-as<br />

para a c<strong>on</strong>tinuação dos estudos. Ao mesmo tempo, c<strong>on</strong>tinuavam os preparativos para a<br />

luta armada, que começaria a 25 de Setembro de 1964.<br />

estudo na Universidade de Witwatersrand em Joanesburgo. C<strong>on</strong>tudo, em 1949, foi expulso, por ser um ”nativo estrangeiro”.<br />

De regresso a Lourenço Marques, M<strong>on</strong>dlane foi preso pelos portugueses, acabando por c<strong>on</strong>seguir ir para<br />

Lisboa em meados de 1950, <strong>on</strong>de se inscreveu na Faculdade de Letras. Comentaria mais tarde que ”tanto quanto sei,<br />

fui o primeiro moçambicano negro a alguma vez entrar na Universidade de Lisboa” (M<strong>on</strong>dlane op. cit.). Estando<br />

ainda em Lisboa, M<strong>on</strong>dlane c<strong>on</strong>heceu vários estudantes e intelectuais das colónias portuguesas, como Agostinho<br />

Neto e Mário de Andrade de Angola, Amílcar Cabral da Guiné e Marcelino dos Santos, seu compatriota. C<strong>on</strong>stantemente<br />

perseguido pela polícia secreta, deixou Portugal e foi para os Estados Unidos em finais de 1951, <strong>on</strong>de<br />

obteve um doutoramento em sociologia pela Northwestern University, do Illinois. Em 1957, M<strong>on</strong>dlane entrou para<br />

o Departamento de Protectorados das Nações Unidas em Nova Iorque, e trabalhou nos quatro anos que se seguiram<br />

como resp<strong>on</strong>sável de investigação para a situação de Tanganica, Sudoeste Africano e Camarões. Visitou Moçambique<br />

como funci<strong>on</strong>ário das Nações Unidas em 1961, mas demitiu-se da organização mundial no final desse ano e entrou<br />

para a Universidade de Syracuse em Nova Iorque, como professor assistente de antropologia. Ao mesmo tempo,<br />

aderiu abertamente ao movimento naci<strong>on</strong>alista moçambicano e foi c<strong>on</strong>vidado a participar na c<strong>on</strong>ferência fundadora<br />

da FRELIMO, em Junho de 1962<br />

36. Um c<strong>on</strong>junto de grupos mais pequenos saiu da FRELlMO em 1962–63. Em Junho de 1965 coligaram-se,<br />

formando o Comité Revoluci<strong>on</strong>ário de Moçambique (COREMO), e c<strong>on</strong>stituindo a sua sede em Lusaca, com autorização<br />

do governo zambiano. Falando da ajuda sueca ao Instituto Moçambicano da FRELlMO e reivindicando ter<br />

a organização mais de quatro mil moçambicanos a seu cargo na Zâmbia, em Junho de 1966, a COREMO fez um<br />

pedido não coroado de êxito à ASDI, pedindo apoio financeiro (Carta de Mazunzo M. Bobo, COREMO Secretário<br />

Naci<strong>on</strong>al para os Negócios Estrangeiros, a Ernst Michanek, Director-Geral da ASDI, Lusaca, 15 de Junho de<br />

1966) (SDA). Por essa altura, a organização foi c<strong>on</strong>hecida pelos do Comités da África Austral de Lund e Uppsala.<br />

Juntamente com a FRELlMO, o boletim de informação Syd- och Sydvästafrika apresentava da seguinte forma a<br />

COREMO: ”outra organização de combatentes, a funci<strong>on</strong>ar na parte sul de Moçambique” (Nº 10, 1966, p. 5),<br />

enquanto o comité de Uppsala, em meados de 1967, numa determinada fase, incluía a COREMO no rol dos dez<br />

movimentos de libertação da África Austral em prol de quem fazia recolha de fundos (Comité da África Austral de<br />

Uppsala: ”Verksamhetsberättelse för tiden 23 februari 1967–29 februari 1968”/”Relatório do período entre 23 de<br />

Fevereiro de 1967 e 29 de Fevereiro de 1968”, Uppsala, 17 de Fevereiro de 1968) (UPA).<br />

37. De volta aos Estados Unidos depois do C<strong>on</strong>gresso da FRELlMO em Setembro de 1962, M<strong>on</strong>dlane deixou a<br />

gestão do movimento ao seu ”representante pessoal”, um negro norte-americano chamado Leo Clint<strong>on</strong> Aldridge<br />

(ou Leo Milas, de pseudónimo). Nascido no Texas, nos EUA, Aldridge fazia-se passar por um moçambicano de<br />

pais Zulus. C<strong>on</strong>fr<strong>on</strong>tado com o facto de ser um impostor, passou a expulsar vários funci<strong>on</strong>ários, recém-eleitos da<br />

FRELlMO, c<strong>on</strong>tribuindo assim, em grande medida, para os problemas e dissensões iniciais no seio do movimento.<br />

De forma extraordinária, Aldridge, promovido ao cargo de Secretário da Defesa e Segurança, c<strong>on</strong>tinuou na FRELl-<br />

MO até Agosto de 1964, altura em que foi finalmente desmascarado e expulso. Em c<strong>on</strong>trapartida, acusou Eduardo<br />

M<strong>on</strong>dlane de ser agente da Central Intelligence Agency (CIA) dos Estados Unidos.<br />

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