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180 Tor Sellström sul, através do Malawi e até Tete”. 34 Batendo a capacidade de manobra do equipamento convencional estacionário de Kaúlza de Arriaga, os grupos móveis de Machel com os seus combatentes pela liberdade de Machel atingiram os portugueses na linha por detrás da sua retaguarda. Em Outubro de 1970, a FRELIMO atravessou o Zambezi, ameaçando pela primeira vez as regiões de colonos ocidentais. Ao contrário do que se esperava, o ”golpe final” contra a FRELIMO tinha-se revelado um passo em frente decisivo para o movimento de libertação moçambicano. À medida que, mais ou menos simultaneamente, a FRELIMO começava a coordenar as suas actividades militares com a ZANU, este avanço para o centro de Moçambique teria um impacto radical sobre a luta de libertação no Zimbabué. 35 Juventude e solidariedade entre estudantes Foi, paradoxalmente, durante a crise de 1968 e 1970 que a FRELIMO começou a ter um vasto apoio popular na Suécia. Como efeito combinado das actividades de divulgação de informação levadas a cabo por Eduardo e Janet Mondlane a partir de meados da década de sessenta e de um debate público quando à proposta de participação da ASEA no projecto de Cahora Bassa em 1968–69, alguns jovens, estudantes e organizações de solidariedade lançaram importantes campanhas em prol da FRELIMO, que se realizaram numa altura em que a ajuda do governo sueco ao Instituto Moçambicano estava suspensa. No caso da FRELIMO, as iniciativas de solidariedade das organizações não governamentais viriam, num período particularmente difícil para o movimento de libertação, a desempenhar um papel muito importante. Passados trinta anos sobre a data em questão, e falando do trabalho realizado em 1969, durante a ”Operação um dia de trabalho”, pelos estudantes do ensino secundário suecos, Janet Mondlane recordaria quase trinta anos depois a forma como começou de facto uma espécie de consciência de massa sobre o que estava a acontecer em Moçambique. [...] Não foi só o dinheiro que teve importância, mas foi sobretudo a sensibilização da população no seu todo. [...] Tratou-se de um acontecimento marcante. A partir daí os acontecimentos sucederam-se uns aos outros, sem parar. 36 Sob inspiração de Eduardo Mondlane, um primeiro grupo de apoio, tinha sido formado em Uppsala no final de 1966, com o objectivo principal de angariar ajuda incondicional para a FRELIMO. Contudo, esse primeiro esforço não foi muito bem-sucedido e o movimento dissolver-se-ia no início de 1970. Por essa altura já tinham arrancado iniciativas de solidariedade mais coerentes como, por exemplo, o lançamento pela Juventude Social Democrata da operação de distribuição de uma versão em sueco do jornal da FRELI- MO, geralmente publicado em língua inglesa, o Mozambique Revolution. Além disso, o Emmaus-Björkå tinham começado a distribuir vestuário aos refugiados moçambicanos 34. Ibid. 35. A ZANU não estava filiada na aliança de Cartum de movimentos de libertação ”autênticos”. Contudo, lidar com a ZANU era como ”negociar com o Diabo” (Christie op. cit., p. 78), pois era evidente para a FRELIMO que a ZANU era um movimento de libertação determinado e sério, que usufruía de amplo apoio popular. A FRELIMO começou por oferecer à ZAPU a possibilidade desta utilizar os seus azimutes para a fronteira com o Zimbabué, mas a ZAPU encontrava-se nesse momento em profunda crise e não respondeu à oferta. A FRELIMO dirigiu-se então à ZANU e, em Julho de 1970, entraram na parte norte de Tete os primeiros guerrilheiros da ZANU, com o objectivo de trabalhar ao lado da FRELIMO. Foi a partir das suas bases em Tete que a ZANU lançou em Dezembro de 1972 a tantas vezes adiada guerra de libertação no Zimbabué (consulte as entrevistas com Joaquim Chissano (p. 41), Marcelino dos Santos (p. 49) e Sérgio Vieira (p. 56)). 36. Entrevista com Janet Mondlane, p. 42.
A FRELIMO de Moçambique: Abrir um caminho sob protecção da FRELIMO, na Tanzânia. 37 Em Novembro de 1968, Sören Lindh, que viria a tornar-se num dos mais destacados membros dos Grupos de África na Suécia, formou um grupo de apoio à FRELIMO que era composto por funcionários públicos, seus colegas de trabalho, a que chamou a Agência Sueca para o Desenvolvimento Administrativo. 38 Ainda activo trinta anos depois, foi este o grupo que mais trabalhou com a promoção da causa da FRELIMO na Suécia. Lindh não teve quaisquer contactos prévios com o movimento de libertação moçambicano. Preocupado com a questão mais abrangente da solidariedade internacional, e influenciado pelos artigos publicados em Moçambique por Anders Johansson no Dagens Nyheter, decidiu criar um grupo da FRELIMO, uma vez que o ”apoio ao Vietname não era uma opção politicamente realista ao nível de uma agência governamental”. 39 O principal objectivo era a angariação de fundos. Os membros do grupo disponibilizaram- 37. Os grupos Emmaus suecos dariam, a partir do final da década de sessenta, contributos muito significativos para os movimentos de libertação da África Austral. Nessa colaboração próxima estiveram particularmente activos o Emmaus-Björkå do sul da Suécia, nomeadamente no envio de grandes quantidades de roupa para os movimentos. Para mais informações quanto à importância da ajuda prestada consulte, por exemplo, as entrevistas a Kumbirai Kangai da ZANU (pp. 215–16) e a Rica Hodgson do ANC (p. 133). Entrevistado em 1996, o presidente Joaquim Chissano recordou a forma como, durante a sua visita à Suécia, no remoto Novembro de 1970, ”trabalhara especialmente com o Emmaus-Björkå” (Entrevista com Joaquim Chissano, p. 40). De acordo com um estudo realizado pela ASDI, o valor do vestuário enviado pelo Emmaus-Björkå à FRELIMO só em 1972 ascendia a quase 1,7 milhões de coroas suecas, ou seja, igual ao total da ajuda humanitária sueca ao Instituto Moçambicano entre 1965 e 1968. No mesmo ano, o Emmaus-Björkå enviaram roupa no valor de 1,1 milhões de coroas suecas ao MPLA de Angola, 0,9 milhões ao PAIGC da Guiné-Bissau, meio milhão à SWAPO da Namíbia e 75.000 à ZANU do Zimbabué, ou seja, um valor combinado de bem mais de 4 milhões de coroas suecas para os cinco movimentos de libertação. Este valor corresponde, por sua vez, a cerca de 8 por cento do valor total doado pelas ONGs suecas ao continente africano no seu todo em 1972 (Jörgen Knudtzon e Miriam Magnusson: ”Svenska icke-statliga organisationers u-hjälp 1972”/”Ajuda ao desenvolvimento por organizações não-governamentais suecas 1972”, ASDI [sem indicação de local nem de data] (SDA). Várias outras organizações suecas de solidariedade, nomeadamente ”Pão e Peixes” (Brödet och Fiskarna) e os Grupos de África seguiriam mais tarde o exemplo do Emmaus-Björkå. No caso do ”Pão e Peixes” que, tal como os grupos Emmaus, tinha uma base religiosa e era inspirada nas ideias do Abbé Pierre, o total da ajuda material sob a forma de vestuário, calçado, equipamento de saúde, etc., dada aos movimentos de libertação na Namíbia, na África do Sul e no Zimbabué entre 1974 e 1993 foi calculado entre 300 e 400 milhões de coroas suecas (Bertil Högberg: ”Det materiella stödet till befrielserörelserna från Brödet och Fiskarna”/”A ajuda material aos movimentos de libertação do ”Pão e Peixes”, Uppsala, 7 de Março de 1997) (BHC). Os grupos Emmaus de Björkå, Estocolmo e Sundsvall juntaram forças como ”Pão e Peixes”, sedeado em Västerås, e formaram a organização nacional chamada ”Solidariedade Prática” (Praktisk Solidaritet). Por essa altura, a recolha de vestuário e outros artigos tinha aumentado, transformando-se numa verdadeira ”indústria da solidariedade”. Durante o seu primeiro ano de actividade, a Solidariedade Prática recolheu 4 mil toneladas de roupa, destinadas principalmente ao ANC, à SWAPO e aos países independentes da África Austral. Essa quantidade corresponde, em termos monetários, a cerca de 120 milhões de coroas suecas (Lasse Ström: ”Fler idealister behövs!”/”Precisam-se: Mais idealistas!”, em Afrikabulletinen, Nº 4, Junho de 1991, p. 34). A partir de 1973–74, e através da ASDI, o governo sueco contribuiu para os custos de transporte do vestuário e de outros artigos recolhidos pelas várias ONGs em prol dos movimentos de libertação. Durante os dezoito anos decorridos até 1990–91, foi pago um valor total de 85,3 milhões de coroas suecas para esta finalidade (valores relativos a despesas efectuadas, de acordo com as contas da ASDI, revistas anualmente e determinadas para este estudo por Ulla Beckman). 38. Em sueco, Statskontoret. 39. Entrevista com Sören Lindh, p. 304. Apesar de pontos de vista divergentes entre o movimento de solidariedade e o governo sueco, ambos apoiavam firmemente a FRELIMO. Marcelino dos Santos declararia mais tarde que nunca se sentiu inibido por nenhum dos partidos (entrevista com Marcelino dos Santos, p. 50). Noutras partes da Europa, a FRELIMO encontrava frequentemente outro tipo de situação. Depois de participar numa conferência de solidariedade em Oxford (Inglaterra) em Abril de 1974, Janet Mondlane escreveu para a FRELIMO, dizendo que a conferência tinha ”corrido bastante bem, com excepção das discussões entre os grupos alemães ocidentais. Contudo, tendo presente que acontecem todos os anos, as discussões não surpreenderam ninguém” (Carta de Janet Rae Mondlane à FRELIMO, Londres, 29 de Abril de 1974) (AHM). Entrevistada em 1996, recordou a ”participação nas conferências de solidariedade europeias, onde nos encontrávamos com a extrema esquerda e com os moderados, com tendências de direita. Os movimentos de libertação limitavam-se a descontrair e assistir ao que se passava entre os vários movimentos de solidariedade. O problema não tinha mesmo nada a ver connosco. Era uma coisa entre eles” (Entrevista com Janet Mondlane, p. 44). 181
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combatentes pela liberdade de Machel atingiram os portugueses na linha por detrás da<br />
sua retaguarda. Em Outubro de 1970, a FRELIMO atravessou o Zambezi, ameaçando<br />
pela primeira vez as regiões de col<strong>on</strong>os ocidentais. Ao c<strong>on</strong>trário do que se esperava, o<br />
”golpe final” c<strong>on</strong>tra a FRELIMO tinha-se revelado um passo em frente decisivo para o<br />
movimento de libertação moçambicano. À medida que, mais ou menos simultaneamente,<br />
a FRELIMO começava a coordenar as suas actividades militares com a ZANU, este<br />
avanço para o centro de Moçambique teria um impacto radical sobre a luta de libertação<br />
no Zimbabué. 35<br />
Juventude e solidariedade entre estudantes<br />
Foi, paradoxalmente, durante a crise de 1968 e 1970 que a FRELIMO começou a ter um<br />
vasto apoio popular na Suécia. Como efeito combinado das actividades de divulgação de<br />
informação levadas a cabo por Eduardo e Janet M<strong>on</strong>dlane a partir de meados da década de<br />
sessenta e de um debate público quando à proposta de participação da ASEA no projecto<br />
de Cahora Bassa em 1968–69, alguns jovens, estudantes e organizações de solidariedade<br />
lançaram importantes campanhas em prol da FRELIMO, que se realizaram numa altura<br />
em que a ajuda do governo sueco ao Instituto Moçambicano estava suspensa. No caso da<br />
FRELIMO, as iniciativas de solidariedade das organizações não governamentais viriam,<br />
num período particularmente difícil para o movimento de libertação, a desempenhar<br />
um papel muito importante. Passados trinta anos sobre a data em questão, e falando do<br />
trabalho realizado em 1969, durante a ”Operação um dia de trabalho”, pelos estudantes<br />
do ensino secundário suecos, Janet M<strong>on</strong>dlane recordaria quase trinta anos depois<br />
a forma como começou de facto uma espécie de c<strong>on</strong>sciência de massa sobre o que estava a<br />
ac<strong>on</strong>tecer em Moçambique. [...] Não foi só o dinheiro que teve importância, mas foi sobretudo<br />
a sensibilização da população no seu todo. [...] Tratou-se de um ac<strong>on</strong>tecimento marcante.<br />
A partir daí os ac<strong>on</strong>tecimentos sucederam-se uns aos outros, sem parar. 36<br />
Sob inspiração de Eduardo M<strong>on</strong>dlane, um primeiro grupo de apoio, tinha sido formado<br />
em Uppsala no final de 1966, com o objectivo principal de angariar ajuda inc<strong>on</strong>dici<strong>on</strong>al<br />
para a FRELIMO. C<strong>on</strong>tudo, esse primeiro esforço não foi muito bem-sucedido e o movimento<br />
dissolver-se-ia no início de 1970. Por essa altura já tinham arrancado iniciativas<br />
de solidariedade mais coerentes como, por exemplo, o lançamento pela Juventude Social<br />
Democrata da operação de distribuição de uma versão em sueco do jornal da FRELI-<br />
MO, geralmente publicado em língua inglesa, o Mozambique Revoluti<strong>on</strong>. Além disso, o<br />
Emmaus-Björkå tinham começado a distribuir vestuário aos refugiados moçambicanos<br />
34. Ibid.<br />
35. A ZANU não estava filiada na aliança de Cartum de movimentos de libertação ”autênticos”. C<strong>on</strong>tudo, lidar<br />
com a ZANU era como ”negociar com o Diabo” (Christie op. cit., p. 78), pois era evidente para a FRELIMO que<br />
a ZANU era um movimento de libertação determinado e sério, que usufruía de amplo apoio popular. A FRELIMO<br />
começou por oferecer à ZAPU a possibilidade desta utilizar os seus azimutes para a fr<strong>on</strong>teira com o Zimbabué, mas<br />
a ZAPU enc<strong>on</strong>trava-se nesse momento em profunda crise e não resp<strong>on</strong>deu à oferta. A FRELIMO dirigiu-se então à<br />
ZANU e, em Julho de 1970, entraram na parte norte de Tete os primeiros guerrilheiros da ZANU, com o objectivo<br />
de trabalhar ao lado da FRELIMO. Foi a partir das suas bases em Tete que a ZANU lançou em Dezembro de 1972<br />
a tantas vezes adiada guerra de libertação no Zimbabué (c<strong>on</strong>sulte as entrevistas com Joaquim Chissano (p. 41),<br />
Marcelino dos Santos (p. 49) e Sérgio Vieira (p. 56)).<br />
36. Entrevista com Janet M<strong>on</strong>dlane, p. 42.