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176 Tor Sellström longo dos anos, a conseguir aumentar a sua presença nas províncias do norte, criando a sua própria administração, bem como escolas, clínicas e um sistema de comércio, com lojas do povo, semelhantes às criadas pelo PAIGC na Guiné-Bissau 11 . Em Março de 1968, Mondlane anunciou a abertura de uma nova frente militar na província de Tete, sede do projecto de Cahora Bassa e, quatro meses depois, a FRELIMO realizou o seu segundo congresso em Machedje, no Niassa. 12 Durante a conferência de Cartum, que teve lugar em Janeiro de 1969, o movimento foi reconhecido pela Organização Afro-Asiática de Solidariedade entre os povos e pelo Conselho da Paz, patrocinado pelos soviéticos, como a ”única autoridade legítima” de Moçambique. 13 Ao mesmo tempo, a FRELIMO foi incluída, juntamente com o ANC da África do Sul, o MPLA de Angola, o PAIGC da Guiné-Bissau, a SWAPO da Namíbia e a ZAPU do Zimbabué, no grupo dos movimentos de libertação designados ”autênticos”. 14 Com o sólido relacionamento político e de ajuda criado pelos Mondlane, nos finais dos anos sessenta, a FRELIMO estava em melhor posição do que os movimentos de libertação da África Austral para receber ajuda oficial directa sueca. Quando, em Maio de 1969, o parlamento sueco apoiou essa política, o movimento moçambicano estava contudo mergulhado numa crise profunda. No início de 1968 tinha estalado um conflito aberto na escola secundária do Instituto Moçambicano em Dar es Salaam, que haveria de levar à suspensão da ajuda sueca. Foi, de variadas formas, um prelúdio para a luta interna que culminou com o assassinato de Eduardo Mondlane, por meio de uma carta armadilhada, a 3 de Fevereiro de 1969, em Dar es Salaam. Esse conflito só ficaria definitivamente sanado com a chegada à presidência do movimento de Samora Machel, em Maio de 1970. A crise da FRELIMO e a contra-ofensiva portuguesa As contradições inerentes à estrutura de topo da FRELIMO vieram abruptamente ao de cima em 1968. Um grupo de ”tradicionalistas que pretendiam uma campanha menos política” 15 e que perfilhavam uma ”postura estreita e nacionalista com tons raciais 11. Em Moçambique, os ”armazéns do povo” eram chamados lojas do povo. 12. Foram muito poucas as pessoas estranhas ao movimento a ter, na altura, oportunidade de visitar as zonas libertadas no norte de Moçambique. A acompanhar Eduardo Mondlane na sua primeira entrada no país como presidente da FRELIMO, Anders Johansson do jornal liberal sueco Dagens Nyheter tornou-se, em Fevereiro de 1968, no primeiro jornalista internacional a fazer um relato da situação na província de Cabo Delgado. Os seus artigos viriam a ter um grande impacto, não apenas na Suécia, mas também em todo o mundo. O jornalista e historiador britânico Basil Davidson esteve presente no congresso da FRELIMO no Niassa, em Julho de 1968. De Setembro a Outubro de 1968, uma equipa de seis estudantes da Universidade de Dar es Salaam, chefiada pelo futuro presidente do Uganda, Yoweri Museveni, fez uma longa viagem por Cabo Delgado e Niassa. Museveni ficou muito impressionado com o que pôde constatar e escreveu um importante ensaio para o jornal universitário, que viria depois a ser incluído num livro editado pelo académico e político do Zimbabué, Nathan Shamuyarira (Yoweri T. Museveni: ”Fanon’s theory on Violence: Its verification in Liberated Mozambique” em N. M. Shamuyarira (ed.): Essays on the Liberation of Southern Africa, Universidade de Dar es Salaam, Estudos em Ciência Política, Nº. 3, Tanzania Publishing House, Dar es Salaam, 1972, pp. 1–24). Por intermédio da atenção internacional dada ao projecto de Cahora Bassa, a luta da FRELIMO e a situação no norte de Moçambique foram alvo de uma larga cobertura mediática a partir de 1968. 13. Citado em ”A Conferência de Cartum: Primeira conferência internacional da Solidariedade” em Legum e Drysdale op. cit., p. C 155. 14. A FRELIMO conseguiu manter a sua situação favorecida, tanto em Moscovo como em Pequim. Cf. as entrevistas com Janet Mondlane (p. 43) e Joaquim Chissano (p. 40). 15. Malyn Newitt: A History of Mozambique, Hurst & Company, Londres, 1995, pp. 524–25.

A FRELIMO de Moçambique: Abrir um caminho Funeral de Eduardo Mondlane, Presidente da Frelimo, em Dar es Salaam, Fevereiro de 1969: O Presidente Nyerere com Janet Mondlane e os três filhos dos Mondlanes (Foto: Uhuru Publications, Dar es Salaam) e tribalistas” 16 começou a opor-se frontalmente à maioria na FRELIMO, congregada à volta da figura do presidente Mondlane. 17 O grupo dissidente era liderado por Lázaro Nkavandame, o secretário de província da FRELIMO para Cabo Delgado, que, a nível das cúpulas, estava próximo do vice presidente, o Reverendo Uria Simango, e o Instituto Moçambicano era apoiado pelo padre e professor católico Mateus Gwenjere. Foi Gwenjere quem, em Janeiro de 1968, incitou os estudantes da escola secundária do instituto a entrar em greve, acusando Janet Mondlane de ter ligações à CIA e de estar contra os moçambicanos brancos e os professores a trabalhar fora do país. Entretanto, Nkavandame iniciara uma campanha de angariação de apoio para a constituição de um movimento separatista em Cabo Delgado. Recusando-se a participar no segundo congresso da 16. Allan Isaacman e Barbara Isaacman: Mozambique: From Colonialism to Revolution, 1900–1982, Westview Press, Boulder, Colorado, 1983, p. 97. 17. Para mais informações sobre a crise da FRELIMO em 1968–70, consulte Christie op. cit., pp. 48–60. Para mais informações sobre as contradições ao nível da produção, consulte Bertil Egerö: Mozambique: A Dream Undone: ong>Theong> Political Economy of Democracy, 1975–84 (”Moçambique: Um sonho não realizado: A política económica da democracia, 1975–84”), Nordiska Afrikainstitutet, Uppsala, 1987, pp. 17–27. Nkavandame e a maior parte dos seus seguidores eram makonde do norte de Moçambique, sendo contrários às posições radicais defendidas pelos líderes das partes mais a sul do país, nomeadamente Eduardo Mondlane, Marcelino dos Santos, Samora Machel e Joaquim Chissano. Apoiados por alguns membros do executivo da Tanzânia, o grupo de Nkavandame virou-se de forma muito virulenta contra os membros brancos da FRELIMO, conseguindo que alguns deles fossem expulsos do país em Maio de 1968. Para mais informações sobre a difícil situação na altura das filiadas brancas no partido consulte a entrevista com Janet Mondlane, p. 44. Cf. e também a entrevista com Pamela dos Santos em Hilda Bernstein: ong>Theong> Rift: ong>Theong> Exile Experience of South Africans, Jonathan Cape, Londres, 1994, pp. 387–391. Tendo-se casado com Marcelino dos Santos em 1968, Pamela dos Santos, do ANC da África do Sul, trabalhava no gabinete da ASDI em Dar es Salaam, em meados da década de sessenta. Haveria depois de trabalhar no Departamento de Informação e Propaganda da FRELIMO. 177

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Tor Sellström<br />

l<strong>on</strong>go dos anos, a c<strong>on</strong>seguir aumentar a sua presença nas províncias do norte, criando a<br />

sua própria administração, bem como escolas, clínicas e um sistema de comércio, com lojas<br />

do povo, semelhantes às criadas pelo PAIGC na Guiné-Bissau 11 . Em Março de 1968,<br />

M<strong>on</strong>dlane anunciou a abertura de uma nova frente militar na província de Tete, sede do<br />

projecto de Cahora Bassa e, quatro meses depois, a FRELIMO realizou o seu segundo<br />

c<strong>on</strong>gresso em Machedje, no Niassa. 12 Durante a c<strong>on</strong>ferência de Cartum, que teve lugar<br />

em Janeiro de 1969, o movimento foi rec<strong>on</strong>hecido pela Organização Afro-Asiática de<br />

Solidariedade entre os povos e pelo C<strong>on</strong>selho da Paz, patrocinado pelos soviéticos, como<br />

a ”única autoridade legítima” de Moçambique. 13 Ao mesmo tempo, a FRELIMO foi<br />

incluída, juntamente com o ANC da África do Sul, o MPLA de Angola, o PAIGC da<br />

Guiné-Bissau, a SWAPO da Namíbia e a ZAPU do Zimbabué, no grupo dos movimentos<br />

de libertação designados ”autênticos”. 14<br />

Com o sólido relaci<strong>on</strong>amento político e de ajuda criado pelos M<strong>on</strong>dlane, nos finais<br />

dos anos sessenta, a FRELIMO estava em melhor posição do que os movimentos de<br />

libertação da África Austral para receber ajuda oficial directa sueca. Quando, em Maio<br />

de 1969, o parlamento sueco apoiou essa política, o movimento moçambicano estava<br />

c<strong>on</strong>tudo mergulhado numa crise profunda. No início de 1968 tinha estalado um<br />

c<strong>on</strong>flito aberto na escola secundária do Instituto Moçambicano em Dar es Salaam, que<br />

haveria de levar à suspensão da ajuda sueca. Foi, de variadas formas, um prelúdio para a<br />

luta interna que culminou com o assassinato de Eduardo M<strong>on</strong>dlane, por meio de uma<br />

carta armadilhada, a 3 de Fevereiro de 1969, em Dar es Salaam. Esse c<strong>on</strong>flito só ficaria<br />

definitivamente sanado com a chegada à presidência do movimento de Samora Machel,<br />

em Maio de 1970.<br />

A crise da FRELIMO e a c<strong>on</strong>tra-ofensiva portuguesa<br />

As c<strong>on</strong>tradições inerentes à estrutura de topo da FRELIMO vieram abruptamente ao<br />

de cima em 1968. Um grupo de ”tradici<strong>on</strong>alistas que pretendiam uma campanha menos<br />

política” 15 e que perfilhavam uma ”postura estreita e naci<strong>on</strong>alista com t<strong>on</strong>s raciais<br />

11. Em Moçambique, os ”armazéns do povo” eram chamados lojas do povo.<br />

12. Foram muito poucas as pessoas estranhas ao movimento a ter, na altura, oportunidade de visitar as z<strong>on</strong>as libertadas<br />

no norte de Moçambique. A acompanhar Eduardo M<strong>on</strong>dlane na sua primeira entrada no país como presidente<br />

da FRELIMO, Anders Johanss<strong>on</strong> do jornal liberal sueco Dagens Nyheter tornou-se, em Fevereiro de 1968,<br />

no primeiro jornalista internaci<strong>on</strong>al a fazer um relato da situação na província de Cabo Delgado. Os seus artigos<br />

viriam a ter um grande impacto, não apenas na Suécia, mas também em todo o mundo. O jornalista e historiador<br />

britânico Basil Davids<strong>on</strong> esteve presente no c<strong>on</strong>gresso da FRELIMO no Niassa, em Julho de 1968. De Setembro a<br />

Outubro de 1968, uma equipa de seis estudantes da Universidade de Dar es Salaam, chefiada pelo futuro presidente<br />

do Uganda, Yoweri Museveni, fez uma l<strong>on</strong>ga viagem por Cabo Delgado e Niassa. Museveni ficou muito impressi<strong>on</strong>ado<br />

com o que pôde c<strong>on</strong>statar e escreveu um importante ensaio para o jornal universitário, que viria depois a<br />

ser incluído num livro editado pelo académico e político do Zimbabué, Nathan Shamuyarira (Yoweri T. Museveni:<br />

”Fan<strong>on</strong>’s <strong>the</strong>ory <strong>on</strong> Violence: Its verificati<strong>on</strong> in Liberated Mozambique” em N. M. Shamuyarira (ed.): Essays <strong>on</strong> <strong>the</strong><br />

Liberati<strong>on</strong> of Sou<strong>the</strong>rn Africa, Universidade de Dar es Salaam, Estudos em Ciência Política, Nº. 3, Tanzania Publishing<br />

House, Dar es Salaam, 1972, pp. 1–24). Por intermédio da atenção internaci<strong>on</strong>al dada ao projecto de Cahora<br />

Bassa, a luta da FRELIMO e a situação no norte de Moçambique foram alvo de uma larga cobertura mediática a<br />

partir de 1968.<br />

13. Citado em ”A C<strong>on</strong>ferência de Cartum: Primeira c<strong>on</strong>ferência internaci<strong>on</strong>al da Solidariedade” em Legum e Drysdale<br />

op. cit., p. C 155.<br />

14. A FRELIMO c<strong>on</strong>seguiu manter a sua situação favorecida, tanto em Moscovo como em Pequim. Cf. as entrevistas<br />

com Janet M<strong>on</strong>dlane (p. 43) e Joaquim Chissano (p. 40).<br />

15. Malyn Newitt: A History of Mozambique, Hurst & Company, L<strong>on</strong>dres, 1995, pp. 524–25.

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