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164 Tor Sellström A Suécia e a União Soviética eram os maiores doadores do PAIGC. 143 Enquanto a Suécia privilegiava a componente civil, os soviéticos eram os principais municiadores da luta no campo militar. 144 Havia uma divisão não coordenada, mas não menos real, de facto, entre os dois estados o que foi, em larga escala, copiado para os movimentos de libertação da África Austral. 145 O facto de, aos olhos dos Estados Unidos e de outros grandes estados ocidentais, a Suécia ser vista como estando a partilhar uma causa com o bloco comunista não desencorajou o parlamento nem o governo suecos de fornecer ajuda não militar. 146 No início da década de setenta a maior crítica que se fazia ao governo social democrata (tanto por parte da oposição não-socialista do Partido Liberal, como pelo movimento de solidariedade) tinha a ver com as relações comerciais que a Suécia mantinha com Portugal, seu parceiro na EFTA, pois dizia-se que aumentar a ajuda humanitária oficial ao PAIGC e seu aliados da CONCP e, ao mesmo tempo, aumentar o comércio com a potência colonial portuguesa era altamente imoral e contraditório. 147 Para os Grupos de África este facto constituía a prova de que o governo ”protegia os interesses dos imperialistas suecos”. 148 O escritor e activista Göran Palm que, depois de uma visita às zonas libertadas da Guiné-Bissau, nos finais de 1969, escrevera entusiasticamente que fora recebido ”como um príncipe” por causa da ajuda sueca, 149 concluía em 1971 que ”a Suécia dá com a mão esquerda social democrata, mas tira com a mão direita, capitalista”. 150 As conclusões de Palm foram apresentadas no prefácio de um livro de textos em sueco, escrito por Amílcar Cabral, e publicado com o título A nossa luta, a Vossa luta. O título foi retirado de um discurso feito em 1964, no qual Cabral declarava que o Imperialismo era o inimigo comum da classe operária internacional e dos movimentos de libertação nacionais. Daí que devesse ser combatido numa ”luta comum”. 151 O discurso de Cabral, incluído na antologia Guerrilha 152 de Anders Ehnmark, foi muito citado pelo movimento anti-imperialista sueco. Numa conferência em Estocolmo em que participaram os Grupos de África de Arvika, Gotemburgo, Estocolmo e Uppsala, que se auto-proclamavam ”grupos de trabalho anti-imperialistas” 153 e que definiram como um dos seus principais 143. Marianne Rappe: Memorando (”Samtal med Folke Löfgren på SIDA den 21.4.1972: PAIGC”/”Conversa com Folke Löfgren na ASDI 21.4.1972: PAIGC”), ASDI, Estocolmo, 24 de Abril de 1972 (SDA). A ASDI solicitou informação sobre outros doadores ao PAIGC e aos movimentos de libertação da África Austral. A informação era regularmente incluída nos documentos apresentados ao Comité Consultivo para Ajuda Humanitária. 144. Na fase final da guerra de libertação, a União Soviética forneceu ao PAIGC mísseis terra-ar, dando a supremacia, de forma decisiva, ao movimento de libertação. Os mísseis foram pela primeira vez usados em Março de 1973, altura em que o PAIGC abateu dois caças-bombardeiros fornecidos pela República Federal da Alemanha. No ano que se seguiu, os portugueses perderam trinta e seis aviões (Rudebeck op. cit., pp. 52–53). 145. No caso da ZANU do Zimbabué, o principal fornecedor de armas era a República Popular da China. 146. Ver, por exemplo, as entrevistas com o antigo director geral da ASDI (1965–79) Ernst Michanek (p. 323) e com a antiga Ministra para a Cooperação para o Desenvolvimento Internacional (1985–91) e dos Negócios Estrangeiros (1994–98) Lena Hjelm-Wallén (p. 293). Em 1998, Hjelm-Wallén foi nomeada vice primeiro ministro. 147. Esta perspectiva era também partilhada por importantes grupos dentro do Partido Social Democrata, no poder. Birgitta Dahl, por exemplo, levantou no parlamento sueco a questão da legislação contra investimentos em Portugal e nas suas colónias (”Resposta do Ministro dos Negócios Estrangeiros a uma interpelação pela Sra. Dahl”, 10 de Dezembro de 1973, em Ministério dos Negócios Estrangeiros: Documents on Swedish Foreign Policy: 1973, Estocolmo, 1976, pp. 155–59). 148. AGIS op. cit., p. 194. 149. Göran Palm: ”Rapport från Guiné-Bissau”/”Relatório da Guiné-Bissau” sem indicação de local nem data (SDA). 150. Introdução por Göran Palm a Cabral (1971) op. cit., p. 25. 151. Cabral (1971) op. cit., p. 37. 152. Ehnmark (1968) op. cit., pp. 139–58. 153. ”Protokoll”/”Actas” (”Konferens mellan Afrikagrupperna i Sverige, 2–3 januari 1971”/”Conferência entre os Grupos de África na Suécia, 2–3 de Janeiro de 1971”) sem indicação de local nem data (AGA).

O PAIGC da Guiné-Bissau: Desbravar terreno objectivos ”estudar e combater o imperialismo, especialmente o da Suécia em África” 154 foi adoptada uma directriz, em Janeiro de 1971 ”para a actividade dos grupos”. 155 Terminada a conferência, os grupos enviaram cartas para os gabinetes da FRELIMO, do MPLA e do PAIGC, informando-os de que o trabalho do movimento de solidariedade se baseava ”no princípio formulado pelo camarada Amílcar Cabral”, nomeadamente que a melhor forma de provar a vossa solidariedade é lutar contra o imperialismo nos vossos países, ou seja, na Europa. Enviar-nos medicamentos é positivo, mas secundário. 156 Independentemente das suas posições quanto ao imperialismo, era difícil afirmar, pelo menos no caso da Suécia, que os líderes do PAIGC, da FRELIMO e do MPLA tenham ficado muito estimulados por, no início de 1971, terem sido informados da aplicação de uma declaração geral feita em 1964 e que se aplicava a uma situação concreta, existente nesse primeiro momento. 157 É além disso improvável que considerassem a ajuda humanitária como algo secundário, ou que vissem de todo a Suécia como um país imperialista. 158 O líder citado do PAIGC participara activamente na ajuda sueca. Cabral tinha também uma enorme abertura de espírito face ao relacionamento entre a Suécia e Portugal. Durante a sua primeira visita, realizada nos finais de 1968, declarou, segundo narra Pierre Schori, que Portugal não devia ser excluído da EFTA, pois isso significaria ”que o país poderia agir com ainda mais à-vontade”. 159 Como consta das notas de uma reunião entre o representante das Nações Unidas Sverker Åström e Cabral, realizada em Fevereiro de 1970, este último deixou clara a sua opinião, dizendo perceber perfeitamente que a filiação de Portugal na EFTA impunha certos limites à Suécia, mas que queria destacar que não gostaria, de forma alguma, de recomendar uma interrupção das relações comerciais entre a Suécia e Portugal, corte esse que sabia ser exigido por certos núcleos radicais de jovens na Suécia. 160 Uma vez que encabeçava uma luta de libertação que estava a correr bem e tendo a intenção de manter e desenvolver relacionamentos internacionais depois da independência da Guiné-Bissau, a diplomacia conduzida por Cabral caracterizava-se por um realismo pragmático. De acordo com o académico guineense Carlos Lopes, o seu principal mote condutor era ”a nossa ideologia é o nacionalismo, obter a nossa independência, e obtê-la de uma forma absoluta, e fazendo tudo o que estiver ao nosso alcance usando as nossas próprias forças, embora cooperando com todos os outros povos para conseguir desenvolver o nosso país”. 161 Esta posição não só contrasta com a interpretação ideológica do 154. Os Grupos de África na Suécia: ”Circular No. 3”, sem indicação de local, 8 de Abril de 1971 (AGA). 155. Ibid. Ver também Södra Afrika Informationsbulletin, No. 11, 1971, p. 2. 156. Carta (em francês) em nome dos Grupos de África de Arvika, Lund, Estocolmo e Uppsala, escrita por Dick Urban Vestbro e enviada à FRELIMO, ao MPLA e ao PAIGC, Estocolmo, 3 de Janeiro de 1971 (AGA). 157. Pelo contrário, numa alocução conjunta com Göran Palm na Universidade de Uppsala, em Novembro de 1968, Cabral disse: ”Não se limitem a manifestar-se. Façam também algo de concreto. [...] Enviem-nos medicamentos e outros bens de que necessitamos” (Upsala Nya Tidning, 28 de Novembro de 1968). O primeiro pedido de ajuda sueca à luta de libertação nas colónias portuguesas em África foi feito por Marcelino dos Santos em nome do MPLA, em 1961. Centrava-se no pedido de medicamentos para os refugiados angolanos na região do Baixo Congo. Apercebendo-se da reacção positiva do jornal Expressen, Cabral também pediu ao jornal liberal sueco que ajudasse a conseguir medicamentos. 158. Cf. as entrevistas com Lúcio Lara do MPLA (pp. 18–21) e Marcelino dos Santos da FRELIMO (pp. 47–52). 159. Citado em ”Portugals argumentnöd bevisar: Kolonialkrigen går dåligt!” (”A falta de argumentos de Portugal prova que as guerras coloniais não estão a correr bem!”), em Arbetet, 13 de Dezembro de 1968. 160. Carta (”Samtal med Amílcar Cabral om läget i Portugisiska Guinea”/”Conversa com Amílcar Cabral sobre a situação da Guiné portuguesa”) de Sverker Åström para o Ministério sueco dos Negócios Estrangeiros, Nova Iorque, 26 de Fevereiro de 1970 (SDA). 161. Cabral citado em Lopes op. cit., p. 57. 165

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A Suécia e a União Soviética eram os maiores doadores do PAIGC. 143 Enquanto a Suécia<br />

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ocidentais, a Suécia ser vista como estando a partilhar uma causa com o bloco comunista<br />

não desencorajou o parlamento nem o governo suecos de fornecer ajuda não militar. 146<br />

No início da década de setenta a maior crítica que se fazia ao governo social democrata<br />

(tanto por parte da oposição não-socialista do Partido Liberal, como pelo movimento<br />

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Portugal, seu parceiro na EFTA, pois dizia-se que aumentar a ajuda humanitária oficial<br />

ao PAIGC e seu aliados da CONCP e, ao mesmo tempo, aumentar o comércio com a<br />

potência col<strong>on</strong>ial portuguesa era altamente imoral e c<strong>on</strong>traditório. 147 Para os Grupos de<br />

África este facto c<strong>on</strong>stituía a prova de que o governo ”protegia os interesses dos imperialistas<br />

suecos”. 148 O escritor e activista Göran Palm que, depois de uma visita às z<strong>on</strong>as<br />

libertadas da Guiné-Bissau, nos finais de 1969, escrevera entusiasticamente que fora recebido<br />

”como um príncipe” por causa da ajuda sueca, 149 c<strong>on</strong>cluía em 1971 que ”a Suécia<br />

dá com a mão esquerda social democrata, mas tira com a mão direita, capitalista”. 150<br />

As c<strong>on</strong>clusões de Palm foram apresentadas no prefácio de um livro de textos em sueco,<br />

escrito por Amílcar Cabral, e publicado com o título A nossa luta, a Vossa luta. O título<br />

foi retirado de um discurso feito em 1964, no qual Cabral declarava que o Imperialismo<br />

era o inimigo comum da classe operária internaci<strong>on</strong>al e dos movimentos de libertação<br />

naci<strong>on</strong>ais. Daí que devesse ser combatido numa ”luta comum”. 151 O discurso de Cabral,<br />

incluído na antologia Guerrilha 152 de Anders Ehnmark, foi muito citado pelo movimento<br />

anti-imperialista sueco. Numa c<strong>on</strong>ferência em Estocolmo em que participaram os Grupos<br />

de África de Arvika, Gotemburgo, Estocolmo e Uppsala, que se auto-proclamavam<br />

”grupos de trabalho anti-imperialistas” 153 e que definiram como um dos seus principais<br />

143. Marianne Rappe: Memorando (”Samtal med Folke Löfgren på SIDA den 21.4.1972: PAIGC”/”C<strong>on</strong>versa com<br />

Folke Löfgren na ASDI 21.4.1972: PAIGC”), ASDI, Estocolmo, 24 de Abril de 1972 (SDA). A ASDI solicitou<br />

informação sobre outros doadores ao PAIGC e aos movimentos de libertação da África Austral. A informação era<br />

regularmente incluída nos documentos apresentados ao Comité C<strong>on</strong>sultivo para Ajuda Humanitária.<br />

144. Na fase final da guerra de libertação, a União Soviética forneceu ao PAIGC mísseis terra-ar, dando a supremacia,<br />

de forma decisiva, ao movimento de libertação. Os mísseis foram pela primeira vez usados em Março de 1973,<br />

altura em que o PAIGC abateu dois caças-bombardeiros fornecidos pela República Federal da Alemanha. No ano<br />

que se seguiu, os portugueses perderam trinta e seis aviões (Rudebeck op. cit., pp. 52–53).<br />

145. No caso da ZANU do Zimbabué, o principal fornecedor de armas era a República Popular da China.<br />

146. Ver, por exemplo, as entrevistas com o antigo director geral da ASDI (1965–79) Ernst Michanek (p. 323) e com<br />

a antiga Ministra para a Cooperação para o Desenvolvimento Internaci<strong>on</strong>al (1985–91) e dos Negócios Estrangeiros<br />

(1994–98) Lena Hjelm-Wallén (p. 293). Em 1998, Hjelm-Wallén foi nomeada vice primeiro ministro.<br />

147. Esta perspectiva era também partilhada por importantes grupos dentro do Partido Social Democrata, no poder.<br />

Birgitta Dahl, por exemplo, levantou no parlamento sueco a questão da legislação c<strong>on</strong>tra investimentos em Portugal<br />

e nas suas colónias (”Resposta do Ministro dos Negócios Estrangeiros a uma interpelação pela Sra. Dahl”, 10 de Dezembro<br />

de 1973, em Ministério dos Negócios Estrangeiros: Documents <strong>on</strong> Swedish Foreign Policy: 1973, Estocolmo,<br />

1976, pp. 155–59).<br />

148. AGIS op. cit., p. 194.<br />

149. Göran Palm: ”Rapport från Guiné-Bissau”/”Relatório da Guiné-Bissau” sem indicação de local nem data<br />

(SDA).<br />

150. Introdução por Göran Palm a Cabral (1971) op. cit., p. 25.<br />

151. Cabral (1971) op. cit., p. 37.<br />

152. Ehnmark (1968) op. cit., pp. 139–58.<br />

153. ”Protokoll”/”Actas” (”K<strong>on</strong>ferens mellan Afrikagrupperna i Sverige, 2–3 januari 1971”/”C<strong>on</strong>ferência entre os<br />

Grupos de África na Suécia, 2–3 de Janeiro de 1971”) sem indicação de local nem data (AGA).

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