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O PAIGC da Guiné-Bissau: Desbravar terreno As colónias portuguesas no centro das atenções A situação na África do Sul, onde vigorava o apartheid, dominou o debate na Suécia sobre a África Austral na primeira metade da década de sessenta. Eduardo Mondlane, presidente da FRELIMO de Moçambique, na sua segunda visita à Suécia realizada em Setembro de 1965, criticou abertamente o emergente movimento de solidariedade por, no seu entender, se concentrar quase exclusivamente na África do Sul, dizendo que é uma ilusão acreditar que o problema da África do Sul nada tem a ver com o dos territórios portugueses de Angola e Moçambique ou com a Rodésia do Sul, e que pode ser resolvido sem que estes territórios sejam libertados. É desejável que o movimento na Suécia em prol da África do Sul inclua também os territórios em questão. 1 Muito devido às críticas de Mondlane a situação mudou muito nos finais da década de sessenta. No início de 1966 o Comité de Lund para a África do Sul decidiu ”após muita ponderação” que o seu boletim informativo, o Syd- och Sydvästafrika passaria, doravante, a cobrir a situação ”nos outros países da África Austral”. Explicava-se então que ”os seus problemas têm um vínculo claro com a situação na África do Sul”. Marcava-se assim o início de uma cobertura cada vez mais intensa das lutas de libertação nas colónias portuguesas, deixando para segundo plano a situação na África do Sul e na Namíbia. O êxito da campanha contra a participação da empresa sueca ASEA no projecto de Cahora Bassa em Moçambique, por volta de 1968–69, na altura em que decorria a guerra do Vietname, levou a que o movimento se ocupasse quase em exclusivo da luta armada nas colónias portuguesas. 2 Em Junho de 1971, aquando de uma conferência dos primeiros Grupos de África, oriundos de Arvika, Gotemburgo, Lund, Estocolmo e Uppsala, decidiu-se ”concentrar a propaganda nas colónias portuguesas”. 3 No ano seguinte, o Södra Afrika Informationsbulletin (sucessor do Syd- och Sydvästafrika), dirigido e publicado pelos Grupos de África, afirmava como seu principal objectivo a divulgação ”de informação sobre a actualidade 1. Mondlane em Dagens Nyheter, 17 de Setembro de 1965. 2. Sören Lindh, destacado dirigente dos Grupos de África, diria mais tarde: ”demos prioridade à luta armada nas colónias portuguesas. [...] Isso também implicou não atender exigências de reconhecimento de uma ou outra organização de outras áreas apesar de, obviamente, estarmos solidários com a sua luta” (Entrevista a Sören Lindh, p. 305). 3. Os Grupos de África na Suécia: ”Circular Nº. 4”, sem indicação de lugar, 23 de Setembro de 1971 (AGA). Os Grupos de África começaram, a partir de Outubro de 1970, a enviar circulares em inglês, descrevendo as suas actividades, para os gabinetes dos movimentos de libertação e organizações de solidariedade com intuitos solidários, sobretudo as baseadas na Europa. Estas cartas de informação, nas quais se incluíam comentários sobre a assistência oficial dada pela Suécia aos movimentos de libertação, foram até 1977 escritas ad-hoc. A partir de meados de 1984 começou a ser publicado o Scandinavian Newsletter on Southern Africa (”Boletim Escandinavo sobre a África Austral”), uma publicação mais formal e ambiciosa, na qual era dada informação genérica sobre as relações entre a Dinamarca, a Noruega, a Suécia e a África Austral, mas incidindo sobretudo no tema das sanções contra a África do Sul.

O PAIGC da Guiné-Bissau: Desbravar terreno da luta em Angola, na Guiné-Bissau e em Moçambique; do desenrolar da situação em Portugal; dos interesses suecos em Portugal e em África e do papel do imperialismo dos EUA em África”. 4 Algumas das principais editoras suecas publicaram na mesma altura livros dedicados à questão das colónias portuguesas. Num estudo sobre as lutas de libertação na África Austral, Gun-Britt Andersson dizia em 1973 que ”na Suécia tem sido muitas vezes mais fácil obter informações sobre as colónias portuguesas do que sobre a África do Sul”. 5 A alteração da situação na África do Sul foi a responsável pela mudança de direcção. O regime do apartheid tinha, na prática e de facto, esmagado a oposição democrática no interior da África do Sul e os movimentos de luta nacionalista da Namíbia e do Zimbabué eram ainda incipientes, mas os movimentos de libertação em Angola e Moçambique tinham, por volta dos anos 60, conseguido afirmar a sua presença, de forma precária mas real. Ao opor-se à ditadura fascista do Portugal de Salazar e recebendo um apoio inequívoco da Declaração da Descolonização, publicada pelas Nações Unidas em 1960, estes movimentos viram aumentar a atenção internacional dada às suas causas durante a segunda metade da década de sessenta. As Nações Unidas apelavam repetidamente aos seus estados membros para que aumentassem a assistência aos povos das colónias portuguesas e, na sua estratégia de libertação, a Organização de Unidade Africana deu prioridade a esses territórios, considerando-os como os elos mais fracos na corrente do domínio colonial e de minoria branca. 6 Na Suécia, as primeiras moções parlamentares em que se propunha apoio oficial às organizações africanas de libertação surgiram a partir de 1967, a favor dos movimentos das colónias portuguesas. 7 Assim que a política de assistência oficial foi aprovada pelo 4. Södra Afrika Informationsbulletin, Nº. 15–16 de Maio de 1972, p. 2. Os Grupos de África publicaram em Janeiro de 1972 um livro sobre as lutas de libertação em África, quase exclusivamente dedicado às colónias portuguesas. Um pequeno capítulo desse livro era dedicado à África do Sul (criticando o ANC) mas não se discutia, por exemplo, a situação no Zimbabué (AGIS: Afrika: Imperialism och befrielsekamp/”África: Imperialismo e luta de libertação”, Lund). Numa reflexão sobre os acontecimentos em África e a mudança de perspectiva dos Grupos de África após a independência de Angola, Cabo-Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe, a AGIS publicou um livro em Agosto de 1977, intitulado Befrielsekampen i Afrika (”A luta de libertação em África”, Estocolmo). Foi uma obra escrita por vários membros do grupo, liderado por Mai Palmberg, e que incluía capítulos sobre a Namíbia e o Zimbabué. Em 1983 foi publicada uma versão revista, em língua inglesa (Mai Palmberg (ed.): ong>Theong> Struggle for Africa, Zed Press, Londres). 5. Gun-Britt Andersson: Befrielse i södra Afrika (”Libertação na África Austral”), Världspolitikens Dagsfrågor, Nº 3, 1973, Utrikespolitiska Institutet, Estocolmo, 1973, p. 33. Na qualidade de secretária de estado dos Negócios Estrangeiros, Andersson liderou a delegação sueca às Nações Unidas/OUA para a conferência de Oslo sobre a África Austral, realizada em Abril de 1973. Desempenhou vários cargos na ASDI (Agência Sueca para o Desenvolvimento Internacional) e na SAREC (Agência Sueca para a Cooperação com os Países em Vias de Desenvolvimento na Área da Investigação Científica), foi representante da ASDI na Tanzânia entre 1983 e 1984. Em 1994 foi nomeada subsecretária de estado dos Assuntos Sociais e, em 1999, subsecretária de estado dos Negócios Estrangeiros, com a pasta da Cooperação Internacional para o Desenvolvimento. 6. A chamada ”estratégia do dominó” foi delineada numa reunião do Comité da OUA para a Libertação, realizada em Dar es Salaam em Junho de 1964. De acordo com essa perspectiva, centrada numa análise da força dos regimes coloniais e brancos, o apoio da OUA (e consequentemente, o apoio internacional) deveria incidir em primeiro lugar na luta das colónias portuguesas e, depois, no Zimbabué, na Namíbia e, por fim, na África do Sul. Numa cadeia de acontecimentos em dominó, a libertação de um país reforçaria (em princípio) o processo de independência dos outros países. Não constituirá surpresa constatar que o ANC da África do Sul, a quem era dada uma menor prioridade, criticou a estratégia da OUA, declarando ”opor-se à teoria estratégica segundo a qual a intensificação da luta na África do Sul deverá acontecer na sequência da libertação da Rodésia do Sul, de Moçambique e de Angola. Privar o movimento de libertação da África do Sul de assistência, fazendo-a depender da libertação de outros territórios é, na nossa opinião, fazer o jogo da ”aliança ímpia” entre a África do Sul, a Rodésia e Portugal” (citação em Thomas op. cit., pp. 92–93). Apesar disso, a libertação de facto da África Austral seguiu o esquema em dominó, delineado pela OUA. 7. Foi o Partido de Esquerda Comunista quem apresentou as primeiras moções ao parlamento, advogando a conces- 139

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da luta em Angola, na Guiné-Bissau e em Moçambique; do desenrolar da situação em<br />

Portugal; dos interesses suecos em Portugal e em África e do papel do imperialismo dos<br />

EUA em África”. 4 Algumas das principais editoras suecas publicaram na mesma altura<br />

livros dedicados à questão das colónias portuguesas. Num estudo sobre as lutas de libertação<br />

na África Austral, Gun-Britt Anderss<strong>on</strong> dizia em 1973 que ”na Suécia tem sido<br />

muitas vezes mais fácil obter informações sobre as colónias portuguesas do que sobre a<br />

África do Sul”. 5<br />

A alteração da situação na África do Sul foi a resp<strong>on</strong>sável pela mudança de direcção.<br />

O regime do apar<strong>the</strong>id tinha, na prática e de facto, esmagado a oposição democrática no<br />

interior da África do Sul e os movimentos de luta naci<strong>on</strong>alista da Namíbia e do Zimbabué<br />

eram ainda incipientes, mas os movimentos de libertação em Angola e Moçambique<br />

tinham, por volta dos anos 60, c<strong>on</strong>seguido afirmar a sua presença, de forma precária<br />

mas real. Ao opor-se à ditadura fascista do Portugal de Salazar e recebendo um apoio<br />

inequívoco da Declaração da Descol<strong>on</strong>ização, publicada pelas Nações Unidas em 1960,<br />

estes movimentos viram aumentar a atenção internaci<strong>on</strong>al dada às suas causas durante<br />

a segunda metade da década de sessenta. As Nações Unidas apelavam repetidamente<br />

aos seus estados membros para que aumentassem a assistência aos povos das colónias<br />

portuguesas e, na sua estratégia de libertação, a Organização de Unidade Africana deu<br />

prioridade a esses territórios, c<strong>on</strong>siderando-os como os elos mais fracos na corrente do<br />

domínio col<strong>on</strong>ial e de minoria branca. 6<br />

Na Suécia, as primeiras moções parlamentares em que se propunha apoio oficial às<br />

organizações africanas de libertação surgiram a partir de 1967, a favor dos movimentos<br />

das colónias portuguesas. 7 Assim que a política de assistência oficial foi aprovada pelo<br />

4. Södra Afrika Informati<strong>on</strong>sbulletin, Nº. 15–16 de Maio de 1972, p. 2. Os Grupos de África publicaram em Janeiro<br />

de 1972 um livro sobre as lutas de libertação em África, quase exclusivamente dedicado às colónias portuguesas. Um<br />

pequeno capítulo desse livro era dedicado à África do Sul (criticando o ANC) mas não se discutia, por exemplo,<br />

a situação no Zimbabué (AGIS: Afrika: Imperialism och befrielsekamp/”África: Imperialismo e luta de libertação”,<br />

Lund). Numa reflexão sobre os ac<strong>on</strong>tecimentos em África e a mudança de perspectiva dos Grupos de África após a<br />

independência de Angola, Cabo-Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe, a AGIS publicou um<br />

livro em Agosto de 1977, intitulado Befrielsekampen i Afrika (”A luta de libertação em África”, Estocolmo). Foi uma<br />

obra escrita por vários membros do grupo, liderado por Mai Palmberg, e que incluía capítulos sobre a Namíbia e o<br />

Zimbabué. Em 1983 foi publicada uma versão revista, em língua inglesa (Mai Palmberg (ed.): <str<strong>on</strong>g>The</str<strong>on</strong>g> <strong>Struggle</strong> for Africa,<br />

Zed Press, L<strong>on</strong>dres).<br />

5. Gun-Britt Anderss<strong>on</strong>: Befrielse i södra Afrika (”Libertação na África Austral”), Världspolitikens Dagsfrågor, Nº<br />

3, 1973, Utrikespolitiska Institutet, Estocolmo, 1973, p. 33. Na qualidade de secretária de estado dos Negócios<br />

Estrangeiros, Anderss<strong>on</strong> liderou a delegação sueca às Nações Unidas/OUA para a c<strong>on</strong>ferência de Oslo sobre a África<br />

Austral, realizada em Abril de 1973. Desempenhou vários cargos na ASDI (Agência Sueca para o Desenvolvimento<br />

Internaci<strong>on</strong>al) e na SAREC (Agência Sueca para a Cooperação com os Países em Vias de Desenvolvimento na Área<br />

da Investigação Científica), foi representante da ASDI na Tanzânia entre 1983 e 1984. Em 1994 foi nomeada subsecretária<br />

de estado dos Assuntos Sociais e, em 1999, subsecretária de estado dos Negócios Estrangeiros, com a pasta<br />

da Cooperação Internaci<strong>on</strong>al para o Desenvolvimento.<br />

6. A chamada ”estratégia do dominó” foi delineada numa reunião do Comité da OUA para a Libertação, realizada<br />

em Dar es Salaam em Junho de 1964. De acordo com essa perspectiva, centrada numa análise da força dos regimes<br />

col<strong>on</strong>iais e brancos, o apoio da OUA (e c<strong>on</strong>sequentemente, o apoio internaci<strong>on</strong>al) deveria incidir em primeiro lugar<br />

na luta das colónias portuguesas e, depois, no Zimbabué, na Namíbia e, por fim, na África do Sul. Numa cadeia<br />

de ac<strong>on</strong>tecimentos em dominó, a libertação de um país reforçaria (em princípio) o processo de independência dos<br />

outros países. Não c<strong>on</strong>stituirá surpresa c<strong>on</strong>statar que o ANC da África do Sul, a quem era dada uma menor prioridade,<br />

criticou a estratégia da OUA, declarando ”opor-se à teoria estratégica segundo a qual a intensificação da luta<br />

na África do Sul deverá ac<strong>on</strong>tecer na sequência da libertação da Rodésia do Sul, de Moçambique e de Angola. Privar<br />

o movimento de libertação da África do Sul de assistência, fazendo-a depender da libertação de outros territórios é,<br />

na nossa opinião, fazer o jogo da ”aliança ímpia” entre a África do Sul, a Rodésia e Portugal” (citação em Thomas<br />

op. cit., pp. 92–93). Apesar disso, a libertação de facto da África Austral seguiu o esquema em dominó, delineado<br />

pela OUA.<br />

7. Foi o Partido de Esquerda Comunista quem apresentou as primeiras moções ao parlamento, advogando a c<strong>on</strong>ces-<br />

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