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134 Tor Sellström este diploma, aprovado a 28 de Maio de 1969, que viria a resolver de uma vez por todas a já muito debatida questão da participação da ASEA no projecto Cahora Bassa, e não uma intervenção directa do governo. O debate no parlamento sobre a ”Lei Rodésia” acabou por coincidir sobretudo com as discussões sobre o auxílio humanitário sueco oficial aos movimentos de libertação da África Austral. Além do que se passou com membros do Partido de Esquerda, especialmente C.H. Hermansson, vários deputados jovens sociais democratas e liberais, como Jan Bergqvist, Per Ahlmark e Ola Ullsten, defenderam mais controlo sobre os investimentos privados suecos no estrangeiro e contactos mais estreitos com os movimentos de libertação. Birgitta Dahl do Partido Social Democrata declarou que o Partido do governo deveria integrar as suas políticas externas, comerciais e de auxílio para promover a solidariedade internacional. Na sua opinião, as empresas privadas suecas não deveriam poder ”fazer política externa”, a política de auxílio da Suécia deveria ”ser dirigida para os países progressivos” e deveria apoiar-se os ”movimentos de libertação social”. 135 Seria esta a direcção que o Partido Social Democrata viria a seguir brevemente sob uma nova liderança. No congresso do partido em Setembro-Outubro de 1969, Olof Palme sucedeu a Tage Erlander. Palme, que representava uma geração muito envolvida com a África Austral e com uma dedicação pessoal à causa nacionalista, desencadeou um ”movimento dentro do movimento” que, fora da direcção e dos congressos do partido, levou a ”volta de 180 graus do Partido Social Democrata e do movimento operário sueco”. 136 No entanto, tanto as questões do auxílio humanitário oficial da Suécia ao PAIGC e aos movimentos de libertação da África Austral como a questão controversa de Cahora Bassa já tinham sido já formalmente resolvidas quando Palme assumiu a chefia do partido e do governo. No início de Maio de 1969, o parlamento sueco havia apoiado o princípio de apoio aos movimentos de libertação e mais tarde aprovaria a ”Lei Rodésia”, que entrou em vigor a 11 de Junho de 1969. No seu primeiro artigo, a lei dizia que ”bens e produtos são objectos materiais com propriedades móveis, incluindo [...] também energia eléctrica”. 137 Foi com este pano de fundo, e voltando atrás com as suas garantias, que a ASEA se retirou de forma surpreendente e espectacular do consórcio ZAMCO e do projecto Cahora Bassa a 3 de Setembro de 1969, no mesmo dia em que este consórcio liderado pela África do Sul recebeu a adjudicação do governo português. 138 Foi um enorme triunfo para o movimento de solidariedade com a FRELIMO, um indicador do que se poderia atingir através de uma campanha sustentada. O jornal britânico ong>Theong> Economist comentou que ”os gritos das manifestações dos estudantes suecos fizeram grande eco no vale do Zambeze”, dando ”um rude golpe” no projecto Cahora Bassa. 139 A liderança da FRELIMO, que, pela voz de Samora Machel, tinha, até inícios de Setembro de 1969 denunciado a ”duplicidade” da Suécia para com Moçambique 140 , vinha agora sublinhar 135. Aftonbladet, 27 de Março de 1969. 136. Andersson em Huldt e Misgeld (eds.) op. cit., p. 97. 137. Tradução da ”Lei Rodésia” sueca em carta do Ministério dos Negócios Estrangeiros à delegação da Suécia na ONU em Nova Iorque, Estocolmo, 1 de Julho de 1969 (MFA). 138. Neste estudo de Cahora Bassa, Middlemas disse que ”segundo os directores da ZAMCO, a ASEA já tinha recebido ordem para sair, com a aprovação da África do Sul, devido à sua incapacidade de resolver os problemas políticos no seu país. Os franceses e alemães não estavam preparados para ceder às exigências do governo sueco de que não deveriam em caso algum negociar com a Rodésia” (Middlemas op. cit., p. 82). 139. ong>Theong> Economist, 27 de Setembro de 1969. 140. Gudrun Ryman: ”FRELIMO: Vi skall stoppa Cabora Bassa” (”FRELIMO: Pararemos Cahora Bassa”), em Dagens Nyheter, 5 de Setembro de 1969.

A sombra de Cahora Bassa a importância da mobilização popular na Suécia em relação à decisão da ASEA. Pouco depois do anúncio da retirada, o jornal oficial da FRELIMO, Mozambique Revolution comentou que não pode haver dúvidas de que a verdadeira razão foi a oposição generalizada ao projecto por parte das forças progressivas na Suécia, demonstrada pelos ataques na imprensa, enormes manifestações populares e até, em certa medida, as críticas no parlamento sueco. A ASEA não conseguiu resistir aos ataques que vinham de todos os lados [...]. Este acontecimento tem enorme importância, já que demonstra a influência e eficácia da opinião pública organizada. [...] Isto é extremamente importante, porque Portugal, o mais pobre e subdesenvolvido país da Europa, só consegue fazer guerra ao nosso país devido ao apoio que recebe dos seus aliados capitalistas. Assim, acções tais como as que decorreram na Suécia podem representar um contributo tão eficaz para a nossa luta de libertação como a ajuda material. 141 Quando, mais tarde nesse mesmo mês, Olof Palme assumiu a liderança do Partido Social Democrata, um dos principais, possivelmente talvez o mais importante, factor de contradição na política da Suécia para a África Austral tinha sido retirado da ordem de trabalhos política. Apesar de não ter sido o resultado de uma intervenção do governo, a campanha contra Cahora Bassa, apresentada como apoio oficial aos movimentos nacionalistas, acabou por abrir o caminho às relações da Suécia com as forças de libertação. A questão das relações económicas da Suécia com o Sul de minorias brancas viria a ser muito debatida nas décadas de 1970 e 1980. É mais que provável que o envolvimento de uma das grandes empresas suecas da esfera da Wallenberg no empreendimento liderado pela África do Sul em Moçambique e apoiada pelo governo tivesse influenciado este debate de forma radical. Cahora Bassa teve um significado enorme para a radicalização do movimento de solidariedade sueco para com a África Austral e para o estabelecimento de relações de confiança entre o governo e os movimentos de libertação regionais. 142 A decisão da ASEA foi um alívio, tanto para as forças políticas suecas envolvidas, como para os movimentos de libertação propriamente ditos, especialmente para a FRELIMO. Convidado pelo Partido Social Democrata a participar no seu congresso de Setembro-Outubro de 1969, Marcelino dos Santos, membro da troika da FRELIMO, nomeada após o assassinato de Mondlane 143 , declarou em Estocolmo ”estamos muito contentes por ver que a ASEA se retirou do projecto Cahora Bassa. Muito sinceramente, a participação da ASEA no consórcio ZAMCO teria criado inúmeros problemas à Suécia e à FRELIMO”. 144 Apoio à FRELIMO e reacções Devido ao encerramento do Instituto Moçambicano em inícios de 1968, o assassinato de Eduardo Mondlane um ano mais tarde e a consequente luta pelo poder no seio da 141. Moçambique Revolution, No. 40, de Setembro de 1969, p. 67. 142. A luta na África do Sul recebeu nessa altura pouca atenção na Suécia. Em Setembro de 1969, a Swedish Cooperative Union and Wholesale Society cancelou o boicote de consumidores, em vigor desde 1963. 143. Os demais membros da troika eram Uria Simango e Samora Machel. Após a expulsão de Simango, Machel foi nomeado presidente da FRELIMO, em Maio de 1970. 144. Dagens Nyheter, 3 de Outubro de 1969. Entrevistado em Maio de 1996, o presidente de Moçambique, Joaquim Chissano disse que ”apoio quando as coisas estão bem não tem significado, mas o facto de a Suécia ter decidido retirar-se de Cahora Bassa, perdendo proveitos económicos, foi uma grande contribuição para a luta de libertação em Moçambique. Pensamos que algumas destas questões devem ser tornadas públicas, para que o nosso povo entenda que devemos apreciar o apoio que recebemos de diferentes países” (entrevista a Joaquim Chissano, p. 38). 135

A sombra de Cahora Bassa<br />

a importância da mobilização popular na Suécia em relação à decisão da ASEA. Pouco<br />

depois do anúncio da retirada, o jornal oficial da FRELIMO, Mozambique Revoluti<strong>on</strong><br />

comentou que<br />

não pode haver dúvidas de que a verdadeira razão foi a oposição generalizada ao projecto<br />

por parte das forças progressivas na Suécia, dem<strong>on</strong>strada pelos ataques na imprensa, enormes<br />

manifestações populares e até, em certa medida, as críticas no parlamento sueco. A ASEA não<br />

c<strong>on</strong>seguiu resistir aos ataques que vinham de todos os lados [...]. Este ac<strong>on</strong>tecimento tem<br />

enorme importância, já que dem<strong>on</strong>stra a influência e eficácia da opinião pública organizada.<br />

[...] Isto é extremamente importante, porque Portugal, o mais pobre e subdesenvolvido país<br />

da Europa, só c<strong>on</strong>segue fazer guerra ao nosso país devido ao apoio que recebe dos seus aliados<br />

capitalistas. Assim, acções tais como as que decorreram na Suécia podem representar um c<strong>on</strong>tributo<br />

tão eficaz para a nossa luta de libertação como a ajuda material. 141<br />

Quando, mais tarde nesse mesmo mês, Olof Palme assumiu a liderança do Partido Social<br />

Democrata, um dos principais, possivelmente talvez o mais importante, factor de<br />

c<strong>on</strong>tradição na política da Suécia para a África Austral tinha sido retirado da ordem de<br />

trabalhos política. Apesar de não ter sido o resultado de uma intervenção do governo, a<br />

campanha c<strong>on</strong>tra Cahora Bassa, apresentada como apoio oficial aos movimentos naci<strong>on</strong>alistas,<br />

acabou por abrir o caminho às relações da Suécia com as forças de libertação.<br />

A questão das relações ec<strong>on</strong>ómicas da Suécia com o Sul de minorias brancas viria a ser<br />

muito debatida nas décadas de 1970 e 1980. É mais que provável que o envolvimento de<br />

uma das grandes empresas suecas da esfera da Wallenberg no empreendimento liderado<br />

pela África do Sul em Moçambique e apoiada pelo governo tivesse influenciado este<br />

debate de forma radical.<br />

Cahora Bassa teve um significado enorme para a radicalização do movimento de<br />

solidariedade sueco para com a África Austral e para o estabelecimento de relações de<br />

c<strong>on</strong>fiança entre o governo e os movimentos de libertação regi<strong>on</strong>ais. 142 A decisão da ASEA<br />

foi um alívio, tanto para as forças políticas suecas envolvidas, como para os movimentos<br />

de libertação propriamente ditos, especialmente para a FRELIMO. C<strong>on</strong>vidado pelo<br />

Partido Social Democrata a participar no seu c<strong>on</strong>gresso de Setembro-Outubro de 1969,<br />

Marcelino dos Santos, membro da troika da FRELIMO, nomeada após o assassinato de<br />

M<strong>on</strong>dlane 143 , declarou em Estocolmo ”estamos muito c<strong>on</strong>tentes por ver que a ASEA se<br />

retirou do projecto Cahora Bassa. Muito sinceramente, a participação da ASEA no c<strong>on</strong>sórcio<br />

ZAMCO teria criado inúmeros problemas à Suécia e à FRELIMO”. 144<br />

Apoio à FRELIMO e reacções<br />

Devido ao encerramento do Instituto Moçambicano em inícios de 1968, o assassinato<br />

de Eduardo M<strong>on</strong>dlane um ano mais tarde e a c<strong>on</strong>sequente luta pelo poder no seio da<br />

141. Moçambique Revoluti<strong>on</strong>, No. 40, de Setembro de 1969, p. 67.<br />

142. A luta na África do Sul recebeu nessa altura pouca atenção na Suécia. Em Setembro de 1969, a Swedish Cooperative<br />

Uni<strong>on</strong> and Wholesale Society cancelou o boicote de c<strong>on</strong>sumidores, em vigor desde 1963.<br />

143. Os demais membros da troika eram Uria Simango e Samora Machel. Após a expulsão de Simango, Machel foi<br />

nomeado presidente da FRELIMO, em Maio de 1970.<br />

144. Dagens Nyheter, 3 de Outubro de 1969. Entrevistado em Maio de 1996, o presidente de Moçambique, Joaquim<br />

Chissano disse que ”apoio quando as coisas estão bem não tem significado, mas o facto de a Suécia ter decidido<br />

retirar-se de Cahora Bassa, perdendo proveitos ec<strong>on</strong>ómicos, foi uma grande c<strong>on</strong>tribuição para a luta de libertação em<br />

Moçambique. Pensamos que algumas destas questões devem ser tornadas públicas, para que o nosso povo entenda<br />

que devemos apreciar o apoio que recebemos de diferentes países” (entrevista a Joaquim Chissano, p. 38).<br />

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