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128 Tor Sellström confronto muito mais aceso. 98 Apesar de já terem sido traçadas as principais linha de batalha, no debate que se seguiria viria a haver uma grande alteração no enfoque e na táctica a adoptar por quem se opunha à ASEA e a Cahora Bassa. Pessoas influentes, sobretudo Anders Johansson do Dagens Nyheter, apresentaram assim uma dimensão, relacionada com a Rodésia, realçando que a participação da ASEA poderia violar as sanções obrigatórias impostas pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas contra o regime da UDI de Ian Smith. 99 Ao mesmo tempo, sectores cada vez mais activos da juventude decidiram empreender acções directas contra a empresa sueca. Desde a sua visita às zonas libertadas em Moçambique em Fevereiro de 1968 que Anders Johansson vinha fazendo campanha activa contra o projecto Cahora Bassa. Num artigo veemente no Dagens Nyheter em meados de Maio, escreveu, por exemplo, que se os trabalhadores da ASEA, perante as ameaças da direcção da empresa, do silêncio da LO e dos jogos de palavras de Lange, mantiverem a sua posição de contribuir para o reforço e prolongamento do poder colonial do regime de Salazar em Moçambique, então eles, bem como a direcção da Federação de Trabalhadores Metalúrgicos, deverão deixar de falar em solidariedade para com os oprimidos do mundo, no Primeiro de Maio e noutras ocasiões. 100 Nesse mesmo artigo, Johansson, que tinha acesso a várias fontes de informação sobre a África Austral, respondeu pela primeira vez que não só a África do Sul, mas também a Rodésia de Ian Smith estavam interessadas na electricidade de Cahora Bassa. Para substanciar essa afirmação, viria, nos meses seguintes, a publicar citações e referências de todo um leque de relatórios e artigos sobre a África do Sul e a Rodésia. 101 A eventual ligação à Rodésia veio a ter impacto imediato neste debate. Em resposta à declaração de independência unilateral da Rodésia, o Conselho de Segurança da ONU recomendou, em Novembro de 1965 uma proibição ao comércio com a colónia rebelde, que, pela primeira vez, foi seguida de sanções obrigatórias em Dezembro de 1966. Seguindo as recomendações do Conselho de Segurança, o governo sueco declarara, em finais de Novembro de 1965, um boicote total a todo o comércio com a Rodésia. No entanto, nessa altura, não havia qualquer legislação específica na Suécia sobre sanções 98. A questão de Cahora Bassa teve um destaque especial no segundo congresso da FRELIMO, que teve lugar numa zona libertada da província do Niassa, em finais de Julho de 1968. (Anders Johansson: ”Gerillamöte mot Salazar”/”Reunião da guerrilha contra Salazar”, em Dagens Nyheter, 24 de Setembro de 1968). 99. Indicador da marginalização da questão anti-apartheid nessa altura, muito poucas vozes suecas, incluindo dentro do movimento de solidariedade, se ergueram contra o facto de a electricidade produzida em Cahora Bassa ir ser exportada sobretudo para a África do Sul e de a ASEA participar na construção de uma estação eléctrica perto de Joanesburgo. Numa declaração apoiada pela direcção nacional do Partido Social Democrata, o Ministro do Comércio Gunnar Lange, por exemplo, limitou-se a dizer em Fevereiro de 1969 que a África do Sul ”não é alvo de quaisquer sanções”, legitimando assim o envolvimento sueco na cooperação estratégica da energia entre Lisboa e Pretória (Gunnar Lange op. cit., p. 13). 100. Anders Johansson: ”ASEA och Moçambique” em Dagens Nyheter, 19 de Maio de 1968. 101. Por exemplo no Dagens Nyheter, 11 de Setembro de 1968. Johansson também apresentou petições às Nações Unidas sobre a questão de Cahora Bassa e da Rodésia. Uma carta sua, datada de 12 de Novembro de 1968, foi distribuída pelo Comité de Descolonização da ONU aos membros da Assembleia Geral, em Maio de 1969. Nessa carta, Johansson disse: ”Gostaria de chamar a atenção do comité para o projecto de Cahora Bassa [...]. Se algum membro do comité estiver interessado em receber informação sobre este projecto, estou disposto a enviar material de várias fontes. Este projecto é construído pelos colonialistas portugueses em colaboração com os regimes da África do Sul e da Rodésia e alguns interesses estrangeiros, até mesmo suecos, para reforçar o bloco de minoria branca na África Austral e conter a revolução da maioria africana. Estou certo de que a electricidade de Cahora Bassa será entregue à Rodésia, o que significa, tanto quanto posso compreender, que há várias empresas francesas, alemãs de leste, sul africanas e suecas a ignorar as decisões da ONU sobre a Rodésia, e que os seus respectivos governos nada fazem para as impedir. Seria muito útil que o comité pudesse elaborar um relatório especial sobre o projecto de Cahora Bassa” (Assembleia Geral da ONU: ”Pedido de Sr. Anders Johanson, Correspondente estrangeiro do Dagens Nyheter, Estocolmo, referente a Moçambique”, A/AC. 109/PET. 1081, Nova Iorque, 15 de Maio de 1969) (AJC).

A sombra de Cahora Bassa económicas internacionais. Em Fevereiro de 1966, foi criada uma comissão governamental para redigir um instrumento legal desse tipo. A comissão apresentou a sua proposta em Março de 1968, pouco antes de ser anunciada publicamente a participação da ASEA na proposta do consórcio ZAMCO. Segundo a proposta de lei, todas as exportações e importações de e para a Rodésia seriam proíbidas, bem como todas as actividades ” para ou susceptíveis de promover” 102 relações comerciais entre a Suécia e a Rodésia, incluindo transferências de dinheiro. A proposta da ”Lei Rodésia” veio coincidir com o debate sobre Cahora Bassa, contribuindo para ”discussões extensas e por vezes muito agitadas dentro e fora do parlamento”. 103 Não se discutia tanto a questão das sanções contra a Rodésia de Ian Smith, onde a Suécia tinha uma posição firme, mas sim o papel da participação da ASEA no projecto de Moçambique e o que representaria neste contexto. Assim que foi apresentada a proposta ZAMCO, ficou claro que haveria empresas da Rodésia ligadas à construção da barragem, pelo menos como fornecedoras de materiais de construção. Enquanto consórcio, a ZAMCO e a ASEA viriam assim a contrariar as sanções das Nações Unidas contra a Rodésia, bem como a ”Lei Rodésia” proposta. Ainda assim, tanto a empresa sueca como o governo preferiram ignorar a questão mais alargada e isolaram o problema como sendo uma questão de entrega de componentes para a transmissão de electricidade a nível local e para a África do Sul, preferindo não ver qualquer eventual ligação da Suécia com a Rodésia. 104 No entanto, facções cada vez mais radicalizadas da juventude sueca tinham outra opinião. Em inícios de Outubro, a Juventude Liberal, por exemplo, fez um pedido ao Ministro dos Negócios Estrangeiros, Torsten Nilsson, para que alargasse as sanções económicas suecas a ”toda a África Austral”. 105 E duas semanas mais tarde, os estudantes sociais democratas da Universidade de Lund declararam que iriam ”utilizar todos os meios possíveis” para impedir a ASEA de participar no projecto Cahora Bassa. Realçando que esta declaração deveria ser vista como uma ameaça, os estudantes dirigiram as suas principais críticas ao seu próprio governo, que, diziam eles, age inteiramente contra a opinião pública e contra a vontade do congresso do partido. No estado actual, a ASEA tem capacidade técnica e formal de executar o projecto Cahora Bassa, que não trará electricidade apenas a Moçambique, mas também à Rodésia e à África do Sul. Desejamos que o governo aprove legislação que impeça uma grande empresa sueca de ignorar as resoluções da ONU sobre sanções contra a Rodésia. Se o governo continuar as suas manobras de evasão e a dar mostras de passividade, vemos como única saída levar a cabo acções directas contra a ASEA. 106 Apesar das ameaças de intervenção directa e sabotagem contra a ASEA, que nunca foram executadas, houve acções extra-parlamentares em finais de Novembro de 1968, iniciadas pela organização de Estudantes para uma Sociedade Democrática (SDS) com sede em 102. Citado em Nordenmark op. cit., p. 43. 103. Ibid. 104. Dagens Nyheter, 10 de Dezembro de 1968 e Svenska Dagbladet, 11 de Dezembro de 1968. Depois de pressões da SSU, o congresso do Partido Social Democrata resolveu, em Junho de 1968, que o governo deveria verificar se a central eléctrica de Cahora Bassa poderia fornecer electricidade à Rodésia. Apesar de pedidos reiterados, entre outros pelo jornal social democrata Aftonbladet, nunca se levou a cabo esse estudo (Ver, por exemplo, Aftonbladet, 13 de Setembro de 1968). 105. Carta de FPU, assinada por Olle Wästberg e Leif Wictorin, ao Ministro dos Negócios Estrangeiros Torsten Nilsson, Estocolmo, 7 de Outubro de 1968 (MFA). 106. Aftonbladet, 23 de Outubro de 1968. 129

A sombra de Cahora Bassa<br />

ec<strong>on</strong>ómicas internaci<strong>on</strong>ais. Em Fevereiro de 1966, foi criada uma comissão governamental<br />

para redigir um instrumento legal desse tipo. A comissão apresentou a sua proposta<br />

em Março de 1968, pouco antes de ser anunciada publicamente a participação da ASEA<br />

na proposta do c<strong>on</strong>sórcio ZAMCO. Segundo a proposta de lei, todas as exportações e<br />

importações de e para a Rodésia seriam proíbidas, bem como todas as actividades ” para<br />

ou susceptíveis de promover” 102 relações comerciais entre a Suécia e a Rodésia, incluindo<br />

transferências de dinheiro.<br />

A proposta da ”Lei Rodésia” veio coincidir com o debate sobre Cahora Bassa, c<strong>on</strong>tribuindo<br />

para ”discussões extensas e por vezes muito agitadas dentro e fora do parlamento”.<br />

103 Não se discutia tanto a questão das sanções c<strong>on</strong>tra a Rodésia de Ian Smith, <strong>on</strong>de a<br />

Suécia tinha uma posição firme, mas sim o papel da participação da ASEA no projecto de<br />

Moçambique e o que representaria neste c<strong>on</strong>texto. Assim que foi apresentada a proposta<br />

ZAMCO, ficou claro que haveria empresas da Rodésia ligadas à c<strong>on</strong>strução da barragem,<br />

pelo menos como fornecedoras de materiais de c<strong>on</strong>strução. Enquanto c<strong>on</strong>sórcio, a<br />

ZAMCO e a ASEA viriam assim a c<strong>on</strong>trariar as sanções das Nações Unidas c<strong>on</strong>tra a<br />

Rodésia, bem como a ”Lei Rodésia” proposta. Ainda assim, tanto a empresa sueca como<br />

o governo preferiram ignorar a questão mais alargada e isolaram o problema como sendo<br />

uma questão de entrega de comp<strong>on</strong>entes para a transmissão de electricidade a nível local<br />

e para a África do Sul, preferindo não ver qualquer eventual ligação da Suécia com a<br />

Rodésia. 104<br />

No entanto, facções cada vez mais radicalizadas da juventude sueca tinham outra<br />

opinião. Em inícios de Outubro, a Juventude Liberal, por exemplo, fez um pedido ao<br />

Ministro dos Negócios Estrangeiros, Torsten Nilss<strong>on</strong>, para que alargasse as sanções ec<strong>on</strong>ómicas<br />

suecas a ”toda a África Austral”. 105 E duas semanas mais tarde, os estudantes<br />

sociais democratas da Universidade de Lund declararam que iriam ”utilizar todos os<br />

meios possíveis” para impedir a ASEA de participar no projecto Cahora Bassa. Realçando<br />

que esta declaração deveria ser vista como uma ameaça, os estudantes dirigiram as suas<br />

principais críticas ao seu próprio governo, que, diziam eles,<br />

age inteiramente c<strong>on</strong>tra a opinião pública e c<strong>on</strong>tra a v<strong>on</strong>tade do c<strong>on</strong>gresso do partido. No<br />

estado actual, a ASEA tem capacidade técnica e formal de executar o projecto Cahora Bassa,<br />

que não trará electricidade apenas a Moçambique, mas também à Rodésia e à África do Sul.<br />

Desejamos que o governo aprove legislação que impeça uma grande empresa sueca de ignorar<br />

as resoluções da ONU sobre sanções c<strong>on</strong>tra a Rodésia. Se o governo c<strong>on</strong>tinuar as suas manobras<br />

de evasão e a dar mostras de passividade, vemos como única saída levar a cabo acções<br />

directas c<strong>on</strong>tra a ASEA. 106<br />

Apesar das ameaças de intervenção directa e sabotagem c<strong>on</strong>tra a ASEA, que nunca foram<br />

executadas, houve acções extra-parlamentares em finais de Novembro de 1968, iniciadas<br />

pela organização de Estudantes para uma Sociedade Democrática (SDS) com sede em<br />

102. Citado em Nordenmark op. cit., p. 43.<br />

103. Ibid.<br />

104. Dagens Nyheter, 10 de Dezembro de 1968 e Svenska Dagbladet, 11 de Dezembro de 1968. Depois de pressões<br />

da SSU, o c<strong>on</strong>gresso do Partido Social Democrata resolveu, em Junho de 1968, que o governo deveria verificar se a<br />

central eléctrica de Cahora Bassa poderia fornecer electricidade à Rodésia. Apesar de pedidos reiterados, entre outros<br />

pelo jornal social democrata Aft<strong>on</strong>bladet, nunca se levou a cabo esse estudo (Ver, por exemplo, Aft<strong>on</strong>bladet, 13 de<br />

Setembro de 1968).<br />

105. Carta de FPU, assinada por Olle Wästberg e Leif Wictorin, ao Ministro dos Negócios Estrangeiros Torsten<br />

Nilss<strong>on</strong>, Estocolmo, 7 de Outubro de 1968 (MFA).<br />

106. Aft<strong>on</strong>bladet, 23 de Outubro de 1968.<br />

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