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“sangue latino, coração de terra bruta”: a etnomusicalidade nativista ...

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i<strong>de</strong>ntificam com o imigrante, o nativo, o guarani-missioneiro, com o gaucho p<strong>latino</strong>, com o<br />

gaúcho lusitano, etc.).<br />

O gran<strong>de</strong> paradoxo <strong>de</strong>ste estudo foi a observação <strong>de</strong> que, os <strong>nativista</strong>s, mesmo com<br />

idéias, em seu discurso, opostas às pregadas pelo MTG, precisaram do espaço adquirido<br />

por ele em termos <strong>de</strong> valorização do que fosse regional, para conquistar espaço para seus<br />

festivais. Quando os festivais surgem, já existe na população sul rio-gran<strong>de</strong>nse, o <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong><br />

cantar a si mesma e sua história, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> qual fosse a concepção <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />

assumida, e esse <strong>de</strong>sejo e esta aceitação fora alimentada pelo movimento tradicionalista<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1947 7 .<br />

Este paradoxo se apresenta, por exemplo, no livreto da 1ª Tertúlia Musical Nativista,<br />

on<strong>de</strong> há um texto sob responsabilida<strong>de</strong> da ATEM – uma entida<strong>de</strong> tradicionalista – e assinado<br />

por Antônio Carlos Machado, que diz o seguinte acerca dos objetivos da Tertúlia:<br />

[...] a Estância do Minuano, entida<strong>de</strong> maior da cultura nativa em Santa Maria, numa promoção <strong>de</strong><br />

envergadura sem par, fará realizar, durante a Semana <strong>de</strong> Santa Maria, paralelamente ao Ro<strong>de</strong>io<br />

Crioulo, uma Tertúlia Musica, que será o primeiro gran<strong>de</strong> passo para colocar a cida<strong>de</strong> entre os<br />

gran<strong>de</strong>s centros <strong>de</strong> estudos e pesquisas das tradições do Rio Gran<strong>de</strong>, para que se busque nossas<br />

verda<strong>de</strong>iras origens culturais e se preserve das agressões vazias e sem sentido que se vêm<br />

praticando contra ela, em nome <strong>de</strong> uma falsa idéia <strong>de</strong> tradição gaúcha. (1980, p.7, grifo<br />

nosso)<br />

Estas músicas vêm então refletir diferentes i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s rio-gran<strong>de</strong>nses, que são<br />

fundamentadas no entendimento <strong>de</strong> fronteira com que cada indivíduo se i<strong>de</strong>ntifica e as formas<br />

como se confrontaram e tentaram se difundir. Cabe observarmos que a fundamentação da<br />

i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> não necessariamente nasce <strong>de</strong> uma elaboração racional. Ela muitas vezes é<br />

subjetiva e se justifica através <strong>de</strong> sentimentos que sustentam o sujeito em seu sentimento<br />

<strong>nativista</strong>. Conforme José Geraldo Vinci <strong>de</strong> Moraes, “[...] a música, além do seu estado <strong>de</strong><br />

imaterialida<strong>de</strong>, atinge os sentidos do receptor, estando, portanto, fundamentalmente no<br />

universo da sensibilida<strong>de</strong>” (2000, p. 211).<br />

Ainda observando esta subjetivida<strong>de</strong> na escolha <strong>de</strong> uma i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> 8 , são válidas as<br />

observações acerca do imaginário e da representação que circunda a figura do rio-gran<strong>de</strong>nse.<br />

Sandra Jatahy Pesavento (1993), em “A invenção da Socieda<strong>de</strong> Gaúcha”, trabalha esta questão<br />

<strong>de</strong>monstrando inicialmente que o imaginário se constrói entre a realida<strong>de</strong> e representações<br />

atribuídas à ela. Ou seja, este imaginário alimenta a questão da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>, on<strong>de</strong>, ligada<br />

sempre às noções <strong>de</strong> nação e/ou <strong>de</strong> região, é elaborada <strong>de</strong> forma on<strong>de</strong> não necessariamente<br />

tenha uma ligação direta com um evento real, mas também <strong>de</strong> anseios e utopias, e estes, por<br />

sua vez, fazem parte <strong>de</strong>sta realida<strong>de</strong>.<br />

2.1 - A Tertúlia Musical Nativista <strong>de</strong> Santa Maria<br />

A Gare da Estação <strong>de</strong> Santa Maria festejou, em novembro <strong>de</strong> 2011, a edição <strong>de</strong> número<br />

7 Esta passagem não se refere ao Movimento Tradicionalista Gaúcho como instituição, até mesmo por este<br />

ter sido institucionalizado apenas na década <strong>de</strong> 1960, mas sim àqueles que se assumiram na condição <strong>de</strong> serem<br />

tradicionalistas e que organizaram um movimento em prol da divulgação <strong>de</strong>sta adoção. Fala-se aqui <strong>de</strong> um<br />

movimento tradicionalista tal qual se fala <strong>de</strong> um movimento <strong>nativista</strong>.<br />

8 Terry Eagleton (2005) em “A idéia <strong>de</strong> Cultura”, diz que “essa preferência por uma i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> cultural em vez <strong>de</strong><br />

outra é arracional, no sentido <strong>de</strong> que optar por ser parte <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>mocracia no lugar <strong>de</strong> uma ditadura não é. [...] Mas<br />

o fato <strong>de</strong> que uma escolha <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> cultural é arracional não é um argumento contra ela. [...] De qualquer modo,<br />

nossas fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong>s culturais, seja àqueles <strong>de</strong> nosso próprio grupo ou a outros, não são necessariamente irracionais<br />

pelo fato <strong>de</strong> serem a-racionais.” (p. 89-90).<br />

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