“sangue latino, coração de terra bruta”: a etnomusicalidade nativista ...
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Se, a princípio, todas as regiões do país são <strong>de</strong>finidas como igualmente importante, o material<br />
publicado revela uma clara orientação em direção às regiões <strong>de</strong> fronteira, <strong>de</strong>vido à necessida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> integração <strong>de</strong>ssas mesmas regiões ao po<strong>de</strong>r do Estado Nacional, sediado no Rio <strong>de</strong> Janeiro<br />
(GUIMARÃES, 1988, p. 23).<br />
Tem-se então, no IHGB, o difusor da historiografia <strong>de</strong> cunho tradicional trabalhada<br />
no Brasil e que fora utilizada pelo MTG. Mas voltar-se ao Rio Gran<strong>de</strong> do Sul leva ainda à<br />
observação do Instituto Histórico e Geográfico do RS, que manteve a mesma corrente em<br />
seu surgimento, embasado ainda na exaltação <strong>de</strong> figuras particulares na busca <strong>de</strong> uma gênese<br />
gloriosa e, principalmente, portuguesa, para a população sul brasileira. Com o findar do<br />
século XIX e início do XX, ambos recebem como propulsoras as idéias então difundidas <strong>de</strong><br />
Auguste Comte, trabalhando a história <strong>de</strong> forma linear <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> suas concepções intitulada<br />
Positivista. Junto a estes está então o Movimento Tradicionalista Gaúcho, porta-voz das<br />
concepções <strong>de</strong> história vigentes do período, protegido, para sua valida<strong>de</strong>, na idéia <strong>de</strong> gênese<br />
gloriosa ao povo sul-rio-gran<strong>de</strong>nse.<br />
O movimento <strong>nativista</strong>, que ganha força e representativida<strong>de</strong> a partir da década <strong>de</strong> 1970,<br />
eclo<strong>de</strong> justamente por expressar o entendimento que gran<strong>de</strong> parcela da população sul-riogran<strong>de</strong>nse<br />
tinha <strong>de</strong> si mesma, contrariando os princípios ditados pelo MTG e o entendimento<br />
difundido pelos Institutos Históricos, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>ndo a formação multi-étnica regional,<br />
admitindo uma cultura popular que pu<strong>de</strong>sse ser mais ”flexível”, sem regramentos precisos<br />
(<strong>de</strong>s<strong>de</strong> que tivesse o cuidado com os elementos que caracterizassem os costumes regionais),<br />
não aceitando o “engessamento folclórico” proposto pelo Movimento Tradicionalista<br />
Gaúcho e sem institucionalizar o Nativismo, organizando suas manifestações através da<br />
arte, principalmente a música 5 .<br />
2 - NOÇÕES DE FRONTEIRA E IDENTIDADE NO CASO DA TERTÚLIA MUSICAL NATIVISTA<br />
DE SANTA MARIA.<br />
O nativismo, movimento que po<strong>de</strong> ocorrer em qualquer região do mundo, é relativo<br />
à expressar as afinida<strong>de</strong>s e sentimentos <strong>de</strong> estima do indivíduo com o local <strong>de</strong> on<strong>de</strong> ele é<br />
nato. É um sentimento que existe no RS <strong>de</strong>s<strong>de</strong> antes do surgimento dos festivais <strong>de</strong> música<br />
<strong>nativista</strong>, mas estes festivais foram a ponte para que se passasse a expressar este sentimento<br />
<strong>de</strong> forma mais saliente e com gran<strong>de</strong> incentivo e aceitação popular.<br />
O primeiro festival <strong>de</strong> música <strong>nativista</strong> nasce em 1971 na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Uruguaiana,<br />
justamente em uma cida<strong>de</strong> da região da fronteira oeste do RS. A Califórnia da Canção<br />
Nativa traz à tona as rivalida<strong>de</strong>s entre os <strong>nativista</strong>s e os tradicionalistas. Des<strong>de</strong> já, é<br />
válida a observação <strong>de</strong> que não necessariamente, os indivíduos envolvidos nestes <strong>de</strong>bates<br />
posicionavam-se precisamente contra uma idéia e a favor <strong>de</strong> outra. Muitos entendiam mesclar<br />
ambas as i<strong>de</strong>ologias e acreditavam que os dois movimentos po<strong>de</strong>riam se somar ao invés <strong>de</strong><br />
rivalizarem.<br />
Estas i<strong>de</strong>ologias são relacionadas às noções <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>, sobre as quais se observa a obra<br />
<strong>de</strong> Stuart Hall “A i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> cultural na pós-mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>” (2006), on<strong>de</strong> Hall apresenta três<br />
concepções distintas <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>, sendo elas através do Sujeito do Iluminismo (indivíduo<br />
centrado no seu próprio “eu”, focado na razão e ação); o Sujeito Sociológico (que aceita<br />
que seu “eu” não é auto-suficiente, tendo uma forte interação com a socieda<strong>de</strong>); e o Sujeito<br />
Pós-Mo<strong>de</strong>rno (sem i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> fixa, moldado a partir do ambiente cultural que o ro<strong>de</strong>ia,<br />
5 Nesse sentido, este artigo procura apresentar composições que <strong>de</strong>notam o entendimento <strong>de</strong> origem hispânica,<br />
pois observarmos que algumas composições <strong>nativista</strong>s também falam sobre o entendimento <strong>de</strong> origem lusitana,<br />
que não é o objeto <strong>de</strong> estudo <strong>de</strong>ste trabalho.<br />
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