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“progresso”: movimento adiante e seqüência passível de descoberta. 102 Nessa<br />
definição, é o próprio movimento em progressão que dá sentido a sua existência. Ao<br />
contrário do lugar comum (do dicionário, por exemplo) vinculado aos usos<br />
iluministas e evolucionistas – que definiram a palavra como uma melhoria inerente<br />
entre um estado primitivo e um estado civilizado, algo como “do pior para o melhor”<br />
– Progresso é um estado bruto de invenção, de vivência no fio da navalha, rumo ao<br />
movimento adiante e aguardando a próxima descoberta. O progresso, nessa<br />
perspectiva, não é linear nem compensatório. É expansão, propagação. Galáxias se<br />
expandem. O sol se expande. O progresso, assim, não evolui, nem salva. Ele pode ser<br />
caótico, com múltiplas direções, pequenos progressos, grandes progressos,<br />
progressos à deriva, progressos para lugar nenhum. Estar “em progresso” é romper<br />
os limites, é estar o tempo inteiro desejando o novo, em movimento sem fim.<br />
Os dois sentidos sugeridos por Willians podem ser lidos como dois princípios<br />
basilares na trajetória de Oiticica. Todas suas obras e trabalhos eram, segundo ele,<br />
feitos sob essa força propulsora do adiante e essa sede de descobertas. Elas eram<br />
Programas em progresso, passíveis de serem reabertas sempre, a partir de novos<br />
usos, novas demandas. Sempre reabertas, porém nunca fechadas. Oiticica utilizou,<br />
por exemplo, as idéias-programas em progresso Bólide e Parangolé até sua morte, ao<br />
longo de quase trinta anos, às vezes com grandes intervalos. Elas eram programas a<br />
serem revisitados, redescobertos, reinventados. Eram, mais uma vez, uma “seqüência<br />
passível de descoberta”. Nunca uma retomada do passado, de coisas antigas, mas<br />
sempre uma nova idéia a partir do programa um dia proposto. Eis como era seu livro:<br />
um programa, cujo progresso, ou seja, a transformação a partir da descoberta do<br />
novo foi incessante. Se para escrever um livro você retoma o projeto diariamente, por<br />
que não reinventá-lo também diariamente?<br />
Um livro planejado por um escritor sem livros é pura ambição. É seu primeiro<br />
trabalho, talvez definitivo, balanço de uma carreira, exposição de todo um<br />
pensamento sobre a arte e a sociedade. Talvez essa ambição seja um fardo. Talvez a<br />
102 WILLIANS, R. “Progressista”, in: Palavras-chave – um vocabulário de cultura e sociedade. São<br />
Paulo: Boitempo, 2007, p.327.<br />
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