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Capítulo 04.pdf - PUC Rio

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Apesar dessa encruzilhada da Caixa – nem livro, nem objeto, nem livro-<br />

objeto – Duchamp dá um “passo além” no seu desejo de livro em relação a autores<br />

da promessa como Mallarmé e Oiticica. Ele levou até o limite a idéia de uma obra<br />

textual cuja forma transgride a idéia do livro, sem abrir mão de ter seus textos lidos.<br />

O livro de Duchamp demorou vinte anos para ser feito, mas foi feito. Mesmo que,<br />

como resultado final, ele não seja especificamente um livro. Ele fez de sua caixa de<br />

textos uma Obra por si mesma, onde os textos lidos foram cuidadosamente<br />

escolhidos e executados por um autor com controle pleno de sua atividade. Ainda de<br />

acordo com a frase de Valéry, o planejamento e a execução do trabalho obedeceram<br />

ao mais absoluto rigor por parte do autor. A partir desse rigor, a liberdade criativa de<br />

Duchamp foi posta à prova e ele conseguiu subverter as regras do jogo tanto da obra<br />

de arte – o que fazer com uma miniatura do urinol ou do Grande Vidro? – quanto da<br />

literatura – o que são os escritos e teorias, pedaços de papel e fragmentos reunidos<br />

conscientemente pelo autor nessa caixa?<br />

A partir dessas questões, a pergunta que apresento é a seguinte: o que faz com<br />

que um artista, no caso Duchamp, consiga manejar a execução de uma obra tão<br />

complexa (mesmo que tenham durado vinte anos) e outros não? Fazendo essa<br />

pergunta de forma direta e simplista sobre o tema desta tese, por que Duchamp, um<br />

anti-artista nato, conseguiu executar seus livros e Oiticica não? Não estou de modo<br />

algum comparando os sujeitos, já que são óbvias as vicissitudes e limitações de cada<br />

um no tempo e espaço para a realização de suas obras; nem estou igualando<br />

Duchamp e Oiticica em “um mesmo pé” de produção e reflexão. Mas não podemos<br />

negar que seus procedimentos frente ao campo das artes de seu tempo eram um<br />

ponto em comum na trajetória de ambos. Para além dos diálogos da obra de Oiticica<br />

com os ready-mades e as idéias de Duchamp, há uma espécie de não-conformismo<br />

de ambos com o funcionamento obrigatório do circuito atelier-marchand-galeria-<br />

venda-museu. Em um texto comparando os dois artistas, Celso Favaretto indica essas<br />

distâncias e aproximações:<br />

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