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seleção de imagens e trechos xerocados de outros livros, tudo se acumulando e<br />
crescendo. Por ser movediço, por estar sempre em movimento, era quase impossível<br />
para Oiticica cortar o processo de criação permanente que o envolveu. Planejar o<br />
livro era estar inventando, isto é, era sua arte em estado bruto.<br />
Livro-rizoma (e sua oposição, o Livro-Raiz), livro nômade, livro aberto, livro<br />
infinito: são muitas as metáforas-modelo que poderiam ser utilizadas para analisar<br />
esse projeto e percurso de Oiticica em relação à sua idéia de publicação. Essa<br />
possibilidade se deve aos relatos que o próprio autor fez desse processo. Narrando<br />
detalhadamente em cartas ou anotações pessoais cada passo de criação e mudança do<br />
seu livro, dando novos nomes ao projeto, inventando durante a própria escrita dos<br />
textos seus desdobramentos e conexões com outros textos, Oiticica deixou registrada<br />
a trajetória dessa obra em funcionamento. Ele nos mostra as hesitações, os fracassos,<br />
a impotência entre o realizado e o desejado. É o relato de um trabalho permanente<br />
ou, novamente em suas palavras, em progresso.<br />
O registro incontornável é ter sempre em mente que esse livro é, como toda a<br />
obra de Oiticica, um work in progress. E o que está em progresso nunca pode parar.<br />
Não se adia o progresso. Ele é uma espécie de força física que nos compele ao telos<br />
infinito da história, não permitindo estabilidades no tempo-espaço. Aqui, ouvimos os<br />
ecos assumidos da obra de James Joyce (mais uma vez “marcada” pela leitura e<br />
tradução dos irmãos Campos, apesar de Oiticica lê-lo no original) e da sua busca da<br />
escrita circular, sem começo nem fim (ou com muitos começos e fins).<br />
O termo “work in progress”, primeiro título das páginas publicadas por Joyce<br />
na revista Transition (1924) e que viriam a formar posteriormente o Finnegan’s<br />
Wake, tem uma longa origem segundo os estudiosos do autor irlandês. Sua<br />
concepção teria origem remota no pensamento de Giambatista Vico, filósofo italiano<br />
do século XVI, como demonstra com maestria Samuel Beckett em seu ensaio<br />
“Dante... Bruno. Vico... Joyce”, de 1929. 100 Em um work in progress o trabalho não<br />
é sobre, nem diz alguma coisa. O trabalho in progress, nos dizeres de Beckett “é a<br />
100 BECKETT, S. “Dante... Bruno. Vico... Joyce”, In: NESTROVSKI, A. (org.). Riverrun – ensaios<br />
sobre James Joyce. São Paulo: Imago, 1992.<br />
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