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Capítulo 04.pdf - PUC Rio

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seja inteligível, contínuo. Se no jogo são suas regras que o abrem e não o que o<br />

limita, foi justamente entre essas duas “regras” da escrita e do livro que Oiticica se<br />

instalou para expandir suas idéias. A língua será expandida, reinventada, colada à<br />

fala e amigada com os idiomas estrangeiros, espaçada, apressada, pontuada de forma<br />

irregular. Já o livro, esse objeto de desejo do escritor-leitor, será recusado em sua<br />

forma clássica, da brochura retangular com páginas em seqüência linear, numeradas<br />

e plenamente preenchidas de textos e fotos. O livro deve ser, assim como a escritura,<br />

a concretude de uma idéia-ato. Deve ser inovador na tentativa de se fundar um novo<br />

espaço em que folhas sem numeração podem incorporar o aleatório em sua<br />

montagem, em que os textos podem ser espalhados em blocos, em que as páginas<br />

possam saltar para fora durante o manuseio do leitor. Mas, para que se atingisse essa<br />

“liberdade” em relação aos paradigmas tradicionais do trabalho e do produto<br />

literário, era necessário um extremo rigor no planejamento dessas línguas e dessas<br />

formas, um total domínio das “regras” para depois burlá-las. Não estou aqui falando<br />

de um artista que foi influenciado pelo espírito dada, mas sim de um artista que teve<br />

em Mondrian, Malévitch e Paul Klee alguns de seus heróis. Portanto, não bastava<br />

que se investisse destrutivamente sobre a língua e o livro. Oiticica queria, com<br />

extremo rigor, subvertendo as regras do jogo, construir – e fruir – um caminho para<br />

sua liberdade poética. Ele não queria substituir a língua; ele queria outra língua<br />

dentro da língua portuguesa. Ele não queria substituir o livro por um novo objeto; ele<br />

queria, justamente, transformar o livro em Livro.<br />

Criar nessa fissura entre a liberdade e o rigor, com o controle do segundo<br />

servindo de combustível para a abertura da primeira, criar a partir da aceitação<br />

subversiva das regras do jogo, é criar sob estado de risco permanente. Mais: é criar<br />

sob a tentação de jogar um jogo sem fim, um jogo em que quanto maior o prazer em<br />

definir, esquadrinhar, editar, escrever sobre, amarrar, paginar (ações do rigor), maior<br />

a possibilidade de indefinir, espalhar, omitir, desamarrar, despaginar (ações da<br />

liberdade). Um cabo de guerra interno, um dínamo de forças que pode, como ocorreu<br />

com Mallarmé, com Oiticica e outros, permanecer ligado para sempre. Sem previsão<br />

de um fim de jogo.<br />

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