religião e pragmatismo em william james - Universidade Federal de ...

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14.06.2013 Views

Para o uso em suas conferências, James propõe simplesmente quatro marcas que, encontradas numa experiência, permitem sejam chamadas de místicas. São elas: inefabilidade, qualidade noética, transitoriedade e passividade. Um aspecto negativo, a inefabilidade, é uma das marcas mais características que caracteriza um estado místico. “Quem a experimenta diz incontinenti que ela desafia a expressão, que não se pode fazer com palavras nenhum relato adequado do seu conteúdo. Disso se segue que a sua qualidade precisa ser experimentada diretamente; não pode ser comunicada nem transferida a outros” (Idem Ibidem). Por essa característica, podemos dizer que os estados místicos se assemelham muito mais com estados de sentimento do que com estados do intelecto. Mesmo sendo mais parecidos com estados de sentimento, os estados místicos parecem ser também “estados de conhecimento, estados de visão interior dirigida a profundezas da verdade não sondadas pelo intelecto discursivo. São iluminações, revelações, cheias de significado e importância, por mais inarticuladas que continuem sendo; e via de regra, carregam consigo um senso curioso de autoridade pelo tempo sucessivo” (Idem Ibidem). Apenas esses dois aspectos já permitem que um estado seja chamado de místico, mas existem ainda duas outras características menos nítidas. Uma é a transitoriedade, os estados místicos não podem ser sustentados por muito tempo. Muitas vezes a sua qualidade pode ser apenas imperfeitamente reproduzida na memória, mas quando se repetem são reconhecidos. E de uma ocorrência a outra pode ocorrer um contínuo enriquecimento. A última das características é a passividade. Ela é caracterizada por um sentimento em que a própria vontade está adormecida, e que ele está sendo agarrado e seguro por uma força superior. Essa última característica liga os estados místicos com o discurso profético, a escrita automática, o transe mediúnico ou qualquer outro fenômeno dessa natureza. Essas quatro características são suficientes para caracterizar um grupo peculiar de estados de consciência chamado de estados místicos. 45

O rudimento mais simples da experiência mística é o aprofundamento da significação de uma máxima ou fórmula que de vez em quando nos ocorre. É quando ouvimos uma frase durante muito tempo e apenas entendemos o seu verdadeiro significado um tempo depois, como se a frase passasse a ter um significado mais profundo, mais tocante. Isso pode acontecer não apenas com frases, mas também com palavras, odores, efeitos da luz sobre algo, entre outras coisas. Um degrau mais alto na escala mística se encontra naquela sensação de ter “estado aqui antes” ou de ter “visto isso antes”. Existem também um tipo de consciência produzido por intoxicantes e anestésicos, especialmente pelo álcool. “O poder do álcool sobre o gênero humano deve-se, por certo, à sua capacidade de estimular as faculdades místicas da natureza humana, geralmente pregadas ao solo pelos fatos frios e críticas secas da hora sóbria. A sobriedade diminui, discrimina e diz não; a embriaguez expande, une e diz sim. É, com efeito, a grande excitadora da função do Sim no homem” (Idem Ibidem). O mesmo pode-se dizer sobre o éter e o óxido nitroso, principalmente esse último, quando suficientemente diluído no ar, estimula a consciência mística de uma maneira extraordinária. O próprio James relata ter realizado algumas observações sobre esse aspecto da intoxicação pelo óxido nitroso, e desde então ele permanece com uma conclusão que se tornou inabalável, nas palavras dele: “A nossa consciência desperta normal, a consciência racional como lhe chamamos, não passa de um tipo especial de consciência, enquanto que em toda a sua volta, separadas dela pela mais fina das telas, se encontram formas potenciais de consciência inteiramente diferentes. Podemos passar a vida inteira sem suspeitar-lhes da existência; basta, porém, que se aplique o estímulo certo para que, a um simples toque, elas ali se apresentem em sua plenitude, tipos definidos de mentalidade que têm provavelmente em algum lugar o seu campo de aplicação e adaptação” (Idem Ibidem). E conclui que não se pode dar as costas para esse tipo de estado de consciência. E citando vários relatos, mostra como esses estados artificiais da mente se caracterizam como legítimos estados místicos. Dentro desses relatos, surge a seguinte questão: “Será 46

O rudimento mais simples da experiência mística é o aprofundamento da<br />

significação <strong>de</strong> uma máxima ou fórmula que <strong>de</strong> vez <strong>em</strong> quando nos ocorre. É quando<br />

ouvimos uma frase durante muito t<strong>em</strong>po e apenas entend<strong>em</strong>os o seu verda<strong>de</strong>iro significado<br />

um t<strong>em</strong>po <strong>de</strong>pois, como se a frase passasse a ter um significado mais profundo, mais<br />

tocante. Isso po<strong>de</strong> acontecer não apenas com frases, mas também com palavras, odores,<br />

efeitos da luz sobre algo, entre outras coisas. Um <strong>de</strong>grau mais alto na escala mística se<br />

encontra naquela sensação <strong>de</strong> ter “estado aqui antes” ou <strong>de</strong> ter “visto isso antes”.<br />

Exist<strong>em</strong> também um tipo <strong>de</strong> consciência produzido por intoxicantes e<br />

anestésicos, especialmente pelo álcool. “O po<strong>de</strong>r do álcool sobre o gênero humano <strong>de</strong>ve-se,<br />

por certo, à sua capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estimular as faculda<strong>de</strong>s místicas da natureza humana,<br />

geralmente pregadas ao solo pelos fatos frios e críticas secas da hora sóbria. A sobrieda<strong>de</strong><br />

diminui, discrimina e diz não; a <strong>em</strong>briaguez expan<strong>de</strong>, une e diz sim. É, com efeito, a gran<strong>de</strong><br />

excitadora da função do Sim no hom<strong>em</strong>” (Id<strong>em</strong> Ibid<strong>em</strong>). O mesmo po<strong>de</strong>-se dizer sobre o<br />

éter e o óxido nitroso, principalmente esse último, quando suficient<strong>em</strong>ente diluído no ar,<br />

estimula a consciência mística <strong>de</strong> uma maneira extraordinária. O próprio James relata ter<br />

realizado algumas observações sobre esse aspecto da intoxicação pelo óxido nitroso, e<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> então ele permanece com uma conclusão que se tornou inabalável, nas palavras <strong>de</strong>le:<br />

“A nossa consciência <strong>de</strong>sperta normal, a consciência racional como lhe<br />

chamamos, não passa <strong>de</strong> um tipo especial <strong>de</strong> consciência, enquanto que <strong>em</strong> toda<br />

a sua volta, separadas <strong>de</strong>la pela mais fina das telas, se encontram formas<br />

potenciais <strong>de</strong> consciência inteiramente diferentes. Pod<strong>em</strong>os passar a vida inteira<br />

s<strong>em</strong> suspeitar-lhes da existência; basta, porém, que se aplique o estímulo certo<br />

para que, a um simples toque, elas ali se apresent<strong>em</strong> <strong>em</strong> sua plenitu<strong>de</strong>, tipos<br />

<strong>de</strong>finidos <strong>de</strong> mentalida<strong>de</strong> que têm provavelmente <strong>em</strong> algum lugar o seu campo<br />

<strong>de</strong> aplicação e adaptação” (Id<strong>em</strong> Ibid<strong>em</strong>).<br />

E conclui que não se po<strong>de</strong> dar as costas para esse tipo <strong>de</strong> estado <strong>de</strong> consciência.<br />

E citando vários relatos, mostra como esses estados artificiais da mente se caracterizam<br />

como legítimos estados místicos. Dentro <strong>de</strong>sses relatos, surge a seguinte questão: “Será<br />

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