Revista de Direito UPIS volume 6

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O direito precisa, sobretudo, enfrentar o “abismo axiológico” 7 que a pósmodernidade implica a questão da legitimidade. Se são possíveis apenas consensos temporários, casuísticos, fica difícil propalar a visão positivista da legitimidade como mera validade intra-sistêmica, racional ou institucional, em que o sentido das normas inferiores encontra subordinação ao das superiores, independentemente de seu conteúdo axiológico, ideológico ou material. Há notória dificuldade de admitir ou valorar como consentânea uma legitimação garantida racional e institucionalmente, seja quanto a conteúdos estimativos, seja quanto a procedimentos argumentativos Sobreleva considerar, por oportunas, as palavras de Nietzsche 8 : Assim como no reino das estrelas há por vezes dois sóis que determinam a trajetória de um só planeta, assim como, em certos casos, brilham à volta de um só planeta sóis de cores diferentes, ora com luz avermelhada, ora com luz verde, para depois o atingir de novo simultaneamente, inundando-o de muitas cores. Também assim nós, homens modernos, graças à mecânica complicada do nosso “céu estrelado”, somos determinados por diferentes morais. Nossas ações brilham alternadamente com diversos matizes, raras vezes são unívocas – e acontece freqüentemente que cometemos ações multicores. Dessarte, afigura mais do que mandatório efetuar pequeno deslocamento do direito do mundo do “céu estrelado” em que gravita o direito posto ou oficial – das instituições e dogmas presentes no modo de pensar o direito na modernidade, representado pela ideologia liberal individualista – para o mundo REAL, inserindo-o no mundo da vida, dos “multicoloridos” conflitos intersubjetivos, dos novos quadros socioeconômicos, científicos e culturais. É preciso novo “Iluminismo”, ou seja, que os pensadores do direito assumam uma atitude corajosa de pensamento e de ação voltada a equacionar a difícil relação em que a progressão geométrica dos conflitos sociais na pós-modernidade é acompanhada em progressão aritmética de reformulação e atualização das leis. As luzes da razão devem ser lançadas, destarte, sobre os novos e desafiadores quadros sociais, políticos e econômicos. Da nova realidade decorrem novos desafios, os quais deverão ser enfrentados na atividade do profissional do direito, como as conseqüências resultantes das experiências genéticas com células tronco e a constitucionalidade da Lei de Biossegurança, debatida no Supremo Tribunal Federal; a questão da propriedade 66 R. Dir. UPIS, v. 6, p. 51 – 69, 2008
industrial, literária, artística, científica; redução do prazo para o direito ao usucapião; violência doméstica; o poder familiar; o tratamento jurídico à união entre homossexuais; os crimes praticados na rede mundial de computadores; a proteção aos direitos da personalidade; o anacronismo da Lei de Imprensa (Lei 5.250/67) para os valores da ordem democrática atual; a composição alternativa dos litígios por meio do compromisso arbitral. O jurista, além de possuir competência técnica, deverá se revestir de idoneidade, aptidão prática e sintonia com os novos problemas oriundos do cenário pósmoderno. É mister que não prescinda de sólida e consistente formação humanística, filosófica e principiológica, para saber lidar com as freqüentes e cada vez mais sensíveis transformações da sociedade, a qual padece com a deterioração dos hábitos e valores, e a busca acirrada e inescrupulosa do bem-estar. Referências Bibliográficas ADEODATO, João Maurício. Ética e retórica: para uma teoria da dogmática jurídica. São Paulo: Saraiva, 2002. AZEVEDO, Luiz Carlos. Introdução à história do direito. 2. ed. São Paulo: RT, 2007. BAUMAN, Zygmunt. Comunidade – a busca por segurança no mundo atual. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2003. COELHO, Luiz Fernando. Teoria Crítica do Direito. 3. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. GIDDENS, Anthony. As conseqüências da modernidade. Trad. de Raul Fiker. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1991. HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Trad. de Tomaz Tadeu da Silva, Guaracira Lopes Louro. 4. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2000. MARQUESI, Roberto Wagner. Fronteiras entre o direito público e o direito privado. Disponível em . Acesso em 30 abr. 2008. NIETZSCHE, Friedrich. Para Além do Bem e do Mal: prelúdio a uma filosofia do futuro. Trad. Alex Marins. São Paulo: Martin Claret, 2002. Notas 1 GIDDENS, Anthony. As conseqüências da modernidade. Trad. de Raul Fiker. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista, 1991. p. 69. R. Dir. UPIS, v. 6, p. 51 – 69, 2008 67
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