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como o consumerista. Não há negar, nos tempos atuais, que o contrato, assim<br />
como a proprieda<strong>de</strong> e a família, vistos <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a concepção oitocentista até agora,<br />
vêm ganhando conotação cada vez mais publicista.<br />
O direito <strong>de</strong> livre contratar é expressão maior do i<strong>de</strong>ário burguês pós-revolucionário,<br />
constituindo princípio vinculado à noção <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> e igualda<strong>de</strong> presente<br />
na <strong>de</strong>cantada Declaração <strong>de</strong> <strong>Direito</strong>s. É um dos pilares do Código <strong>de</strong> 1804 e<br />
está presente em todos os sistemas do mundo oci<strong>de</strong>ntal. Mercê <strong>de</strong>sse cânone, à<br />
pessoa humana, enquanto ser dotado <strong>de</strong> personalida<strong>de</strong> e como cidadão livre, é<br />
dado pactuar nas condições que julgar a<strong>de</strong>quadas, contratando como, com quem e<br />
o que <strong>de</strong>sejar. Trata-se da faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> dispor cláusulas, firmando o conteúdo da<br />
avença e criando, inclusive, novas modalida<strong>de</strong>s, vale dizer, os contratos atípicos.<br />
Há uma explicação histórica para essa liberda<strong>de</strong>. Livre das peias do absolutismo,<br />
a socieda<strong>de</strong> pós-revolucionária po<strong>de</strong> interagir e buscar o que há <strong>de</strong> melhor<br />
para si, cumprindo ao Estado intervir apenas para assegurar a execução do contrato<br />
não cumprido, ou seja, para fazer valer a palavra empenhada e não honrada. A<br />
essa esfera <strong>de</strong> po<strong>de</strong>res, que impe<strong>de</strong> a ingerência do Estado, abrindo espaço para a<br />
movimentação do particular, costuma-se chamar direitos <strong>de</strong> primeira geração.<br />
A plena liberda<strong>de</strong> na contratação parte da premissa <strong>de</strong> que a vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
ambos os contratantes tem o mesmo peso e que a contratação é lícita e legítima pelo<br />
só fato <strong>de</strong> respeitar-lhes a vonta<strong>de</strong>. Disso resultaram aforismos caros à burguesia,<br />
como o contrato faz lei entre as partes e o combinado não é caro. Essa premissa<br />
permitiu, por exemplo, que trabalhadores europeus, no auge da Revolução Industrial,<br />
fossem contratados para laborar mais <strong>de</strong> doze horas por dia em troca <strong>de</strong> um<br />
salário <strong>de</strong> fome e sem qualquer assistência social.<br />
A ambição burguesa leva ao extremo o papel da vonta<strong>de</strong>, firmando falsa<br />
idéia: a <strong>de</strong> que, sendo os homens naturalmente livres e iguais, a vonta<strong>de</strong> do contratante,<br />
sendo livre e igual à do outro, é suficiente para legitimar a convenção. Tal<br />
raciocínio seria verda<strong>de</strong>iro se os homens fossem naturalmente livres e iguais, mas<br />
não são nem po<strong>de</strong>riam ser.<br />
Chegou um tempo em que o Estado interveio no campo dos contratos.<br />
Primeiro, fê-lo na locação <strong>de</strong> serviços, disciplinando o contrato <strong>de</strong> trabalho para o<br />
fim <strong>de</strong> <strong>de</strong>limitar a jornada diária, estabelecer o direito a férias, ao salário mínimo, à<br />
assistência previ<strong>de</strong>nciária, <strong>de</strong>ntre outros benefícios. Mais recentemente, na disciplina<br />
consumerista, reconheceu a condição <strong>de</strong> inferiorida<strong>de</strong> do consumidor, assegurando-lhe<br />
direitos até recentemente impensáveis, como a facilitação do acesso à<br />
justiça com a inversão do ônus da prova e, especialmente, na disciplina dos contratos<br />
<strong>de</strong> a<strong>de</strong>são.<br />
62 R. Dir. <strong>UPIS</strong>, v. 6, p. 51 – 69, 2008