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Mbembe, ao passo que na ocupação colonial no período inicial da modernidade<br />

“tratava-se de capturar, delimitar e exercer controle sobre uma área geográfica<br />

física – de inscrever no solo um novo conjunto de relações sociais e espaciais”,<br />

no período moderno tardio “a ocupação colonial é uma concatenação de múltiplos<br />

poderes: disciplinares, biopolíticos e necro-políticos”. Dentre os postulados de<br />

Mbembe, inclui-se a maneira como, sob a ocupação colonial característica da<br />

modernidade tardia, políticas de verticalidade substituíram modelos espacializados<br />

e contribuíram para a redefinição da relação entre soberania e espaço. Portanto,<br />

conforme os cálculos de uma política de verticalidade, a soberania é expressa<br />

pela vigilância e pelo monitoramento de múltiplas geografias que habitam um<br />

mesmo espaço, o que resulta naquilo que ele chama de “ocupação estilhaçante”,<br />

o policiamento e controle não apenas do terreno, mas também do espaço aéreo,<br />

assim como de túneis subterrâneos, reservas de minério, armazéns de munição,<br />

abrigos antibomba etc. Mbembe dedica porção significativa de seu artigo a<br />

examinar as maneiras pelas quais estados pós-coloniais são particularmente<br />

vulneráveis a tecnologias sofisticadas de vigilância e manipulação sob o regime<br />

global contemporâneo da necro-política. Tal alegação é uma elaboração de um<br />

argumento proposto pelo autor em obra anterior, na qual afirma que “a pós-colônia<br />

é um palco particularmente revelador (e bastante dramático) onde se representam<br />

as questões maiores da sujeição e de seu corolário, a disciplina”.<br />

A noção exasperada e controversa do que constituiria o pós-colonial,<br />

especialmente no que diz respeito à expansão das fronteiras da teoria pós-colonial<br />

para incluir espaços geopolíticos previamente ignorados, tem sido motivo de<br />

debate nos campos da ciência política e das teorias literária e cultural, bem como<br />

na antropologia e na sociologia. Tötösy de Zepetnek sugere que:<br />

Partindo da premissa de que a antiga União Soviética pode ser<br />

entendida, por seus parâmetros políticos, militares, econômicos<br />

e ideológicos, como centro em suas relações com nações<br />

satélites, as literaturas da Europa Central e da Europa Oriental<br />

são compreendidas como periféricas em relação ao centro<br />

Soviético e, consequentemente, como situações pós-coloniais.<br />

Sugere-se também que a condição de pós-colonialidade daquela região torna-se<br />

problemática a partir de sua emergência, ou transição, para uma “nova situação<br />

colonial ditada por forças econômicas e mercadológicas controladas pelo centro<br />

da Europa Ocidental”. Chioni Moore argumenta, de modo similar, em prol da<br />

necessidade de “críticas simultâneas, tanto de um pós-colonial muito restrito<br />

quanto de um pós-soviético demasiado paroquial” e que:<br />

O termo pós-colonial e tudo o que ele implica – linguagem,<br />

economia, política, resistência, liberação e sua ressaca – pode<br />

ser aplicado com acerto às regiões anteriormente sob o controle<br />

russo-soviético pós-1989 e pós-1991, bem como já foi aplicado<br />

ao sul da Ásia pós-1947 ou à África pós-1958. O Leste é o Sul...<br />

Quando a Rússia movimenta sua empreitada colonial rumo ao<br />

oeste, a situação muda radicalmente, e falo aqui principalmente<br />

da expansão soviética ocorrida após a Segunda Guerra Mundial<br />

rumo aos Balcãs independentes e nações como a Polônia, a<br />

geração praça moscou o cinema húngaro contemporâneo<br />

Hungria, a Tchecoslováquia, a Romênia e a Bulgária. Segundo<br />

a maior parte dos critérios clássicos – ausência de poder<br />

soberano, restrições de viagem, ocupação militar, falta de moeda<br />

passível de conversão, economia doméstica governada pelo<br />

estado dominante e educação forçada no idioma do colonizador<br />

– as nações centro-europeias estavam, de fato, sob o controle<br />

Russo-Soviético de 1948 a 1989 ou 1991.<br />

De diversas maneiras, portanto, as políticas imperiais soviéticas imitavam as de<br />

outros impérios históricos e serviram como base ou justificativa para intervenções<br />

repressoras, e por vezes violentas, nos assuntos domésticos das nações satélites<br />

do Leste e do Centro europeus.<br />

Uma breve revisão da trajetória evolutiva do Estado húngaro suplementa as<br />

proposições teóricas de Tötösy de Zepetnek e de Chioni Moore, para que se possa<br />

construir uma ponte conceitual entre a consideração da pós-colonialidade húngara<br />

e a introdução de abordagens teóricas às políticas textuais da Europa Central e da<br />

Europa Oriental e à interrogação do necro-poder. A noção de Tötösy de Zepetnek<br />

abarca a proposição de que há uma espécie de dupla periferalização, à qual<br />

designa por “periferalidade intermédia”, das culturas da região. Certas ansiedade<br />

políticas e culturais foram sentidas como uma função das pressões exercidas por<br />

dois centros coloniais distintos e poderosos, nominalmente o Ocidente e a União<br />

Soviética (ver, por exemplo, “Configurations of Postcoloniality”). Aplicando-se a<br />

noção de Mbembe de necro-política, em função de ter sido submetida às ideologias<br />

concorrentes que se encontravam em alta durante o regime de bipolaridade<br />

que definiu a Guerra Fria, a Hungria esteve simultaneamente sob condições de<br />

ocupação colonial características à primeira modernidade e à modernidade tardia.<br />

Ocupada militarmente pela União Soviética de 1947 a 1989, e experienciando a<br />

importação – tanto por parte da União Soviética quanto dos comunistas húngaros<br />

– de modelos marxista-leninistas de organização política, econômica e social, a<br />

Hungria foi uma espécie de holding colonial do Império Soviético. Após o fracasso<br />

da revolução de 1956, o então recém-nomeado Secretário Geral do Partido<br />

Socialista dos Trabalhadores, János Kádár, estabeleceu um contrato social tático<br />

entre as autoridades governantes e a população. Depois de um período inicial de<br />

reajuste, os líderes húngaros começaram a realizar experimentos com a liberação<br />

de certos segmentos da sociedade, mais notavelmente a permissão, através do<br />

Novo Mecanismo Econômico (1966), da livre empresa limitada e uma importação<br />

cada vez maior de itens de luxo do Ocidente. Restrições de viagem foram também<br />

afrouxadas, dando ensejo a uma mobilidade mais intensa e a uma exposição<br />

cada vez maior a normas juridicopolíticas ocidentais, criando uma proliferação de<br />

diferentes tipos de zonas de contato e formas nuançadas de interação. O Novo<br />

Mecanismo Econômico, reforçado por uma atitude cada vez mais assertiva de<br />

autodeterminação no que diz respeito às políticas interna e externa, bem como a<br />

insistência em não ser identificada regionalmente segundo um modelo tradicional<br />

Oriente-Ocidente e sim como parte da Europa Central, permitiu à Hungria meditar<br />

sobre as tensões entre os dois principais modelos ideológicos então concorrentes,<br />

o comunista e o capitalista. Após a queda do Muro de Berlim, já em meados dos<br />

anos 1990, uma crescente classe abastada, cujos membros incluíam antigos<br />

oficiais do partido comunista – que se beneficiaram com as privatizações pós-1989<br />

– começou a reclamar maior acesso a possibilidades irrestritas de acumulação de<br />

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