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Mais, ainda - Centro de Comunicação e Expressão - UFSC

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<strong>de</strong> nós afirma não ter sido o primeiro. O que é seguro é que se não houvéssemos nos<br />

dividido nosso peso conjunto teria trazido o balão <strong>de</strong> volta ao solo um quarto do <strong>de</strong>clive<br />

abaixo e poucos segundos <strong>de</strong>pois, quando o vento acalmou. Mas, como disse, não havia<br />

uma equipe, não havia plano, nenhum compromisso a ser quebrado. Nenhum fracasso.<br />

Será, então, que se po<strong>de</strong> aceitar que correu tudo certo, cada um por si? Ninguém<br />

discordou, mais tar<strong>de</strong>, <strong>de</strong> que este foi um curso razoável <strong>de</strong> ação? Jamais tivemos esse<br />

consolo, porque um pacto mais fundo, ancestral e automático, está inscrito na nossa<br />

natureza. A cooperação -a base dos mais primitivos sucessos <strong>de</strong> sobrevivência das tribos<br />

<strong>de</strong> caça, a força por trás <strong>de</strong> nossa crescente capacida<strong>de</strong> para a linguagem, o instrumento<br />

<strong>de</strong> coerência social. Nossa aflição <strong>de</strong>pois, no "aftermath", foi prova da nossa<br />

consciência <strong>de</strong> fracasso pessoal. Mas largar a corda era nossa natureza também. O<br />

egoísmo está escrito em nossos corações. Esse é o nosso dilema <strong>de</strong> mamíferos – o que<br />

oferecer aos outros e o que guardar para si. Equilibrar-se nessa linha, mantendo o olho<br />

nos outros e sendo vigiado por eles, é o que chamamos moralida<strong>de</strong>. Suspenso a alguns<br />

metros <strong>de</strong> altura, sobre a escarpa em Chiltern Hills, nosso grupo dramatizou o conflito<br />

ancestral e sem resposta: nós ou eu.<br />

Alguém disse eu e então não havia mais nada a ganhar dizendo nós. De maneira<br />

geral, a gente exerce o bem quando faz sentido. Uma socieda<strong>de</strong> boa é aquela que dá<br />

sentido a essa bonda<strong>de</strong>. De um momento para outro, pendurados embaixo do cesto, nós<br />

estávamos numa socieda<strong>de</strong> em pedaços, estávamos nos <strong>de</strong>sintegrando. De um momento<br />

para outro, a escolha sensata era cuidar <strong>de</strong> si. O menino não era meu filho e eu não ia<br />

morrer por ele. No instante em que vi <strong>de</strong> relance um corpo caindo -mas <strong>de</strong> quem?- e<br />

senti o balão dar um solavanco para cima, a questão estava <strong>de</strong>cidida: não havia lugar<br />

para altruísmo. Bonda<strong>de</strong> não fazia sentido. Larguei a corda e me fui ao chão, calculo, <strong>de</strong><br />

uns quatro metros. Caí com todo peso <strong>de</strong> lado e me safei com uma perna machucada.<br />

Ao meu redor -antes ou <strong>de</strong>pois, não tenho tanta certeza - se <strong>de</strong>spencavam outros corpos.<br />

Jed Parry ileso. Toby Greene quebrou o calcanhar. Joseph Lacey, o mais velho, fizera<br />

serviço militar com o regimento <strong>de</strong> pára-quedistas e só teve o trabalho <strong>de</strong> dar uma<br />

cambalhota.<br />

Até eu me pôr <strong>de</strong> pé o balão já estava a 50 metros <strong>de</strong> distância e um homem<br />

continuava balançando na corda. Em John Logan, marido, pai, médico e membro <strong>de</strong><br />

uma equipe <strong>de</strong> resgate <strong>de</strong> alpinismo, a chama altruísta <strong>de</strong>ve ter queimado um pouco<br />

mais forte. Não precisava ser muito. Quando quatro <strong>de</strong> nós se largaram, o balão,<br />

liberado <strong>de</strong> uma carga <strong>de</strong> 300 quilos, <strong>de</strong>ve ter dado um salto. Um segundo <strong>de</strong> hesitação<br />

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