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Mais, ainda - Centro de Comunicação e Expressão - UFSC

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ombros <strong>de</strong> um pai que ele não reconhecia, berrou para ser posto <strong>de</strong> novo no chão,<br />

provocando um acesso <strong>de</strong> raiva na mãe exausta.<br />

Mas a maior parte eram sorrisos e abraços e em 35 minutos eu presenciei mais <strong>de</strong><br />

50 finais felizes <strong>de</strong> teatro, cada um com a aparência <strong>de</strong> ser um pouco menos bem<br />

encenado do que o anterior, até que comecei a me sentir emocionalmente esgotado e a<br />

suspeitar <strong>de</strong> que até as crianças estavam sendo insinceras. Já estava me perguntando até<br />

que ponto agora eu seria convincente ao cumprimentar a Clarissa quando ela me <strong>de</strong>u um<br />

tapinha no ombro, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> ter passado pela multidão sem me ver e ter dado a volta<br />

pelo outro lado. Meu distanciamento se dissipou imediatamente e eu gritei seu nome,<br />

como todo mundo...<br />

Menos <strong>de</strong> uma hora <strong>de</strong>pois, tínhamos estacionado junto a uma trilha que passa<br />

pelos bosques <strong>de</strong> faias em Chiltern Hills, perto <strong>de</strong> Christmas Common. Enquanto a<br />

Clarissa trocava os sapatos, eu enchia uma mochila com o nosso piquenique. Partimos<br />

<strong>de</strong> braços dados, <strong>ainda</strong> exultantes com o nosso reencontro; o que havia <strong>de</strong> familiar nela -<br />

o tamanho e consistência da mão, o calor e tranqüilida<strong>de</strong> da voz, a pele clara <strong>de</strong> celta e<br />

os olhos ver<strong>de</strong>s - também era uma novida<strong>de</strong>, resplan<strong>de</strong>cente <strong>de</strong> uma outra luz, que me<br />

fazia relembrar nossos primeiros encontros e os meses que passamos nos apaixonando.<br />

Ou, então, fiquei imaginando, eu é que era outro homem, meu próprio rival sexual,<br />

vindo roubá-la <strong>de</strong> mim. Quando lhe contei, ela riu e me disse que, para um sujeito<br />

simples, eu era um simples muito complicado e foi quando paramos para nos beijar,<br />

refletindo em voz alta se não teria sido melhor ir logo para cama, em casa, que<br />

percebemos, através da folhagem fresca, o balão <strong>de</strong> hélio à <strong>de</strong>riva sonhadoramente do<br />

outro lado do vale cheio <strong>de</strong> árvores, a oeste <strong>de</strong> on<strong>de</strong> a gente estava. Nem o homem, nem<br />

o menino eram visíveis para nós. Lembro <strong>de</strong> ter pensado, sem dizer, que essa era uma<br />

forma precária <strong>de</strong> transporte, on<strong>de</strong> quem <strong>de</strong>fine o curso é o vento, não o piloto. Depois<br />

pensei que seria essa precisamente a natureza <strong>de</strong> sua atração. E instantaneamente a idéia<br />

me fugiu da cabeça.<br />

Passamos pelo primeiro bosque, até chegar em Pishill, parando para admirar as<br />

folhas novas nas faias. Cada folhinha parecia brilhar com uma luz <strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro. Falamos<br />

sobre a pureza <strong>de</strong>ssa cor, folhas <strong>de</strong> faia na primavera, e como olhar para ela limpa a<br />

mente. À medida que íamos caminhando pelo bosque, o vento ia ficando mais forte e os<br />

galhos rangiam como maquinaria enferrujada. Nós conhecíamos aquele caminho muito<br />

bem. Era com certeza a paisagem mais linda a uma hora do centro <strong>de</strong> Londres. Eu<br />

adorava as quebras e ondas do campo, com seus blocos <strong>de</strong> calcário e sílex aqui e ali, e<br />

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